09. Decisões precipitadas

Conto de Luã como (Seguir)

Parte da série O garoto da mesa 09

- obrigado por vir comigo, Edu. – Livia fala ao desligar o carro quando paramos em frente do prédio de dois andares e com traços contemporâneos, pintado em branco e com revestimento de madeira em uma das paredes, do chão ao teto.

Pareço estar quase mais nervoso do que ela, que respira fundo assim que entramos no estúdio de fotos da agência, onde outras pessoas estão esperando para tirarem as medidas dos modelos para a seleção. São mais de quinze pessoas, entre homens e mulheres entre uns 20 a 25 anos, mas mais variadas aparências. Há meninas de cabelos cacheados e armados, cabelos louros e escorridos, uma ruiva que me lembra muito a Marina, um homem negro de olhos claros lindos e outros com cabelos loiros, castanhos, lisos, crespos, curtos ou compridos. Apesar de serem tão diferentes, todos eles têm algo em comum; têm corpos perfeitos, deixados à mostra através de sungas e biquínis, peles perfeitas, rostos sem marcas de espinhas ou oleosidade. Parecem mais bonecos talhados a mão. Seria algo estupidamente lindo se não fosse triste. Triste pois eu consigo imaginar o quão trabalhoso deve ser para ter esse tipo de beleza, se for comparado ao que eu presenciei com Livia na última semana. É algo desumano ter que se submeter a coisas que prejudicam para ter uma aparência bonita. Eu realmente espero que isso não seja algo generalizado, pois o mundo das passarelas se tornaria algo decepcionante para qualquer um que pudesse viver essa realidade de perto todos os dias.

Agora estamos quase no final da fila, Livia é uma das últimas da fila das meninas, que é bem maior que a dos meninos.

No início da fila, dois scooters, um homem e uma mulher, tiram as medidas das pessoas enquanto eu me distraio olhando para o cômodo. É inteiramente branco, com um pano da mesma na parede maior, usado como fundo para fotografias, junto com alguns equipamentos de luz e uma mesa azul escuro com um Mac e um sofá amarelo e puffs laranjas e vermelhos agrupados perto da porta, formando uma espécie de sala de espera.

- e se eu não estiver dentro dos padrões? – Livia me tira da minha distração, me fazendo olhar para ela e para seu par de olhos grandes e preocupados me fitando e esperando por uma resposta.

- você vai estar, Livs. Você manteve o padrão do último desfile, certo?

- certo.

- não engordou, só emagreceu, certo?

- certo.

- então. Relaxa, você precisa é relaxar. E depois, comer alguma coisa, pois tá o dia todo só com o sanduíche natural do café da manhã. Que tal passarmos no Burguer King depois?

Ela me olha pasma, como quem dissesse “eu to aqui quase tendo um surto por causa das minhas medidas e você quer ir no Burguer Fucking King?

- to zuando. – eu digo sorrindo, muito mais pela sua reação do que por qualquer outra coisa.

- engraçadinho.

- mas vamos passar lá naquele lugar natureba que você gosta, pelo menos.

- tá, por mim tudo bem. Só quero que isso acabe logo.

A fila anda mais um pouco e então Livia me aponta sua amiga da agência, a de cabelos crespos castanhos e bem armados, pele branca e olhos claros, chegando na frente da scooter. Em poucos segundos a mulher passa a, segundo Livia, tão temida fita métrica em volta do corpo dela, e então o olhar de reprovação da mulher para a modelo faz Livia ficar triste.

- ela não passou. – sua voz é triste e nervosa. – Edu, a Fabi é uma das modelos mais magras e brilhantes daqui da agência, e ela não passou. Eu to ferrada. Eu não vou passar.

- Livia, calma. – eu falo, segurando sua mão e atraindo sua atenção para mim. – o que for pra ser, vai ser.

