07. Contra a parede

Conto de Luã como (Seguir)

Parte da série O garoto da mesa 09

Estamos dentro do taxi, indo rápido pelo centro da cidade em direção ao apartamento de Felipe. Ele está do meu lado no banco de trás, com a cabeça escorada na janela, quase dormindo. Ele tenta falar, mas estão tão embriagado que não sai uma palavra que faça sentido. Estou com a calça suja de vomito, pois ele passou mal um pouco depois de sair da boate e me acertou. É engraçado como os papéis se inverteram agora. Se no ano passado ele havia me carregado pra casa, agora é a minha vez de o fazer. Seria cômico se não fosse triste. Seu estado é deplorável. Como ele pôde ir tão fundo? Logo estamos em frente ao prédio. O caminho até o elevador é fácil, mas depois eu sofro pra carregá-lo. Subo ele com muita dificuldade nas escadas, já que ele não está se ajudando e é consideravelmente mais pesado do que eu. Chego no banheiro ofegante, e coloco ele dentro do box. Ligo o chuveiro e a água fria o faz gritar.

- não! Desliga isso! Desliga logo, caralho!

Ele mal consegue falar, por conta do álcool. Sua língua está pesada.

- desliga! Tá fria. – ele continua seus protestos, inúteis para mim. Nada cura melhor um porre do que um banho de água fria. Quer dizer, até tem algo sim, vergonha na cara, mas estava faltando para ele nesse momento.

Eu continuo em silêncio. Ele agora está pelado, sentado no chão do banheiro, com o fluxo contínuo da água fria em seu corpo. Ele está tão vulnerável. Me bate um arrepio só de pensar que alguém poderia ter feito algo com ele lá na boate, se eu não estivesse lá.

- eu não sei o que você tá fazendo aqui! Por que não me deixou lá e aproveitou a noite com o seu namoradinho?

Tudo bem, lá vamos nós de novo. Eu suspiro e conto até dez mentalmente para não dar uns tapas nele. Felipe é o tipo de bêbado chato, que precisa mandar calar a boca toda hora.

- você acha ele mais bonito do que eu?

Eu continuo não falando nada. Dessa vez eu o olho duro, e de repente tenho vontade de rir. Meu Deus, ele é tão irritante.

- claro que é. Aquele cabelo ruivo e...

- nossa Felipe cala a boca! Meu Deus. Você é o bêbado mais pé no saco que eu já vi, caramba.

Ele me olha por uns instantes, e aparece um vestígio de um sorriso em seu rosto. Acho que no meu também. Mas que merda, não era isso o planejado. Desvio o olhar dele.

- vem, vamos. Se não você vai acabar ficando resfriado.

