Capítulo 1

Conto de SyncMaster como (Seguir)

Parte da série Tribulações

Durante toda a minha vida eu me espremi entre as opiniões e vontades de todos. Principalmente dos meus pais, sempre me equilibrei entre as vontades deles, em outras palavras: eu me dividia entre as coisas que eles queriam que eu me tornasse, e o que eu realmente queria ser. Não me refiro à profissão, me refiro à minha personalidade, minhas opções, que não deveriam ser tomadas por ninguém além de mim. Mas quanto mais eu crescia, mais eu compreendia que eu não poderia me dividir dessa forma para sempre, uma hora eu precisaria tomar meu lugar, uma hora meus pais e todo o mundo cobraria uma postura minha. Uma hora eu teria que me mostrar íntegro, da forma que eu realmente era, sem usar a máscara do que quer que meus pais gostariam que eu fosse. E pensar nisso, para mim, era apavorante.

Eu tinha 16 anos, fazia o segundo ano do ensino médio no período da manhã. A escola ficava razoavelmente perto de casa, e eu tinha duas grandes amigas na minha sala: a Angélica e a Bianca... As duas eram loiras, magras e um pouco mais baixas que eu! As duas sabiam que eu era gay, mas ao mesmo tempo sabiam que eu nunca tinha ficado com outro garoto.

Eu tinha cerca de 1,80 metros de altura, loiro, cabelo bagunçado, magro. Era um garoto comum! Um pouco tímido, nunca fui popular e nem gostava de chamar a atenção dos outros... Sempre tinha vergonha de falar em público e ainda mais vergonha de "chegar" nos garotos.

Estávamos no começo do ano, era o primeiro dia de aula! Eu estava na esquina esperando o ônibus da escola passar quando a Bianca chegou por trás de mim e falou: "Bom dia, Fe"... Tomei um leve susto, estava distraído. Respondi seu bom dia e reparei na sua cara de sono.

Felipe: Deixa eu adivinhar, ficou acordada até tarde?

Bianca: Não consigo me segurar! Não dá sono pra dormir cedo.

Felipe: Te entendo... - falei baixo. Eu dormia cedo até demais, nove e meia, no máximo dez da noite eu já estava na cama... E nos últimos dias eu estava pior, porque a Bianca e a Angélica inventaram de correr no final da tarde... Claro que me arrastaram junto, e claro que eu fiquei mais cansado ainda com isso...

Felipe: Eu to dormindo ainda mais cedo, agora com essa história de correr.

Bianca: Você é muito mole... - ela riu.

Felipe: Só não to acostumado...

Bianca: Só é mole mesmo!

Felipe: Não enche… - falei de forma mais descontraída, para não parecer chato.

Logo o ônibus apareceu, subimos junto com alguns outros alunos que também estavam no ponto esperando... Me sentei em um dos primeiros bancos com a Bianca, a Angélica subia alguns pontos mais a frente, então normalmente ela se sentava num banco separado de nós dois.

Bianca: Ficou sabendo da novidade?

Felipe: O que?

Bianca: O amor da sua vida foi embora!

Pensar naquilo me deixava triste e feliz ao mesmo tempo. Ela estava falando do Carlos, um garoto da nossa sala que eu gostava há um bom tempo, a Bianca jurava que ele já tinha percebido, mas ainda assim nunca nem sequer me deu um minuto de atenção... Esse sempre foi meu poder especial: gostar de garotos que nunca me darão atenção.

Felipe: Já vai tarde... - falei emburrado.

Bianca: Lá vamos nós...

Felipe: O que quer dizer?

Bianca: Você com esse costume de querer parecer durão, insensível, e que não liga pros outros...

Fiquei quieto, e ela não puxou mais assunto. Um tempo depois a Angélica subiu no onibus, acenou pra nós e sentou um pouco mais pra frente, em um dos poucos bancos vagos.

Felipe: Pra onde ele foi? - perguntei quando estávamos quase chegando na aula.

Bianca: Rio Grande do Sul... Não ficou mesmo sabendo da história?

Felipe: Não, o que aconteceu?

Bianca: Os pais dele se separaram... A mãe dele foi pra lá, morar com os pais, e ele foi junto.

Felipe: Nossa... Então vai ser difícil ele voltar...

Bianca: Viu como você se importa?

Angélica: Se importa com o que? - ela perguntou se aproximando.

Felipe: Nada, depois falamos sobre isso...

Angélica: Tá né...

Mas mesmo assim eu percebi a Bianca “desenhando com os lábios”: "Carlos".