Independente do resultado que Livia tiver hoje, eu estou muito orgulhoso dela. Depois daquele dia, jogamos os remédios laxantes fora pela descarga e então eu pude ver ela parar de forçar vomito. Ela ainda não está comendo muito, mas isso tudo já é um grande avanço. E infelizmente, o que mais deixa ela feliz é sair com o Cesar. Acho que por bom senso dele, ele não foi mais lá no apartamento, então eu não tenho que ver ele mais do que o estritamente necessário no restaurante, como se isso já não fosse demais para mim. Todos os dias, sem exceção, eu fico martelando na minha mente o fato de que eu estou escondendo de Livia o fato de que ela está namorando um cara comprometido, e eu me sinto péssimo por isso. Eu preciso contar logo, mas sempre que eu tento, eu falho no meio do caminho. Ver seu rosto alegre e imaginar que ao contar, sua alegria vai se transformar em decepção é algo que eu não consigo lidar. Um pouco do meu receio em contar se deve também pela ameaça de Cesar, que me pareceu e ainda me parece real. Eu realmente não sei com quem eu estou lidando, pois eu me surpreendo com ele a cada dia que passa. Mas eu preciso arranjar coragem e contar a verdade para Livia, mesmo que isso doa.

Assim que chega a vez dela, vejo estampado em seu rosto a aflição aí acompanhar com os olhos todo e cada movimento da fita em volta de seu corpo, enquanto vejo que ela está dura e ereta sem nem se mover, o que me deixa muito angustiado. Assim que a mulher termina e fala algo para Livs, ela se vira sorrindo e olha para mim, me fazendo ter a certeza e o alívio de deu tudo certo.

- eu passei, eu passei Edu! – ela fala consideravelmente baixo, para não fazer esparro no meio de todo mundo, mas ela está tão eufórica que tenho quase certeza que seus olhos estão úmidos de emoção.

- eu sabia que você ia conseguir, Livs! Eu sabia! – eu não consigo esconder que estou muito feliz e aliviado por ela estar assim realizada, pois assim ela vai estar parando com toda a pressão e a preocupação em relação ao seu corpo. – bora comemorar então?

- só se for pra se esbaldar em uma jarra bem grande de suco de laranja natural. – ela soa brincalhona, como a Livia que eu conheço mesmo, então eu vejo que está tudo bem.

__

São 8h da manhã e sou apenas eu no restaurante, verificando alguns documentos e notas fiscais de fornecedores enquanto os outros não vem. Estou tentando deixar tudo um pouco mais organizado e claro para que eu possa guardar tudo mais tarde, já que desde que Cassiano foi embora, a sala de arquivos foi ficando esquecida e agora está uma bagunça. Minha concentração é atrapalhada quando meu celular toca e me assusta, já que o ambiente estava absurdamente silencioso, tanto que eu podia até ouvir o barulho da minha respiração e nada mais. Para minha surpresa, é Cassiano.

- alo?

- Edu! Te atrapalho?

- não, de jeito nenhum. Tudo bem?

- tudo ótimo, e aí?

- tudo ótimo também, to no restaurante já, organizando algumas coisas. E aí no Nordeste, como estão as coisas?

- na verdade eu acabei de desembarcar aqui em São Paulo. Precisei vir para uma reunião de negócios e pensei em te ligar para marcar de nos vermos, quero saber como andam as coisas.

- bem, se você quiser vir aqui agora, estou sozinho, aí a gente pode conversar melhor. Na verdade tem algumas coisas que eu gostaria de falar com você mesmo, melhor ainda se fosse pessoalmente.

- aconteceu alguma coisa?

- não, nada demais – tento soar o mais calmo possível – ate daqui a pouco.

