capitulo 26 - Who is Kevin? - parte 03

Conto de GibGab como (Seguir)

Parte da série A cor da loucura

Houve, não só um, mas mais de um problema para nos impedir. Digo nós, porque esse conto é nosso, não só meu como de todos que leram e continuam lendo. Gostaria de agradecer a essas pessoas que já estão aturando minha escrita hoje e também a meses. Se os leitores que eu poderia ter não são como vocês, então não vale a pena. Vamos viver nossas emoções e deixar o resto como está, como resto. Lhes desejo um ótimo ano, do fundo do meu coração.

As respostas aos comentários estão logo depois do capítulo.

E sobre Arthur, podem chama-lo como preferirem. Eu ainda prefiro Arthur.

______________________________________________________________________

- Oi, Arthur. Você sabe falar? - senti uma descarga elétrica percorrer minha espinha ao escutá-lo se dirigir a mim.

- Ele não vai falar com você. Leva muito tempo para ele se acostumar - falou Yuri.

- Não, pode deixar, eu consigo - puxei todo o ar dos pulmões – Oi, Rodrigo.

- Nossa! Ele falou – mais uma vez entrou em cena, metendo-se onde não era chamado. Yuri sabia como ser chato quando queria.

- Não seja chato, Yuri.

- Tudo bem, eu tenho mais de um amigo - ele foi até Tabatha, uma maluca divertida que conheceriamos melhor mais tarde na adolescência. Aquela foi a primeira aproximação que eu saiba, mas Yuri fazia parecer que não. Não era muito inteligente confiar nas histórias daquele moleque.

- Eu quero perguntar, porque não fala comigo?

- Eu não sei. Eu tenho medo de falar bobagem - prendi meus olhos nos dele. Quis passar o máximo de confiança.

- Eu não me importo, pode falar o que quiser.

- É que com você é mais difícil ainda.

- por quê? O que eu fiz?

- Nada, é que eu vi como todo mundo gostava de você e falava com você.

- Isso foi antes. Ninguém quer saber mais de mim.

- Eu quero - minhas expectativas para mim mesmo estar confiante cairam. Felizmente, Ro me deu alívio quando sorriu discretamente. Não foi um sorriso de deboche.

Uma vontade de sair dançando tomou conta da minha cabeça. A minha primeira conversa com Ro foi bem sucedida. A partir daquele dia passei a ser mais desinibido com ele por perto.

•••

Foram inúmeras passagens com Rodrigo dividindo a cama comigo. Ele me visitava com frequência, dormíamos juntos com frequência. Como eu queria que esse "dormir" não significasse apenas dormir mesmo. O bom é que pude me aproveitar um pouquinho, nada de mais, alguns toques. Aquilo me torturava. Não era para ser nenhum assédio. Com isso, eu pretendia que Ro notasse por conta própria o quanto eu o desejava. Ele, por sua vez, fingia não estar notando nada. Não sei se era para proteger nossa amizade, então não me manifestei.

Depois de um tempão ouvindo que sou para ele como um irmão, entrei no seu jogo. Não durou tanto quanto queria. Houve recaidas.

Recaidas não combinam com bebidas.

Adolescentes bebem, eu não conseguia ver de outra maneira. Não aproveitaria a curta vida jovem sem um leve consolo. Tentei levar Rodrigo para o mundo onde isso era filosofia. O resultado foi um beijo. O jeito foi ignorar no dia seguinte, como eu já sabia que ele também faria.

Me custou ter dúvidas sobre o sucesso nesta situação. Fui vencido pelo cansaço. Rodrigo só queria saber de Matheus. Eu estava cada vez mais distante de minhas metas românticas. Apenas ficar com alguns garotos não me satisfazia mais. Eu precisava de um relacionamento mais sério.

•••

Em uma noite, que já se via e ouvia algazarras a quilômetros de distância, me meti em uma daquelas festas insanas, cheias de menores se misturando a universitários pirados e baladeiros de cateirinha, em um depósito; porém, se seguindo há duas horas, a música não me divertia mais. Agora era atordoante ouvir todo aquele barulho. Homens e mulheres passavam as mãos em mim descaradamente. Me perdi por entre a multidão.

Me encontrava totalmente sem rumo quando o vi a uma distância segura. Segura, pois ele me agarraria ali mesmo se tivesse chance, eu tenho certeza. Era um sujeito moreno claro, possuidor de um corpo atlético junto a um belo rosto com olhos encantadores. Havia alguma coisa que chamava bastante atenção. Pensei até que seus olhos eram claros, mas quando cheguei perto vi que era uma perfeição ainda mais elaborada. Seu olhar se fazia delicado pelo tamanho dos cilios, entretanto, se fazia forte pelas sobrancelhas grossas, que quebravam um pouco da delicadeza, o tornando másculo.

Que diabos!

•••

Nosso suor se misturava, em um canto distante da festa. Seus beijos ficavam cada vez mais quentes. Impulsivamente, levantei um pouco sua camisa e toquei suas costas nuas. Aquilo foi um erro. Nicholas, como disse que se chamava, transformou um simples amasso em um amasso pré-sexo selvagem, beijando-me com fúria. Afastei seus lábios dos meus para ter tempo de respirar. Ele aproveitou a moleza que estava meu corpo para enfiar a mão na minha cueca.

— Ei! Volta aqui. — gritava aos quatro ventos quando, graças a Deus, consegui fugir de seus braços.

— Vá à merda! Você é um estúpido.

Comemorei crente de que havia o despistado. De qualquer forma eu ainda não conseguia encontrar a saída. Ele acabaria me achando. Sim, infelizmente foi o que aconteceu. Dessa vez, não consegui me soltar sozinho, contudo, uma alma — concerteza boa — usada por Deus, passou por perto, esbarrando bruscamente em Nicholas. Não esperei para vê-lo se levantar, claro.

•••

Uma hora depois, com o lugar mais vago, pude, até que enfim, encontrar a porta de saída/entrada. Sentei-me no banco de uma pracinha minúscula próxima. Reconheci algumas pessoas da festa que passavam por perto. Fiquei sonolento, morto-vivo. Pensei seriamente em dormir no banco. Minha cabeça cambaleava rodopeando para jogar meu corpo no momento em que alguém me chamou não muito distante.

Aquela silhueta não me era estranha. O POBRE RAPAZ usava uma calça skinny preta, uma camiseta branca e, por cima, uma jaqueta. O clima quente o dedurava, ele não podia ser daqui, foi o que pensei de início. Era um cara alto, com o cabelo arrepiado e um corpo magro porém definido.