Descemos do ônibus e entramos na escola... Estudávamos juntos desde a quinta série... Não podia ser diferente esse ano! Entramos na sala e sentamos nas primeiras carteiras do lado esquerdo da sala (próximo das janelas)... O resto do pessoal foi chegando, e realmente o Carlos não apareceu. Também não tivemos nenhum aluno novo... Fiquei um pouco desapontado...

Durante a última semana em vinha criando a expectativa de que o amor da minha vida poderia entrar como um novo aluno esse ano, e então seríamos felizes para sempre, como costuma acontecer nas histórias por aí, mas talvez eu estivesse sonhando muito alto, eu não era personagem de um romance, nem era um príncipe encantado de um conto de fadas!

Infelizmente a turma do fundão continuou a mesma! Isso incluía alguns caras bem chatos como o Diego, o Vinicius e o João... Sempre evitei conversar com eles, mas em alguns momentos eu tinha uma vontade muito grande de mandá-los tomar no buraco.

Angélica: Por que tá quieto hoje, Fe? - ela perguntou no intervalo.

Bianca: Por causa do Carlos... - ela interrompeu.

Angélica: Aah, fica assim não... Seu príncipe vai aparecer ainda... - ela disse num tom mais sério do que o da Bianca.

Felipe: Não é por causa dele... - menti.

Bianca: É pelo o que então? Você ficou com essa cara de depressão depois que desceu do ônibus. Não me incomodo de você ficar chateado com essa situação, mas me incomodo com você achando que sou idiota...

Não respondi. Geralmente quando eu não respondia era porque eu concordava com a pessoa, e só não queria dizer isso.

Angélica: Gente, mudar de assunto, né?

Era sempre a Angélica que mudava de assunto e me salvava dos “espinhos” da Bianca… Em outras palavras, ela sempre interferia quando a Bianca começava a me encher muito o saco.

Ao final da aula, quando estávamos saindo pra pegar o ônibus, a Angélica entrou na frente da Bianca e sentou comigo no banco. A Bianca mostrou os dentes de um jeito engraçado e sentou-se sozinha.

Angélica: Pode almoçar em casa hoje?

Felipe: Posso... Mas de última hora, sua mãe não vai estressar?

Angélica: Não, eu já avisei ela... Te perguntei se você pode, mas te faria ir pra lá mesmo que você dissesse não!

Felipe: Aah tá... - falei rindo.

Eu sempre almoçava sozinho em casa, meus pais não faziam horário de almoço e eu que fazia meu almoço... Na maioria dos dias eu fazia um almoço até que caprichado pra mim, mas quando eu não estava muito bem eu nem almoçava (era o caso daquele dia).

Quando o ônibus parou no ponto da Angélica,me levantei e desci junto com ela, mas não perdi a chance de dar um leve tapa na cabeça da Bianca quando passei por ela. Não convidamos a Bianca pra almoçar conosco porque sabíamos que ela diria “não”, ela precisava almoçar em casa porque a mãe dela tinha que cuidar da sua mãe (vó da Bianca) além de uma criança pequena... Então era difícil pra ela, a Bianca tinha sempre que estar em casa nesses horários onde os dois precisavam de mais atenção que o normal.

Angélica: Você é muito submisso...

Felipe: Como assim?

Angélica: Quando os outros falam de você, ou falam algo que não te agrada... Você fica quieto e não se defende...

Felipe: Mas ela tinha razão sobre o que estava falando...

Angélica: Então alguma coisa na sua vida precisa mudar... Se é que você se incomoda tanto com isso quanto aparenta.

Felipe: Claro que me incomodo... Você acha que eu gosto de gostar de um garoto e depois ele nunca corresponder?

Angélica: Não foi disso que eu falei... Mas se é sobre isso que você quer falar, tudo bem... - Ela disse rindo - Você sempre fica afim de hétero... Como quer que te correspondam? Algum pode até corresponder, mas não vai ser do jeito que você espera… Não vai ter nenhum sentimento da parte dele.

Fiquei em silêncio de novo... Ela fez um barulho chato com a boca e entramos na sua casa.

Felipe: Oi, Rose... - era a mãe da Angélica.

Rose: Oi, Fe! Tudo bem? - ela disse sorridente.

Felipe: Tudo sim, e com você? - quase falei "senhora", ela não gosta que a chamem de senhora.

Rose: Tudo ótimo... Que bom que você veio mesmo... Hoje tem o seu prato favorito!

Felipe: Nossa, obrigado… Mas não precisa… - falei sem jeito.

