Capítulo 13

Conto de SyncMaster como (Seguir)

Parte da série Tribulações

Angélica: Correu tudo bem... - ela disse no portão da sua casa. Eu tinha acabado de me despedir da Rose e a Angélica me acompanhou até o portão.

Felipe: É, correu.

Angélica: Eu sei que você não tá confiante, mas agora eu tô envolvida nisso pra te ajudar, e preciso de você firme e forte, ou não vou poder te ajudar! Seja forte!

Felipe: Tá...

Nos abraçamos por um momento.

Angélica: Nunca reparei que você era tão mais alto que eu...

Dei uma risada meio forçada e soltei-a.

Felipe: Sua baixinha.

Angélica: Então tchau.

Felipe: Tchau.

Fui devagar pra casa, era só nove da noite, meus pais provavelmente estavam terminando de jantar, no máximo estavam sentados conversando um pouco. Comecei a me preocupar o que me esperava quando chegasse lá. Fiquei em dúvida se devia contar do namoro logo de cara ou não. Fui andando tão distraído que nem vi por onde fui passando. Só dei por mim quando já estava em frente de casa.

Parei e encarei a chave do portão por um segundo, respirei fundo, destranquei o portão e entrei, a porta da sala estava aberta; as luzes lá dentro, acesas. Não havia barulho de televisão ligada e nem conversas altas.

Entrei e parei na porta da cozinha, os dois estavam sentados na mesa, um ao lado do outro, de frente pra porta por onde entrei.

Nos encaramos como em um filme de velho oeste, só fiquei com medo de um deles sacar uma arma e me matar.

Edson: Tem algo pra nós?

Felipe: A mãe disse que eu podia ir...

Edson: Não to falando disso.

Felipe: Tá falando do que, então?

Edson: Tá se fazendo de desentendido?

Felipe: Perdão se não tenho bola de cristal.

Edson: Sua sogra já ligou aqui toda alegrinha.

Fiquei preocupado, será que eles iam engolir essa?

Edson: Que namoro rápido, né?

Felipe: A Angélica sempre foi afim de mim... - Falei um pouco nervoso, tentando parecer calmo - E você queria tanto que eu arrumasse uma namorada, e agora que arrumei, vai ficar questionando? - Não sei de onde tirei coragem pra falar assim com meu pai.

Edson: Hum, que sorte sua... - ele disse um pouco sério - Promessa é promessa, seu castigo acabou, mas eu ainda quero ter certeza de que esse namoro é real, entendeu? - Ele disse colocando o chip do meu celular em cima da mesa e empurrando um pouco pra frente.

Acenei a cabeça com pouca vontade, peguei meu chip e fui pro meu quarto. Por que isso me deixava tão fulo da vida? Eu ainda não tinha entendido se o problema era a falta de confiança ou se é só porque eram meus pais mesmo.

Tão rápido quanto pude eu coloquei o chip e liguei meu celular... Recebi várias mensagens, uma do Nicolas, ele dizia: "hey, tá tudo bem? pq não veio pra aula?". Me partiu o coração ler a mensagem dele, era algo que eu teria que deixar pra trás agora, se existisse qualquer sentimento da parte dele, por menor que fosse a possibilidade de existir, provavelmente seria destruído com a notícia do meu namoro.

Outra mensagem era avisando que alguém tentou me ligar enquanto meu celular estava desligado, reconheci os quatro últimos dígitos do número, era da Angélica. As ligações foram logo depois do meio dia.

Eu estava muito suado, estava muito calor! Coloquei meu celular pra carregar, peguei minha toalha e fui tomar um banho. Tentei ser rápido, sem deixar de aproveitar o banho. No final me sequei de qualquer jeito, enrolei a toalha na cintura e sai apressado pra chegar ao quarto, aparentemente meus pais já tinham ido dormir.

Fechei a porta depois de entrar, deixei a toalha cair no chão e me olhei no espelho da porta do guarda roupa, ajeitei meu cabelo que estava meio "vaca lambeu", meu corpo ainda estava um pouco molhado, eu não tinha me secado direito. Pus a mão no meu peito, fechei os olhos e desci com a mão sentindo minha pele fria por causa do banho gelado, segurei meu pênis e abri os olhos, encarei meu pulso ainda dolorido e "roxo", parei no mesmo instante, toda aquela situação era culpa do Túlio, a mensagem no celular era dele, se não fosse a mensagem dele, nada daquilo estaria acontecendo. Mas então comecei a me contrariar, não era culpa de ninguém, o Túlio chegou onde chegou porque eu deixei, porque eu dei corda e levei a situação até aquele ponto. E meus pais descobririam sobre minha homossexualidade cedo ou tarde, tanto faz se eu estaria com o Túlio ou qualquer outro garoto. Mesmo que fosse com o Nicolas, eles descobririam e teriam uma reação muito parecida.

