CAPÍTULO 2
Parte da série Deus Americano
CAPÍTULO 2
Cheguei ao bar dez minutos antes das oito da noite. Meu pai insistiu em me trazer, mas Charlotte e ele estavam completando quatro anos de casamento hoje não atrapalhá-lo. Muitas pessoas já tinham chegado ao bar. Algumas pessoas apenas querendo expressar seu ponto de vista sobre algo, algumas pessoas procurando por simpatia e outras simplesmente procurando por um amigo. No fim de tudo era sempre igual. Eu serviria bebidas e encontraria alguém que desabafaria comigo. No fim eu teria uma boa gorjeta. O maldito sonho americano.
- boa noite Violet – falei lavando minhas mãos em uma pia atrás do balcão.
- você chegou – falou ela com um sorriso – sinto muito pelo o que aconteceu hoje – falou ela trazendo a bandeja. Ela tinha acabado de servir dois homens.
- esquece isso. Não era pra ser hoje – falei colocando chopp para um grupo de amigos que tinham acabado de entrar.
O ambiente no bar era agradável. A música tocava, mas era algo muito alto, as pessoas podiam conversar, beber e comer em um lugar agradável de se estar. Não tinha pista de dança, mas algumas pessoas não se importavam com isso e dançavam do mesmo jeito.
Algumas horas se passaram e o bar estava cheio. Todo mundo naquele bar estava muito animado para a chegada do herói no ida seguinte, aparentemente todo mundo ia ao aeroporto ver sua chegada. A pátria é muito importante para as pessoas do meu país, especialmente quando se trata de soldados.
Enquanto conversava com um cliente qualquer vi de longe um homem alto entrar no bar. Ele tinha um cigarro entre os dedos e veio até o balcão.
- gostaria de uma caipirinha – falou o homem sentando-se de frente para mim.
- claro – falei me virando e preparando a bebida.
Entreguei para o homem que deu um meio sorriso e agradeceu fazendo um gesto com a cabeça. Ele tomou sua bebida e começou a prestar atenção nas demais pessoas que estavam naquele bar.
Parei de prestar atenção nesse enigmático homem e quando olhei para o lado vi que Violet estava me chamando ao longe. Passei por outros dois atendentes e fui até ela.
- o que foi?
- eu estou me sentindo mal – falou Violet caminhando até o fundo do bar.
- o que está sentindo – falei seguindo-a.
Assim que saímos para fora do bar, em um beco Violet vomitou no chão. Segurei os cabelos dela e ela continuou inclinada por um tempo.
- você está bem? O que está acontecendo com você?
- eu estou assustada – falou Violet.
- porque? O que aconteceu?
- Estou grávida.
- Violet… - falei não conseguindo esconder meu descontentamento com a noticia – você tem certeza?
- tenho – falou ela olhando pra mim sob seus cabelos negros. Ela se levantou e limpou a boca. Ela tinha um piercing no nariz e vários brincos na orelha.
- é do Luke?
- é – falou ela respirando fundo.
- tem certeza?
- tenho. Eu só tenho feito com ele nas últimas semanas.
- não é essa minha pergunta. Tem certeza que está grávida?
- o teste deu positivo hoje antes de vir para o trabalho.
- o que você vai fazer em relação a isso?
- eu não posso ter um bebê – falou ela se sentando no segundo degrau de uma escada que dava para dentro de uma loja.
- você pode abortar.
- eu já pensei nisso e eu não tenho coragem. Eu não quero ter um bebê, mas eu não tenho coragem de mata-lo.
- então a última opção é adoção. você precisa tê-lo – falei me sentando do lado dela na escadaria.
Violet pareceu cabisbaixa e eu olhei para o alto vendo as estrelas. A música do bar era abafada pela porta fechada e alguns carros passavam na rua.
- você já contou para o Luke?
- não. Acho que ele vai surtar – falou ela colocando as mãos na cabeça parecendo desesperada – ele vai me deixar.
- se ele te deixar por causa disso, ele não te merece.
- não posso perde-lo – falou Violet começando a chorar.
- pelo amor de Deus Violet. É só um homem. você não está chorando porque ele pode te deixar por estar grávida, ou está?
- você nunca se apaixonou na vida – falou ela olhando pra mim – É por isso que você não entende.
- realmente não entendo – falei me levantando – preciso voltar lá pra dentro, você consegue voltar ou quer que eu avise o gerente que não volta mais hoje?
- não. Eu preciso. Vou aproveitar enquanto posso porque quando o Danny descobrir que estou grávida ele vai me colocar no olho Da rua.