Eu o levanto do chão e o ajudo a lhe segurar enquanto ele escova os dentes e depois o levo pro quarto. Como eu senti saudade. Saudade dele, de casa, de tudo. Quando passo pela porta do quarto, as lembranças me golpeiam sem dó nem piedade. Caio aparecendo de cueca na minha frente, exibindo aquele corpo musculoso, a pele bronzeada, o cabelo perfeito, a barba desenhada. Felipe dormindo na cama, aparentemente em sono profundo, e depois tudo ficou embaralhado na minha mente. O soco, as lágrimas, Marina me buscando. Tudo aparece em flashes pra mim, tudo muito rápido. Não é algo que eu queira lembrar muito. Deito ele na cama e ele tenta falar algo, mas não sai nada. Pouco depois ele já está dormindo. Eu suspiro ao o olhar. Nunca havia visto Felipe fora de si, e ultimamente ele tem se mostrado em seu extremo. No bar com Bernardo, agora na boate. Tenho medo por ele. As pessoas fazem loucuras por amor. Eu não quero o ver se destruindo assim por causa da gente. De repente, me sinto exausto. Já são quase 4h da manhã, e eu não quero pegar outro taxi pra voltar pra casa, muito menos incomodar Marina para me buscar a essa hora. Nem sei se eles ainda estão lá. Me lembro de Bernardo. Sua cara de decepção quando eu estava saindo com Felipe de lá. Eu sei que ele quer demonstrar que está numa boa com tudo isso, que não quer apressar nada, mas ele sofre ao me ver com Felipe. Ao ver que nosso sentimento ainda existe. Eu queria tanto que as coisas fossem mais fáceis. Bernardo merece muito ser feliz, e eu não quero que ele sofra me esperando. Talvez esse dia nem irá chegar. Mesmo que eu não fique mais com Felipe, eu não sei se seria bom pra mim engatar um namoro logo em seguida. Acho que preciso de um tempo sozinho. Mas por ora, isso não precisa ser debatido em minha mente. Estou tão cansado que decido passar a noite aqui e ir embora de manhã cedo, antes de Felipe acordar. Não quero ter muito contato. Aliás, quanto menos, melhor. Estou quase cedendo, e não posso fazer isso. Está tudo tão confuso, e eu ainda nem sei o que aconteceu aquele dia. Nem sei se quero saber. Mas eu queria muito que Felipe não tivesse feito nada. Eu sacudo minha cabeça, tirando esses pensamentos irritantes da minha mente. Tiro meus tênis e deito no sofá de roupa e tudo. O ambiente me traz muitas lembranças daquele dia, o que me faz demorar um pouco pra pegar no sono. Dormir aqui também não é a coisa mais confortável do mundo, mas eu não quero estar lá em cima perto dele, nem no quarto dele, nem em nenhum outro. Quero ficar aqui.

Ah Eduardo, você é tão masoquista. Você sabe que quer estar perto dele. Você quer isso mais que tudo agora. Na verdade, você quer entrar lá dentro daquele quarto e encher ele de beijos, dizer que sentiu sua falta e que não aguentar mais isso. Você é um idiota, cabeça fraca e que não se dá valor. Vá dormir, garoto.

Meu pensamento tem razão. Eu não presto. Eu gosto de sofrer. Talvez seja por isso que estou aqui. Talvez seja por isso que vejo o rosto de Felipe em cada um que passa por mim na rua. Ele está debaixo da minha pele, correndo em minhas veias. E nem essa decepção horrível me fez gostar menos dele.

Acordo com o sol batendo forte na minha cara, aquecendo um lado do meu rosto. A grande porta-janela da sala está com a persiana aberta, deixando a luz entrar e iluminar todo o cômodo. Me espreguiço e olho no celular. São 9h. Só agora percebo a bagunça que está esse apartamento, em todos os lugares. Felipe definitivamente não sabe se virar sozinho. A cozinha é a pior parte. A lixeira está transbordando, e parece que a última vez que foi trocado o saco foi quando eu ainda estava aqui. A louça na pia forma uma montanha nojenta, e eu me pergunto por quê Felipe deixou tudo ficar assim. Qualquer ser humano sabe lavar louça. Ele bem que podia ter chamado Caio, seu amorzinho, ora lhe ajudar. Tenho certeza que ele iria adorar a ideia. Acho que Caio viria correndo até se Felipe pedisse para ele limpar suas fortes no banheiro, tamanha a obsessão que ele ter pelo que é... pelo que ERA meu. Ver tudo desse jeito me deixa aflito, e eu não quero pensar muito, então decido arrumar as coisas. Isso me ocupa um bom tempo. Começo lavando a louça, que pra mim é o mais agonizante de ver. Quando termino, fico aliviado. Um terço da cozinha está limpa. Então, começo esvaziar a lixeira e pego as coisas espalhadas no chão. Há embalagens de fast food pra todo o lado. Eu balanço a cabeça em desaprovação, pensando em como a saúde dele deve estar com isso. Mas algo perto do balcão da pia me chama a atenção. O sol bate e reflete algo prateado e luminoso. Me agacho para pegar. É uma embalagem de remédio vazia. Olho no verso.