Mandei uma mensagem pra Angélica: "sua mãe ligou pros meus pais?".

Angélica: Ligou, em incentivei ela, achei que seria bom eles saberem antes de você chegar em casa.

Felipe: Boa ideia! Devolveram meu celular.

Angélica: Falaram algo?

Felipe: Falaram, mas eu conto amanhã... To com preguiça de digitar...

Angélica: Sua cara... kkkk... Ok, lipe... Até amanhã, então?

Felipe: Até amanhã! Boa noite...

Angélica: Boa noite! Até...

Coloquei o celular de lado e lembrei do sms do Nicolas, será que ele ainda estava pensando em mim ou já tinha se esquecido que eu faltei da aula? No fim das contas não importava, peguei meu celular e mandei um último sms pro Nicolas: "fiquei em casa pq não me senti mto bem, amanhã eu vou! Boa noite".

Ele demorou pra responder, até achei que já tinha dormido, mas enfim a resposta chegou: "aah, que bom... Então até amanhã! Boa noite".

Li aquela mensagem várias vezes, "aah, que bom", que bom que eu ia no dia seguinte? Que bom que nos veríamos de novo? Que bom que eu estava bem? Tive vontade de chorar mais uma vez, e eu nem mesmo sabia se ele gostava de mim da mesma maneira que eu estava gostando dele.

Fechei os olhos e desmaiei na cama. Acordei com minha mãe me chamando no dia seguinte, mais uma vez senti aquela vontade de virar para o outro lado e dormir, mas não deixei isso tomar conta de mim, sentei na cama e peguei meu celular, tinha uma mensagem do Nicolas! Ele deve ter enviado depois que dormi, dizia apenas: "dorme bem".

Meu cabelo estava uma bagunça, provavelmente porque ele ainda estava molhado quando deitei pra dormir. Tomei outro banho e me vesti, tomei um bom café da manhã em silêncio enquanto meu pai lia alguma coisa na internet e minha mãe se vestia no quarto. Eu percebia que meu pai me olhava as vezes, e logo voltava sua atenção ao notebook.

Comi depressa pra sair logo dali, aquilo me incomodava demais! Mas não adiantou muito, porque meu pai levantou da mesa quase junto comigo. Peguei a mochila no meu quarto, me despedi deles e fui pro ponto esperar o ônibus. Vi a Bianca de longe.

Bianca: Bom dia... - ela suspirou.

Felipe: Bom dia.

Ela parecia um pouco fora de si, nem mesmo perguntou porque eu tinha faltado no dia anterior. E era extremamente comum para ela perguntar.

Subimos no ônibus e sentamos juntos, mas quando o ônibus parou no ponto da Angélica e ela subiu e se sentou no seu banco de sempre, eu saí dali e fui me sentar com a Angélica.

Felipe: Bom dia.

Angélica: Bom dia... - ela sorriu.

Felipe: Dormiu bem?

Angélica: Sim, e você?

Felipe: Bem.

Angélica: Quer falar sobre ontem?

Felipe: Foi legal.

Angélica: Sim, foi.

A garota sentada na nossa frente deu uma olhadinha pra nós, pensei comigo mesmo: "pronto, agora a história vai ser ampliada exponencialmente e a escola vai achar que a Angélica até mesmo engravidou". Não foi essa a intenção, não era essa história que eu queria espalhar.

Angélica: Contou pra Bianca?

Fiz que não com a cabeça.

Felipe: Ela não disse uma palavra além de "bom dia"... Ela tá viajando...

Angélica: Ai, ai, ai... - disse olhando pra Bianca no banco lá pra trás.

Felipe: O que?

Angélica: Nada, só preocupação. Ela tá aérea desde ontem. Isso não é normal pra ela...

Felipe: Nem um pouco...

Finalmente o ônibus parou na nossa escola e nós descemos, me certifiquei de que a Bianca estava consciente o bastante pra entender que ela também descia lá.

Angélica: Hey, o que aconteceu? - Ela perguntou à Bianca logo que descemos.

Bianca: Acho que tô apaixonada.

Fingi um engasgo dos grandes... Acabei fazendo todos em volta olharem pra mim, a Angélica chegou por trás, passou os braços no meu peito e me apertou, como se estivessem tentando me desengasgar. Igual aquelas cenas na TV. Com esse escândalo, todos estavam olhando e rindo, alguns olhavam preocupados, então encerrei o teatro. A Bianca estava com cara de quem queria dizer: "o que esse débil tá fazendo?".