Angélica: Abaixa a bola... Não é por causa de você... Foi só coincidência! - ela brincou.

Felipe: Tá com ciúmes porque sua mãe faz a comida que eu gosto, e não a sua? - perguntei rindo, a Rose riu também.

Angélica: Besta, não é isso...

Deixei minha mochila na sala, encostada no sofá, e fui pra cozinha com as duas. O pai da Angélica morreu em um acidente feio. Ele estava voltando de uma cidade vizinha, para onde tinha ido a trabalho, e um caminhão invadiu a pista e bateu de frente com o carro dele. O motorista do caminhão, que estava bêbado, sobreviveu, e o pai da Angélica, que estava trabalhando para sustentar esposa e filha, morreu. Desde então era só ela e minha mãe. O dia do acidente dele é uma das datas que eu me lembro perfeitamente! Não porque foi uma data boa pra mim, pelo contrário! A Angélica não parava de chorar no dia, e eu estava fazendo de tudo pra que ela parasse, tentando confortá-la, passei o dia colado nela, assim como os dias seguintes... Com o tempo ela se conformou, parou de chorar todos os dias. O acidente aconteceu quando estávamos na sexta série, e talvez tenha sido essa aproximação que nos tornou tão amigos, porque nunca mais nos separamos.

A mãe da Angélica logo teve que sair e foi trabalhar... Nós ficamos sentados na mesa por mais um tempo! Eu não queria ir embora, não queria ficar sozinho em casa, e a Angélica sabia disso.

Angélica: Você pode ficar? Preciso de ajuda com a louça...

Tá certo, não era um bom motivo pra me fazer ficar, haha, mas era a Angélica, né?

Felipe: Claro... - falei começando a pegar as coisas da mesa e levando até a pia. A Angélica foi ao quarto e trocou de roupa, voltou com um short curto e uma regata... Ela era uma menina muito linda mesmo.

Angélica: Se troca! - ela disse jogando uma bermuda pra mim.

Desdobrei aquela bermuda e a reconheci quase imediatamente, era minha!

Felipe: Não sabia que estava aqui… - falei meio surpreso.

Angélica: Você esqueceu ela da última vez que dormiu aqui, acabei esquecendo de de levar depois. Tira o tênis, veste essa bermuda, tá calor!

Felipe: Tem razão…

Deixei a cozinha para me trocar, dobrei minha calça e deixei-a perto da minha mochila, assim como meu tênis e minhas meias.

Voltei pra cozinha e a Angélica estava me esperando, escorada na pia.

Angélica: Não quer tirar a camisa? Sei que não é fácil pra sua mãe ter que lavar uniforme seu durante a semana.

Felipe: Daqui a pouco você vai me deixar pelado aqui… - dei risada.

Angélica: Aah não se preocupe... Sei que não vai me deixar fazer nada contigo nu... - ela riu.

Felipe: Besta...

Acabei tirando a camisa... Ela tinha razão... Minha mãe não tinha muito tempo durante a semana pra ficar lavando roupa, e eu sempre me esforçava pra não sujar os uniformes da escola.

Angélica: Vamos correr hoje de novo, né?

Felipe: Claro... Se você quiser...

Angélica: Ah, claro que eu quero… Assim você não fica enfiado em casa.

Felipe: Então vamos...

Angélica: Se você fosse hétero, daria um bom namorado... - ela riu.

Felipe: Acho que sim, porque você vive falando isso.

Ela riu.

Angélica: Eu sei... É porque você vive cabisbaixo... Aí também serve pra te animar um pouco.

Felipe: É... - falei sem jeito.

Angélica: O que tá te incomodando tanto? Você não tá normal hoje!

Felipe: Nada...

Angélica: Eu não conto pra Bianca, pode confiar em mim...

Felipe: Sempre confiei...

Angélica: Então fala! Você sabe que eu sei que tem algo errado... É o Carlos?

Respirei fundo.

Felipe: Não é só o Carlos...

Angélica: Então o que?

Felipe: Sou eu...

Angélica: Aah, como assim, moço? - ela disse surpresa.

Felipe: Nunca ninguém se interessa por mim, Angélica... To começando a achar que tem algo errado comigo.

Angélica: Já falou sobre isso com alguém?

Fiz que não com a cabeça.

Angélica: Fe... - ela respirou fundo - O que eu posso te falar, hein?

Felipe: Que eu tenho razão.