Rohypnol 1 mg. O que é isso? O nome não me soa estranho. Saco meu celular do bolso e pesquiso na internet. Meu sangue ferve quando eu descubro. É um sonífero. Felipe está se dopando de remédio pra dormir? Ele chegou a esse ponto? Subo em direção ao quarto furioso, pensando em que falar, e qual a sua possível resposta. O envelope está vazio, o que significa que ele provavelmente está tomando todos os dias. Felipe precisa parar

Com isso. Entro no quarto pouco claro, pelas fendas das cortinas, e o cutuco até ele acordar. Ele me olha com um olho aberto e o outro fechado, ainda sonolento.

- ai. – ele leva sua mão até a cabeça. Provavelmente a ressaca deve estar agindo nesse momento.

- pode me explicar o que é isso? – levanto a embalagem prateada vazia para ele ver.

- o que é isso?

- remédio pra dormir. Você tá usando isso desde quando?

Ele parace confuso.

- desde nunca. Nem sei o que é isso. Onde você achou?

- no chão da cozinha.

- é comprimido?

- é.

Porra. Meu cérebro começa a raciocinar. Ele não consegue tomar comprimidos. Ele nunca toma. Um pensamento assustador me corre a cabeça. Será que Caio o dopou aquela noite? Meu Deus. Se ele fez isso, eu realmente não sei com que pessoa com quem estamos lidando. Será que ele seria capaz?

- você tá pensando o mesmo que eu?

Felipe me olha e deve ter percebido minha expressão perplexa.

- depende. O que você está pensando?

- que Caio armou tudo isso.

- como eu vou saber que você não armou isso?

Minhas palavras saem ásperas. Não sei bem se há possibilidade, mas minha mente foi mais rápida que minha boca.

- eu não sei como provar pra você, por que você nem me deixou explicar até agora.

Engulo em seco. Eu realmente não deixei. Eu não queria explicações. Mas agora eu passei a querer. Uma parte de mim quer acreditar em Felipe, e se isso acontecer, vou me sentir um idiota por ter duvidado dele esse tempo todo. Mas por outro lado penso que ele pode estar tão desesperado pra voltar, que apelou para eu acreditar e ficar arrependido. Eu não sei o que pensar. Felipe parece não acreditar no que está acontecendo. Sua expressão de surpresa me faz ficar balançado. Isso está mexendo muito comigo. Estou me sentindo enjoado.

- olha Felipe, eu tenho que ir. Agora você já está bem, eu fico tranquilo. E só uma coisa, não bebe mais desse jeito. Isso é perigoso, e eu nem sempre vou estar por perto pra te ajudar.

Não queria demonstrar que eu me importo tanto. Isso me faz ficar mais vulnerável perante ele. Acho que já estou falando demais. Já deveria ter ido embora. Ele me encara, o rosto inexpressivo.

- você tá com ele?

Eu franzo o cenho.

- não, Felipe. Somos apenas amigos.

- ele reprime um riso.

- que bom.

Eu sacudo a cabeça em desaprovação. Quero lhe falar tanta coisa, lhe xingar muito, mas ao mesmo tempo quero dizer que sinto sua falta feito um louco.

- eu vou indo nessa. Se cuida.

- você não vai me deixar explicar o que aconteceu aquele dia?

Eu paraliso onde estou. Sim, eu quero. Mas não sei se devo ouvir. Ele se senta na cama, e gesticula para eu fazer o mesmo. Eu me rendo. Me aproximo dele, e me sento curioso.

- bem, era domingo de Páscoa, e você estava lá com a sua mãe. Estávamos brigados, e eu esperava uma mensagem sua pelo menos.

- eu também esperava.