- Não se preocupe com isso, vamos dar um jeito nisso.
Ajudei Violet a se levantar e nós dois entramos de volta no bar. Violet foi na minha frente e enquanto caminhávamos de volta para dentro o homem que eu tinha servido caipirinha a pouco passou pela gente indo ao banheiro, foi então que eu vi ele passando a mão na bunda da Violet que virou-se rapidamente.
- tá ficando doido? – falou ela empurrando o homem. A bebida que ele segurava derramou em sua roupa.
- sua vaca – falou o homem irritado.
- seu babaca, você passou a mão nela – falei empurrando o cliente que quase caiu no chão.
- tá ficando louco – falou ele vindo pra cima de mim, mas outros homens interviram. Eu estava pronto pra briga.
- você passou a mão nela seu imbecil – falei sendo segurado por dois caras.
- idiota!! – falou Violet claramente irritada.
No meio daquela confusão o gerente, Danny, apareceu.
- o que está acontecendo aqui? – perguntou ele confuso.
- esse imbecil me atacou, derramou bebida em mim e me agrediu – falou o homem pra mim.
- Sim, mas esse imbecil passou a mão em mim – falou Violet.
- tá ficando doida garota? – falou o homem irritado.
- porque você não é homem e assume o que fez? – falou Violet.
- já chega! – falou Danny – Vocês estão demitidos.
- ótimo – falou Violet.
Nesse momento senti um frio na barriga. Lembrei de tudo o que Violet passaria nos próximos meses.
- a culpa é minha, ela não merece ser punida – falei me acalmando.
- tudo bem – falou Danny – Violet, você fica! – ele foi até o caixa e tirou um bocado de dinheiro – Griffin, cai fora daqui.
- se ele for, eu também vou – falou Violet insistindo.
- não faça isso Violet – falei pegando o dinheiro da mão do gerente e olhado para a barriga dela – você precisa pensar no seu bebê – falei cochichando.
- eu sinto que devia ir com você – falou ela – isso é culpa minha.
- a culpa é do babaca – falei tentando mostrar pra ela a razão. Já que ela quer ter o bebê ela precisa colocar ele em primeiro lugar.
- eu vou com você – falou ela triste.
- você não precisa fazer isso, eu vou me virar – falei dando a volta no balcão e saindo do bar.
Algumas pessoas ficaram me encarando quando saí, mas não dei importância. Por alguns instantes senti que tinha feito algo errado. Devia ter ficado calado, devia ter deixado pra lá e fingido que não vi, mas eu não era esse tipo de pessoa. Não conseguia simplesmente ignorar um cara passando a mão em uma amiga.
Ao chegar lá fora vi que algumas pessoas estavam lá conversando, bebendo e fumando. A noite estava fria e escura. Alguns carros passavam na rua e o relógio marcava pouco mais da meia noite.
Chamei por um taxi para ir pra casa. O que estava feito, estava feito. Assim que cheguei na porta de casa, paguei a corrida e o táxi se foi caminhei em direção a porta de entrada e foi quando ouvi alguém chamar meu nome. Uma voz masculina conhecida. Ao olhar para trás vi que era Kenny, o vizinho que mora na casa de frente para a nossa. O vizinho que estava mais cedo lá em casa cochichando com meu pai.
- Griffin? – perguntou ele descendo as escadas da porta da casa dele – o que faz uma hora dessas em casa? Não devia estar trabalhando?
- o que você faz aqui fora?
- eu desci pra tomar água e vi o taxi parando na porta da sua casa.
- é uma longa história – falei me virando para entrar em casa.
- eu gostaria de ouvir essa história… se você quiser me contar é claro – falou ele parado no meio da rua com os braços cruzados, estava muito frio.
- eu fui demitido.
- porque?
- na verdade é uma história bem curta – falei me aproximando mais dele – Arranjei briga no bar com um cliente. Ele passou a mão na minha amiga e eu não consegui me conter.
- puxa, sinto muito.
- eu me sinto um idiota.
- você se sente assim agora, mas você ainda é novo. Você tem muito o que caminhar na vida. Mais pra frente vai perceber que empregos vem e vão, mas amigos são pra toda vida. Você vai ter orgulho do que fez e não vai se arrepender do que podia ter feito, acredite, eu sei bem como é isso.
- como assim? – falei vendo em seu olhar algo enigmático.
- eu sei muito bem como é a sensação do arrependimento.
- e do que você se arrepende?
- é uma longa história.
