09. Sim/Não

Conto de Luã como (Seguir)

Parte da série O garoto da mesa 09

Fala galera! Tudo bem? A série já tá chegando ao fim, só faltam mais quatro capítulos ):

Maaas, eu já tenho o projeto da segunda temporada pronto. O incentivo de vocês, comentando, me dando feedback o tempo todo, me faz ficar muito feliz, além de me dar ânimo pra continuar escrevendo. Obrigado a todos. Boa leitura! (:

Estou sentado na poltrona bem em frente ao diretor, que bufa enquanto passa a mão por sua cabeça calva. Ele parece não ter se acalmado ainda. Nem eu, ou ninguém nessa sala.

- o que deu em vocês? Pareciam uns animais na quadra! Não me resta outra alternativa a não ser suspender vocês. E se acontecer de novo, vai ser expulsão. Não tolero violência nessa escola.

- mas diretor, os dois estão fazendo bullying com o Eduardo há dias, aqui dentro da escola. O senhor não vai fazer nada?

Felipe, mesmo com um saco de gelo na bochecha inchada e todo amarrotado, não perde o jeito superprotetor.

- isso é verdade, filho?

Eu abaixo minha cabeça, olhando para meus dedos entrelaçados sobre minhas pernas.

- sim.

- e o que eles estão fazendo?

- há dias eles estão fazendo chacota, me chamando de apelidos e me perseguindo.

Os dois protestam logo em seguida, mas o diretor exige silêncio.

- e que tipo de apelidos, Eduardo?

- todos em relação a minha sexualidade, diretor.

Alvarenga olha um tanto surpreso para mim por um milésimo de segundo, e em seguida volta seus olhos para eles, aborrecido.

- não tolero bullying nessa escola tanto quanto não tolero agressão física. Se eu ficar sabendo que isso ocorreu novamente, vocês serão expulsos também.

Os dois parecem ter perdido a língua. Não sei onde foi parar a coragem que tinham há minutos atrás na quadra. Só depois que eu saio da sala do diretor que eu sinto meu corpo dolorido. Pelo menos animamos ainda mais o jogo. Volto até o ginásio para pegar minha mochila, e as interséries continuam a todo o vapor. Minha suspensão vai durar o resto da semana. Minha primeira suspensão na vida. Mas me sinto aliviado, não aguentava mais ser oprimido daquele jeito. Espero Felipe pegar suas coisas e vamos embora.

Estamos caminhando rumo ao ponto de ônibus, indo para sua casa. Apesar de tudo, estamos eufóricos com a cena.

- você viu a cara deles lá na diretoria? Foi hilário!

- nem pareciam os dois valentões que ficavam me atormentando. Mas você não precisava entrar em briga por mim Felipe.

- acho que é minha sina né Edu? Sempre entrando em confusão pra te salvar.

Ele se vira rapidamente pra mim e me da um sorriso de canto perfeito.

Já estamos em sua casa, sozinhos. César está trabalhando, Lívia já havia ido embora no início da semana, e Pedro está na escola. Ao entrarmos na cozinha, Felipe me surpreende dizendo que vai fazer o almoço.

- você sabe cozinhar?

- não, mas vou tentar.

Nós dois sorrimos, mas sinto aflição de pensar em Felipe cozinhando. Jogo minhas coisas no sofá junto com as dele, e me sento na mesa.

- o que vai sair de almoço?

- surpresa, só preciso que corte os legumes pra mim.

Ele se vira com olhar debochado, e eu sorrio lembrando que disse a mesma coisa pra ele dias atrás. Pego as coisas e começo a ajudá-lo.

- onde está seu carro?

- está na garagem. Mas meu pai leva a chave junto desde aquele dia que eu peguei escondido.

- eu faço uma cara de “eu tentei te avisar” e ele mostra a língua com uma careta.

- muito adulto, Felipe.

Ele sorri e vem ao meu encontro me beijar.

Pouco tempo depois, o almoço está pronto. Arroz de forno e bife acebolado. Não é uma das minhas comidas preferidas, mas eu gosto. E o cheiro parece tão bom quanto a aparência.

- confesso que eu fiquei com medo da ideia de você cozinhando, mas agora eu to vendo que eu estava errado. A cara tá ótima.

Seu sorriso é triunfante.

- obrigado.