- shh, me deixa falar até o final. Eu estava sozinho em casa, terminando um trabalho da faculdade, e Caio me ligou me pedindo minha parte do projeto que estava no meu pen drive. Eu disse para ele vir pegar, pois estava muito ocupado pra sair de casa. Em pouco tempo ele chegou. Me pediu pra entrar, eu disse que você não estava em casa e que não era uma boa ideia, mas ele disse que queria esclarecer algumas coisas. Ele foi muito persuasivo, e eu não quis ser mal educado. Ele entrou, e me pediu desculpas pela boate e pelo beijo. Ele não queria causar nada entre a gente, mas agiu por impulso. Eu fui um pouco grosso, dizendo que a gente estava brigado por causa dele, que sua atitude havia sido imatura, sabendo que eu era comprometido. Ele pediu desculpas de novo, e disse que não iria insistir nada, e que ficaria feliz por termos pelo menos uma amizade saudável. Eu disse que não sabia muito bem, e que achava que não era uma boa ideia. Ele me perguntou onde era a cozinha, eu mostrei e ele me pediu para pegar um copo de suco, pois estava com sede. Eu disse que ele não precisava se incomodar e que eu pegava, mas ele insistiu. Ele gritou de lá perguntando se eu queria algo, e eu disse que queria suco, também. Pouco depois ele voltou com nossos copos, e depois eu não lembro de mais nada. Só lembro quando você estava no quarto, eu e ele de cueca, e eu não sabia de nada do que estava acontecendo. Você saiu correndo, e eu tentei ir atrás, mas ele me segurou, e eu lhe dei um soco. Falei pra ele dar o fora daqui, e ele saiu desnorteado. Tentei ir atrás de você de novo, mas comecei a passar mal. Fui até o banheiro, vomitei, e logo depois Marina subiu. Ela foi bem rude, mas eu entendo que ela estava te defendendo. Quando ela disse que você iria pra lá, meu mundo caiu. Você não queria me ouvir, e eu mal sabia o que estava acontecendo. Eu sofri muito essas últimas semanas, Edu.

Nessa hora, ele está quase chorando. E eu estou tentando tanto não fazer o mesmo. Não suporto mais isso. Eu lhe beijo. Beijo com tanta vontade, com tanta força. Lágrimas caem de nossos olhos, enquanto eu o beijo, mordo seu lábio, solto gemidos, agarro seu cabelo. Meu coração está quase explodindo, minhas pernas estão bambas e meu estômago dói. Que saudade de seu gosto. De sua língua na minha, de sua respiração ofegante, de tudo. Mas me separo assim que meu juízo volta ao normal.

- desculpa, eu não quis fazer isso.

- desculpa pelo que?

- eu tenho que ir Felipe, desculpa.

À medida que saio do quarto, meu coração se aperta dentro do peito. Eu estou tonto, a emoção foi muito intensa. De repente, quero ficar. Quero lhe encher de beijos novamente e lhe abraçar forte. Eu sinto tanto sua falta. Eu não queria ser tão dependente de alguém assim. Nunca fui. Ser sozinho parecia uma ótima ideia pra mim antes de eu conhecer Felipe. E agora eu não me vejo mais sem ele, e acho que é por isso que é tão difícil me afastar. Vejo ele com os olhos confusos enquanto eu saio. Estou descendo as escadas rindo sozinho por minha loucura. Foi um dos melhores beijos que já roubei dele.

Estou chegando em casa, fechando a porta da frente e indo em direção ao quarto. Preciso da minha cama. Foi uma das noites mais desconfortáveis pra mim, seguida de uma manhã muito eletrizante. Entro no quarto escuro por causa da janela fechada e tento fazer o mínimo de barulho possível, mas acho que quanto mais cuidado a gente tem, maior a probabilidade de fazer barulho. Eu tropeço em um tênis e bato meu pé na cadeira da escrivaninha, fazendo Bernardo acordar.

- Edu?

- oi Bê. Desculpa.

- tudo bem. Como você tá? Fiquei preocupado.

- to bem, acabei de chegar.

- que horas são?

- quase meio dia.

- você dormiu lá?

Eu hesito em responder, mas ele já sabe a resposta.

- eu já entendi.

