3 - NÃO É A HORA CERTA

Conto de lunaluasoares como (Seguir)

Parte da série Série Desafios

- Boa noite amor... – Ela me recebeu assim que abri a porta.

- Boa noite linda. – Demos um beijo rápido.

- Pedi comida japonesa pra gente. Vai tomar um banho enquanto arrumo tudo por aqui. – Ela disse já me conduzindo para o banheiro.

- Você leu meus pensamentos. – Sorri pra ela e fui pro banho e demorei o máximo possível, me preparando para o que viria.

Saí do banho e já estava tudo pronto, ela só me esperava para jantar.

- Como foi a reunião?

- Ótima. – Respondi com um sorriso animado. – Melhor do que eu esperava. Eduardo se mostrou muito satisfeito com nosso projeto.

- Fico muito feliz por você! – Ela disse enquanto acariciava minha mão. – Quer conversar agora?

- Vamos terminar de jantar primeiro. – Tudo para adiar essa conversa.

Terminamos de comer, retiramos a mesa e arrumamos tudo. Fomos para sala, me sentei em dos sofás, ela se sentou de frente pra mim e aí a coisa toda começou.

- Conversa comigo amor. Me preocupo muito quando você fica assim.

- É o de sempre Dani. Você já sabe... - Tentei parecer o menos grosso possível.

- Já parou pra pensar que talvez você se sinta sozinho? – Ela tinha um tom de voz manso, mas era sempre a mesa história... família.

- Sozinho como? – Disse ainda calmo. – Eu tenho você, meus amigos...

- Sozinho de família Fernando.

- Você é minha família Dani, praticamente moramos juntos.

- Mas não moramos... você não quer casar e ter filhos?

- Claro que eu quero Dani. Só não quero agora. – Sua expressão ao ouvir minhas palavras era de tristeza. – Filho é muita responsabilidade e ainda não é a hora certa.

Era sempre assim. Nossas conversas sobre o que eu sinto, acabavam em família, casamento e filhos. Dani vivia dizendo que me sinto sozinho, porque sou “sozinho” e não tenho família. E sempre acabava do mesmo jeito, brigando.

Esse era o momento em que às vezes, eu respirava fundo e contava até 10, para não mandar tudo ir pro raio que o parta. Mais precisamente a Dani.

- Você é a pessoa mais responsável que eu conheço Fernando. Você se da tão bem com a Alice... – Sua voz começou a ficar um pouco alterada, em um tom choroso. – Tudo que eu mais quero é formar uma família com você.

- Eu também quero uma família Dani, você sabe. Mas agora eu estou me dedicando muito à empresa. Quero ter um filho, para me dedicar inteiramente a ele. E a Alice é diferente, você sabe.

- Diferente como? Ela é uma criança e você cuida muito bem dela. – Ela suspirou. – Além disso, seu pai já deixou tudo pra você Fernando.

- A Alice fica no Lar Dani. Saio com ela às vezes, me preocupo com ela, mas sei que ela está bem, além disso, ela já está bem grandinha, já vai pra escola e era um desejo do meu pai. – Disse passando as mãos na cabeça. – E tenho que fazer o meu melhor, no momento eu só não quero me preocupar com filho. – Eu já começava a alterar a voz com ela e eu não gostava disso.

- Seu pai conciliava tudo... trabalho, esposa, você... – Ao ouvi-la dizer essas palavras, fiquei triste. Ela me conhece e sabe da minha história. – E agora, você só tem de continuar o trabalho dele, não precisa passar tanto tempo na empresa. Ela já está lá!

- Meu pai perdeu muitas coisas comigo Dani e você sabe.

- Você não me ama Fernando? – Ela perguntou chorando...

Dani mudava o foco das nossas conversas assim, uma hora era uma coisa e já partia para outra, me cobrando sentimentos. Sentimentos esses, que eu sempre fiz questão de deixar bem claros. Mas ultimamente ela me cobrava amor.

- Você sabe que eu sou louco por você. – Tentei me aproximar, mas ela se afastou.

- Você nunca diz que me ama.

- Desde quando precisamos de palavras Dani? Eu mostro que gosto de você com minhas atitudes.

- Mas eu estou falando de amor Fernando. A-M-O-R! – Ela continuava a chorar. – Esse “sou louco por você”, não é amor e você sabe. Eu preciso mais que isso.