Me dispuz de imediato. Quem diria que depois de ser quase estuprado naquela droga de festa, eu ainda teria ânimo para me excitar com outro cara, levando em consideração o que já havia passado antes. Aquilo me deixou acesso, revigorado e esperançoso. Eu ainda tinha jeito.

Oh! Sim!

— Ei, garoto! Você mesmo. Tem horas?

— Cla... Claro.

As palavras não saiam da minha boca. Não havia garoto mais confuso que aquele diante de mim.

— Ok — deu-me as costas. Uma risada escapou assim que se distanciou um pouco.

— Espera! — Gritei — São 03:50.

— Obrigado — seu sorriso ia ficando maior, ele estava se reaproximando — Prazer. Eu me chamo Léo, Leonardo, na verdade — estendeu sua enorme mão — Não vai me comprimentar? Não fala com estranhos? — sacaneou. Sua risada de criança grande me deu calafrios.

— Desculpa. Também é um prazer. Eu me chamo Arthur.

— Então, Arthur, eu notei que você está aí sozinho, quase se entregando ao sono. Você não é nenhum mendigo, é?

— É claro que não — minha gargalhada saiu um pouco mais escandalosa do que eu pretendia.

— Estou afim de fazer uma boa ação. Não quer dividir o táxi comigo?

— Sim, por favor — confirmei sentindo um alívio.

— Ok. Vamos? — estendeu sua mão.

— Deixa, eu posso me levantar sozinho.

Leonardo precisou me levantar contra a minha vontade. Léo me levou ao táxi. Uma leve impressão de que ele não ia deixar que eu adormecesse se formou. Ele não estava afim de pagar a despesa pelo vomito que eu poderia deixar escapar. Acordado, me controlava melhor. Ele só não sabia que eu não estava bêbado e sim sonolento.

— Arthur? Eu posso te chamar de Art? — ele puxava conversa sentado no banco de trás comigo.

— Fique a vontade — tentei parecer seguro. Aquela aproximação rápida me dava medo.

— É um prazer conhecê-lo, Art.

— Você já me disse isso.

— Não, antes eu disse para o Arthur e não para o Art.

— E qual é a diferença?

— Como um exemplo posso te mostrar a diferença entre o Léo e o Leonardo, pode ser?

— Agora não dá. Tenho que ir embora — abri a porta sem me dar conta de que o carro estava em movimento.

— Opa! Vá com calma. Você vai cometer suicídio pulando do carro porque eu te convidei para sair?

— Sair? Agora? Como pode ver, eu não estou em condições — troquei risos com Léo. O que tinha de tão hilário para me fazer rir daquele jeito? Minha intenção não era rir, muito menos assim. Queria parecer sério.

— quem disse que precisa ser agora? Agora não temos tempo mesmo, o sol já está quase nascendo. Não quer sair amanhã comigo? Nós podemos nos encontrar aqui. Eu posso te levar a um lugar muito maneiro.

— Não vai dar — o encarei abertamente, demonstrando o quanto àquilo parecia suspeito para mim.

— Opa! Não é o que você está pensando.

— Não é?

— Claro que não. Eu não sou gay e tenho namorada.

— Eu não disse nada — ergui as sobrancelhas de um jeito exagerado. Tudo que fazia tinha um certo exagero.

— Mas pelo visto pensou. Não liga não, não estou bravo. Eu quero alguém para sair comigo, um amigo, porque minha namorada não é muito de sair.

— Você não tem amigos? — meus olhos se esbugalharam depois que percebi a grosseiria que havia cometido — perdão.

— Deixa pra lá. Eu tenho amigos. Eles não gostam de sair porque são muito religiosos, evangelicos. A minha namorada também é.

— Você é evangelico?

— Costumava ser. A minha antiga igreja não tinha espaço para pessoas como eu.

— Escuta, eu não posso descer aqui? Já está pertinho.

— Nem pensar. Estamos em uma parte muito perigosa da cidade. Não vê aqueles marginais usando drogas? — apontou para um grupo de garotos suspeitos na calçada, que fumavam sigarros igualmente suspeitos.

— Droga! Eles irão me matar.

— Eles? Matar?

— Meus pais.

— Já entendi. Você parece bem novinho mesmo.

— Eu não fugi de casa, se é o que está pensando.

— Quantos anos você tem?

— Tenho quinze.

— Eu tenho dezecete, algum problema?

— Por que teria?

— Não é nada. Você parece um pouco mais novo do que diz ser.

— Todo mundo diz isso. Deve ser porque eu sou um pouco baixinho.

— Gosto de baixinhos.

— Oque você quer dizer com "gosto de baixinhos"?

— Não me leve a mal. Eu quis dizer que gosto de pessoas baixinhas — um alívio para mim até... — Minha namorada também é assim.

— Tá legal, agora eu preciso mesmo ir — o táxi acabara de parar em frente a minha casa.

— Ok. Pode ser no próximo sábado? Nos vemos sábado?

— Pode ser — disse depois de mais de meio minuto pensando. Na verdade, me forcei a falar para que me deixasse dormir.

— Ok. Até sábado.

— Até sábado.

— Espere! Você ainda não me deu seu numero — o taxista não resistiu a gargalhar o ouvindo. Ele era realmente insistente. Na certa, o taxista devia estar pensando: "que viado teimoso!" — Sabe, para combinarmos tudo. Você pode ter um imprevisto e tal.

— Mas...

— Ah não! Nem pensar! Você não vai me dar um bolo — falou, colocando as mãos nos bolsos, riscando o chão com o pé esquerdo, imitando um gesto tímido. O taxista negou com a cabeça, de volta a gargalhar.

— Cara!

— Você quer dormir, não quer? Essa noite você não conseguirá dormir sabendo que tirou minhas esperanças — foi uma confissão de suas verdadeiras intenções — Ah vai. Não custa nada.

— Ok, ok.

Ainda tentei o velho truque do número falso. Léo não era tão ignorante ao ponto de não perceber. Ele testou e pode constatar. Me sentindo envergonhado, entreguei o verdadeiro número, dessa vez, sem dizer uma palavra.

As coisas em casa não estavam muito boas. Papai ficava frustrado por eu não conseguir cumprir meu papel. O Riagain pai conseguia esconder muito bem a antipatia que sentia por meus amigos, mais específicamente os que frequentavam nossa casa, pois, segundo ele, não estávamos ali para brincar. Meu pai só sabia me pressionar.

