CAPÍTULO 3

Conto de Natanael como (Seguir)

Parte da série Deus Americano

CAPÍTULO 3

Estava vestido de branco em um lugar ao qual não reconhecia. O lugar parecia todo branco. Era como um terminal, um galpão ou algo parecido. Sentia o vento passar por entre meus dedos e meus cabelos. Olhei em volta, mas não vi ninguém além de mim. Era como se eu tivesse chegado lá, mas não me lembrasse como. Era estranho e ao mesmo tempo reconfortante. Toda a dor que sentia por alguns instantes, não existia mais.

- Corra! – falou uma voz cochichando em meu ouvido. Virei rapidamente, mas tudo não passou de um cochicho. Não havia ninguém – você precisa mata-lo! – falou novamente uma voz cochichando bem próximo de mim.

- eu não vou fazer isso – falei olhando para minhas mãos. Elas jorravam sangue. Não era como se eu tivesse me machucado. Elas brotavam de mim sem fonte nenhuma. O sangue vermelho caiu no chão sujando tudo ao meu redor.

- você precisa saber a hora de ir embora – falou uma voz atrás de mim. olhei para trás e pela primeira vez vi alguém. Uma mulher de longos cabelos pretos. Eram tão grandes que encostavam no chão e continuavam por trás dela. Não conseguia ver seu rosto porque os cabelos cobriam tudo o mais.

A única coisa a qual tinha certeza é que ela também usava branco e sangue também brotavam de suas mãos. Era hora de obter respostas. Quando tentei abrir a boca para perguntar algo percebi que não conseguia. Olhei para trás e vi um espelho atrás de mim. vi que minha boca estava costurada. Senti uma aflição tentando abrir a boca. Levei a mão até meus lábios tentando separá-los e uma dor lancinante me possuiu.

- Haaa! Gritei de dor enquanto eu rasgava os pontos que amarravam a única ferramenta que tinha para me defender. Sangue começou a jorrar da minha boca diretamente para o espelho.

Fechei a boca e vi um reflexo atrás de mim, tentei me virar, mas não tinha coragem. Foi então que senti alguém puxar o manto branco que eu vestia. Era como uma roupa de hospital. Olhei para baixo e seu uma criança perto de mim. por volta dos seus cinco ou seis anos.

- Charlie? – falei pela primeira vez.

Olhei novamente para o espelho vendo um reflexo atrás de mim. o sangue escorria pelo enorme espelho e a cada segundo podia ver mais nitidamente quem era. Apertei os olhos com o coração batendo bem forte. Aproximei o rosto do espelho e quando finalmente o reconheci ele levou a mão até a minha cabeça e bateu com ela no espelho várias vezes. Uma vez, duas vezes, três vezes.

Acordei suado e sentado na cama. Estava ofegante e por alguns instantes eu não sabia onde estava, foi quando me lembrei de tudo o que tinha acontecido na noite anterior. A briga com meu pai, a fuga e a salvação. Por algumas instantes meu coração palpitou.

Olhei para o meu celular e vi que ainda era cedo. Sete e cinquenta. Ainda dava tempo de ir com Violet ver o soldado chegar no aeroporto. Me levantei rapidamente e depois de ter escovado os dentes, vesti a melhor roupa que tinha. No momento da raiva peguei qualquer roupa e nem vi que a maioria nem era tão boa de se usar fora de casa.

Antes de descer as escadas liguei para Violet. O celular chamou algumas vezes até que ela finalmente atendeu.

- Griffin? – perguntou ela atendendo.

- sou eu.

- como você está?

- apesar de tudo, estou bem.

- sinto muito pelo o que aconteceu ontem na noite.

- Puxa Violet, se você soubesse que ser demitido não foi o pior da noite de ontem…

- o que aconteceu? – perguntou ela preocupada.

- depois eu te conto… ou não. Enfim, estou te ligando pra saber se vamos ao aeroporto.

- pensei que você não fosse querer ir depois do que aconteceu.

- é claro que eu quero ir.

- ótimo, vamos nos encontrar no aeroporto?

- pode ser. Assim que chegar eu te ligo ou se você chegar primeiro, você me liga.

- combinado.

Assim que desliguei o telefone eu desci as escadas da casa de Gray. Ainda era cedo e ninguém estava acordado. Peguei uma caneta e um papel e escrevi onde estava indo e que horas voltava.

Ao sair na calçada eu tive o azar de pegar meu pai colocando o lixo pra fora. Nós nos olhamos e ele ficou espantado. Ele não sabia que eu estava hospedado na casa do vizinho. Ele estava com seu robe vermelho e tinha acabado de acordar pela sua expressão.

- Griffin – falou meu pai caminhando até mim – você está hospedado com o Gray?

- estou – falei dando dois passos para trás. Ao me ver fazer isso ele parou.

