11. Em chamas

Conto de Luã como (Seguir)

Parte da série O garoto da mesa 09

Entrar naquela porta do restaurante temendo encontrar Cesar fez meu coração palpitar descontrolado. Porém, logo ao entrar no salão e notar que quem estava no caixa assinando algumas coisas que geralmente são de Cesar era a Dani fez minha cabeça se embolar em um nó. Ele não veio? Bom, isso soa ótimo logo de cara, mas pra todo o resto da equipe não e eu não consigo pensar em outro motivo por ele ter faltado a não ser pela confusão de hoje cedo.

- Edu, graças a Deus você chegou! Eu tentei falar com você pelo celular, mas tava desligado. - Dani parece realmente aliviada ao me ver.

- cadê o Cesar?

- pois é, eu queria saber também. Falta menos de uma hora pra abrirmos pro jantar e ele ainda não chegou. Eu também tentei falar com ele, mas o celular dele também tava dando na caixa postal.

- hum, bom, a gente dá um jeito. Vai dar tudo certo! - eu tento falar confiante, mas com meu olhar e minha cabeça perdida e confusa por tudo. Não consigo parar de pensar que Felipe e Livia estão magoados comigo, ainda mais por coisas que eu não fiz ou que eu não tive culpa de acontecer. Ou será que tive? Será que se eu tivesse contado antes pra Livia, teria sido diferente? Certo que sim. Eu sou um idiota! Tentei arranjar o momento certo e acabei empurrando tudo pra frente, adiando até onde eu conseguia pra no final acontecer isso. Sigo para o banheiro para colocar meu uniforme e fico tentando criar coragem para mandar mensagem para Felipe. Em uma escala de 0 a 10, ele deve estar bravo comigo no nível 11.

Pouco depois de eu entrar na cozinha e ajudar todos a reorganizar a equipe, já que Dani ficaria o dia todo no caixa e isso nos custaria uma pessoa a menos na equipe de saladas, vejo Murilo chegar e sua cara de ressaca mal escondida misturada com vergonha invadem sem rosto ao me ver. Ele se põe ao meu lado no balcão, onde eu estou começando a cortar alguns pimentões em cubos e colocando em uma vasilha para agilizar os temperos das carnes mais tarde.

- e aí, pé de cana.

- e aí. - ele parece ruborizar só de falar comigo. Imagino que ele deve estar bastante embaraçado. - aqui, seu RG.

- ah sim, valeu. - pego-o e coloco no bolso, lembrando que em partes isso foi um dos motivos da ligação de Murilo que me trouxe tanta dor de cabeça agora a pouco.

- e como foi com o Felipe? Deu pra matar a saudade?

- bem, não tivemos o encontro ideal que eu tava planejando. - falo frustrado ao olho pra ele com uma expressão chateada e ele entende que havia algo errado.

- por que? Aconteceu alguma coisa?

- muitas coisas. O Felipe às vezes é tão cabeça dura...

- mas por que?

- ele não gostou que eu sai ontem sem falar nada pra ele e ainda mais que eu dormi na sua casa.

Murilo faz uma careta de "é, eu to ferrado com ele" e eu sinto vontade de rir.

- desculpa Edu, eu não queria ter provocado briga entre vocês...

- relaxa, não foi culpa sua. O Felipe é bastante incompreensível às vezes, já me acostumei. E também não foi só isso, nosso dia já tinha começado mal.

- nossa hein, por que?

Penso rapidamente e acho melhor deixar essa parte de fora da nossa conversa, até mesmo porque é a privacidade de Livia e de Cesar que estão em jogo, mesmo que eu não tenha consideração nenhuma por ele.

- nada não, só coisas bobas que foram se embolando e deu nessa confusão toda.

Ele percebe que eu não quero falar sobre isso e começa a me ajudar com os vegetais, trocando desse assunto pesado por outro.

- o Rômulo me ligou umas mil vezes hoje.

- e você?

- não atendi. - ele dá de ombros.

- você não vai poder fugir pra sempre, agora que ele sabe ele com certeza deve estar confuso e quer conversar contigo sobre isso.