- eu gostaria de ouvir essa história, se você quiser me contar…- falei apostando alto. Talvez tivesse algo a ver com o que ele e meu pai conversavam mais cedo.
- na verdade… - Kenny começou a falar e eu levei um susto quando meu pai abriu a porta de casa logo atrás de mim.
- o que está acontecendo aqui? – perguntou meu pai – Griffin? O que fez aqui? – perguntou meu pai para mim. apesar disso, ele estava olhando para Kenny. Como se ele reprovasse Kenny estar falando comigo.
- eu fui mandado embora pai.
- o que aconteceu? – perguntou ele curioso.
- briga no bar. Um babaca passou a mão na Violet e eu fui pra cima dela defende-la.
- não se preocupe com isso, você vai ficar bem – falou meu pai levando a mão direita até minha testa alisando a cicatriz que eu tinha. A cicatriz que ganhei no acidente.
- eu já estava indo pra casa – falou Kenny.
- boa noite – falou meu pai entrando em casa comigo.
- vou dormir, estou cansado.
- você está bem? Não quer conversar?
- sobre o que? Eu fui demitido.
- o que vai fazer agora? – perguntou meu pai indo para a cozinha.
- não sei. Vou procurar outro emprego. Enquanto isso a construção da minha casa vai ter que parar – falei triste.
A casa que eu construo pra mim na verdade é um projeto de minha mãe. Ela era uma excelente arquiteta e essa era a casa dos sonhos dela. Ela fez o projeto, mas nunca conseguiu levar a diante já que sua vida acabou de forma trágica.
- você precisa esquecer essa cada Griffin – falou meu pai colocando dois copos de leite e colocando no micro-ondas.
- eu não vou esquecer pai. Eu jurei que ia fazer essa casa e vou fazer. É o sonho da minha mãe.
- sim, mas não é o seu sonho!
- quem disse que não?
- você sente essa obrigação de fazer essa casa e isso é culpa do Kenny. Ele é que colocou na sua cabeça que pra você superar a morte da sua mãe você devia sentir que finalizou algo e agora você quer terminar essa casa a qualquer custo. Está saindo muito caro. Todo seu salário estava indo pra essa obra. Talvez isso seja um alerta para que pare com isso.
- eu não vou deixar a casa pela metade pai – falei sentando-me a mesa – é o projeto da minha mãe e ao morar nessa casa vou me sentir mais perto dela. Eu só tinha nova anos. Não sei muito sobre ela, tudo o que sei é que esse era um sonho dela.
- o que você e Kenny estavam conversando antes de eu chegar?
- o que isso tem a ver com qualquer coisa?
- Griffin, eu soou seu pai e eu sei o que é melhor pra você. A partir do momento que você arranjar outro emprego eu não vou mais te ajudar. Você vai ter que usar seu salário para se sustentar. Eu andei te sustentando enquanto você usava todo seu dinheiro nessa casa e isso não tem feito bem a você.
- você não pode fazer isso comigo, você prometeu desde o começo que me ajudaria com esse projeto.
- sim, mas não tem te feito bem. você tem estado obcecado com esse projeto. Acho melhor pelo menos por um ano ou dois você focar sua vida em outra coisa.
Ao ouvir essas palavras eu me senti mal. Não importa se eu estava obcecado ou não. Esse é um projeto que eu decidi ter em minha vida. É o legado de minha mãe. Seria um lar pra mim e eu tenho dado duro todo esse tempo.
- você não tem o direito de fazer isso comigo – falei gritando com meu pai – foi você quem a matou! – falei de uma vez.
- o que você está dizendo? – perguntou meu pai assustado.
- eu nunca disse nada e eu prometi a mim mesmo que foi um acidente, mas era você que estava dirigindo aquele carro. A culpa foi sua.
- você não tem o direito de jogar a culpa em mim.
- foi você quem a matou e você também quase me matou também – falei começando a surtar.
- que gritaria é essa? – perguntou Charlotte descendo as escadas vestida com seu robe.
- você não tem o direito de me punir por querer continuar o protejo da minha mãe. pra você foi fácil, conseguiu uma nova esposa e esqueceu da vida que tinha. Sou eu quem precisa ir a ao psicólogo, tomar remédios e tentar superar aquele dia.
- o que está acontecendo? Porque vocês estão gritando a essa hora da noite?
- eu disse para Griffin que não vou mais ajuda-lo com o projeto da casa.
- já era sem tempo – falou Charlotte – Griffin você precisa seguir em frente. Precisa esquecer sua mãe, ela está morta.