Depois de ouvir mais um sermão do meu velho, tive a reação normal de qualquer adolescente, corri para meu quarto. Meu coração quase saiu pela boca ao encontrar um completo estranho sentado na minha cama.

Não tenho certeza da idade, uns 20 e tantos anos, por aí. Era um cara alto, magro, com cabelos negros e olhos castanhos escuros. Ele usava um belo terno preto, pena que estivesse tão amarrotado. O gel no cabelo cobinava perfeitamente com seu ar de mauricinho. Seu olhar sedutor e as dobras perfeitamente visíveis em sua roupa me levaram a imaginar coisas absurdas para explicar o amassado.

No fim das contas o olhei tanto que já até me parecia familiar. Foi o que fez o susto piorar quando o vi se aproximar.

— Quem é você? — interroguei. — Não se aproxime — forcei minha voz a não falhar. Saiu baixo, porém passando uma certa irritação.

— Não precisa ficar nervoso, Kevin.

— Kevin? Você deve estar me confundindo. Fora daqui! Eu não te conheço.

— Não precisa mentir para mim. Nós estamos aqui, o Circle.

— O Circle?

— Eu vim para ter certeza de que você está fazendo tudo direitinho.

— Me desculpe — abaixei a cabeça em sinal de vergonha e arrependimento.

— Então é verdade?

— Não é culpa minha. Ele não me deixa chegar perto. Eu juro que me esforcei.

— Não o bastante, pelo visto.

— Ele só sabe me fazer pagar mico.

— Mas o que é isso? Você não é um adolescente comum. Você não teve a infância para te tornar igual aos outros. Comporte-se como um adulto, porque pessoas como nós amadurecem rápido. Essas palavras chegaram a me dar nojo. Nem parece que você é o mesmo Kevin que passou por tudo aquilo.

— E quem é você para me dizer o que tenho que ser?

— Jura que não lembra de mim?

— Não, eu não lembro. Talvez porque prefira não lembrar.

— Olhe para mim, Kevin. Eu salvei a sua vida. Graças a mim, você está livre.

— Está enganado. Foi Pedro que me salvou.

— Pedro, Pedro, Pedro — cantarolou — Você nunca se perguntou o motivo de ter ido parar naquele túneo?

— Provavelmente porque acharam que eu estava morto.

— Exato. Mas isso foi graças a mim.

— Quem é você afinal?

— Você me conhecia como Liam.

Certo, ficou claro que aquele estado semelhante a um tipo de letargia idusida, dando as condições para a simulação da minha morte foi provocada por uma substância levada até mim por Liam. Liam, agora Paulo, também me falou sobre o sacrifício que teve que fazer por mim. Havia um espião do Circle que se infiltrou nas instalações e contactou-o. Ele foi escolhido porque era o mais maduro e também o que mais se manifestava sobre querer escapar. Foi dito que só um poderia sair de lá. De última hora, Liam pede ao espião, aproveitando meu desmaio, que me leve em seu lugar. Eles só não contavam com a possibilidade de que eu despertasse mais cedo. É impressionante como isso sempre tem interferido. Foi Pedro quem me encontrou.

Um garoto tão corajoso não ficaria a mercê daqueles criminosos por muito tempo. Foram dois anos e meio até ele ter novamente a chance de escapar. Foi feito um treinamento durante esse período. O seu superior o deixou responsável por me vigiar, jurando se assegurar de que eu cumpriria a missão. Câmeras escondidas foram instadas na minha casa.

Daquele dia em diante, Paulo, como eu deveria chamá-lo agora, se tornou a minha mais frequente visita. Papai fez uma série de perguntas a ele. E um dia ele nos deu a mais animadora surpresa que tivemos desde que fui encontrado. A irmã de Rory estava de viagem marcada para o Brasil. A ruiva ______ recebeu uma suposta ligação do irmão. Liam não conseguiu que ela lhe contasse tudo que o provável Rory disse na ligação. Ela estava vindo ao Brasil para nos contar. Sua mãe teria a obrigado a prestar depoimento, mas na hora H a garota ficou com um pé atrás por uma razão: Rory disse que, além da própria, somente eu poderia ficar sabendo. Pelo que foi dito, tudo apontava para a Califórnia.

•••

— Alô. Art? — disse o sujeito da ligação com um número desconhecido.

— Quem?

— Arthur.

— Sou eu. Quem está falando?

— Eu.

— Eu quem?

— Eu! Ora bolas! — uma risada irritante do outro lado da linha.

— Que legal. Vá mandar trotes para sua vovózinha.

— Não é trote — novamente a risada.

— Então quem é?

— É o Léo da pracinha. Não lembra — sua voz saiu com um pouco de decepção.

— Nã... Não — menti.

— Sério?

— Desculpa.

— Tudo bem — a decepção mais uma vez — Você me deu um bolo e já faz alguns dias que tento ligar.

— Desculpa por isso também. Ando muito ocupado.

— Será que podemos remarcar para este sábado? — um silêncio se seguiu. Pensei em todas as broncas do meu pai, a pressão de Paulo/Liam, a embromação de Rodrigo. E Puta que pariu! As festas de fim de ano passaram sem que eu percebesse. Eu não aproveitava a vida tanto quanto imaginava aproveitar.

— Por quê não hoje?

— Ok — disse Leonardo com uma animação pouco leve — Você decide o horário.

•••

Foi vendo a ansiedade transmitida no gesto de Léo ao esfregar as mãos, imitando um consolo para o frio ou tentando limpar o suor, que as dúvidas voltaram. Será que isso era mesmo por meu primo? Na minha cabeça, eu precisava ter uma vida sexual ou romântica para, quando encontrá-lo, provar que ele também pode ter. Será que no fundo eu estava fazendo por mim? Eu não serei esse cara egoista. Me dedicarei a encontrar meu primo, mesmo que, para isso, eu tenha que destruir minha vida.

— E não é que você veio.

— Desculpa te decepcionar, mas só vim para dizer que não posso ir.

— Por que não?

— Por que não? Eu só não posso.

— Está com medo?

— Olha, eu não te conheço. Se você não me deixar em paz...

— Calma, calma. Eu não sou nenhum maníaco tarado.

— Ninguém aqui tocou nesse assunto. Está admitindo que pretendia algo comigo?

— Não, é o contrário disso. O que acontecer depois é culpa do destino.

— Você é louco.