- eu sei, mas eu não quero ver ele. Não hoje, não depois de todo o vexame que eu dei e do jeito que eu contei pra ele. Eu sinto como se eu tivesse feito a maior merda da minha vida. - ele balança a cabeça, parecendo mais como se tivesse falando consigo mesmo do que comigo.

- acontece, amigo. Quem nunca teve um porre desses e fez merda?

- é, isso é. - ele sorri, tirando sua atenção dos tomates e olhando pra mim. - obrigado, Edu. Por tudo.

Eu sorrio e sinto meu coração se aquecer. Murilo parece estar sendo meu novo melhor amigo aqui em São Paulo, sem dúvida.

- amigos são pra isso, não é?

- com certeza.

_

Logo quando o restaurante abre, me sinto feliz em ver que Cesar nem fez tanta falta como eu achava. Talvez seja porque o movimento está fraco, ou porque a equipe está trabalhando ainda mais pesado pra não deixar nada atrasar, mas as coisas parecem ir bem. Quer dizer, quase todas as coisas. Eu ainda sinto minha cabeça querer explodir de dor e eu sei que não estou conseguindo me concentrar direito no que eu faço. Como resultado disso, a noite demora um século pra passar e eu acabo me sentindo mais cansado do que se eu tivesse bebido todas ontem e tivesse ficado com uma ressaca maior que a de Murilo, que por sinal foi ainda mais produtivo hoje do que em seus dias de sobriedade, o que eu pensava ser impossível por dois motivos; ele já era ótimo no que fazia e qualquer pessoa de ressaca não consegue fazer as coisas em sua total capacidade. No fim da noite, eu me despeço de todos e fico feliz por estar indo embora pra minha cama, mas o pensamento de que Livia deva estar muito chateada comigo me deixa desanimado. Como eu vou olhar pra cara dela? Vamos focar brigados por muito tempo? Eu odeio isso, esse clima chato, achei que eu nunca teria isso com ela e que não teria isso com Felipe tão cedo, ainda mais hoje que era pra ter sido um dia tão especial com ele aqui em São Paulo. Assim que eu chego em frente ao prédio eu começo a preparar meu discurso de sinceras desculpas mentalmente, esperando do fundo do coração que Livia entenda o meu lado e me perdoe. Porém, quando as portas do elevador se abrem e eu sigo o corredor, avisto a porta do apartamento entreaberta. Um arrepio percorre meu corpo e eu me sinto em estado de alerta, pensando no motivo do qual a porta do apartamento estaria entreaberta, quase 23:30 da noite. Me aproximo mais e vejo que a luz da sala está ligada, então Livia provavelmente está em casa. Minhas maos parecem travar na hora de empurrar as rodas da cadeira pra frente, como se parte de mim estivesse com muito medo de entrar naquele apartamento, mas ao mesmo tempo necessitando entrar logo para ver se está acontecendo alguma coisa. Eu empurro a porta e finalmente entro, então vejo Cesar na sala, tampando a boca de Livia com a mão enquanto cochicha alguma coisa pra ela e pressiona ela contra a parede, aparentemente bebado.

- solta ela, Cesar! - meu grito ecoa pelo cômodo, fazendo Livia abrir os olhos e me deixar ver que ela estava chorando, presa nos braços fortes dele, que a deixava sem saída.

- Edu!

- sai daqui viadinho, eu to resolvendo meus problemas com ela.

- eu falei pra você soltar ela!

Sigo com meu corpo quente de raiva em direção aos dois para o tirar de perto dela, então logo quando eu chego ao seu lado e o empurro, ele a solta e me dá um soco no rosto, fazendo eu cair pro lado com a cadeira devido à força do golpe. Eu sinto uma dor imensa nas minhas bochechas e a adrenalina começa a me deixar cego de raiva, corajoso o suficiente pra tentar levantar e tirar aquele monstro de perto de Livia. Mas ele vem pra perto com mais raiva ainda de mim e me dá um chute do lado da costela, fazendo eu urrar de dor.

- é bom né? Se meter na relação dos outros? Toma aqui, seu merda! Seu viado desgracado!

