Capítulo 32

Conto de SyncMaster como (Seguir)

Parte da série Tribulações

Vinicius: O que ela queria? - Ele perguntou assim que entrei no quarto.

Me sentei na cama primeiro, respirei fundo e falei: Falar sobre a escola aqui. E ela também disse que falou com meu pai, ele me disse pra fazer academia com você.

Vinícius: E você vai fazer? - Ele ficou na dúvida.

Felipe: Por que pergunta? Não quer que eu faça?

Vinícius: Quero, só que você não parece animado com a ideia.

Felipe: Não é isso... - Tranquilizei-o.

Vinícius: O que é, então? Às vezes você parece ter o mundo nas costas...

Nos entreolhamos, eu percebi que não conseguiria esconder a verdade por muito mais tempo. Mas também ainda não estava me sentindo seguro pra contar tudo a ele.

Felipe: Só tô estranhando... não estar em casa, e estar longe dos amigos.

Vinícius: Você tinha sentimentos por alguém de lá, né?

Fiz que sim com a cabeça, eu não conseguiria mentir sobre isso.

Vinícius: Agora eu entendo... - Ele disse sério - Bom. Eu nem sei o que dizer pra ajudar, sou péssimo nisso...

Felipe: Ah, não se preocupa. Acho que ninguém pode me ajudar. Só me promete uma coisa?

Vinícius: O que? - ele me olhou nos olhos.

Felipe: Se eu começar a ficar depressivo, me enfiar pelos cantos sem querer fazer nada, você me dê uns tapas!

Vinícius: Tá fechado! - Ele riu - Te dou uma surra se precisar.

Felipe: Também não precisa de tanto. Uma surra tua deve machucar... - Dei uma risada forçada, tentando descontrair - Um ou dois tapas é suficiente.

Ele só sorriu me olhando.

Felipe: Você precisa fazer seu negócio aí. Vou te deixar em paz...

Vinícius: Não, fica aí. - Ele disse de repente.

Olhei pra ele um pouco em dúvida.

Vinícius: Sempre quis alguém que ficasse desviando minha atenção e não me deixasse terminar a tarefa em tempo.

Felipe: Você é estranho. - Dei risada.

Vinícius: E é só o seu primeiro dia comigo, hein... - Ele ergueu as sobrancelhas.

Felipe: Aí você me deixa com medo, cara.

Demos risada juntos. Eu me acomodei na cama e fiquei olhando pro teto. Percebi que ele voltou a escrever alguns segundos depois. A essa altura, eu enxergava dois caminhos pelos quais eu podia seguir: quebrar tudo e todos (no sentido figurado) pra voltar pra casa logo e continuar com o Nicolas. Ou podia dar tempo ao tempo, esperar a poeira abaixar. Dar uma chance pra "minha nova casa", e pro Vinícius.

O problema de sair quebrando tudo, era que apenas aumentaria a tensão. Meus pais com certeza iam revidar e tomar atitudes mais drásticas, pois ainda estavam nervosos com o acontecimento. E talvez fizessem algo que separaria o Nicolas e eu para sempre. Sobre esperar, dar um tempo e uma chance, era algo mais pacífico, diplomático, demoraria mais, mas era como minha tia disse: talvez, quando eu me reencontrasse com o Nicolas, seria pra nunca mais nos separarmos! O problema de esperar é que eu deixaria o Nicolas sozinho, sem notícias, preocupado... e eu também ficaria sozinho. Era como voltar aos dias em que imaginávamos se existia alguém no mundo para nós, porém o Nicolas sabia que essa pessoa existia, mas ela estava desaparecida, ele não sabia onde eu estava, com quem estava, se estava bem ou se ainda pensava nele. Naquele momento eu pensei na Bianca, desejei que ela fosse forte e cuidasse do Nícolas.

Comecei a pensar tanta coisa, mas tanta coisa, que comecei a pensar bobagens, algumas coisas absurdas, que não faziam sentido. Tomei um susto enorme com um travesseiro acertando em cheio a minha cara.