— Não há uma mente sam sequer neste mundo, caro Art.

— Eu vou embora.

— Espera! — ele puxou meu braço — Me dá uma chance, vai.

— Não me toque — ergui meus olhos para encara-lo, tentando parecer o mais sério possível.

— Eu não vou te machucar. Não quero nada de você além da sua companhia e amizade.

— Por que está forçando tanto? Por que insiste?

— Eu vi aquele garoto te beijando na festa. Ele pareceu um pouco bruto.

— Não! Egano seu.

— Não precisa se preocupar ou agradecer.

— Agradecer?

— Eu esbarrei no idiota de propósito.

— Então foi você?

— Sim. Eu não gosto de brigas, mas eu não podia deixar você ser estuprado em público. Essa foi a solução que encontrei para acabar com isto sem ter que quebrar a cara daquele panaca.

— É mesmo? — sem querer, esbocei um sorriso bobo. Não pude evitar estar me sentindo protegido perto dele — por quê?

— Eu faria isso por qualquer um, mas você em especial... Você parecia tão frágil, tão indefeso. Até pensei que você fosse chorar haha — ele sentou-se em um banco próximo e segurou dois dos meus dedos e puxou com a levesa e cuidado que nunca tiveram comigo — Eu sou o mais velho de cinco irmãos. Eu estou acostumado a cuidar das pessoas. Eu tenho essa necessidade de proteger todo mundo, inclusive os fracos e oprimidos — rimos da sua última frase.

— Está me chamando de fraco?

— Você é um pouco delicado, mas eu gosto disso.

— Delicado?

— Não se assuste com o comentário. Eu quis dizer que você parece frágil. Não estava fazendo piada.

— Sei...

— É sério. Eu não tenho preconceitos e você parece... Tranquilo.

— Tranquilo? Está sugerindo que existe um padrão gay em que eu não me encaixo. Isso sim é um preconceito.

— Não, por favor, não pense isso.

— Relaxa — minha mente obrigou meu corpo a parar, me calando e segurando a respiração até várias frases surgirem nos meus pensamentos — Eu estava brincando — simplifiquei.

— Ufa! Que alívio — figindo limpar o suor da testa, passou a mão por ela. Rimos.

— E então... Vamos?

— Vamos — foi o que pode dizer.

ELE NÃO IRÁ ME DECEPCIONAR.

Certo, a verdade é que com meu melhor amigo por perto, meu namorado não existia. Enfim me senti Culpado por estar agindo assim. Tomei uma decisão importante: "Ro que se dane! Eu tinha um namorado que se importaava comigo. Dali em diante, minha amizade colorida seria apenas uma simples amizade deixada em segundo plano.

O mal de quem quer esquecer é o destino.

•••

A noite era minha vida. O Arthur é um ser noturno, ama ver a escuridão sendo consumida pela luz elétrica multicolor. Eu me divertia observando as pessoas embriagadas antes de eu mesmo me embebedar. Elas pareciam tão felizes. Sendo assim, ainda mais tão inusitado, uma festa no meio da floresta, como um grande festival de música eletrônica. Pena que dessa vez eu tinha uma companhia, e ditadora ainda por cima. Léo me vigiava por dois motivos primordiais para ele: primeiro, para barrar qualquer cara que chegasse perto de mim; segundo, não me deixar beber.

Seria perfeito se a velha história não me perseguisse novamente. Não acreditei no que estava vendo. O destino resolveu me pregar outra peça. Enquanto Léo ia ao banheiro — qualquer moitinha por perto — uma certa pessoinha detestável vinha na minha direção.

— Eu não sabia que você gostava de festas?

— Tá brincando, Matheus? O Arthurzinho aí não perde uma — disse Junior, um dos amigos idiotas de Matheus, de passagem, logo saindo em outra direção.

— Vejamos, como é que posso dizer isso? Ah sim. Não é da sua conta.

— Ora! Pega leve, Arthur. Por que está sendo tão mal-educado?

— O que você quer exatamente? Por que está falando comigo? Nós nunca nos demos muito bem.

— Quero encerrar este assunto, dar um basta em tudo isto. Por que brigamos tanto mesmo? Você sabe? Deveríamos deixar as diferenças de lado.

— Espera que eu acredite nisso?

— O que eu ganho mentindo?

— Não posso ler sua mente, sabia?

— Não fique tão na defensiva. Nós até temos algo em comum.

— Temos?

— Ambos gostamos de Rodrigo.

— Ai! Essa doeu — ironizei.

— Do que está falando? — ele ergueu uma das sombrancelhas e riu, inclinando a cabeça um pouco para cima. Estava claro que ele estava sendo sorrateiro.

— Dois podem jogar este jogo.

— Não há nenhum jogo. Você está paranoico — disse, mudando sua expressão para outra que era tão convincente que fazia com que eu me esquecesse das primeiras — Venha, vamos nos divertir. Venha esquecer tudo — sua mão tocou meu braço, esperando alguns segundos para ter certeza de que eu não iria resistir.

Ele ainda insistiu mais e completamente bebado não tinha como negar. Quando meu namorado me encontrou já era tarde demais. Ele teve que ligar para meus pais, avisando que eu dormiria na sua casa. Valeria a pena toda aquela briga de casal que tivemos depois se eu conseguisse tirar algo da boca de Matheus. Essa era a minha chance de encontrar Rory.

Matheus sempre me rejeitou por eu fazer parte de outro grupo, o dos nerds. Meu disfarce me colocou do lado errado. Para me aproximar de Matheus, eu teria que ter ao menos 10% da popularidade que ele tinha. Acredito que com as mudanças no meu visual e na minha postura, tudo tenha mudado. Mas sempre existiria Rodrigo para nos distânciar.

No começo, bem no início, quis muito me aproximar daquele garoto. O problema era que o idiota, mesmo ignorando Ro o tempo todo, não gostava de me ver ao seu lado. Ele fazia o possível e o impossível para me ver longe do meu melhor amigo. Me fez tropeçar, jogou cola no meu uniforme, colou chiclete no acento da minha cadeira, cortou parte do meu cabelo com uma tesoura de cortar papel, pôs coisas estranhas na minha mochila e por aí vai.

Aquele foi o início do novo plano de Matheus para me manter longe de Rodrigo. Ainda me rendeu uma festa para comemorar a minha viagem aos EUA. Acabei atraindo alguns aproveitadores. O que eu mais desejava acertar era Matheus. Pelo visto, o peixe mordeu a isca, pois foi ele que planejou a festa surpresa.