Então, em um vestígio de força em meu corpo, mesmo com dor e sem condições de brigar no mesmo nível que ele, eu puxo sua perna e tento o derrubar, mas é em vão, com toda a força de Cesar em comparação com a minha, minha tentativa soa até ridícula. Porém, para minha surpresa, ouço um barulho alto que me faz parar por impulso, então vejo os estilhaços do vaso de vidro caindo junto com Cesar no chão. Livia agora parece estar em pânico, com os olhos arregalados e com o corpo estático, olhando pra ele por alguns segundos e depois pra mim, sem dizer nada. Cesar, que agora está machucado na cabeça, se levanta cambaleando e vai em direção à porta, sem nem olhar pra trás ou dizer algo.

- Livia, não deixa ele ir embora! Chama a polícia! - eu protesto, mas minha voz falha no final, quando sono uma dor forte nas costelas e fecho os olhos com força, reprimindo um gemido.

- calma, depois a gente vê isso. Agora eu vou te levar no medico e depois a gente vai até a delegacia fazer o boletim de ocorrência. - sua voz é calma e ela parece não estar pensando muito no que acabou de acontecer com ela, apenas se preocupando comigo.

- ele te machucou?

- não. - sua voz fraqueja e eu tremo só de pensar que ele poderia ter feito

algo pior com ela, se eu não tivesse chegado a tempo.

Ela me põe de volta na cadeira com cuidado e eu sinto meu corpo todo doer, principalmente minhas costelas, mas não é nada que tivesse que se preocupar com algum osso quebrado, por exemplo. Porém, mesmo assim vamos até o hospital e eu sou examinado, recebo alguns remédios pra dor e um atestado médico pra ficar em casa no outro dia, então vamos até a polícia e registramos a ocorrência. Posso ver nos olhos de Livia o quanto ela está decepcionada e assustada com tudo o que aconteceu hoje, em como Cesar passou de seu namorado perfeito a um monstro inescrupuloso em um período tão curto de tempo. Na saída da delegacia, o ar frio da madrugada me faz puxar as mangas pra baixo até cobrirem minhas maos, então eu as enlaço embaixo dos braços e sigo em silêncio com Livia até o carro. São quase 4h da manhã e eu sinto que meu corpo está exausto, mas minha mente continua trabalhando a todo o vapor, me fazendo pensar em tudo e me deixando ainda mais agitado.

- com toda essa confusão, eu até esqueci que amanhã de noite é o desfile lá da agência. - Livia quebra o silêncio um pouco antes de virarmos na esquina onde o carro ficou, então eu também me lembro do evento e fico espantado em como as semanas passaram rápido.

- nossa, é verdade, eu também tinha esquecido.

- não sei nem como que eu vou desfilar, eu ando um caco ultimamente, hoje mais do que nunca.

- eu to me sentindo péssimo por tudo isso, Livs. Eu acho que se eu tivesse criado coragem pra te falar antes eu podia ter ajudado a evitar tudo isso. Me desculpa.

Após minha confissão sair naturalmente e minha franqueza ser exposta, ajudando a tirar o peso das minhas costas, Livia olha pra mim e pela primeira vez hoje eu consigo ver ela menos tensa, mais ela mesma.

- esquece isso, Du. Você não teve culpa, aliás ninguém teve. O Cesar é um cretino e é só. Agora ele tá fora das nossas vidas.

- da sua, pelo menos sim. Mas infelizmente da minha não. Ainda vou ter que aturar ele no restaurante. - dou um suspiro fundo e pesado sem nem pensar, ao me deparar com essa situação. O ambiente no restaurante vai ficar ainda mais tenso entre eu e ele e não há nada que possa ser feito por isso.

- ei, não pensa nisso agora não. Vamos pra casa, dormir e amanhã a gente resolve tudo. O que me diz?

Eu olho pra ela e sorrio, enquanto paramos no meio fio e ela destrava a porta.

- me parece uma ótima ideia.

Então, ela sorri de volta e me ajuda a entrar no carro, então logo estamos indo pra casa, me deixando aliviado por finalmente dar um fim nesse dia louco e longo, muito longo.