Apesar de não querer deixar Cassiano preocupado, eu sinto que preciso conversar com ele sobre o que vem acontecido. Eu já deveria ter feito isso muito antes, inclusive quando ele fez aquilo de passar meu número de telefone para o Fernando, mas por medo de Cassiano achar que eu estou tendo dificuldades em lidar com situações aparentemente fáceis de resolver, eu achei melhor prolongar e deixar tudo se ajeitar sozinho, ou no pior dos casos, eu ter que resolver por conta própria, apenas eu e Cesar. Porém, vejo que as coisas estão ficando mais complicadas e eu não estou conseguindo ter o pulso firme necessário para que, pelo menos minha posição hierárquica mais alta, fosse o suficiente para me ajudar. Agora, com Cassiano na cidade, acho que é mais do que conveniente eu deixar ele a par da situação, pois caso Cesar faça outras coisas, Cassiano saiba que não é a primeira vez.

Não demora muito para que eu ouça uma batida na porta de vidro da frente, então eu saio da mesa e sigo em direção a Cassiano, que está do lado de fora me esperando com um sorriso e com uma mala pequena ao seu lado. Abro a porta e sinto o ar frio bater em meu rosto, então cumprimento-o e assim que ele entra, volto para o calor aconchegante e artificial do ar condicionado, espantando a incomum onda fria que está fazendo essa semana.

- que surpresa boa você aqui. – digo lhe dando um sorriso enquanto ele puxa uma cadeira e se senta de frente para mim, na mesa cheia de documentos espalhados e pastas de plástico.

- foi de ultima hora. Vejo que você entrou de cabeça mesmo, esses documentos estão pra ser arrumados desde o meio do ano passado.

- bom, eu vim pra esperar os fornecedores, acho que daqui a pouco eles devem estar aí. Enquanto isso comecei a organizar as coisas.

- fico feliz em saber que você está se empenhando, Edu. – ele diz, sorrindo orgulhoso. – mas o que você queria me contar? Aconteceu alguma coisa?

Tomo uma grande quantidade de ar ao tentar pensar uma maneira boa o suficiente para contar tudo.

- Cassiano, você sabia que o Cesar tem alguns problemas com... você sabe... gays?

- sei, ele é uma pessoa com um gênio bastante difícil, não só com isso, mas com várias coisas. – ele agora repousa suas mãos sobre a mesa e brinca com os polegares de forma despretenciosa, sorrindo. – inclusive eu já tive muitos desentendimentos com ele por causa do pensamento fechado dele. Mas por que? Ele te fez alguma coisa? – sua expressão agora se faz seria.

- bom, é complicado falar assim, sem que seja chato, eu não quero ficar tendo que recorrer a você toda hora, mas a minha situação com ele tá bem difícil, Cassiano. Desde quando eu cheguei ele tem sido bastante hostil, mas eu sempre tentei relevar, só que teve uma situação na última semana que passou dos limites. Você sabe o Fernando? Cliente de vocês aqui ha um bom tempo, pelo que eu saiba?

- claro, ele é um dos clientes mais antigos que a gente tem. Por que?

- bem, eu não sei por que, mas o Cesar fez uma brincadeira de muito mal gosto esses dias. Na hora de dar a comanda para o Fernando, ele escreveu meu número no verso e disse que tinha sido eu que tinha pedido. O cara obviamente ficou muito bravo e disse que não voltaria mais aqui. Eu sinto muito pelo fato de a gente ter perdido um cliente como ele, mas eu espero que você saiba que não foi minha culpa.

- Cesar fez isso? – Cassiano agora está com o olhar atônito, parecendo não acreditar no que acabou de ouvir.

- infelizmente, fez.

- olha Edu, eu peço desculpas pela atitude dele. Imagino como deve ter sido frustrante pra você ter ficado nessa situação, eu vou conversar com ele sobre isso seriamente hoje. Eu não posso admitir atitudes como essa aqui dentro.

- tudo bem. Obrigado pela compreensão, Cassiano. Eu me sinto péssimo pelo ocorrido com o Fernando, queria muito que ele soubesse que foi tudo um mal entendido, mas ele não vai querer nem me ouvir.

- não se preocupe com isso. Eu vou conversar com ele e esclarecer tudo.