•••

Foram dois meses enrolando. Não sei se ele ficaria muito feliz ou muito triste com a notícia. Leonardo queria atenção. Ele já não aguentava mais ser o ciumento. A sua solução foi também me fazer ciúmes. Contando com os problemas familiares, tinha tudo para não dar certo.

Um dia, cheguei super exausto da escola, mais do que de costume. Eu vim a pé , com um calor insuportável na minha cola, acrecentando que as aulas foram muito cansativas. Ao chegar no quarto, com a camisa ensopada de suor, me deparei com a visão de Léo deitado na minha cama, dormindo, sem ter tirarado os sapatos. A única coisa que passou pela minha cabeça foi enchotar aquele folgado o quanto antes da minha cama. Já fazia uma semana que o canalha não atendia minhas ligações. Não pensei duas vezes e o puxei de uma vez, o fazendo rolar para fora da minha cama. Tive vontade de rir depois, pois nem assim o preguiçoso acordou.

Depois de uma longa espera, entendi que havia algo de errado, então fui até a cómoda e peguei um frasco de um perfume vagabundo qualquer, me sentei no chão e coloquei a abertura do frasco próxima ao seu nariz. O safado acordou tocindo, pondo o dorso da mão na boca. Não movi um dedo para ajudá-lo enquanto se engasgava com a própria saliva.

— Oi — ele finalmente disse, ainda com dificuldade para respirar.

— O que está fazendo aqui? Resolveu lembrar que tem um namorado?

— Calma, amor. Veja, eu já estou a uma semana sem dormir. Tudo que eu quero agora é te explicar o que aconteceu.

— ok. Estou ouvindo.

— Vai me deixar falar?

— E porque não?

— É que eu achei que você fosse resistir um pouco.

— Acha que eu fiquei aqui chorando, esperando por um sinal de vida do meu "amado namorado"? — ironizei.

— A julgar pelas ligações e mensagens... — disparou em tom baixo.

— O que disse?

— Nada. Só disse que você tem razão.

— Não vai me contar o que aconteceu?

— Não sei se devo.

— Então por que está aqui?

— Tem razão.

— Porque sou sempre eu que tenho?

— Você está certo. Eu não te mereço.

— Ok, já entendi.

— Entendeu?

— Sim. Você me traiu — falei na mais mansa calma, o que levantou o estranhamento nos olhos dele. Leonardo não sabia onde estava se metendo.

— É sério? Você está mesmo falando isso com essa tranquilidade?

— Léo, eu ainda sou jovem, ainda tenho muito tempo pela frente. Por que eu deveria me preocupar com isso?

— Ok. Mas eu não te traí.

— E o que poderia ser tão trágico que o faria deixar o conforto de seu lar para vir parar na casa desse desconhecido.

— Não brinque com isso. Eu nunca te esqueceria.

— É melhor você falar logo. Já estou perdendo a paciência.

— Certo. O que vou dizer poderá mudar tudo, dependendo da sua decisão — seus olhos mostraram sinal de que iria chorar, mas pareciam esperar pelos meus, que não se abalavam — A minha família... Eles descobriram, sabem que estou namorando um garoto, você. A culpa foi minha. Eu deixei meu celular dando sopa por aí.

— Obrigado por dividir isso comigo.

— Obriagado por dividir isso comigo? É tudo que tem a dizer?

— Agora você tem o direito de me criticar depois de me abandonar sem avisar nada?

— Me desculpa, por favor, amor.

— É só isso?

— Infelizmente não.

— O que mais você aprontou?

— Minha familia está me obrigando a voltar com minha namorada e, ainda por cima, a me casar com ela. Se eu não fizer isso vou perder tudo. Eu admito, não sou um cara trabalhador que lutou para conseguir tudo que tem. Os meus pais me deram um apartamento e o que mais tenho de valor. O que eu faço, Art? Estou desesperado.

— Faça o que lhe der na telha.

— O que?

— A vida é sua, Léo. Já está mais do que na hora de você se responsabilizar? Não me pergunte o que fazer como se eu tivesse a obrigação de responder. Eu não posso te ajudar. Só você pode se ajudar.

— Eu sei. Me perdoa, me perdoa por tudo.

— É só isso? — repeti.

— Como assim é só isso?

— É só isso? — voltei a repetir.

— É? Quer dizer, sim, é só isso.

— Eu te perdoo — seus olhos, vermelhos de tanto chorar, tornaram a saltar. Ele não conseguiu acreditar na tranquilidade com que eu lidava com a situação.

— Você só pode estar brincando.

— Eu já disse que tenho tempo o suficiente para me arriscar.

— Mas o que isso significa?

— Faça a coisa certa, Leonardo.

Os passos pesados do meu pai nos obrigou a não continuar com a conversa. Praticamente expulsei Léo da minha casa. O empurrei até o quarto de hóspedes antes que meu pai chegasse perto o suficiente para vê-lo. Quando meu pai, acompanhado de Liam e Alice, entraram no quarto, aproveitei para colocá-lo para fora, ainda o empurrando.

Nossa relação nunca mais foi a mesma. Eu sabia que Léo estava mentindo. Com certeza ele veio com a intenção de contar a verdade, mas se arrependeu. Há um mês, descobri que ele vivia uma vida dupla. Ele estava noivo. Acho até que ele nunca terminou com ela. Por que perdoá-lo tão facilmente? Eu queria aproveitá-lo o máximo possível, pois sabia que depois eu jamais o veria novamente.

Como disse, ele queria me fazer ciúmes, não que tenha funcionado. O que me fez ficar com uma pulga atrás da orelha foi a sua insistência em querer deixar a porta aberta para que eu descobrisse ou desconfiasse. Ele passou a tocar no nome dela sempre que tinha chance. A curiosidade me tirava o ar. Pensei em terminar com ele assim que descobri, porém houve algo que me fez parar para meditar. Segui a noiva até um restaurante. Ela estava com a mãe de Léo quando começou a se sentir mal. Não houve um homem ou mulher que movesse um dedo para ajudá-la além de "nossa" sogra. Pesando bem, a reação normal ao ver uma pessoa vomitando era se afastar. Pois bem, a minha não foi essa. Fui chegando vagarosamente até me encostar para ampará-la.

Aguardamos a saída da moça, que demorava na sala do médico, em um banco no corredor. Enquanto isso conversei um pouco com dona Amélia, a mãe do Leonardo.