Felipe: Que? - Perguntei bravo.

Vinícius: Você parecia estar entrando em depressão. Mas estou longe pra dar um tapa.

Felipe: Eu só estava pensando na vida...

Vinícius: Qualquer que seja seu problema, não adianta! As coisas acontecem, você querendo ou não. A única coisa que você escolhe é se vai aprender e crescer com o que está acontecendo, ou se revoltar e ter raiva, dizendo que não tem sorte e que as coisas só acontecem com você!

No começo achei que ele estava brincando, e por instinto ameacei dar risada. Mas quando vi seu rosto, estava sério! Tinha um olhar apreensivo, de quem já tinha pensado muito no que acabara de dizer. E não estava dizendo por brincadeira.

Fiquei sério novamente, nos entreolhamos por longos segundos.

Felipe: Obrigado. - Falei sem pensar, e me encostei na cama.

Vinícius: Pelo que?

Felipe: Pelo pensamento. É bonito e reflexivo.

Vinícius: Você acha? Achei meio bosta...

Felipe: Sério?

Vinícius: Sério. Só eu pra pensar nessas bobagens...

Felipe: Não é bobagem. É só que...

Vinícius: O que? - Ele riu.

Felipe: Ninguém mais da valor pra essas coisas. - Ele me olhou um pouco espantado - Se você disser isso pra algum moleque, ou mesmo uma menina, provavelmente vão dar risada da tua cara. Mas se parar pra pensar no que você disse, faz todo sentido.

Vinícius: Obrigado. Você é gentil...

Felipe: Não tô dizendo isso por gentileza. É porque concordo com o que você disse!

Vinícius: Mesmo assim, obrigado.

Sorri pra ele, que retribuiu e voltou a escrever no seu caderno.

Ficamos em silêncio por alguns segundos. Eu queria arrumar algo pra conversar! Só pra não deixar ele fazer a tarefa como ele disse que queria. Pensei, pensei e pensei, mas não consegui achar nada para distraí-lo! Me senti um antissocial. Acabei achando algo, depois de um tempo...

Felipe: Tarefa de que?

Vinícius: História...

Felipe: Difícil?

Vinícius: Não...

Felipe: Tem muita coisa?

Vinícius: Sim...

Felipe: Quanto?

Ele parou de escrever e olhou pra mim querendo rir.

Vinícius: Vinte exercícios...

Felipe: Nossa...

Vinícius: Pois é!

Fiquei quieto por alguns segundos, de propósito, só pra ele conseguir retomar a concentração.

Felipe: Você está em qual?

Vinícius: No décimo segundo...

Felipe: Nossa. Você é lento, hein?

Vinícius: Filho da mãe... - Ele riu.

Felipe: Você não queria alguém que tomasse sua atenção e não te deixasse fazer as tarefas?

Vinícius: Estou repensando nisso. - Ele brincou.

Felipe: Então eu paro...

Vinícius: Não! Mas você vai ver quando estiver fazendo suas tarefas...

Sorri e fiquei em silêncio, observando-o voltar a escrever. Eu já não sabia porque evitei tanto ele no começo. Lembrei que eu o chamava de pirralho em pensamentos.

Simulei na minha cabeça o momento em que eu contaria toda a verdade pra ele! Tentei imaginar as reações dele, com base no pouco que eu conhecia a seu respeito. Mas era difícil, apesar de não termos nos separado durante todo o dia! Pois eu não sabia sua opinião a respeito de homossexualidade, essa palavra ainda nem tinha aparecido em uma conversa pra que eu tentasse observar sua expressão.

Ainda assim, imaginei de várias formas o momento. Desde reações negativas, até reações positivas, amigáveis e compreensíveis. Claro que eu esperava uma reação positiva, talvez ele até pudesse me ajudar a voltar pra minha casa.

De repente eu peguei o travesseiro e arremessei nele. Fiquei sério, encarando-o. Por um momento achei que ia dar briga dessa vez, pois ele me encarou sério...