Olho para Cassiano e vejo o quanto ele está empenhado em fazer eu me sentir bem aqui no restaurante, logo todo o sentimento de raiva e angústia que eu havia sentido por Cesar até agora, pelo menos por hora, cessa.

O interfone toca, então eu me lembro dos fornecedores de peixe, e assim que eu peço licença para Cassiano, vejo Cesar entrar pela porta da frente. Sinto que não havia hora melhor para eu ter algum pretexto para sair de perto, pois eu não gostaria de estar perto quando eles conversassem. Isso só pioraria a situação.

Depois de me dedicar a um bom tempo conferindo a mercadoria e guardando-a com a ajuda de Dani, que chegou a bem pouco tempo atrás, Cassiano vai até a cozinha e sutilmente analisa tudo. Agora eu me sinto orgulhoso por estar tudo arrumado.

- essa cozinha tá mais organizada de quando eu estava aqui. To impressionado. – ele fala sorrindo, com um leve toque de orgulho em seu tom de voz.

- fico feliz em ouvir isso. – eu digo depois de guardar o último saco de peixe congelado na parte debaixo do freezer e fechar a porta.

- sobre aquele nosso assunto, tá tudo resolvido.

- obrigado, de verdade.

- se precisar de qualquer coisa que eu puder ajudar, mesmo de longe, não pensa duas vezes em pedir. Eu estou lá mas estou sempre pensando em vocês aqui.

- pode ficar tranquilo, tá tudo sob controle. Bom, pelo menos agora.

Ele sorri e eu me sinto tão mais leve deixar ele saber de tudo é conseguir resolver de um jeito tão mais fácil, de um jeito que eu não consigo, já que Cesar é amigo dele e o escuta, ao contrário de mim.

- bom, agora eu tenho que ir. Vou para o hotel deixar as coisas, tomar um banho e já me preparar para a reunião. De noite eu já estou indo embora, então provavelmente eu não vou poder passar aqui pra dar tchau. Se cuida, guri. – ele vem para um abraço, e eu aceito de bom grado.

- você também, Cassiano. E se cuida.

- você também.

Depois de boa desenvencilharmos, ele dá tchau para Dani e para Murilo, que também acabou de chegar.

Assim que ele vai embora, eu volto até o salão e vou até a mesa para pegar os documentos, enquanto vejo de relance que Cesar me encara firme enquanto está fazendo a abertura do caixa. Não sei se eu ter contado para Cassiano ajudou ou não, mas eu sinto que fiz a coisa certa. Acho que seria pior se ele soubesse depois, ou se Fernando falasse para ele o que aconteceu na sua versão, que é diferente da realidade, me deixando com a imagem manchada. Entro na sala de arquivos e começo a colocar as pilhas de pastas e documentos avulsos um do lado do outro, separando de acordo por onde estão guardados. Quando guardo uma das pilhas na gaveta bem ao lado da outra que contém as pastas com dados dos funcionários, eu penso em algo insano, arriscado, mas necessário. Eu venho pensado há dias sobre como contar para Livia sobre as mentiras de Cesar, mas não sabia ao certo como fazer sem ele estar junto, já que ele negaria tudo e alegaria que eu estou mentindo por causa dos nossos atritos. Então, eu não consigo achar uma maneira melhor de ela descobrir a verdade se não eu lhe dando o contato direto da noiva de Cesar e, de uma vez só, as duas saberem com quem elas estão lidando. Vou até a sala onde são guardadas os documentos e então procuro no armário a pasta de Cesar. Faltas, atestados, dados pessoais e referências de trabalhos anteriores, está tudo aqui, inclusive o que eu mais preciso. Como já era de se esperar, seus dados estão atualizados e o número de telefone de sua noiva, que agora eu sei que cujo nome é Ingrid, está lá. Trato de anota-lo em um pedaço de papel e guardo-o em meu bolso, com o coração acelerado e me sentindo em uma espécie de filme de ação, onde eu estou em uma missão ultrassecreta ou algo parecido. Mas, como nesses mesmos filmes, naquela parte de tensão máxima onde o personagem é quase pego em flagrante, a porta da sala se abre e eu guardo rapidamente a pasta de Cesar no meio das outras, me virando e tentando manter uma feição calma, embora por dentro meu coração esteja pulando, ainda mais quando vejo que quem está parado de pé e encostado no batente é justamente quem eu temia.