- Não vou dizer que te amo... eu nem sei o que é amor Dani. Eu só tive você e o que eu sinto é forte, nunca dei motivos pra você duvidar dos meus sentimentos.

- Mas não é amor... – Ela respirou fundo tentando parar o choro e voltou a falar. – Quando você começa com essa loucura de que está faltando alguma coisa, eu me sinto uma inútil na sua vida.

- Não fala assim Dani. Você é uma das pessoas mais importantes nessa vida. – Tentei me aproximar novamente, mas novamente ela recuou.

- Mas não sou o suficiente. Às vezes sinto como se você estivesse acomodado com nossa relação, me sinto usada.

Fiquei furioso com essa última palavra, fui direto até ela, a segurando pelos braços e ficamos cara a cara.

- Não acredito que você está insinuando que estou te usando Daniela. – Era quase um grito de tanta raiva. – Eu sempre te tratei com respeito e sempre fui sincero com você, em todos os sentidos. Agora você vem dizendo que se sente usada?!

- Desculpa, não foi o que eu quis dizer. – E voltou a chorar.

- Mas disse. Depois de tudo que passamos juntos, você vem com essa, só porque não quero um filho agora ou porque não digo que te amo?! – Meu tom parecia mais alto a cada palavra que saía da minha boca.

- Você não é feliz Fernando, vive dizendo que falta alguma coisa, mas você tem tudo. Mas não é completo. Quero alguém completo. Eu preciso disso, de alguém me ame, sem medo. Alguém que queira o que eu quero.

- Dani, sinceramente, você está me deixando confuso com essa discussão e está sendo até egoísta. Eu sempre penso mais em você do que em mim mesmo, sempre procuro um jeito de não te magoar... – Ela ficou em silêncio. Estava exausto, nossas discussões sempre tinham o mesmo percurso. Mas hoje ela se superou. – Não quero mais brigar, me diz o que você quer...

- Eu quero você, mas quero você inteiro pra mim. – Ela disse mais calma. – Talvez seja bom você seguir o conselho do Enrico e procurar ajuda. – Ela me olhava diretamente nos olhos. – Vou sair por aquela porta e quero que me procure quando estiver pronto pra isso, pra me amar.

- Dani, não faz isso... – Enquanto eu falava, ela ia em direção a porta. – A ajuda pode não resolver esse problema com o amor e eu gosto de você. Quero ficar com você.

- Eu preciso de amor, Fernando. – Foi a última coisa que ela disse antes de sair e me deixar sozinho.

Eu gostava da Dani, até me imaginava com ela futuramente, como uma família, filhos e tudo mais. Mas amor não era o que eu sentia. Não era como se eu fosse fazer qualquer coisa para ficar com ela, mas eu gostava dela e ela me deixar desse jeito, me machucou. Sei que ela também estava sofrendo, sei que essa minha confusão a deixava triste, mas também me deixava triste...

Ficar sozinho naquele apartamento depois que a Dani terminou comigo, não estava bom. Ficava lembrando das suas palavras, ela me acusar de a estar usando, foi o cúmulo do absurdo. Eu poderia não a amar como ela tanto queria, mas usar não. Nunca a tratei mal ou faltei com o respeito, não mentia, a não ser por essa sensação de falta que me perseguia, mas eu metia mais pra mim do que ela e ali sozinho... estava com uns pensamentos sem noção, pensando em alguém que não deveria, porque era loucura. Eu sei que era loucura.

Senti uma necessidade de conversar com alguém e eu estava mesmo com uns pensamentos sem noção, querendo conversar... só podia estar ficando doido mesmo. Então saí, já estava tarde, eu sei, mas saí.

Uma decisão e tudo ao seu redor muda.

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Eram quase onze da noite, quando cheguei em seu apartamento, ele sabia que eu estava subindo porque o porteiro avisou, mas mesmo assim, pareceu surpreso ao abrir a porta.

- Fernando?! – Ele usava apenas um short de seda, não se preocupou em trocar de roupa para me receber.

- Oi Hugo... tudo bem? – Eu disse sorrindo. – Sei que está tarde. – Disse abaixando a cabeça, olhando para o chão.

- Sim... está. – Ele disse parecendo confuso. – Veio fazer o que aqui?

