01

Conto de Leaozinho como (Seguir)

Parte da série Por Dentro

A sala era fria. Fria porque não se ouvia gente de verdade, talvez somente mentiras. As pessoas passavam pra lá, pra cá, e o resto era somente o resto. Era tudo frio. Não havia importância de gente, mas somente importância do que teria sido feito daquela gente. Ele ainda tremia, a respiração era ofegante. De óculos escuros, pra que ninguém pudesse reconhecê-lo, olhava e tentava ficar calmo, mesmo sendo em vão. Em vão porque lá fora, câmeras pipocavam seus flashes e os muitos jornalistas se perguntavam o que Vitor Silveira fazia numa delegacia. O advogado dele já havia perguntado mais de mil vezes o que teria acontecido para, naquela madrugada, Vitor ter lhe procurado. Durante o caminho da casa do advogado até aquele lugar, se via um Vitor trêmulo, ofegante. Muito diferente do que estávamos acostumados a ver na televisão, onde ele era seguro, forte. Mas Vitor manteve-se calado. Os jornalistas eram impedidos de chegar até ele pelos policiais, que apareciam aos montes. A delegacia havia parado. E agora toda aquela frieza voltava-se para Vitor. A mulher que chorava a procura do seu filho já havia silenciado, bem como o rapaz que fora preso por porte de drogas, a travesti que reclamava seu dinheiro e o delegado, que já experiente, já preparava-se para alguma bomba.

Vitor não se mexia. E agora havia parado de tremer. E sua cabeça fervilhava. Ele sabia que ao abrir a boca, todo o mundo saberia dele e de tantos outros. Todo mundo saberia o que havia acontecido com ele. Mas ele precisava se vingar. Quando se ama, é necessário que se veja por dentro do que verdadeiramente é. Ele tinha medo, mas a certeza era muito maior que ele. Quando os jornalistas soubessem de tudo, ele seria manchete. A mulher que chorava pelo seu filho, choraria pelo filho de outra mulher. A travesti não mais reclamaria seu dinheiro. E o delegado teria, enfim, uma verdadeira história. Simples para o delegado, simples para Vitor.

O advogado continuava insistindo em saber o porquê daquele chamado urgente. E Vitor, quieto, não deixava que nada escapasse.

-- Vitor, você precisa me contar o que está acontecendo! Como posso ser a seu favor sem saber o que aconteceu? - e Vitor continuava calado. - Olhe, o que quer que te tenha acontecido, pode ficar tranquilo, vou saber dobrar esse delegado, mas você precisa me contar o que está acontecendo. Eu fico imaginando: matar você não mataria, sei sua índole e você seria incapaz. Roubar? Você já tem de um tudo! Celebridade, seguido... Você foi roubado? Estuprado. Você foi estuprado, Vitor? Tudo bem, se não quer me contar, vai contar ao delegado. Aí vem o policial.

E agora Vitor voltava a ficar trêmulo. O policial se aproximou, e como quem tem intimidade, disse:

-- Vitor Silveira, por favor.

Vitor levantou-se, nervoso, trêmulo. Em sua cabeça pensou em gritar ali mesmo. Ou sair correndo. Ou chorar. Mas ele estava, visualmente, calmo. Apenas trêmulo.

O policial abriu a porta, e ele viu uma sala pequena. Foi lhe dito para sentar, mas antes que qualquer coisa pudesse acontecer, retirando o óculos, Vitor disse:

-- Eu matei Sérgio Carneiro.

Comentários

Há 0 comentários.