Angélica: Não, porque você não tem! Fe, você realmente tem um problema, mas é essa auto estima baixa, você é muito depressivo as vezes... Sai pouco, não conhece gente nova... E sempre que se interessa por alguém, é por um daqueles garotos populares que só querem saber de piriguetes... Você devia parar de olhar só pro tamanho do braço e olhar o tamanho do cérebro, do caráter... - fiquei um pouco em silêncio, e ela completou - E do coração.

Fiquei em silêncio, eu acho que esse meu silêncio devia irritar muito.

Angélica: Nós vamos começar a sair de fim de semana, vamos conhecer alguém legal pra você!

Felipe: Ah, Angélica, não sei... Você também quase não sai!

Angélica: Então vamos nós dois começar a sair! - ela brincou.

Felipe: Tá bom... - tentei falar sorrindo.

A Bianca nos mandou mensagem mais tarde dizendo que ela não poderia sair pra correr com a gente, porque a vó dela não estava muito bem e sua mãe pediu pra ela ficar em casa... Então eu fiquei a tarde toda na casa da Angélica, depois de lavarmos louça fomos ver televisão... Mas passamos grande parte do tempo conversando.

Angélica: Vamos correr? - ela disse quando era quase cinco da tarde - É bom passarmos da sua casa pra você deixar suas coisas.

Felipe: É, tem razão.

Vesti minha camisa e calcei o tênis, ela fechou as janelas da casa e nós saímos... Fomos andando sem pressa até minha casa... Ela me contou de um primo que se assumiu gay pra família naquelas férias, ela não deu muitos detalhes, mas disse que não teve uma boa repercussão pela família... Mas a Rose, mãe da Angélica, apoiava o garoto.

Angélica: Pena ele morar longe, senão eu te apresentava ele... É bonitinho... E é um cara legal, tem nossa idade.

Entrei em casa e fui direto ao meu quarto. Meus pais deviam estar quase chegando... Vesti outra camisa, guardei minha mochila e já fui saindo com a Angélica. Fomos até o parque de lazer que tinha ali perto, digo, não era tão perto, mas já que a intenção era caminhar/correr, valia a pena.

O caminho era por uma rua bonita, as calçadas ostentavam flores bem coloridas que os próprios moradores do bairro cuidavam, além das árvores, claro.

Paramos por um minuto quando chegamos no parque, sentamos em um banco e ficamos ali olhando o movimento. Tinha um campo de futebol no meio do parque, todo cercado por uma tela que evitava que as pessoas de fora do campo tomassem boladas enquanto estavam caminhando... Sempre havia um bando de meninos jogando, um mais lindo que o outro, mas naquele dia o campo estava vazio!

Angélica: Não tem nenhuma paisagem pra admirar hoje... - ela brincou referindo-se aos meninos jogando bola.

Felipe: Parece que não...

Angélica: É legal quando eles fazem um time com camisa e outro sem... - ela riu.

Felipe: Tenho que concordar... - ri junto.

Angélica: Só tem velho caminhando aqui... Me sinto uma senhora de 70 anos caminhando com meu marido de 90...

Felipe: Porque eu tenho 90 e você só 70?

Angélica: Aah é... Eu sou mais inteligente, tenho que ser a mais velha...

Felipe: Você é a mais enrugada, só isso...

Angélica: Ô moleque... - ela riu e me deu um tapa - Te penduro naquela árvore e fico batendo com um galho como se fosse uma pinhata.

Felipe: Duvido...

Angélica: Aah é?

Felipe: É! Porque eu vou te pendurar primeiro - falei pegando ela no colo e saindo em direção à arvore, a Angélica soltou um grito alto fazendo todos ali nos olharem, então coloquei ela no chão imediatamente - Não precisa gritar assim, louca!

Angélica: Seu doido! Me mata do coração… - ela riu.

Começamos a rir juntos, e acabamos entramos na trilha de caminhada.

Felipe: Metade desse povo já deve achar que somos namorados.

Angélica: Ou que você só tá querendo me comer...

Felipe: Angélica! - dei risada.

Angélica: É, ué... Acha que os moleques de hoje em dia são como esses velhos foram?

Felipe: Você não tem jeito... - falei olhando em volta.

Meus olhos travaram em uma figura andando bem mais pra frente, estava sozinho. Ele me chamou atenção quando olhou pra trás e brincou com uma mulher que estava sentada num banco com uma criança. Ele tinha cabelo preto arrepiado, pele "café com leite" e vestia uma camisa sem manga, bermuda e tênis. Não consegui ver direito o seu rosto, mas pra não perder o costume, toquei o braço da Angélica e falei: "Vamos andar um pouco mais rápido?".

Angélica: Pra que?

Felipe: Quero ver aquele moreninho ali de perto...