- Saber como você está... você não me ligou.

- Eu disse que não ligaria. – Ele disse revirando os olhos.

- É você disse... – Ficamos em silêncio por alguns segundos. – E então... vamos conversar assim... eu aqui fora e você aí dentro? - Ele sorriu.

- Desculpa, entra aí... – E deu passagem para que eu entrasse. – Fique à vontade.

Entramos e nos sentamos. Me sentia meio estúpido por estar ali, mas ele foi a primeira pessoa que me veio em

mente. Talvez por ele ter dito sobre já ter se sentido assim, confuso.

- Como está sua perna? – Tentei puxar assunto.

- Segundo o médico, daqui duas semanas tiro esse gesso maldito! – Ele disse suspirando.

- Desculpa vir aqui a essa hora. Eu só precisava conversar com alguém. – Me recostei no sofá, tentando relaxar um pouco.

- Tudo bem. Ainda estava acordado, mas se eu estivesse dormindo, te daria vários socos. – Hugo sorria. Ele sempre sorria, mas eu já disse isso. – Mas se você quer conversar, deveria ir até seus amigos e não vir até mim.

- Meus amigos me julgariam. Preciso de alguém que não me julgue. – Eu disse sorrindo, ainda me sentido estúpido.

- E porque eles te julgariam?

- Porque deixei uma mulher incrível ir embora. – Olhei pra sua cara, que parecia confuso.

- E porque a você deixou? – Ele se inclinou um pouco pra frente.

Contei todo o caso. Desde quando nos conhecemos, até hoje. Contei sobre minhas dúvidas, mas não falei sobre. Hugo se mostrava bem atento e era estranho falar com ele, às vezes era como se ele estivesse me entendendo, às vezes não e eu me sentia meio idiota por estar conversando com ele, àquela hora da noite ou já era madrugada?

Segundo ele, eu estava meio na fossa e precisava encher a cara. Me fez tomar um whisky, usando sua perna, para me chantagear, com a consciência pesada.

Falei sobre a Dani me mandar procurar ajuda e então Hugo começou a sorrir, não, a sorrir não, a gargalhar e eu meio que fiquei sem entender o motivo.

- O que foi Hugo? O que é assim tão engraçado?

- Cara, percebe que isso é meio irônico? – Ele continuava sorrindo. – Você aí se abrindo e eu aqui tentando te entender, procurando as palavras certas pra dizer.

- Não é nada engraçado Hugo. – Falei com o rosto sério. – Você vai ficar rindo da minha cara?! Vou embora desse jeito.

- Prometo parar de rir. – Ele cruzou os dedos e ficamos em silêncio por longos minutos, até que ele se controlou. – Não estava rindo da sua cara, mas rindo da situação. Seu amigo e sua ex te aconselham a procurar ajuda e você vem até mim... – Ele balançou a cabeça. – Talvez eu foda com sua mente Fernando... – Ele tinha um sorriso malicioso nos lábios, aí eu dei risada, isso era verdade, não era como se ele fosse me ajudar.

Continuamos conversando, madrugada a dentro. Eu parecia uma matraca, não sabia que conseguia conversar tanto, principalmente com um “estranho”. Eu falava mais sobre mim, Hugo raras vezes falava sobre ele.

Depois de muita conversa, Hugo me ofereceu sua casa. Ainda bem, eu não queria voltar para a minha.

No dia seguinte, me levantei e fui até a sala a procura do Hugo, mas não o encontrei, fui até a cozinha e tinha um bilhete na geladeira.

“Bom dia Fernando!

Tive que sair um pouco mais cedo e não quis te acordar. Fique à vontade, a casa é sua.

Fiz café da manhã, coma ou me sentirei ofendido.

Se sair antes de eu chegar, deixe a chave com o porteiro, já o avisei.

Até mais, abraços. - Hugo.”

O Hugo é uma peça, muito gentil por sinal. Tomei café, desapontar o cara assim logo de primeira, não dá. Saí logo após e deixei a chave com o porteiro como ele havia me pedido, mas deixei uma resposta ao seu bilhete.

“Bom dia Hugo, você poderia ter me deixado uma mensagem, isso é bem antigo.

Obrigado por ter me recebido e você é um cara muito prendado, o café estava ótimo.

Abraços!”

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