Capitulo I: Noventa e sete porcento.

Conto de Lucky32 como (Seguir)

Parte da série O homem esguio.

Capitulo I: Noventa e sete porcento.

Sempre fui muito ruim com datas em geral, aniversários, natais e festividades não me prendiam na realidade. Aborreci muita gente por culpa desse habito. O engraçado mesmo, é que aquela quarta feira me lembro muito bem, o sol havia acabado de nascer, a rua suja estava quase vazia, exceto pelas poucas pessoas que aguardavam a chegada do ônibus. Eu estava nervoso, queria que minha mãe estivesse lá, mas minha irmã estava doente, e exigia atenção e cuidados maternos. Não que me importasse, sempre fiz tudo sozinho, sendo irmão mais velho, isso era o requisitado por minha mãe.

Naquele dia estava frio, e eu como sempre havia esquecido de por um agasalho, apenas de camisa, colocava minhas mãos no bolso em vão na tentativa de esquentá-las . Não me lembro exatamente quanto tempo demorou para o ônibus chegar, e não sei se foi pela minha ansiedade, ou se realmente aconteceu, mas o veículo demorou muito, porém quando ele chegou não consegui me mover. Estava tenso, suor frio escorria pela minha testa. Sequei com a palma da mão, que estava gelada, o que me ocasionou em um pequeno choque térmico, me forçando a sair daquele transe. E por fim recitei um mantra que me ajudou a me mover. “ Não posso olhar para trás.”

Falei centenas de vezes para me convencer, até mesmo sussurrei. Você que está lendo pode ter impressão de que estava abandonando tudo que me era importante. Só que na realidade foi ao contrário, a cidade em que eu morava era um lugar que me fez sofrer, passei minha adolescência inteira estudando, trabalhando e nas poucas horas livres frequentava uma ong para pessoas de baixa renda. Passei anos nessa rotina e quando completei dezoito anos, houve um convite da coordenadora da instituição para eu dar aula de desenho na nova filial, em uma cidade do interior. Não que eu fosse um profissional, bem longe disso, mas como passei anos nessa ong, e consegui absorver algum conhecimento. Depois de uma longa conversa com minha mãe, ela me apoiou e disse que se eu quisesse poderia ir.

As vezes na vida temos a sensação de ter pouco, e querer mais. Mas no momento em que eu estava ali na fila prestes a entrar no ônibus, senti vontade chorar, e voltei ao meu mantra, que funcionou.

O homem gordo que estava na porta recolhendo os bilhetes com cara de poucos amigos recolheu meu bilhete, e como em um milagre sorriu. Acho que minha cara de sofrimento me denunciou, incrível nunca vou esquecer o rosto daquele o homem. Infelizmente por culpa dele após pisar no primeiro degrau do veículo, olhei para atrás e chorei.

Quem ler deve entender como um desabafo, ou apenas lamurias de um louco a beira da sanidade, mas não pense mal de mim. Para poder entender o meu presente desespero nesse quarto , tenho que lhe contar tudo desde o início, pois acredite você não iria crer se eu for direto.

Após chorar muito dentro do ônibus de viagem, e quatro horas de agonia. O veiculo parou no terminal. Eu havia chegado em meu destino. Araras. A cidade era bem pequena, o terminal diferente de Osasco era limpo e não fedia. Tratei de me apressar e retirar a bolsa que estava no compartimento do veículo, e me dirigi em direção ao ponto de ônibus em frente ao terminal, onde encontraria minha amiga e futura chefe Eduarda.

Não sei bem, mas desde o primeiro momento em que cheguei em Araras, tive um pressentimento ruim. Por mais bonito e tranquilo que o lugar me parece se, algo estava errado, infelizmente não consegui ouvir meu intimo, a espera pela minha amiga de tantos anos.

- Cleber?- Ela gritou ao mesmo tempo que equilibrava uma bolsa verde fluorescente.