__

Os flashes dos fotógrafos chegam a ser irritantes, clicando pessoas da alta sociedade paulista logo na entrada do salão de eventos e no início das fileiras. Semicerro os olhos a todo o momento, intercalando minha atenção entre as pessoas muito bem vestidas, algumas até um tanto exóticas e com trajes que não se vê tanto nas ruas e em Livia, que agora conversa com uma mulher alta, magra e morena, lá pelos 40 anos e provavelmente ex modelo, a julgar pelo porta e pela beleza. Livia parece tão nervosa e cansada, mas ao mesmo tempo parece tão feliz que eu me sinto ainda mais feliz por ela estar realizando uma etapa importante na carreira dela. Esse é sem duvida um dos maiores desfiles de moda que eu já vi, tanto pessoalmente quanto na mídia, até mesmo porque esse é meu primeiro evento de moda que eu compareço.

"O primeiro de muitos, se eu deixar Livia me levar naqueles que ela participar." - penso comigo mesmo, confiante pelo trabalho dela e certo de que depois desse desfile, ela vai ganhar visibilidade maior e talvez comece a firmar seu nome na indústria de vez.

Logo as fileiras estão todas ocupadas e o burburinho começa a ficar maior, as pessoas começam a ficar animadas e ansiosas pelo começo do desfile, já que algumas luzes acabam de ser apagadas, deixando um ar mais elegante e intimista, ao mesmo tempo que a música ambiente, que antes era baixa e tímida, começa a se sobressair e então surgem imagens de algumas modelos no telão, como uma espécie de prévia das coleções das marcas presentes.

Pontualmente às 21h da noite o desfile começa. As luzes se apagam um pouco mais, ficando apenas algumas lâmpadas em LED distribuídas nas laterais da passarela, então a primeira modelo aparece. A marca que Livia está desfilando é responsável por abrir o evento, trazendo uma atmosfera londrina, com cores mais discretas e com cortes retos, calças largas e com bastante toques de veludo. Bom, isso é o que eu acho, a julgar pelo que eu vejo. Com certeza críticos de moda podem explicar isso melhor, mas não há ninguém que possa explicar o orgulho que eu sinto quando Livia surge, alguns minutos mais tarde, com o rosto sério e focado pra frente, assim como todas as outras modelos, e vestindo um macacão cinza bem solto e com cortes assimétricos, quase sem maquiagem, apenas com um batom nude, conferindo um tom neutro e dando destaque realmente a roupa, que é linda. Sua postura séria e aparentemente confiante me faz abrir um sorriso largo e querer gritar e assoviar pra ela, mas eu me lembro que estou em um evento chique e muito importante pra ela, então eu acho que ela me mataria se eu desse vexame. Porém, do nada eu sinto meu sorriso desaparecer quando vejo ela caindo no palco, fazendo com que todos ficassem em alerta e se entreolhassem aflitos. Passados alguns segundos, ela não se mexe. Minha garganta já começa a se fechar e eu sinto vontade de chorar e de ir voando até ali saber o que houve com ela. Um dos seguranças chega até ela é se agacha, colocando seus dedos polegar e indicador em seu pescoço e verificando pulsação. Ele confirma que ela está bem para o outro segurança mais ao longe e eu suspiro aliviado. Era isso, o desfile havia terminado e Livia agora tinha a atenção de toda e qualquer pessoa presente aqui, com seus olhares preocupados, curiosos ou de desdém. Tento achar algum jeito de ir mais perto, mas o acesso é muito estreito. Droga! Quero saber como ela está. Pouco tempo depois vejo ela se mexer, então as pessoas em volta começam a falar que ela estava acordando. O mesmo segurança de antes volta a se agachar e ajuda ela a se levantar, começando a acompanhar ela para fora da passarela, em direção aos bastidores. Livia parece tentar não olhar para nenhum lado, apenas para baixo, de vergonha. Ela responde algumas coisas para o segurança, porém não o olha. Então, logo depois eu a perco de vista. As pessoas começam a comentar sobre o ocorrido e eu não sei se o desfile ainda vai continuar, e é aí que eu penso em tentar achar Livia lá dentro.