— Eu queria agradecer mais uma vez por ter nos ajudado.

— Não precisa agradecer.

— Claro que precisa. Imagine só, a noiva do meu filho passa mal e eu não posso fazer nada. Uma senhora de idade como eu não poderia mesmo.

— A noiva do seu filho?

— Sim. Ela é linda e ele escolheu bem, não é? Mas não se anime porque ela já está comprometida.

— Não, eu não quis...

— Sim, sim, eu sei. Estava brincando. Você ainda é só uma criança.

— Já sou um mocinho, dona Amélia — a olhei contendo meu ar risonho e lhe dei uma piscadela, a fazendo rir.

— Espere. Você me conhece?

— Sou um amigo do seu filho — agi rápido.

— Acho que estou lembrando.

— Dona Amélia! Dona Amélia! — interrompeu sua nora.

— Estou aqui, minha filha.

— Temos que ir.

— Ir para onde? O que foi que aconteceu?

— Houve um problema, então não teve como fazer exame nenhum.

— E onde vamos?

— À farmácia.

Eu me agachava entre os carros, esperando ver na farmácia a minha frente estar errado. Ela levava uma coisa em sua mão até a bolsa. Que cruel, disse a mim mesmo ao ver o teste de gravidez caseiro em sua mão.

Fiz longas meditações. Conclui que nada podia ser feito. Eu não queria me desfazer de Léo, então ao chegar em casa e o encontrar em uma calçada na frente, jurei aos céus que iria aproveitar o namoro enquanto ainda podíamos fingir que estava tudo bem.

É lamentável o jeito como o tempo passou tão rápido e o inevitável chegou. Ele pareceu a vítima, pois até eu me espantava com minha própria frieza. Não foi do jeito que pensei que seria. O irresponsável abandonou a noiva grávida. Me vi na obrigação de acabar com isso logo.

— Então é isso, Arthur? Eu aqui preocupado por estar sendo um canalha com você, e você aí me usando.

— Não é nada pessoal, cara.

— Não é nada pessoal? Pois para mim é. Eu desisti do meu filho para ficar com você.

— O problema é seu e do moleque. Não. Pensando bem, é só seu, porque para ele vai até ser bom não ter você como pai.

— Isso ainda me parece magua. Por favor, diga que está terminando comigo porque está magoado. Não diga que nunca se importou comigo.

— Eu me importei com você. Você transa muito bem — não deixei que ele percebesse o quanto eu também estava surpreso com o que abava de dizer. Para mim era a melhor forma de fazê-lo entender. Eu teria que ser duro com ele para um final feliz à criança que iria nascer. Se nós iríamos acabar mal de qualquer jeito pelo menos alguém sairia ganhando dessa história, e que seja o mais inocente.

— Eu não acredito. Então por que você ficou tanto tempo comigo?

— Eu já disse, você transa muito bem.

— Você namarou comigo por quase um ano só pelo tamanho do meu bilau, é isso?

— Eu também pensei em outras partes do seu corpo, mas você não quis saber de me ver mexendo nesse seu lado proibido que você diz que ninguém tocou, se é que me entende — ri por impulso. A situação não me afetava, então mantinha meu humor sereno. A única coisa que podia me preocupar era o bebê que poderia nascer e crescer sem um pai por perto.

— Arthur... Eu te amo — forcei meu rosto a travar para não demonstrar o quanto aquelas palavras me assustaram.

— E que culpa eu tenho. Eu não queria te magoar mais do que você já está, mas você já está enchendo meu saco.

— E o que poderia me deixar ainda mais triste? Pode falar. Me fala logo! — minha alma quase escapou pela boca quando achei que ele fosse se atrever a me bater. Ele era um brutamontes — Eu te amo — um alívio me preencheu.

— Se é o que você quer... — ignorei a última frase — Esse namoro só existia para você. Eu nunca te pedi em namoro e, pelo que sei, você também não.

— Foi porque primeiro eu achei que você precisava de um tempo. Depois até tive vergonha de perguntar, porque achei que não fosse preciso, que já estava óbvio que tínhamos uma relação mais seria.

— Você não está dizendo isso.

— Você tem que me entender. Eu ainda sou muito jovem. Tenho que experimentar um pouco da vida antes de embarcar em um compromisso.

— Eu te falei tantas vezes em morarmos juntos, em construirmos uma vida feliz com um ao lado do outro.

— Eu sei disso e é o que me dói. É nessa hora que sinto que te enganei — meu astral foi despencando aos poucos. Eu não pude me manter mais tão frio e, sinceramente, agradeço por isso. Eu não estava gostando de encarar aquele meu lado.

— Qualquer um perceberia isso e me cortaria na hora, tiraria essas ilusões da minha cabeça.

— Eu percebi. Acontece que por você me fazer tão bem, achei que tinha me apaixonado.

— Então é verdade? Você me amava e se decepcionou com o que fiz? — seus olhos se encheram de lágrimas e de esperança ao mesmo tempo.

— Você me fazia bem porque, além de amante, também era meu amigo. Espero que continue sendo este último. Você nunca me fez sentir esse sentimento forte de que tanto fala.

— E o que eu faço agora? O que vai ser da minha vida sem você?

— Você pode se virar muito bem sem mim. Não ligue mais para esse cara chato chamado Arthur. Agora você tem por quem lutar. Eu sei que disse que seu garoto estaria ganhando se não tivesse um pai como você, mas não falei sério. Eu acredito em você. É a sua chance de construir uma vida feliz, com sua esposa e seu filho.

— O que está me pedindo?

— Eu não queria me desfazer de você. Provavelmente, depois disso, você nunca mais vai olhar na minha cara. Não vou negar que você foi importante. Você me ajudou a superar muitas coisas, pena que nem todas. Quando descobri que sua noiva, na época apenas namorada, estava grávida, pensei que poderia enrrolar um pouco, adiar o inevitável. Foi tão difícil ouvir seus planos para o futuro. Soube muito bem que aquilo significava que você não reagiria bem quando soubesse.

— Você sabia de tudo antes de mim?

— Tive uma especie de sentimento de posse, acreditando ser ciúmes. Ele me fez a seguir para qualquer lugar que ela fosse.

— Parece que você não gostou muito da ideia de me perder.

— E quem gostaria de perder um amigo confidente como você?

— Amigo...

— É o que você é para mim.