- aconteceu alguma coisa, Cesar?

- na verdade, acho que a gente precisa conversar.

- sobre o que?

- sobre você ficar contando para o Cassiano o que acontece aqui dentro. – ele fecha a porta, deixando-nos completamente a sós. – você não consegue resolver nada sozinho?

- bom, eu tentei, mas você não colaborou. Ele precisava saber o que estava acontecendo na ausência dele.

Ele sorri e se aproxima de mim, se curvando sobre a mesa e colocando seus braços apoiados nela, deixando seu rosto bem próximo do meu.

- você não vai conseguir me manchar com ele. O Cassiano e eu somos amigos há muito tempo, eu ajudei ele a erguer isso aqui. Você acha que é amigo dele? – ele sorri, sarcástico. – Besteira. Eu sou. E eu só preciso lembrar você que daqui a menos de um ano você vai embora, de volta para o sul, e quem vai continuar aqui sou eu.

- bem, francamente isso não me interessa. Por enquanto o chefe aqui sou eu, Cesar. É nesses meses em que eu ficar aqui, você vai ter que aceitar isso e trabalhar direito. Se você fazer a gente perder outro funcionário por motivos pessoais seus, o Cassiano vai voltar a saber.

- você pensa que tá conseguindo se manter em cima dessa pose de chefe, não é mesmo? Você é uma piada, Eduardo. Todo mundo sabe que você não consegue fazer nada direito aqui dentro, precisa que os outros te mostrem como fazer, o que fazer, quando fazer. Você só sabe se setor chefe pra falar que é um, mas na verdade você não tem competência pra isso.

- ah é? Então quem você acha que poderia ser um chefe de verdade? Você? Porque se fosse, o Cassiano teria te escolhido.

Percebo a raiva se formando em seus olhos, enquanto eu sinto que eu acabei de pisar em seu calo mais doloroso.

- eu posso não parecer como um chefe, mas é o que eu sou agora. E eu sinceramente estou me esforçando pra caralho pra deixar tudo em ordem por aqui. Não vai ser um homofóbico ridículo igual você que vai atrapalhar o meu trabalho, muito menos ditar as regras aqui dentro. Tudo o que você faz e diz pra me deixar acuado e me sentir inseguro é em vão e apenas fica feio pra você. – digo sendo o mais sincero possível, a sinceridade se sobressaindo pela raiva e apagando o meu medo que eu sentia agora a pouco, de ele perceber que eu estava mexendo nas coisas dele. – Acho melhor você se por no seu lugar, Cesar. E se você me der licença, eu tenho bastante o que fazer, acho que você também.

Ele então se vira e vai em direção à porta, a expressão debochada como sempre, e quando finalmente sai da minha vista, eu suspiro aliviado por ele não ter notado que eu estava mexendo em sua pasta.

__

Murilo estaciona o carro no meio fio e meus olhos se enchem com o tamanho da casa de Rômulo. Estamos nos três carregando algumas bebidas enquanto podemos escutar a música abafada dentro da casa. Só agora consigo ver o quão rico ele é, com uma festa de aniversário dessas proporções e com todos esses carros parados perto da casa, uma das mais modernas e diferentes que eu já vi, feita principalmente de madeira e aço, com grandes paredes de vidro que revelam muito do seu interior, mas que pelo fato de ser noite, não dá pra ver muito.