A Angélica parou de me apertar e pegou minha mão pra continuar andando.

Bianca: Não teve graça. E qual é a dessas mãozinhas aí?

Felipe: Acho que teve graça sim, metade da escola tá rindo... - Falei sem graça.

Angélica: Mas explica melhor isso...

Bianca: To conversando com um garoto que estuda aqui no período da tarde... Ele é tão fofo, meigo, carinhoso... E é um gato!

Dei um tapa leve na cara da Bianca e falei: "Quem é você?".

Bianca: Ai, gente, não posso ter sentimentos?

Felipe: Você acabou de dizer que tá apaixonada, e que o cara é fofo... Não, não é normal.

A Angélica riu, e então entramos na sala, de cara avistei o Nicolas. Ele estava sorridente desde que entrei, não soltei a mão da Angélica, percebi que ele bateu os olhos nas nossas mãos e perdeu um pouco do seu sorriso, depois desviou o olhar e voltou com seu sorriso normal. Meu coração se apertou.

Evitei olhar pra ver se a alguém na sala estava reparando.

A primeira aula era Educação Física, as meninas foram jogar vôlei e os meninos futebol, alguns ficaram de fora (claro que eu fui um deles), e me sentei na arquibancada da quadra. Ao lado do diário de classe e do apito do professor que estava no meio da quadra dando início na partida. Normalmente ele não era tão organizado, mas ele sabia que dava briga entre os moleques da minha sala se ele não ficasse em cima.

O professor era novo, era o primeiro ano dele na nossa escola, e ele parecia ser novo em questão de idade também! Seu nome era Michel (fala-se Michél mesmo), pele bronzeada, cabelo preto, bem raspado dos lados e um topete pequeno em cima, nunca gostei daquele corte, mas pra ele ficava legal. E algo que não é incomum pra professores jovens de educação física: seu corpo malhado (acho que por isso ele sempre ia dar aula com camisa regata, pra mostrar seus braços).

Depois de dar início ao jogo, o professor saiu da quadra e sentou-se comigo.

Michel: Não vai jogar?

Felipe: Não gosto de futebol, então ninguém nunca me escolhe... - falei rindo.

Michel: O que você costuma jogar?

Felipe: Vôlei e basquete.

Michel: Certo... Eu também nunca gostei de futebol... Sempre preferi vôlei, ou handball...

Felipe: Handball não curto tanto... Acho tão sem graça quanto futebol...

Michel: Qual seu nome?

Felipe: É Felipe...

Michel: Huum... Bom, não preciso dizer o meu, eu espero... - Disse rindo.

Felipe: Não, não precisa.

Michel: Quantos anos você tem?

Felipe: Tenho 15, mas tô pra fazer 16.

Michel: Entendo. Eu tenho 23...

Felipe: Nossa...

Michel: Não parece?

Felipe: Imaginei que você fosse novo, mas não tanto... - Dei risada.

Ele riu também.

Michel: Entrei pra faculdade logo que saí do ensino médio, então me formei novo... E tive sorte de conseguir pegar aula já esse ano. Na verdade faço 24 no mês que vem.

Felipe: Huuum.

Estiquei o pescoço pra olhar a quadra de vôlei, pude ver a Angélica fazendo um saque.

Michel: Tá interessado no vôlei ou na garota?

Felipe: Ah... É complicado.

Michel: Entendi.

E então eu olhei pra quadra de futebol. Eles tinham diferenciado os times como "com camisa" e "sem camisa". Era uma divisão interessante, pelo menos eu achava.

Michel: Droga, eles não podem fazer isso. Menos ainda na minha aula. - Ele disse se levantando e entrando na quadra. - Garotada, vamos por as camisas! Tem os coletes ali do lado justamente pra dividir os times!

Olhei mais uma vez pra quadra de vôlei, e quando voltei minha atenção pra quadra de futebol, meus olhos encontraram os do Nicolas, ele estava sério, fazendo aquele "biquinho" de quem está pensando.

Enfim, olhei pra baixo e o Michel sentou-se ao meu lado de novo.

Felipe: Desculpa perguntar. Não é da minha conta... mas porque eles não podem fazer isso "principalmente na sua aula"?

Ele sorriu e olhou pra baixo.

Michel: Bom... é norma da escola que eles não podem tirar a camisa aqui dentro. E eu disse isso sobre a minha aula pra evitar confusão com inspetores de aluno e com outros professores.

Felipe: Mas eles sempre fizeram times sem camisa com outros professores e nunca tiveram problemas.