Angélica: Ai, Felipe... De novo não!

Mas eu segurei sua mão e puxei pra ela começar a andar mais depressa, até nos aproximarmos mais dele. Como o chão era coberto de pedriscos, ele deve ter ouvido nós dois chegando um pouco mais rápido, e olhou pra trás na hora! Larguei a mão da Angélica e desviei o olhar. Seu rosto era lindo, não tinha barba e sua pele era lisinha. Não era malhado também, era só um pouco mais "cheio" que eu, kk.

A Angélica me cutucou e fez sinal pra sairmos de perto dele... Então ela "desenhou com a boca": Ele percebeu, vamos sair daqui.

Fiz que não com a cabeça e continuei andando atrás dele. Fiquei pensando num assunto pra falar com a Angélica...

Felipe: Tem algo da escola pra amanhã?

Angélica: Não, Felipe... - ela disse num tom impaciente.

Um tempo depois o garoto olhou pra trás, e dessa vez eu não desviei o olhar.

Pra minha surpresa, ele disse: "e aí"...

Felipe: Oi... - respondi antes mesmo que ele terminasse de falar.

Ele sorriu e olhou pra frente de novo. Olhei pra Angélica sorrindo e ela fez bico.

Acabamos não correndo, às vezes dávamos uma distância maior dele, só pra não ficar muito grudado, mas logo eu chegava um pouco mais perto.

Umas cinco voltas depois de um silêncio irritante, com aquele barulho dos pedriscos nos nossos pés, ele virou pra trás e falou: "Vocês moram por aqui?".

Felipe: Mais ou menos... - tomei a frente da Angélica - Não é muito perto, mas a gente já aproveita pra andar um pouco mais né?

Ele sorriu, diminuiu o passo e se encaixou entre a Angélica e eu... Seu perfume era suave, uma delícia. Ele tinha lábios finos e um sorriso agradável.

Ele: Prazer, meu nome é Túlio... E o de vocês?

Felipe: Eu sou o Felipe...

Angélica: Eu Angélica...

Ela não estava muito empolgada.

Túlio: Vocês são namorados?

Felipe: Não, não! Só amigos...

Túlio: Aah tá, é que eu vi vocês lá atrás, achei que fossem...

Angélica: É só amizade mesmo... É que a gente se conhece a muito tempo...

Túlio: Entendi... Vocês tem quantos anos?

Felipe: Fiz 16 mês passado... Ela ainda tem 15, e você?

Túlio: Tenho 16, vou fazer 17 em junho...

Felipe: Aah, legal...

Ele sorriu.

Felipe: E você, mora por aqui?

Túlio: Sim, é bem perto na verdade...

Felipe: Aah tá... É sua mãe? - falei passando pela mesma mulher que ele brincou no começo, eles sempre se olhavam quando passávamos por ela.

Túlio: Minha tia... - ele respondeu meio sem jeito - Eu moro com ela.

Felipe: Aah, desculpa...

Túlio: Relaxa, tudo bem!

Eu queria perguntar porque ele não morava com os pais, mas achei que seria muita invasão.

Túlio: Vocês vem aqui todo dia nesse horário?

Felipe: Sim, já é rotina... - falei logo.

Túlio: Hum, bom saber, não tenho muitos amigos por aqui...

Felipe: Ah tá, pode ficar com a gente… - falei sem pensar.

Túlio: Obrigado... - ele disse com uma risadinha.

Demos mais uma volta juntos, e então ele falou: "Gente, eu já vou indo... Minha tia precisa dar banho da minha sobrinha... A gente se vê amanhã?".

Felipe: Claro... A gente se vê aqui...

Angélica: Também tá na hora de irmos, Fe... - ela disse parando de andar.

Túlio: Então, tchau! E até amanhã... - ele disse apertando minha mão, e acenou pra Angélica dizendo "tchau".

Quando saímos do parque, eu falei: Ele é bonitinho, né?

Angélica: É sim, mas vê se não se apaixona...

Felipe: Por que? Ele deu mais atenção pra mim do que pra você...

Angélica: É verdade, Fe... Mas isso não significa que ele é gay!

Felipe: Seja mais otimista, Angélica...

Angélica: Seja mais realista, Felipe… Ele deu mais atenção pra você porque só você falou, eu nem tinha tempo de responder.

No final das contas, eu sabia que ela tinha razão, mas é claro que eu não ia assumir isso! Então fiquei em silêncio.

Comentários

Há 1 comentários.

Por edward em 2017-02-04 23:10:37
Vou acompanhar. O enredo me agradou muito .