Ela era um pouco mais alta do que eu, cerca de um metro e setenta dois, sua pele morena era semelhante com a minha. Poderíamos até ser confundidos como irmãos facilmente.

- Oi, Duda...- Disse meio sem jeito, pelo ataque de euforia.

Eduarda era bem otimista e alegre, provavelmente foi por esse motivo que em tão pouco tempo ela conseguiu o cargo de diretora na ong. Fazia pouco mais de um ano que eu não a via...

Me perdoem por desviar a todo momento do foco. Mas me dói muito lembrar dela.

Voltando ao que interessa...

Naquele dia ela estava radiante, os longos cabelos negros ondulados deram lugar a um chanel liso. Ficamos meia hora ali só colocando o papo em dia. No final, meio desconcertado, convenci Duda de que estava cansado e precisava descansar. No final peguei minha mochila e caminhamos em direção ao Gol cinza. No carro, ela continuou a tagarelar, não me lembro ao certo o que ela disse, porém algo que cravou em minha mente, e nunca mais esquecerei foi quando passamos em frente ao prédio em que eu supostamente daria aula. A sensação que me veio naquele momento foi de desespero. Quem sabe se eu não tivesse escutado a minha intuição, eu poderia ter evitado a situação em que me encontro agora.

Ela apontou para o prédio, e comentou algo sobre a pouca verba e reforma. Não lembro muito bem o que Duda falou, mas ainda sentia o efeito da minha intuição por isso sussurrei apenas um sim. Eu estava tão cansado e só queria relaxar. Poucos metros adiante ela estacionou o carro em frente a uma viela, ao lado de um mercado pequeno. A viela possuia uma poça de agua proviniente do esgoto em frente a porta. O lugar também não cheirava muito bem. Com anseio desci do carro e andamos até a porta do beco;

- Moça posso cuidar do seu carro?- Um garoto pardo, parcialmente banguela disse enquanto corria em nossa direção.

Eduarda sorriu e disse que sim, retirando da bolsa uma moeda, a qual entregou ao menino.

Caminhamos pelo estreito corredor úmido, mal conseguiam passar mais de uma pessoa ao mesmo tempo por ele. De ambos os lados varias portas de diferentes tamanhos e modelos se destacavam pelo caminho, hora ou outra, acabei tendo que abaixar devido algumas casas tinham o telhado muito baixo, onde a ponta de um dos mesmos quase me acertou.

Bruscamente ela parou.

- Aqui é seu quarto – Duda sussurrou meio apreensiva.

Peguei a chave meio sem jeito e coloquei na porta branca, que possuía o numero cinquenta e dois entalhado.

- É bem simples... – ela se referiu ao quarto. – Porém é temporário. Aposto que a verba dentro de algum...

Fiz um gesto para ela parar. – É perfeito.- falei me referindo ao cômodo.

O lugar era apertado, havia uma cama, um fogão e uma mini geladeira.

- Qualquer coisa me procura, estou no numero vinte e nove.- Duda disse em meio a um bocejo.

murmurei um "tudo bem". Eduarda por fim me deu um beijo e saiu.

Não consigo explicar para vocês a minha reação ao adentrar esse quarto que me encontro a primeira vez. Mas naquele momento o cansaço me dominou apenas deitei e cai na cama.

Agora que estou digitando no escuro, lembrando da Duda penso em como eu poderia ter evitado toda essa situação enquanto finjo que não o enxergo. Nesse exato momento ele está na porta do banheiro me observando, e sei que o mesmo está curvado por ser muito alto. Pra ele tudo isso é um jogo, e no momento em que eu demonstrar conhecimento sobre sua presença, sei que estarei morto!

Comentários

Há 1 comentários.

Por Um alguém em 2016-03-07 11:49:20
Nossa, esse último parágrafo foi terrível, deu um aperto no coração kkk, na primeira parte eu meio que não entendi nada, e achava que não leria seu conto, mas a partir desse eu com certeza vou acompanhar, muito bom, ótima escrita, já tem um seguidor agora querido kk, até o próximo capítulo!