Após comermos e arrumarmos a bagunça na cozinha, vamos para o sótão, que é sem dúvida um dos cômodos mais legais da casa. É claro e arejado, com um sofá enorme, puffs coloridos, uma mesa de sinuca, um home theater e uma estante com livros e CDs. Estou deitado com a cabeça em seu colo, e estamos ouvindo Ink, do Coldplay. Seus olhos estão fundos nos meus.

- quando é o vestibular da UFCSPA?

- logo depois da formatura.

- você já tá estudando?

- desde o começo do ano.

Fico ansioso só de pensar, e Felipe percebe.

- ei, não fica nervoso. Vai dar tudo certo.

Eu sorrio em agradecimento pra ele, que me planta um beijo na testa.

- e você, já decidiu qual curso vai fazer?

- publicidade. Eu sempre tive essa paixão, mas meio que desfoquei quando pensei em seguir os passo do meu pai. Mas eu não gosto de economia, nunca gostei.

- eu sei que quase sempre tem essa pressão de seguir os passos do pai, mas seu pai parece ser um homem liberal, ele não te obrigaria a fazer algo que você não gosta.

- claro, o problema não é meu pai, sou eu. Eu queria fazer o mesmo que ele e lhe dar orgulho, como se fosse algum tipo de compensação por eu ser...

Felipe não termina a frase, um tanto sem jeito.

- gay?

- isso.

Felipe ter vergonha ou receio de sua sexualidade é novidade pra mim.

- Felipe, seu pai não tem vergonha de você. Aliás acho que você tem um dos pais mais bacanas que eu já vi. O fato de você ser gay pode sim soar estranho logo de início, mas não chega a ser motivo de vergonha pra ele, isso eu posso te afirmar.

Ele me olha e me faz carinho no cabelo.

- eu sei. Acho que era algo que eu criei na cabeça.

Olho pro relógio e tomo um susto. Está em cima da hora pra eu ir trabalhar. Pego minhas coisas no sofá da sala, me despeço rapidamente de Felipe, e sigo meu caminho. Ainda bem que não é longe. Chegarei bem em tempo.

Estou terminando de guardar algumas notas fiscais no balcão do caixa quando Humberto aparece em minha frente, animado.

- Edu, você se importa de fechar a loja hoje? Eu preciso sair mais cedo.

Percebo está usando perfume também.

- claro que não Humberto, mas aconteceu alguma coisa?

- não, eu tenho um encontro.

- isso é ótimo! Com quem?

Ele ruboriza.

- com Carlos.

Eu quero dar pulos de alegria agora mesmo. Eles vão sair! Eles parecem se combinar. Torço por eles desde agora. Dou um sorriso enorme para ele e desejo boa sorte. Termino minhas coisas e então percebo que está quase na hora de fechar. Pego minhas coisas em meu armário, desligo o computador e tiro a placa da floricultura da calçada, ajeitando-a no lado de dentro próximo às flores. Estou abaixando a porta de ferro quando vejo que alguém estaciona o carro bem atrás de mim. Termino de colocar o cadeado e me viro para ver quem é.

- oi Edu.

Eu estremeço.

- oi pai.

- você tem um minuto?

- na verdade não, eu tenho que ir pra casa logo. Aconteceu alguma coisa?

- não, eu só queria te convidar pra dar uma volta e conversar.

- desculpa, mas eu realmente não posso.

- o que você acha de ir almoçar lá em casa domingo então?

Merda, fico sem saída. E também não posso fugir pra sempre.

- claro pai.

Tento dar um semblante de sorriso. Ele parece um pouco mais aliviado quando eu aceito o convite.

- tudo bem. Você quer uma carona?

- não precisa. A gente se vê domingo.

- combinado, domingo.

Percebo um vestígio de sorriso em seu rosto, mas não retribuo. Ele entra de volta no taxi, e vai embora. Não, eu não tinha que ir pra casa logo. Por que eu não consigo deixar tudo pra trás e esquecer daquela briga? Felipe tem razão, ele é meu pai. Não posso deixar a mágoa me afastar dele.

Acordo de manhã cedo com meu celular tocando. É Felipe.

- bom dia, dorminhoco.

Olho pro relógio e são 9:13.

- bom dia. Caiu da cama?

Não, só queria te convidar pra dar uma volta. Topa?

- claro.

Meu dia já começou bem. Deixo escapar um sorriso bobo.