- cala a boca, não fale nunca mais sobre minha mãe – falei com raiva apontando o dedo pra ela.
- Griffin! – falou meu pai me repreendendo pro gritar com Charlotte.
- eu não acredito que você concorda com ela.
- ela é minha esposa e ela está certa. Todo mundo parece ter seguido em frente. Você é o único que não consegue entender que sua mãe se foi.
- queria que você estivesse morto – falei para meu pai – minha mãe não merecia morrer daquele jeito. Queria que fosse você que tivesse morrido naquele acidente.
Nesse momento Charlotte veio até mim e deu um tapa na minha cara. Meu pai veio rapidamente até Charlotte e segurou o braço dela a puxando para trás.
- o que está fazendo? – perguntou ele para Charlotte.
- ele não tem o direito de dizer isso. Ele já tem vinte e três anos, precisa crescer e vira homem.
- Griffin… - falou meu pai olhando para mim. seu olhar tinha mudado. Eu alisava meu rosto com raiva – Sinto muito. Isso não devia ter acontecido.
- eu vou embora daqui – falei respirando fundo.
- por favor filho, fique – falou meu pai tentando se aproximar, mas eu não deixei.
- você morreu pra mim – falei dando a volta em meu pai e em seguida subindo as escadas. Peguei uma mochila e coloquei o máximo de coisas que consegui.
- vamos conversar – falou meu pai entrando no meu quarto – vamos nos acalmar e conversar.
Sem prestar atenção no que ele dizia eu peguei minha mochila e desci as escadas. Em seguida eu sai de casa batendo a porta. A noite estava fria, mas isso não me impediu de sair de casa. Eu não tinha destino, mas isso não me impediu de caminhar. Sai pela calçada com muita raiva. Meus olhos lacrimejavam de ódio pelo misto de sentimentos dentro de mim.
Não havia ninguém na rua e eu caminhei rapidamente descendo a rua. Não tinha ninguém e não tinha nada a não ser o dinheiro que o gerente me deu.
Estava tão irritado e nervoso que não percebi que estava sendo seguido pela rua. Os meus passos abafavam o barulho dos passos que estavam atrás de mim.
- Griffin! Espera!
Quando olhei para trás vi que era Gray Chandler. Gray era vizinho do lado direito da casa de meu pai. Era um homem solteiro que vivia só. Ele vivia naquela casa a um bom tempo. Ele me conhece desde criança.
- Gray?
- o que está acontecendo?
- nada – falei limpando os olhos.
- eu ouvi a gritaria e vi você saindo de casa.
- briguei com meu pai.
- pra onde você vai a uma hora dessas?
- na verdade eu não sei.
- você pode vir pra minha casa se quiser.
- não quero incomodar.
- não vai incomodar. Você pode ficar quanto temo você quiser. Eu te conheço desde moleque. Lembro da sua mãe. Tinha vinte anos quando me mudei para cá. Foi trágico a forma como ela se foi.
- sim, foi trágico – falei concordando.
- você pode ficar o tempo que quiser.
- obrigado – falei seguindo Gray de volta pela rua. Quando entramos em sua casa vi uma mulher na sala de estar. Ela estava vestida com uma camisa masculina branca, que lhe pareceu um vestido.
- Griffin, essa é Felice, minha namorada.
- prazer – falou Felice apertando minha mão.
- prazer Felice.
- Gray, você vai chamar a policia? – perguntou ela preocupada comigo.
- foi só uma briga de família – falou Gray – ele vai ficar comigo por um tempo.
- você está bem? – perguntou Felice para mim.
- estou sim.
- vou mostrar seu quarto – falou Gray subindo as escadas junto com Felice.
Ele mostrou meu quarto e disse que eu podia ficar a vontade. Agradeci pelo o que ele estava fazendo e disse que não ficaria muito tempo. Não queria incomodar por muito tempo. assim que ele se foi eu tranquei a porta do quarto e me deitei na cama. Estava cansado de tudo o que tinha acontecido. Tinha passado por muito estresse naquela noite.
Apaguei a luz do abajur e virei para o lado tentando dormir. Enquanto pegava no sono lembrei que na manhã seguinte o soldado chegaria. O famoso ‘Deus Americano’, como foi apelidado pela mídia. Prometi a Violet que iria com ela, mas agora já não tenho certeza se irei. A minha vida era um inferno e é como dizem, uma desgraça nunca vem desacompanhada. Não vou pensar nisso agora, vou apenas fechar os olhos e dormir. Que os sonhos tragam aquilo que o pesadelo de estar acordado não consegue.