Mas aí vi que ele realmente estava se importando mais comigo do que com a tarefa! Pois ele pegou o travesseiro, levantou da sua cama e veio na minha direção.

Felipe: óóó, para! Aí já tá apelando! - Falei rindo.

Vinícius: Apelando? - Ele perguntou mandando o travesseiro na minha cara. Antes mesmo que eu voltasse a enxergar, ele segurou o travesseiro do meu rosto e me empurrou. Eu deitei na cama rindo com o travesseiro socado no rosto.

Vinícius: Apelar? To tentando fazer a tarefa, e você não me deixa fazer a tarefa! Fica chamando minha atenção! E quando resolvo te dar atenção, você reclama que to apelando? - Ele disse empurrando mais o travesseiro a cada palavra que dizia.

Felipe: Parei, parei! - Falei entre as risadas - Você não sabe brincar! Pode fazer a tarefa...

Ele soltou o travesseiro e se levantou da cama. Ele era forte! Era difícil "enfrentar". Mas quando tive a chance, eu segurei o travesseiro e arremessei na cara dele de novo...

Talvez tenhamos feito muito escândalo, porque a Izaura apareceu na porta, parecia preocupada.

Izaura: Meninos! Que isso? Tudo bem?

Eu caí da risada.

Vinícius: Tá sim, mãe. É só brincadeira! - Ele riu.

Izaura: Nossa, achei que estavam brigando de verdade!

Demos risada juntos, ela sorriu e saiu do quarto dizendo: "se é brincadeira, então tá bom".

Felipe: Não vai não! - Falei logo antes do Vinícius enfiar o travesseiro na minha cara de novo.

Vinícius: Vai continuar?

Felipe: Vou! - Dei risada. E ele me prensou mais

Vinícius: Vai mesmo continuar? - Ele riu.

Felipe: VOU!

E então ele me soltou, sentou-se na minha cama e sussurrou: Não quero fazer a tarefa mesmo.

Felipe: Irresponsável... - Eu disse ainda deitado.

Ele me deu a mão e me puxou, pra que eu me sentasse.

Vinícius: Parecemos duas crianças, sabia?

Felipe: Você é uma criança!

Vinícius: Sou mais velho que você, rapaz!

Felipe: Mas parece uma criança!

Vinícius: Seu mala!

Dei risada. Me encostei na parede, e ele se encostou também, mas um pouco afastado de mim.

Vinícius: Posso perguntar uma coisa?

Felipe: O que?

Vinícius: Por que você me evitava tanto, no começo?

Fiquei em silêncio por alguns segundos.

Felipe: Dava pra perceber?

Ele fez que sim com a cabeça.

Vinícius: E não diga de novo que era timidez...

Felipe: Não, acho que era meu lado anti social mesmo... - Dei risada - Alguma coisa me dizia que a gente não ia se dar bem...

Vinícius: Huuuuum... - Ele zombou, e eu dei um pequeno soco no seu braço - Essa coisa aí deve ter se enganado... - Ele riu.

Felipe: Acho que sim…

Nós jantamos não muito tempo depois! Ele continuava gentil demais, me servindo as coisas, perguntando se eu queria isso, ou se queria aquilo. Era isso nele que me incomodava, talvez fosse só amizade mesmo, mas se fosse mais que isso, eu não podia deixar que ele desenvolvesse esse sentimento.

Fomos pro quarto depois de jantar. Bom, na verdade, eu fui pro quarto, e o Vinícius foi pro banheiro escovar os dentes. Aproveitei o tempo sozinho no quarto pra me trocar, vestir uma roupa pra dormir, e já arrumar a minha cama.

Só quando ele veio pro quarto que eu fui escovar os dentes. Tentei ficar ali mais ou menos um tempo razoável pra que o Vinicius tivesse tempo de se trocar, se é que ele ia se trocar. Pois já estava com uma roupa que mais parecia pijama.