— Até me dá vergonha que um marmanjo como eu esteja sofrendo por um pirralho mirrado que nem você — com um sorriso na boca e lágrimas nos olhos, ele passava a mão na minha cabeça — Nada vai me tirar da cabeça que tudo acabou por eu ter sido um canalha covarde e mentiroso.

— Não se culpe. Eu também não sou nenhum santo. A vida me deu tantos golpes que já não consigo mais levantar. Eu sei que sou frio e insensível as vezes e que meu humor é imprevisível, mas fazer o que? Se não posso ficar de pé o que tenho a fazer é rastejar. Eu tenho que insistir.

— E por que você insiste tanto? No que você insiste? O que aconteceu que te deixou desse jeito? Desculpa falar, mas eu não sei se você é doce ou amargo. Parece que há duas pessoas dentro de você. Me deixa te ajudar, Art.

— Art. Só você me chama assim. Sentirei falta disso.

— Você ainda não me respondeu.

— Não perca seu tempo tentando descobrir. Eu digo que só tenho a necessidade de tentar me reerguer me aponhando em alguém. Sabe, eu não quero ser um perdedor, não quero que as pessoas tenham pena de mim.

— E por quê teriam?

— Eu já não sou mais problema seu, ou melhor, nunca fui. Case-se com a mãe do seu filho. Estará fazendo a coisa certa.

— Eu não a amo. Como vou me casar sem amor?

— Nem parece que é você que está falando. Você está tão frágil.

•••

Recebi uma menssagem do chato do Junior, perguntando se não iria à escola. Queria ver uma coisa, então o ignorei, depois a festinha idiota do Matheus. Do que se tratava?

E mais uma vez Léo. Já fazia um mês desde o nosso último encontro. Eu o observava pela janela enquanto ele beijava a noiva e acariciava a sua barriga ainda pequena. Leonardo se divertia, ria, aproveitava as alegrias de sua nova vida tão rápido quanto se esquecia de que já amou um garoto além do seu próprio filho. A minha expectativa era de um menino, um homemzinho. Foi bom estar ali para ter certeza de que ele estava feliz. Agora quem tinha que buscar a felicidade era o senhor, Arthur.

•••

Seu beijo era tão doce. Fui eu que inicie o beijo, porém fui deixando aos poucos ele me conduzir. Queria ter certeza de que não estava fazendo a contra gosto. Contudo, não aguentando, o lacei com os braços e voltei a tomar o controle. Seus lábios tinham uma textura ainda mais lisa e macia que a de uma uva.

Matheus, você de novo!

É, de facto, o garoto me perseguia. O pior é que eu me odiei infinitamente quando vi a tristeza no rosto de Rodrigo ao ver Matheus correndo dali, fugindo do que acabava de nossa visão. Não era para ter culpa. A culpa significava que ele não me amava mais do que amava o OUTRO. Se fosse apenas por tê-lo magoado, mas foi por tê-lo decepcionado, eu senti isso. Por isso me voltei a Rodrigo e, com uma dor no coração, disse:

— Não precisa falar nada — fiz uma pausa para pensar se deveria continuar — Eu vou ajudar a procurar.

Eu... Eu estava entregando Ro de bandeja.

Lembrei da festa na floresta e das outras vezes que o vi próximo ao lago. Matheus deveria estar nas margens do lago. Sim, de facto ele estava. Meus planos de chegar de fininho foram tirados da jogada graças a um graveto que ficou no caminho do meu pé.

— Você? Já era de se esperar — ele riu ironicamente.

— Eu não vim por você. Rodrigo é o meu melhor amigo e não quero perder a sua...

— Pode ir calando a boquinha. Vai me dizer que aquilo que vi agora pouco era só uma brincadeira entre amiguinhos? — essede sua vez de falar — Eu só não tenho certeza de qual dos dois beijou quem. Você o quer? Você o deseja? Vamos ver se vai aguentar bater de frente comigo. O que você quer é me irritar. Você tem inveja e quer me roubar o que lutei muito para conseguir.

— E se for verdade? — perguntei — Olha, você e Ro nem estavam namorando. Eu não sei o que ele pode ter visto em você. Você não passa de um... — me contive para não terminar a frase.

— Não me provoque.

— Você pode até me bater, mas não vou deixar barato.

— Eu tenho uma ideia melhor — ele avança para mim com a velocidade com que um leopardo persegue e captura sua presa.

Encostado em uma árvore velha, preso nos seus braços fortes, não há muito o que fazer. Ele fez várias tentativas de invadir minha boca com sua língua. Foi bruto e nojento. Ele apertava minhas bochechas na expectativa de estimular minha mandíbula a abrir-se. Até tampou o meu nariz para que eu respirasse pela boca. Aquilo me lembrava do passado. Foram vários os chutes e socos para que eu cedesse. As tentativas frustradas pareciam tê-lo feito desistir. Ele não passava de um selvagem vulgar.

— Do que você tem medo. Vem cá. Não tem ninguém aqui.

Após ter dito aquelas palavras, Matheus investe em outras táticas. Suas mãos tocam meus cabelos e descem meu rosto até chegarem nos meus lábios. Seus polegares os acariciavam lentamente, primeiro o superior e depois o inferior, o mais arrepiante, admito. Depois dos lábios, a mão descia até meu peito e entrava na minha camiseta, acariciando todo meu tronco, desde o peito até a barriga e um pouco da cintura. Quando estava no cós de minha cueca, um arrepio me fez gemer, dando espaço ao beijo.

— O que está fazendo?

— Só mais um pouquinho. Não vai demorar muito.

— Pare já com isso.

— Arthur — ele me largou de repente — Quero dizer, Kevin — parei de me debater estantaneamente — Esse é o seu nome, você não é deste país e eu sei o que você veio fazer aqui.

— Não sei do que está falando.

— Jura? Eu tenho cara de idiota?

— Já que perguntou...

— Não faça gracinhas. Nós dois sabemos que o que falei é a mais pura verdade.

— Como você sabe? — minhas lágrimas já escorriam pelo meu rosto, como uma cascata.

— Você costumava ser um mistério, um mistério que seria irrelevante se não estivesse tentando tirar o que é meu. Para derrotar o rival é preciso conhecê-lo. Eu não sabia de nada sobre você, então porque não? Eu o segui, descobri onde você mora, entrei na sua casa — ele parecia tranquilo. Esperei algum tempo até ter certeza de que ele não adicionaria algo ao que acabava de dizer, pois a frase me pareceu incompleta.

— Você invadiu minha casa?