Quando ele abre a porta da sala, Area Code do Nick Jonas ecoa pelos meus ouvidos, dando um clima bem urban no ambiente atrás dele, cheio de luzes e pessoas.

- até que enfim! Pensei que não iam vir.

- acabamos nos atrasando por causa das bebidas. – sacudo minha garrafa de vodka na mão, mostrando que viemos com munição.

- se é por isso então tão desculpados. Vem gente, entra aí!

A festa parece estar no ápice, todo mundo sorrindo e dançando, então eu penso que Rômulo realmente sabe dar uma boa festa. Eu e os meninos vamos até a cozinha colocar as bebidas no freezer e servir alguns drinks antes de circular pelo quintal, onde há mais gente em volta da piscina, algumas dentro, outras no salão de festas aberto... Acho que metade de São Paulo foi convidada pra essa festa.

- o Rômulo é bem influente né? Digo, olha só pra toda essa gente.

- é, ele é mesmo. Metade dessas pessoas são ex dele. – Emanuel brinca, sem saber da situação constrangedora de Murilo.

Logo ele e Mateus pedem licença pra irem até algumas amigas conversar e eu e Murilo decidimos ficar sentados na beira da piscina, curtindo o ar fresco e longe da multidão aglomerada lá dentro.

- tá tudo bem?

- tá, por que? – Murilo me olha e tenta seu melhor sorriso, mas há algo de errado nele. Mesmo o conhecendo pouco tempo eu consigo sentir isso.

- você parece triste, distante.

- só acho que não foi uma boa ideia ter vindo.

- por causa do Rômulo. – minha suposição parece mais como uma afirmação.

- por causa do Rômulo. – ele finalmente confessa. – sabe, todos os anos é isso, essas festas cheias de pegação, ele dando em cima de todo mundo e eu fazendo cara de paisagem, bancando o amigo que tá sempre ali, mas na verdade eu queria era poder ficar em casa assistindo uma maratona de Friends e me poupar de aborrecimentos.

- bom, isso é meio que inevitável, né Murilo. Vocês são melhores amigos, se você não viesse ele ficaria triste e também desconfiaria.

- é, mas eu já to cansando disso sabe Edu? Eu queria tanto ter coragem de pelo menos jogar tudo o que tá trancado na minha garganta na cara dele, aí pelo menos eu estaria mais leve e não precisaria ter que andar com ele como se fossemos simples amigos.

Eu realmente não sei o que dizer pra ele, nem ao menos uma frase clichê pra acalmar seus ânimos ou algo parecido, então um pequeno silêncio se instala entre nós, enquanto olhamos os dois para o céu claro e limpo.

- minha bebida acabou. – é tudo o que eu consigo pensar.

- a minha também.

- vamos buscar mais?

- bora lá.

A noite se encaminha normalmente, a não ser pelo fato de que Murilo começa a beber um pouco mais do que eu ou Mateus ou Emanuel, então ele finalmente parece ter deixado a tristeza de lado e começa a conversar animado, brincar e até a dançar em algumas horas. Agora estamos todos juntos na beira da piscina, inclusive as duas amigas dos meninos, então Murilo cutuca meu braço e eu vejo sua cara de quase bêbado, com os olhos pequenos e vagos.

- vou buscar mais bebida.

- Murilo, acho melhor você ir com calma, se não vai acabar passando mal.

- se eu não beber eu vou ter que ir embora agora mesmo, porque eu to louco pra ir no Rômulo e me declarar pra ele. Não to mais aguentando, Edu.

Ele termina de falar baixo no meu ouvido e me corre um vestígio de loucura na cabeça. Talvez o que falta para ele seja um pouco de coragem.

- então eu acho que você deveria ir lá e tentar a sorte.

- eu o que?

- é, quem sabe ele não esteja assim atirado pra todo mundo esse tempo todo porque não achou a pessoa certa. E quem é a pessoa certa? Você! O não você já tem, vai lá tentar conquistar o sim dele.