- me perdoa por ontem a noite. Charlotte também está arrependida. As intenções dela são boas. Ela só queria que você melhorasse.

- a estrada pro inferno está pavimentada com boas intenções pai.

- eu tenho boas intenções e você sabe disso.

- não. Você não tem boas intenções, você me trata como se eu fosse doido. Você está tomando as decisões por mim.

- eu ainda acho que estou certo. Você precisa se focar em outra coisa. E se você precisar ficar com raiva de mim, eu aguento. Eu sou seu pai. Só estou tentando fazer o que é melhor pra você.

- é uma época engraçada pra tentar ser um bom pai.

- sempre fui um bom pai.

- não pra mim – falei olhando em direção do sol – eu preciso ir.

- você vai ao aeroporto?

- vou. Violet quer ir e além do mais eu acabei ficando com vontade de ir de qualquer maneira.

- posso te levar lá se quiser.

- eu dispenso. Vou caminhando até a rodovia principal e vou pegar um taxi até lá.

- não precisa, eu chamo um pra você – falou ele pegando o celular e chamando um taxi.

Enquanto ele pedia pelo taxi lembrei do sonho que tinha tido. Até aquele momento eu nem lembrava que tinha sonhado. Na verdade não lembro exatamente o que sonhei só sei que foi algo agoniante.

- o taxi chegará em alguns minutos – falou ele apertando os olhos por causa do sol.

- obrigado.

Assim como o previsto o taxi chegou em alguns minutos. Entrei no taxi e disse que gostaria de ir ao aeroporto.

- muita gente está indo pra lá hoje –falou o taxista saindo com o carro.

- é sério? – perguntei surpreso com aquela informação

- sim. Muita gente já está lá. Ele é um herói e nasceu aqui mesmo em Chicago. Ele é um orgulho.

- você acredita que nunca tinha ouvido falar nele até pouco tempo?

- sério? a mídia tem noticiado ele por tanto tempo, especialmente a impressa local.

- pois é. É engraçado.

Seguindo viagem vi ao longe o aeroporto. Assim que nos aproximamos percebi o quão sério era aquela recepção. Havia dezenas de pessoas, talvez centenas. Algumas com suas bandeirinhas americanas, outros com bandeiras de “Boas Vindas” ao herói nacional.

- eu não te disse? – falou o taxista parando – aqui é o mais perto que posso te deixar. Devido a multidão os taxis e carros não podem se aproximar mais do que isso.

- obrigado – falei pagando a corrida e saindo do taxi.

Assim que sai senti um frio na barriga e uma brisa gelada passar por mim mesmo o sol brilhando a todo vapor. As pessoas passaram por mim e eu me senti esquisito por alguns instantes. Meus pés não se moveram, mas não foi preciso muito para caminhar com as pessoas que estavam indo até o aeroporto.

Peguei o celular e liguei para a Violet enquanto caminhava em direção ao aeroporto. Sabe quando as coisas acontecem e você tem a impressão de que estão em câmera lenta? Foi como me senti ao ver a multidão em volta do aeroporto. Podre de mim que não sabia que a verdadeira multidão estava lá dentro. Todas gritando e assovinado.

Os funcionários nos guiavam dependendo de onde queríamos ir. Decidi ir para o saguão do aeroporto. Ele passaria por lá quando desembarcasse. Violet não atendeu ao celular e eu tentei mais uma vez. Foi para a caixa de mensagens. Gravei uma mensagem dizendo onde estaria. No saguão principal onde ele passaria. Me esgueirando consegui ficar na frente.

A imprensa estava em peso no local. Entrevistando algumas pessoas e outras noticiando o ocorrido. Era com certeza transmissão nacional.

- voo chega que horas? – perguntou uma mulher ao meu lado.

- as nove horas pelo o que eu ouvi falar. Pode ser alguns minutos antes ou depois.

Depois de algum tempo observando a multidão meu celular tocou. Vi que era Violet.

- onde você está Violet? – falei atendendo o celular.

- estou no aeroporto.

- onde você está?

- estou do lado de fora. Acabei de chegar no aeroporto e o taxista me deixou muito longe.

- aconteceu o mesmo comigo. Eu estou no saguão. Está cheio de gente aqui. La do direito e do lado esquerdo. Quando ele chegar vai passar no corredor do meio. Vem logo.

- Ele Chegou!! – gritou uma voz mais atrás de mim. nesse momento todo mundo no local gritou. O avião que o trazia estava taxiando na pista.

- o avião dele chegou Violet.

- não desliga o telefone – falou Violet ofegante. Provavelmente estava correndo.

- cuidado. Não vai cair e se machucar – falei lembrando-a do bebê.

- estou chegando – falou ela correndo.

- cuidado Violet, é sério. Você não é a única a correr pra chegar aqui.