- te encontro ai daqui a pouco.

Me levanto e vou procurar algo pra vestir. Pego uma camiseta básica lavanda e calça jeans. Estou tomando café quando ouço a campainha tocar. Ao abrir a porta, lá está ele, com o cabelo bagunçado do vento e com seu sorriso de canto de tirar o fôlego.

- ei. – eu estou visivelmente mais feliz ao vê-lo.

- ei.

Recebo um beijo. O convido pra entrar, mas ele diz que não temos tempo. Ele está com uma mochila grande, abarrotada de coisas, e isso me deixa ainda mais curioso. Seguimos para a área rural da cidade. Quando percebo, estamos a caminho da cachoeira. Faz muito tempo que eu não venho aqui. Com essa correria nas últimas semanas, eu não tive tempo pra isso. Andamos mais um pouco até chegarmos no nosso destino. Solto um sorriso involuntário ao ver aquela beleza natural. Mas Felipe não para de caminhar, e eu o sigo. Andamos mais alguns minutos pela margem d'Água até chegarmos em uma área de árvores altas, com muita sombra e gramado plano. Felipe tira a mochila de suas costas, aliviado por se livrar do peso, e começa a tirar as coisas. Uma toalha de mesa, coisas pra comer...

- isso é um piquenique?

Felipe me olha e sorri, e eu sorrio mais ainda.

Estamos sentados, contemplando a natureza, e comendo sanduíches. A luz que entra pelas frestas das árvores bate no rosto de Felipe, deixando-o ainda mais lindo. Mas há algo de errado com ele. Parece aflito.

- Lipe, ta tudo bem?

Ele me olha e sorri, limpando as mãos suadas na calça .

- bom, acho que eu ja vou começar.

- começar o que?

- só me escuta até o final, tá bom?

Eu o olho um tanto surpreso, e o deixo terminar. Eu também estou ficando aflito agora.

- hoje faz exatamente 5 meses que eu te conheço. E quando eu te vi, lá no restaurante pela primeira vez, eu já senti uma coisa diferente. Depois, o assalto na rua, e o reencontro na escola, tudo me fez ter mais certeza que a gente não tinha se encontrado por acaso. Sempre que eu te vejo Edu, meu coração bate feito um louco, de tão feliz. E bom, eu não sou muito bom em palavras, mas dizem que quando a gente encontra a pessoa certa, a gente reconhece na hora.

Então, ele abre a mochila e pega uma caixa pequena aveludada. Ai meu Deus. Meus olhos, que já estavam lacrimejantes, se transbordam ao ver aquilo.

Ele abre a embalagem e retira dois colares de prata com alianças de compromisso como pingentes.

- eu ouvi falar em algum lugar que colocando a aliança perto do coração faz mais sentido ainda do que no dedo, então eu tive essa ideia. Edu, eu sei que a gente já tá junto há tempos, mas eu nunca pedi oficialmente.

Ele se ajeita e fica de joelhos em minha frente, com o colar na mão.

- você quer namorar comigo?

Ai meu Deus, meu coração está quase pulando pra fora da minha boca agora.

- sim, eu quero, claro que quero.

Digo isso e o cubro de beijos, emocionado com tudo. Ele pega um dos colares e coloca em meu pescoço, beijando minha nuca em seguida. E então, eu coloco o dele. Estou tão feliz agora que podia gritar bem alto pra todo mundo ouvir o quanto amo Felipe. A bagunça que anda acontecendo comigo é grande parte por nossa relação, mas ao mesmo tempo que tudo parece errado, tudo parece tão certo também. E eu sei que lutaria até o fim pra ficar junto com ele.

Já é domingo, e não consegui dormir a noite toda ansioso por esse almoço. Me levanto pra me arrumar, e minha tia está acordada na cozinha, passando café.

- bom dia, tia.

Lhe dou um beijo no rosto.

- bom dia Edu. Caiu da cama?

- nem consegui dormir.

- tá ansioso?

- muito, e com um pouco de medo também.

- medo de que?

- não sei, de não dar certo, de nosso encontro ser um desastre, eu não sei.

Fátima me segura pelos ombros e me lança um olhar encorajador.

- vai dar tudo certo, Edu. Não fica nervoso.