Voltei ao quarto quando já não tinha mais o que esperar, entrei e ele estava sentado na sua cama, com bermuda e camisa! Estava escrevendo algo no seu caderno! Imaginei que fosse a sua tarefa, então resolvi não atrapalhar, eu já tinha atrasado demais a tarefa dele. Mas ele parou de escrever sozinho.

Felipe: Demorei tanto assim que você teve tempo de fazer 8 exercícios?

Vinicius: Não, bobo. Só terminei aquele que você me interrompeu na metade.

Felipe: Aah... - Fiquei sem graça.

E então ele guardou o caderno e o estojo na mochila, e se deitou na cama.

Vinicius: Sortudo...

Felipe: Eu?

Vinicius: É...

Felipe: Por que? - Perguntei com medo.

Vinicius: Vai ficar a manhã toda de folga amanhã.

Felipe: Acredite, acho que eu prefiro não ficar.

Vinicius: Por que?

Felipe: Sei lá... - Menti. Na verdade eu não queria mais ficar sozinho naquela casa. Minhas vontades estavam mudando tão rápido quanto minhas impressões sobre o meu primo. A única coisa que não mudava era o Nicolas. Eu não parava de me perguntar como será que ele estava. Será que já tinha me procurado em casa, ou meus pais teriam entrado em contato com os pais dele?

Vinicius: De qualquer jeito, de tarde nós vamos na academia. Você vai se matricular e já vai ter algo pra fazer...

Felipe: Eu já posso começar amanhã mesmo?

Vinicius: Acho que sim. O dono é bacana, ele até deixa você ir de graça por um dia, pra ver como é lá, o ambiente, quem frequenta, os equipamentos.

Felipe: Huum. Que bonzinho...

Vinicius: Pois é... - Ele riu.

Me deitei na minha cama e encarei o teto. Nessas horas de silêncio eu pensava de novo em tudo o que tinha acontecido. E eu voltava a sentir medo e incerteza...

Vinicius: Bom, até amanhã, então.

Felipe: Até. Boa noite, Vinicius.

Vinicius: Boa noite, Felipe.

E então não teve mais risadas, briga de travesseiros, piadinhas ou momentos "ownt". O Vinicius ficou quieto, e talvez tenha dormido logo depois de se despedir. Mas eu não, minha cabeça não se esvaziava!

Fazia um tempo que o Vinicius estava quieto quando levantei. Eu estava sem sono, e aquele silêncio, onde a única coisa que eu ouvia era a respiração pesada do Vinicius estava me incomodando. Fui pra sala, liguei a TV num volume tão baixo que eu mesmo não ouvia direito. Fiquei ali, pensando coisas que apenas alimentaram minha raiva e meu rancor.

Comentários

Há 5 comentários.

Por Elizalva.c.s em 2017-03-30 21:14:40
Felipe tem que tomar uma atitude e não ficar só pensado na vida pois pensar não te leva pra lugar nem um as atitudes é que faz a diferença.😘😘😘😘
Por edward em 2017-03-30 17:05:35
Tô amando a história, no entanto,poderia não fugir tanto dá realidade , afinal ele já devia ter ligado pra Nicolas , com qualquer celular ! Mas vou esperar o que você vai fazer ,pois as vezes o escritor tem algo preparado que nós meros leitores não sabemos.bjs
Por Guerra21 em 2017-03-30 00:08:27
Posso está errado mas vai rolar alguma coisa entre esses dois.
Por luan silva em 2017-03-29 23:02:57
eu concordo com o júnior, o fê já poderia ter feito alguma coisa, ter dado algum sinal de vida.
Por Júnior amor em 2017-03-29 22:25:33
Vc fala q tem sentimeto pelo Nicolas. E nem sequer tentou fugir pra ir encontrar ele. Também vc poderia pegar um celular dá sua tia ou do seu primo pra ligar pra ele e dar sinal de vida. O amor verdadeiro luta com todas as forças pela outra pessoa mas você não faz nada.😏😭😶