Passando por entre as pessoas, ainda alvoroçadas e de pé comentando o ocorrido, procuro uma porta que me dê acesso para os camarins. Encontro uma porta perto da área de coquetéis e de painel pra fotos, então sigo o corredor olhando pra dentro de todos os cômodos até achar o de Livia. Ela está sentada no sofá, tomando água e escutando os gritos do que eu penso ser seu responsável da agência. Passo pela porta atrevidamente e vejo uma mulher passar logo depois de mim com uma bandeja com algumas frutas e bolachas integrais, então ouço o homem de voz afeminada é um tanto fanha gritar de novo com Livia, perguntando se ela havia perdido a noção por ter ficado dois dias sem comer absolutamente nada. Ao ouvir isso, meu estômago se contrai. Ela fez o que? Livia! Você é louca?

- não é permitido a entrada de pessoas não autorizadas! - o homem grita ao me ver, me olhando com desaprovação.

- eu sou conhecido dela! - rebato com a voz ríspida, sem pensar muito nas consequências disso pra Livia e focando mais na raiva e na decepção que eu estou sentindo dela nesse momento.

- ah, então aproveita e tenta colocar algum juízo na cabeça dessa menina, porque ela acabou com o nome da nossa agência depois desse vexame!

Então, o homem insuportável gira em seus calcanhares e sai da sala bufando de raiva, acompanhada pela assistente quieta que trouxe as coisas pra Livia. Eu a encaro preocupado e ela tenta me olhar, mas logo seu olhar desvia do meu.

- eu sei o que você tá pensando e por favor, não quero ninguém me julgando agora.

Eu vou até ela e repouso minha mão em seu joelho, não falando nada. Sei que deve estar sendo um momento terrível pra ela e eu não tenho o direito de tornar isso pior. Chamo a para um abraço assim que vejo que ela me olha surpresa pelo meu silêncio, então ela desaba ao me abraçar. Seus braços me seguram firme e eu escuto ela soluçando, chorando compulsivamente e eu não sei o que dizer. Depois de um longo tempo, ela finalmente quebra o silêncio:

- minha carreira foi pro ralo. Eu ando tão esgotada e tá acontecendo tanta loucura na minha vida, a pressão tá insuportável e eu... - então ela tranca a fala e começa a chorar de novo e tudo o que eu faço é puxar ela pra mais perto ainda de mim e afagar seus cabelos.

- calma, você não tem culpa. Os últimos dias foram intensos e você tava se cobrando demais por causa desse concurso, Livs. Calma, não precisa chorar.

Então ficamos ali, sem dizer mais nada por um bom tempo, enquanto eu penso que talvez realmente a carreira de modelo dela possa ter sido prejudicada por isso, mas que talvez todo esse prejuízo de agora possa servir pra ela mudar seus hábitos e cuidar melhor de aí própria, a partir de agora. Porém, eu penso em como é difícil pra ela sentir a frustração de ter um dia tão importante acabando em confusão, além do medo de isso atrapalhar sua carreira efetivamente.

Sem dar explicações ou se despedir de ninguém, Livia se troca rapidamente e saímos do evento, que agora voltava aos eixos com a apresentação de outra marca, felizmente garantindo a atenção das pessoas para outro foco que não fosse Livia. Após sairmos para o ar frio da noite, vamos até o carro e seguimos pra casa em silêncio, enquanto eu não acho muito difícil de imaginar que Livia esteja com o pensamento longe, em sobre como sua carreira vai ficar depois de tudo o que aconteceu hoje.

__

Assim como nos outros dias da semana, hoje Cesar também não apareceu para trabalhar. Eu já liguei pro Cassiano e contei o ocorrido, sem dar muitos detalhes sórdidos, mas mesmo assim contando que houve um desentendimento entre a gente fora do trabalho e que desde então ele não apareceu mais. Cassiano disse que sentia muito e que apesar de ter uma amizade forte com Cesar, as coisas estavam começando a ficar difíceis em relação ao lado profissional, com ele agindo estranhamente e agora com isso. Então ele me disse que eu tinha total liberdade para começar a procurar outra pessoa de confiança pra contratar, treinar e deixar no controle do caixa. Hoje, o dia está corrido e o movimento alavancou, compensando todos os outros em que o fluxo foi baixo. É sábado à noite e Murilo só sabe falar de sair depois do expediente e aproveitar que amanhã ele não trabalha, então vai ir até uma boate nova que inaugurou na zona oeste, perto da Vila Madalena, então ele me convida pra ir e eu torço o nariz.