Michel: Pode até ser. Mas é porque alguns professores ficam em cima de mim por causa da minha opção sexual.

Desviei o olhar pra outro lado, não podia ser verdade.

Felipe: Como assim? Você é gay?

Michel: Sou. Isso te incomoda?

Felipe: Não, eu respeito! É que eu não esperava...

Michel: Por que não? - Ele disse rindo.

Senti meu rosto queimar, eu queria enfiar a cabeça embaixo da terra.

Felipe: É que sei lá. Você não parece...

Michel: Não pareço gostar de homens? Fica tranquilo, não tô aqui te chavecando! - ele sussurrou num tom irônico.

Felipe: Não, não foi isso que eu quis dizer... É que você não tem nenhum trejeito, nada que faça pensar que é gay.

Michel: Eu já tinha entendido... - Ele riu - Só achei engraçado você ficando vermelho.

Olhei pra quadra, tentei localizar o Nicolas e vi ele olhando pra mim, mas desviou o olhar quando olhei pra ele.

Olhei de novo pro Michel, que estava olhando pro Nicolas e também olhou de novo pra mim quase ao mesmo tempo, sua cara dizia: "to entendendo".

Michel: Você é daqui mesmo? Mora nessa cidade?

Fiz que sim com a cabeça.

Felipe: E você?

Michel: Também, me mudei pra cá pra poder fazer a faculdade. Moro aqui desde então... Um apartamento aqui perto.

Felipe: Entendi. Namora? - perguntei sem pensar.

Michel: Não...

Felipe: Fala sério!

Michel: É sério... Por que é tão difícil de acreditar quando digo que estou solteiro? É por que sou malhado e bonitão? - Ele riu.

Felipe: Deve ser... - Falei sem segurar a risada.

Por fim o sinal tocou. A aula acabou!

Michel: Vamos moçada! Pra sala! Acabou a aula! - Ele disse pegando seu material e indo embora - Até mais, Felipe!

Felipe: Até...

Ele se afastou e entrou na quadra pra recolher os coletes e a bola, depois foi correndo fazer o mesmo na quadra de vôlei, mas no meio do caminho encontrou as meninas vindo com a bola. Se ele fosse esperar uma atitude dessa dos garotos, ficaria o resto do dia esperando.

O Nicolas devia ser o garoto da sala que jogou futebol e estava menos suado, não prestei muita atenção no jogo pra ver se ele tinha participado de verdade ou não. Na verdade fiquei distraído com o Michel.

Nicolas: Por que não jogou hoje?

Felipe: Ah, não gosto de futebol...

Nicolas: Eu também não, mas me escolheram. - Ele ergueu os ombros.

Felipe: Eles nem me escolhem pra futebol, sabem que sou um desastre...

Ele riu, e a professora da segunda aula entrou na sala.

Na hora do intervalo a Angélica me pegou pela mão e me tirou da sala antes que alguém nos prendesse lá dentro. Alguns alunos no fundo da sala gritaram “A casa caiu, lek”! Ela me levou até a quadra, sentamos mais ou menos no mesmo lugar que eu estava com o Michel antes.

Angélica: Conta! O que seus pais falaram?

Felipe: Quando cheguei em casa, meu pai perguntou se eu tinha algo pra eles, disse que minha sogra tinha ligado lá em casa toda alegre pra falar sobre a novidade.

Angélica: Só isso?

Felipe: Não... calma! Ele perguntou assim: "Que rápido, né?".

Angélica: E aí?

Felipe: Inventei que você gostava de mim há um tempo. Então ele acabou engolindo, disse que ia cumprir sua palavra, cancelou meu castigo, devolveu meu chip mas disse que quer ter certeza de que nosso namoro é real.

Angélica: Nada que não esperávamos.

Felipe: É, nada...

Estávamos sentados bem próximos.

Angélica: Acho que estão comentando sobre nós. - Ela disse olhando pra um grupinho de alunos lá longe. Eram da nossa sala, não paravam de olhar pra nós dois, vi o Nicolas no meio deles, parecia sério, não falava com os outros, só olhava pra nós.

Felipe: É, bem ou mal? O que você acha?

Angélica: "Finalmente", eles devem estar dizendo. - Ela riu.

Acabei rindo junto com ela. Mas então nosso super intervalo de 10 minutos acabou, e voltamos pra sala. Durante todo o resto da manhã, o Nicolas não virou pra trás nenhuma vez.

Comentários

Há 1 comentários.

Por Elizalva.c.s em 2017-02-25 19:11:09
Esse namoro vai dá o que falar...😍😍😍😘😘😘😘