— Eu precisava de algo que o mandasse para o lugar onde você deveria estar. Que fosse na Irlanda ou no inferno. Eu me pergunto como alguém tão despreocupado conseguiu viver de mentiras por tanto tempo sem ser descoberto. Foi preciso apenas entrar pela porta dos fundos para ouvir a conversa que você teve com seu pai.

— O que você quer?

— Obediência. A partir de agora, você será submisso a minha vontade.

— Vai sonhando.

— Você quer seu primo de volta, não quer?

— Por favor. Você também já passou por isso.

— Ele te faz esquecer de tudo, não é? Ro. Ele é o meu remédio para tudo. Eu não costumo sentir remorsos pelos erros que cometo. Tenho a impressão de que sou um monstro esperando uma oportunidade para atacar qualquer um que seja. Talvez seja porque não consigo me apegar a nenhum conceito moral, nem mesmo a religião que minha família tanto ama. Mas Rodrigo consegue me lembrar a diferença entre o certo e o errado. É só por ele que vivo essa vida. E, ao mesmo tempo, sem palavras, ele me diz que não estou sozinho, que não sou o único. Eu e Ro somos iguais e temos que ficar o resto de nossas vidas juntos, é o destino. Você está sobrando nessa história.

— Do que tem medo então? Se você tem tanta confiança nesse papo de destino, por quê me vê como uma ameaça?

— Eu o vejo como um atraso. Não acho que você seja capaz de destruir o que ele sente por mim. Isso começou muito antes de você.

— Não é culpa minha. Eu só me apaixonei por um cara. Eu não seria baixo como você. Nunca, jamais usaria um truque tão traiçoeiro.

— Então você não o ama tanto assim. Não me importo se está preparado para ouvir — suas mãos agarravam minha cintura — Não resista. Esse é só o primeiro golpe. Esse será o primeiro passo para você reecontrar esse tal de Rory. Você só tem que esperar sem resistir.

— Rodrigo...

— Isso mesmo.

O que aconteceu depois, foi o já previsto. Rodrigo chegou e nos viu aos beijos, como Matheus havia planejado. Entre socos e pontapés, fugi como um covarde que sou. Claro, sempre fui um covarde fraco que dependeu da sorte e da bondade dos outros para sobreviver. Continuo dependendo.

•••

— Aí está você. É com você que quero falar. Quero que me esclareça algumas coisas.

— A pergunta é: E quando você não quer? Estou até começando a pensar que você não é muito esperto.

— Olha, Liam...

— Cale já essa boca! Não me chame assim, eu já disse. As paredes têm ouvidos.

— Tudo bem, Paulo. Isso nem importa agora. Vamos ao que interessa. Vai mentir e dizer que você não viu quando Matheus entrou na minha casa? Você mesmo disse que havia instalado câmeras escondidas, o que me leva a crer que você também queria que eu soubesse disso. O que está acontecendo?

— Foi para isso mesmo que vim aqui. Vim para explicar tudo — Liam, que estava de pé, agora senta-se, dando a entender que a conversa seria longa — Já faz mais ou menos um ano desde que procurei Matheus para uma abordagem direta. Tudo o que tinha que fazer era contar a ele toda a verdade.

— Como assim? Se você só prentendia contar a ele e esperar que dissesse sim ou não, então para quê servimos?

— Exatamente, vocês não serviram de nada. Você deveria se aproximar do garoto, mas ao invés disso declarou guerra a ele por causa de outro garoto. O que há com você?

— Se é verdade por que não nos mandou de volta?

— É aí que está. Eu não deveria ter feito isso. Levei uma bronca do meu superior por isso.

— Isso significa que temos que ir embora?

— Felizmente não. No fim, eu o convenci de que você ainda tinha um papel muito importante. Matheus é obcecado por esse tal de Rodrigo e você representa uma ameaça para ele. Ele irá com você à Califórnia, onde se encontrarão com alguns novatos e membros mais jovens do Circle, com a condição de facilitar para Matheus.

— Está me dizendo para desistir de Rodrigo e deixar o caminho livre para Matheus?

— Você decide, Rory ou Rodrigo?

FIM

______________________________________________________________________

Esse fim não significa o fim da serie, singnifica o fim da narração de Kevin. Para quem não entendeu, a cena em que Arthur vê Léo feliz com a esposa é anterior a comemoração surpresa que Matheus fez para Arthur.

leo lima: Eu já havia pensado nessa ansiedade gerada pela pequena saga de Kevin, interrompendo o ciclo de do enredo de Rodrigo. Tudo será explicado. É engraçado você perguntar sobre a relação de Matheus com Arthur, porque isso faz parecer que o capítulo foi feito para você. Os dois se odeiam, mas nem sempre foi assim, pelo menos não da parte de Arthur. Obrigado por comentar.

Salvatore: Digo isso porque há coisas que RO fazia questão de não perceber. Seja você mesmo, esqueça o que eu disse. Obrigado por comentar.

Sammy Fox: Eu queria muito escrever sobre a reação de Arthur após a morte de Yuri, pena que não tive tempo. Fico muito triste por não ter conseguido. Obrigado por comentar.

Comentários

Há 2 comentários.

Por Henry Thorne em 2016-01-17 18:14:12
Eu amo muito essa série! Está cheia de reviravoltas surpreendentes, ótimo capítulo, achei a despedida que o Art deu para o Léo tão triste e simbólica "você está tão frágil" :/ o arthur aka Kevin já fez sexo me surpreendi, essas reviravoltas que muita não é o que parece ser ficou muito bom aqui, a história começou como um romance doentil e ganhou outras proporções, a minissérie complementar who is Kevin serviu para ampliar esse maravilhoso universo criado por você, só o que faltou foi contar acontecimentos mais recentes, realmente me surpreendi com essa minissérie sem dúvida este foi o melhor capítulo da minissérie e o melhor da série, muito ansioso pelo próximo já normal :/ capítulo.
Por leo lima em 2016-01-12 11:09:38
Esse capítulo foi ótimo, espero que a história se desenrole logo, não aguento mais de ansiedade, quero que o art ache o rory e continue vivendo no Brasil co. O pai e a madrasta, mas não quero que ele fique com o Rodrigo, o RO tem que ficar com o Matheus, e mudar o jeito dele ser. Por favor, não demore mas tanto pra postar o conto, acabei achando esse capítulo hj por acaso, até achei que VC já tinha desistido de continuar a serie. Porfavor, vou pedir de novo. Nao demore mais a postar.