"Só fiz isso uma vez desde que eu sofri o acidente e até foi legal, porque foi com a Marina, mas não sei se eu tenho animo pra isso de novo" - penso comigo mesmo, me achando ridiculamente preguiçoso.

Estamos quase no fim do expediente, mas a casa ainda está cheia. Novos pedidos, muitas mesas pedindo sugestões da casa, tudo indo realmente bem. Vou até a cozinha novamente, depois de atender um cliente que me chamou até à mesa para me dar ótimos elogios sobre o tempero da comida e sobre o atendimento, então eu vejo todos trabalhando em sintonia. Murilo, com sua agilidade e seu perfeito manuseio nas carnes, Dani, com seu par de olhos orientais e com suas mãos mágicas pra preparas sobremesas... É uma equipe ótima, que me recebeu de braços abertos e faz eu me sentir em casa. Conto pra eles sobre o elogio do cliente e parabenizo toda a equipe, então o sorriso de satisfação de todos é motivo de orgulho pra mim.

"São meus feras dessa cozinha" - penso comigo mesmo, então o fato de já estarmos no meio de abril me assusta. O tempo está passando rápido e logo eu vou voltar pro sul. E eu vejo desde agora que eu vou sentir falta de tudo e de todos aqui, sem dúvida nenhuma. Dani, que estava fazendo mini tortas de maçã e canela, acaba me tirando de meia devaneios ao soltar um grito e reprimir um palavrão ao queimar seus dedos, tirando a forma do forno. Ela vai direto ao banheiro lavar as mãos e eu vou até o escritório pegar o kit de primeiros socorros, com band-aids e pomada pra queimadura. Reclamo em pensamento que não faz nem um mês que eu arrumei tudo aqui e já está tudo bagunçado novamente, enquanto tento me lembrar onde eu tinha colocado essa bendita caixa. Procuro nos armários, nas gavetas da mesa e nada. Então, olho na estante de livros e trofeus de Cassiano, bem ao lado da luminária pequena e cilíndrica e finalmente acho-a. Porém, para meu grande azar, ao tentar ser mais rápido ao pegar as coisas de dentro da caixa, eu a repouso de mal jeito em cima das pilhas de papéis de cima da mesa e eles acabam caindo no chão, se espalhando e me fazendo suspirar fundo. Travo as rodas da cadeira e me apoio ao lado da mesa pra pegar tudo do chão sem ter risco de eu cair, e por sorte não são muitos e não estão relativamente longe. Quando eu estou quase acabando de pegar o último, um barulho de pessoas gritando faz meu coração parar por alguns milésimos de segundo. Esses gritos são aqui dentro, bem ao lado da sala, no salão que está lotado de gente. Assim que eu saio pela porta, o cheiro de queimado invade meu nariz e faz eu começar a juntar os fatos. Me apresso pra ver se está tudo bem e eu vejo os clientes correndo em direção à saída, enquanto uma labareda se forma vindo da área do bar, no outro lado do salão, então eu vejo que a porta da cozinha está aberta e Murilo está tentando acalmar os clientes e direciona-los para a saída convencional e para a saída de emergência, mais ao lado. Olho assustado pra tudo isso e me pergunto como tudo isso aconteceu tão rápido. A porta da cozinha está aberta e os funcionários estão saindo assustados de lá, enquanto alguns ajudam Murilo a acalmar e ajudar os clientes e outros simplesmente entram em pânico. Mas que merda é essa? O alarme de incêndio está próximo ao bar, o que me impossibilita de chegar lá pra tentar aperta-lo. Pensa Eduardo, pensa! O extintor! Vou até a cozinha pra pega-lo e, para meu maior azar, ao chegar vejo que alguém esqueceu o fogão industrial ligado e isso causou outro princípio de incêndio, com as labaredas chegando ao teto. Mas que porra! Me apresso e fecho o registro de gás o mais rápido possível, então as chances de explosão já são menores. Eu sinto meu corpo todo tremer com a adrenalina e tudo o que eu preciso fazer é pegar a merda do extintor pra tentar apagar o fogo. Estou quase chegando lá pra pegar quando ouço uma pequena explosão do lado de fora da cozinha, provavelmente causada pela grande quantidade de álcool das bebidas no bar. Em menos de um minuto, a cozinha também já está em chamas. O calor do fogo que se espalha pelo teto e pelas paredes é insuportável e o cheiro de queimado é tóxico, me fazendo tossir e colocar o nariz pra dentro do uniforme. Uma labareda forte se solta do fogão e isso me assusta, fazendo eu ir pra trás sem jeito e tropeçar com a cadeira em algo que me faz cair. Droga! A situação está totalmente fora de controle e não há ninguém na cozinha, ninguém pra me ajudar a pegar a merda do extintor... bem, a essas horas o extintor nem adiantaria mais. Me arrasto em direção a saída de emergência, já que a saída da porta que dá acesso ao salão está interditada pelo fogo. É aí que mais uma pequena explosão, dessa vez vinda de dentro da cozinha, faz tudo piorar. Como se não bastasse tudo isso, a maçaneta da saída de emergência está quente demais e a porta parece estar com certa dificuldade pra abrir. Droga, droga, droga! Preciso pensar rápido. Agora sou apenas eu aqui e eu preciso me salvar. Tenho a ideia de tirar o avental e usá-lo como proteção para minhas maos, evitando o contato direto com a barra de ferro larga e grossa que serve pra abrir passagem, ao mesmo tempo em que eu o puxo pra baixo e pra trás, no sentido do qual a porta se abre, porém, sem sucesso. Não consegui aplicar a força necessária, já que é relativamente alto pra mim e eu não estou nem tendo mais força pra nada, devido ao ambiente estar cada segundo mais quente. Então, me arrasto de volta até perto dos armários, já completamente suado e com o nariz doendo por causa da fumaça tóxica, a procura de algo para que eu pudesse alcançar a droga da maçaneta e pudesse forçar o suficiente pra ela abrir. Porém, não consigo achar nada. A única solução agora é de tentar subir novamente na minha cadeira e ficar na altura ideal pra eu poder forçar a porta e abri-la. Volto até a cadeira, que estava caída pro lado e por sorte ainda não tinha sido atingida pelo fogo, então a ponho direito no chão e forço pra subir, apressado. Mas o fato de eu ter esquecido de travar novamente as rodas antes de tentar subir fazem a cadeira deslizar pra frente e eu perder o apoio, então eu caio com tudo no chão e bato minha cabeça no piso, desmaiando.