Murilo parece processar na mente as minhas palavras e depois de alguns segundos ele sorri.

- você tem razão. Eu vou lá. Vou acabar com isso logo. Mas você precisa vir comigo, ficar nem que seja de longe me dando apoio moral.

- tá, beleza. Vamo lá.

Caramba, será que eu fiz a coisa certa? Não sei, mas eu to tão ansioso quanto o Murilo pra essa conversa. Seguimos animados para dentro da casa procurando por Rômulo, indo até a sala, e é quando atravessamos a porta que eu me dou conta que não deveria ter encorajado meu amigo. Rômulo está parado no meio da sala beijando outro cara, tipo beijando mesmo, na maior pegação, e isso me quebra por dentro, pensando o quão triste Murilo está agora. Olho para ele e vejo que ele está a ponto de chorar, então ele sai e faz seu caminho de volta pra fora da sala, enquanto eu vou atrás dele.

- Murilo, espera aí!

Entro na cozinha e vejo ele entrando dentro de um cômodo no pequeno corredor perto da geladeira. Sigo ele e bato na porta, mas não tenho resposta. Bato novamente e ele grita lá de dentro.

- me deixa quieto, Edu!

Eu engulo em seco e decido ser um pouco mais insistente, então giro a maçaneta e vejo que ele está sentado na privada do lavabo, um lavabo maior do que o normal, maior e mais luxuoso, assim como tudo naquela casa.

- posso entrar?

Ele consente com a cabeça, então eu entro e fecho a porta, me colocando do lado dele e ficando quieto, deixando ele livre de perguntas ou de qualquer tentativa de diálogo.

- desculpa, não queria ter descontado em você. – ele quem começa a conversa.

- eu que peço desculpas. Não deveria ter te encorajado, tava na cara que isso não era uma boa ideia.

- pelo menos eu tentei, e você me apoiou. Agora eu sei que não vale a pena. To com a consciência limpa.

Ele se levanta, enxuga o rosto e seca as mãos na calça, passando por mim e indo em direção à porta.

- onde você vai?

- embora. Não tenho mais nada pra fazer aqui.

- como você vai?

- dirigindo, ué.

- mas e os meninos?

- não sei Edu, eles que vão de taxi. Só preciso ir embora.

- tá, espera eu avisar eles e eu vou contigo, tá legal?

- tá.

Eu invento uma desculpa qualquer para os meninos de que o Murilo ficou bêbado demais e eu ia levar ele pra casa, então eles não ficariam perguntando muito. Depois de muito tentar, consigo convencer ele a irmos de taxi, já que ele não está em condições de dirigir e seu carro não é adaptado, o que me impossibilita de ser o motorista da rodada.

Ao passarmos pela sala, Rômulo nos vê e percebe a cara de choro de Murilo, então ele tenta pará-lo tocando em seu ombro mas Murilo nem ao menos olha pra ele, o que faz Rômulo ficar confuso.

- tá tudo bem com ele?

- tá sim, ele só precisa ir pra casa.

Digo isso e ouço a porta da frente batendo com força, então vou atrás dele pra certificar de que ele está bem. Assim que saio e chego na calçada, ouço a porta sendo aberta novamente e vejo Rômulo vindo em nossa direção.

Droga, isso não vai acabar bem.

- Murilo, o que aconteceu? Ta tudo bem?

- tá tudo ótimo, pode voltar lá pra dentro.

- por que você tá com raiva? Aconteceu alguma coisa?

- não, não aconteceu nada. Tá tudo absolutamente bem. – ele exala veneno e sarcasmo em sua voz, enquanto ele ri mas ao mesmo tempo seus olhos estão marejados.

- então por que você tá quase chorando?

- Rômulo, sai daqui, por favor.

- por que?

- porque você é um burro que não consegue ver que eu te amo, caralho! Agora volta lá pra dentro e continua passando o rodo em todo mundo, como você sempre faz e me deixa em paz!