Eu lhe retribuo com um sorriso, lhe dou um abraço e saio. O dia está lindo, poucas nuvens, temperatura amena. O caminho parece ser mil vezes mais longo por conta da ansiedade. Quando chego em frente à casa, meu coração acelera. Continuo andando até chegar na porta. Quando toco a campainha, logo minha mãe abre a porta. Ao me ver, já se emociona, me puxando para lhe dar um abraço apertado.

- oi meu filho. Que saudade.

Tento não chorar, mas também estava morrendo de saudades.

- eu também, minha mãe.

Ao entrar, vejo meu pai preparando o churrasco na cozinha.

- oi Edu.

Meu pai ainda está tímido, mas visivelmente feliz ao me ver.

- oi pai.

Decido acabar com tudo isso de uma vez e vou até ele lhe dar um abraço. Como eu havia sentido sua falta também. Sinto que ele chora nesse momento.

- me perdoa filho, me perdoa por favor.

- esquece isso pai.

Foi um dos poucos abraços que eu tinha dado nele, e foi a única vez que eu vi ele chorando. Sinto que um peso havia saído dentro do meu peito. Lembro do que Felipe havia me falado sobre perdão, e vejo o quanto ele estava certo.

O churrasco está pronto, e minha mãe está terminando de preparar as saladas e o arroz, e eu decido colocar a mesa. Quando sento em meu lugar de costume na mesa e vejo meus pais comigo, sinto uma alegria imensa. Eu sentia tanta falta dessas refeições em família. Foi o almoço mais falante que tínhamos feito até hoje. Havia tanta novidade pra se contar, e tanto sentimento envolvido, que eu em poucos minutos ninguém se lembrava que eu havia ficado quase dois meses fora de casa.

- Edu, eu tenho uma coisa boa pra te contar.

- conta ai mãe.

Ela olha pro meu pai e os dois sorriem, e eu fico curioso.

- seu pai parou de beber.

Santo Cristo. Eu ouvi bem?

- meu Deus isso é ótimo pai!

- é muito difícil filho, mas eu estou resistindo desde o dia que você saiu de casa. Eu jurei pra mim mesmo que não iria acabar com a minha família.

Sinto tanto orgulho dele agora. Meu coração está até acelerado de tão feliz que eu estou.

- eu já marquei minha primeira consulta nos alcoólicos anônimos, mas estou um pouco receoso de ir sozinho.

- eu vou com você pai.

- vai?

- claro que vou. Se precisar eu vou todas as consultas. Estou junto contigo nessa.

Nossos olhares de cumplicidade fazem meu coração se aquecer. Olho para minha mãe, que não podia estar mais feliz escutando aquilo. Meu pai está procurando ajuda. Era o que eu sempre quis. As coisas finalmente estão se encaixando.

Comentários

Há 6 comentários.

Por Dougglas em 2015-12-25 07:52:18
Cara, que capítulo lindo e fofo do início ao fim. Os valentões sendo colocados no lugar, o piquenique, o pedido de namoro, a iniciativa do pai pra uma reconciliação, o almoço, o pai parar de beber. Tu me matou com tanta fofura dessa vez. Amei demais o capítulo.
Por Luã em 2015-08-15 02:23:57
Oi gente! Quero primeiro pedir mil desculpas pela demora do capítulo 10. Pra mim tá corrido essa semana e eu to terminando de revisar e reescrever algumas partes. Prometo que no máximo no domingo à noite o capítulo vai estar pronto. E os próximos eu também vou tentar postar um por dia no decorrer da semana que vem. Obrigado galera! (:
Por Niss em 2015-08-15 00:24:45
Luãã?? Hellooo to sentindo falta hein... Acontececu algo??
Por Niss em 2015-08-11 23:07:51
Awnn que bom finalmente as coisas estão dando certo, espero que esses garotos saiam do caminho deles dois e que possam ser felizes juntos... *-* Estou muito feliz pelo pai dele!! Espero pelo proximo captulo. Kisses, Niss.
Por Disturbia em 2015-08-11 18:19:24
Ai muito lindo, confessou que deixei escapar uma lágrima no pedido de namoro kkk... E ansioso para a segunda temporada
Por luan silva em 2015-08-11 16:14:31
q fofo esse capitulo foi muito lindo to feliz pelo pai dele, ainda bem q ele reconheceu q errou e pediu desculpas e tbm o pedido de namoro foi muito lindo...