- Não vou ser pisoteada, OK? – falou ela ainda ofegante. Era possível ouvir o barulho dos carros e da gritaria pelo telefone dela.

Alguns guardas tentavam conter a multidão para que não passassem da faixa e nem pulassem em cima do soldado. Algumas pessoas me empurravam e foi quando ao longe vi a porta do avião se abrir. Próximo ao avião haviam alguns soldados enfileirados esperando pelo herói ao qual eu sinceramente nem sabia qual o nome.

- está chegando Violet? – perguntei uma última vez.

- ainda não entrei no aeroporto – falou ela parando para respirar. Percebi pela sua voz.

Nesse momento todas as pessoas começaram a cantar em coro o hino nacional. Um por um foram levantando sua voz e logo todos cantavam.

Por alguns instantes me esqueci de Violet ao telefone. Vi ao longe o homem descendo as escadas do avião. Mais uma vez eu vi tudo acontecer em câmera lenta. O vento passava devagar por entre as bandeiras nas mãos de todos os presentes.

O homem cumprimentou os soldados em fileira e em seguida acenou para todos no saguão enquanto finalizavam o hino. Ele veio caminhando na nossa direção segurando sua mala. Ele vestia a roupa camuflada. Era como se ele soubesse que todos estariam lá para recebe-lo. Ele tinha sido preparado para aquilo.

- Griffin, ele chegou? – perguntou Violet.

- sim.

Quando dei a resposta ouvi um barulho pelo telefone. Um carro freando e em seguida uma batida.

Meu coração palpitou naquele momento. Ouvi algumas pessoas gritando do outro lado do telefone.

- Violet? – falei ansioso – Violet?

Não obtive resposta. Comecei a ficar nervoso e tentei voltar pela multidão saber, o que tinha acontecido com ela. Me virei para trás tentando passar pela multidão, mas não conseguia.

Olhei para a frente e vi que o soldado se aproximava do saguão e foi quando uma confusão começou do lado direito. Parecia uma briga. Os guardas correram até lá e foi quando meu celular tocou. Olhei para tela e vi que era Violet.

Nesse momento a multidão começou a empurrar e eu fui cambaleando para a frente e fui parar no meio do corredor. Os guardas voltaram para a posição que estavam e nem me perceberam lá no meio do caminho onde o soldado passaria. Eu não me importava.

- Violet? – falei atendendo o telefone – você está bem? Graças a Deus! – falei esperando ouvir sua voz – pensei que fosse tivesse sofrido um acidente ou algo parecido. Eu disse pra você não correr. Você está chegando? – falei de costas para a o soldado que caminhava naquela direção eu encarava a multidão e foi quando um dos guardas me viu lá parado.

- quem fala? – perguntou uma voz masculina do outro lado da linha.

- esse telefone é da minha amiga Violet, ela está bem?

Por alguns instantes a pessoa do outro lado da linha não disse nada e foi quando ouvi um barulho estridente. Eu me assustei e o celular caiu no chão. Em seguida tudo o que eu vi foi pessoas correndo para todos os lados. Pessoas gritando.

Meu coração batia forte no peito e tudo oque eu fazia era olhar em volta sem entender. Em seguida ouvi outro barulho daquele só que dessa vez foi mais perto e bem mais alto e junto com o barulho senti um baque no meu corpo que involuntariamente caiu para a frente como se algo tivesse me acertado.

Meu corpo bateu com tudo para a frente. Senti minha cabeça bater no chão e em seguida algo escorrendo. Senti um corte na minha testa. Senti o chão frio e gelado em minhas mãos. Caído no chão vi as pessoas correndo.

Elas passavam como vultos a minha frente. Os pés corriqueiros indo de um lado para o outro. A barulheira infernal e a dor redundante. Forcei minhas mãos e tentei levantar o corpo, mas não conseguia. Estava tonto e desorientado por ter batido a cabeça no chão.

Era como se não sentisse meu corpo. Não conseguia mover minhas pernas, por mais que eu tentasse.

- vai fica tudo bem – falou uma voz cochichando em meus ouvidos. Estava novamente sonhando ou era apenas minhas consciência tentando me acalmar?

Mais uma vez tentei me levantar, mas não consegui. Foi então que senti uma mão se repousar sobre a minha.

- fique calmo, fique abaixado – falou novamente a voz em meus ouvidos. Foi então que virei o rosto para o lado e percebi que não era minha consciência. Tinha alguém em cima de mim me forçando para baixo. Era por isso que não conseguia me levantar.

- o que aconteceu? – perguntei tentando ter alguns esclarecimentos.

- um atirador insurgente – falou a voz do homem que me segurava.

- eu fui atingido? – perguntei com medo da resposta.

- Não, mas foi por pouco – falou ele tentando me acalmando.