O único som que conseguimos ouvir depois da confissão de Murilo e o som abafado da música da bendita festa lá dentro. Eu olho para os dois e vejo que Rômulo não sabe o que dizer, muito menos Murilo, que parece ter finalmente tirado o peso dessa angústia e agora olha com a expressão amargurada para Rômulo. Para minha surpresa, ele nem tenta dizer mais nada, apenas abaixa a cabeça, gira em seus calcanhares e volta a caminhar em direção à porta. Quando ele a fecha, Murilo desaba no choro, sentando no meio fio e colocando as duas mãos na cabeça, uma mistura de ódio e tristeza emanando de dentro pra fora dele e visivelmente arrependido por ter revelado aquilo pra Rômulo.

- eu sou um babaca mesmo.

- não, não é. – digo ao chegar ao seu lado e repousar minha mão em seu ombro.

- agora além de tudo eu não vou mais ter a amizade dele. Tenho certeza que ele vai se afastar de mim. O que eu faço agora, Edu?

- bom, sinceramente eu não sei, Murilo. Mas quer um conselho? Deixa pra resolver isso amanhã. Vamos embora, você chega em casa, toma um banho, dorme e descansa bem pra amanhã poder pensar sobre isso. O que me diz?

Ele me olha e finalmente vejo ele tentar sorrir.

- acho que eu fico sincero e corajoso demais quando bebo.

- é, sem duvidas, meu amigo.

Comentários

Há 5 comentários.

Por Luã em 2016-03-05 12:06:32
E aí gente! Fico feliz que vocês estejam se apegando e gostando do Murilo. Ele é um personagem secundário bem importante pra temporada, um dos grandes amigos do Edu e também um destaque nessa estadia temporária do nosso protagonista em São Paulo. Obrigado pelos comentários e pelo apoio! Tem capítulo novo no ar, confere lá! ;)
Por Nivis em 2016-02-25 23:41:59
Genteeee, chocada feat. enterrada. Arrasou mana pqp... e lembre-se o carioca voltou kkkkkkk
Por Sirferrow em 2016-02-24 15:43:09
Coitado do Murilo!!!! Espero que Rômulo caia na real e fique com ele. Muito bom o capítulo, quero o próximo pra ontem. PS: adoraria que você fizesse um especial com Murilo/Rômulo. Ficaria incrível.
Por Felipe Fernandes em 2016-02-24 00:59:50
Kkkkkk eu me identifiquei nessa situação do Murilo pois ja via a mesma coisa kkkk sim sou um bocó enfim.... aeeeeeeee eu ja tava com saudades do conto e foi muito dahora aquele basta que o Edu deu no Cesar tipo foi demais e ainda to com pena da Livia pelo Cesar estar fazendo isso com ela tbm... adorei o capitulo... me trouxe algumas lembranças bobasque eu ja tinha esquecido kkkkkk mas relaxa e ja to sentindo falta do Felipe ai kkkkkk o conto fica estranho sem O Garoto Da Mesa 09 kkk e não demora muito pra postar o proximo. Ate breve. #SaudadesFelipe
Por Niss em 2016-02-23 22:40:12
Cara! Eu sei que é tão complicado... Para os dois né?! O Murilo enfim descarregou o que ele tinha pra falar. Eu acho que ele está entendendo errado, pois é tão confuso para o Rômulo, quanto pra ele, porque o Ro nem imaginava isso, creio eu, e receber essa noticia assim, de uma vez é bem pesado pra qualquer processador octacore... É foda... Só espero que os dois, independente dos proximos caminhos em relação a isso, ao menos não fiquem com raiva um do outro... Fiquei bem feliz pela Livs, e imagino o quanto deve ser dificil pra ela equilibrar a moda e a saúde. O Edu lacrou na cara do César, quero ver ele comer a própria merda agora. Hahaha. No mais, adorei o capitulo Mana. Espero pelo proximo. Kisses, Mana Nissan Spears.