Comentários

Há 5 comentários.

Por Mahrio em 2016-04-02 19:19:08
Olá autor da série! Venho pela primeira vez escrever para elogiar a sua série. Tudo em apenas um fim de semana. Estava muito ansioso por este capítulo novo, e agora ansioso em dobro para os capítulos que virão! Parabéns!!
Por Sirferrow em 2016-04-02 17:43:47
Mdsss Coitado do Edu. Espero q alguém o salve l. Isso deve ter sido o canalha do César. Q raivaa.
Por LuhXli em 2016-04-02 16:23:31
Acho que isso é coisa do César! Espero que tudo fique bem logo!
Por Felipe Fernandes em 2016-03-31 14:19:03
Ah MDS ESSA TENSÃO É INCRIVEL PARA OS LEITORES! Migoo seu lindo... ta muito dahora esse capitulo. Adrenalina do começo ao fim e o jeito que tudo ta desabando é incrivel... mesmo... eu quero saber como vai rolar o desfecho do Felipe com o Edu... percebi que ta acontecendo a mesma coisa na época do bernardo haha tipo eles tão presos num loop temporal kkkk enfim continua logo e parabens.... ate breve.
Por Niss em 2016-03-30 20:00:35
Meu Deus Edu!! Cadê o Murillo?? Será que ele não sentiu falta do Edu lá fora?? Porra. Se fosse a Mari já tinha ido buscar ele... Mas ainda tem mais uma chance, ele tem que pegar o Edu de lá.. E aí dele se não o fizer... É uma pena a Livia perder essa oportunidade... Ela merece mais uma chance. Claro não nessa mesma agência, mas numa melhor. Quanto a agressão, eu tenho certeza que a praga desse César vai ser punido. E gostei muito da atitude do Edu em tentar defender ela é também de ter feito o boletim de ocorrência e denunciado aquele pobre coitado. Espero pelo próximo, e com a presença do Lipe. Kisses, Mana Nissan Spears.