Olhei para frente novamente e vi que um homem estava caído no chão. Parecia ter sangue em volta dele.

- o atirador foi atingido?

- sim.

- então estamos seguros.

- não até segunda ordem – falou ele levando uma mão até meu pescoço me mantendo parado.

Virei o rosto para o outro lado e vi que varias câmeras estavam apontando para nós. As canais noticiavam ao vivo o ataque.

- quem era o alvo? – perguntei tentando ignorar toda estressante situação.

- eu – falou o homem – você estava bem na minha frente, não poderia deixar você me servir de escudo humano.

- você salvou minha vida – falei sentindo meu coração bater rápido.

- nada mais do que minha obrigação.

- quem é você? – perguntei curioso.

- Ralf – respondeu ele com sua voz rouca e macia e estranhamente reconfortante.

- acho que estamos seguros Ralf.

- podem haver outros atiradores. Precisamos ficar abaixados até ter certeza de que não existem mais atiradores.

- e o soldado? O herói? Será que está tudo bem com ele? – falei me lembrando do porque estar ali.

- mais ou menos – falou o homem.

- porque você não sai de cima de mim? se você é o alvo você não devia estar se protegendo?

- não faz bem o meu estilo.

- não entendo, você disse que é o alvo.

- sim, mas eu nunca disse que estava tentando me proteger. Meu trabalho só estará completo quando você estiver a salvo.

- qual o seu trabalho exatamente?

- depende, hoje meu trabalho é você.

- eu ainda acho que você devia estar se protegendo.

- tem dois Snipers escondidos no aeroporto. Foram eles que acertaram o atirador e estão preparados caso exista outro. Não é trabalho deles te proteger. É injusto, mas é a verdade. Eles atirariam em você se desconfiassem que você fez parte disso tudo. Você estava fora da multidão no meio do meu caminho. Existe grandes chances deles acharem que você está no meio dessa bagunça.

Nesse momento vimos o esquadrão da S.W.A.T. entrar no saguão.

- vocês estão bem? – perguntou um deles de pé na nossa frente.

- sim.

- não existe outro atirador.

Ao ouvir essas palavras o peso saiu de cima de mim.

Ao me sentir livre me virei de bruços encarando o teto. Finalmente vi o homem de pé parado no alto com a mão estendida. Estiquei a mão e ele me ajudou a levantar.

- você está bem? – perguntou o homem olhando fixo pra mim quando fiquei de pé. Estava sem reação. Agora percebi que era ele.

- é você – falei sem jeito – o herói.

- Ralf Theodore Falconer – falou ele apertando minha mão. agora de perto eu conseguia vê-lo de verdade. O homem tinha um olhar cansado, mas otimista. Ele não tinha um sorriso em seu rosto, mas parecia animado. Ele tinha cabelos loiros desgrenhados, uma barba bem preenchida em seu rosto. Seus olhos eram de um azul penetrante e envolvente. Era como se tivessem colocado a água do mar e o céu dentro de seus olhos. Eu podia o vento soprando seus olhos formando ondas.

- você está bem? – perguntou o policial da SWAT.

- estou falei saindo do meu transe.

- Violet! – falei me lembrando dela. Soltei a mão do soldado e me virei tentando correr para fora, mas os policiais me seguraram.

- se acalma – falou o soldado segurando meu braço – você precisa ser examinado. Você tem um corte profundo na testa.

- eu estou bem – falei olhando em volta. Havia pessoas chorando e outras apenas sentadas no chão sem acreditar que aquilo tinha acontecido. Tudo o que queria era saber se minha amiga estava bem.

O soldado me segurou forte e não me deixou ir. Os paramédicos se aproximaram para me examinar.

- dê algo para ele se acalmar, ele deve estar em choque – falou ele me segurando mais forte ainda.

Os paramédicos se aproximaram e colocaram algum remédio em uma seringa. Ralf então me abraçou forte por trás me imobilizando enquanto o médico aplicava o calmante na minha veia.

- em instantes ele ficará bem – falou o médico.

Senti exatamente quando o remédio fez efeito, foi como um choque no meu corpo que começou no meu peito e se espalhou pelo meu corpo.

Senti meu corpo ficar mole e de repente não senti mais nada a não ser sono. Meu corpo cedeu ao cansaço do estresse.

- vai ficar tudo bem – falou Ralf com os braços envoltos em mim. ele segurou meu corpo quando não consegui mais ficar em pé. Ele se ajoelhou no chão e me colocou deitado no chão. Seu rosto foi a última coisa que vi antes de apagar. Sua mão alisando minha testa foi a última coisa que senti.

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Um abraço a todos e espero que estejam gostando. Tem alguns errinhos de digitação, mas é que não tenho tempo de revisar, mas acho que tá dando pra ler bem. Um abraço e até o próximo!

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