Fico com o coração apertado em ver sua reação. Ah Bernardo, por que as coisas têm que ser assim?

- vocês se acertaram?

- não.

- eu sinto muito. Eu acho.

Ele reprime um riso, e eu pego o travesseiro da minha cama e atiro nele.

- bobo.

Ele se levanta e senta na cama, ficando próximo de mim.

- eu vejo que você logo vai voltar pra lá. Que fique bem claro que eu não queria. Acima de tudo, você é um ótimo amigo, e eu vou sentir falta do meu companheiro de quarto.

Ele estende o braço para me abraçar, e eu o faço. Um abraço forte, intenso, com sentimento. As coisas entre eu e Bernardo ainda não são muito definidas, pois eu sei que ele gosta de mim, e eu não queria que ele sofresse. Mas eu gosto muito de sua amizade e sua companhia. E ele tem razão. Algo me diz que eu não vou conseguir ficar muito tempo longe de Felipe. Ter perdido o controle agora a pouco já foi um forte indício. Imagino o quanto deve ser difícil pro Bernardo admitir isso, que eu ainda amo Felipe, pois pra mim também é. Nossa conversa de hoje nos deu mais uma opção do que pode ter acontecido. Eu apenas ouvi o ponto de vista dele. Mas não sei se é verdade. Caso não seja, e ele estiver mentindo descaradamente, eu não quero nem vê-lo mais na minha frente. Ficar aqui também me faz bem. A amizade Marina me faz bem. A companhia de Bernardo me faz bem. Eu só espero que ele possa me enxergar como amigo algum dia. Amor não correspondido deve ser uma merda. Bernardo não merece isso.

- cadê o resto do pessoal?

- acordaram mais cedo pra ir na redenção.

- nossa, isso que eu chamo de pique.

- não é algo que se encaixe em mim. Eu amo minha cama.

Eu sorrio, e ele se ajeita na cama, se escorando na parede, do lado oposto da beirada.

- vocês chegaram tarde ontem?

- não muito. A festa não era tudo aquilo. O ponto alto da noite foi a briga do Felipe.

- nem me lembre. Você não quis ir com elas? Agora de manhã?

- quis aproveitar pra ficar em casa. A faculdade tá me matando, preciso descansar um pouco.

- eu sei bem. Amanhã é a seleção, eu to nervoso.

- você vai se sair bem, tenho certeza.

- eu espero que sim.

Ele me olha, um pouco sem jeito, e depois desvia o olhar. Vejo que ele está tentando não demonstrar tanto seus sentimentos, mas sem sucesso.

- você não quer treinar um pouco? Eu adoraria ser a sua cobaia.

- você é um oportunista barato, Bernardo.

- não posso evitar, caipira.

Eu me levanto e vou até a cozinha, e ele vem logo atrás. Preparo uma lasanha, e nos esbaldamos comendo. Bernardo é todo elogios para o prato, e eu fico feliz. Isso me acalma sobre amanhã, acho que não vou me sair tão mal. Depois de almoçarmos, ficamos deitados no quarto assistindo filme juntos, comendo besteiras e jogando conversa fora. Estar com Bernardo é sempre algo ótimo. Temos um bom entrosamento, além do fato de ele estar me distraindo dos meus pensamentos. Estou com tanta dúvida sobre o que aconteceu com Felipe aquele dia. Eu não sei como vou fazer pra descobrir. Quando já é de noite, as meninas chegam animadas, enquanto eu estou terminando de guardar a louça limpa no lugar.

- ei caipira! Como estão as coisas? – ela vem até a mim e me da um abraço. Em seguida nos sentamos na mesa.

- ei, tá tudo bem.

- e o bebum, como tá?

- Felipe?

- isso.

Eu sorrio pelo apelido. Acho que se encaixa bem na situação.

- deixei ele são e salvo na cama. Quando sai hoje de manhã ele já estava acordado. Acho que vai ficar bem.

Eu me lembro do sonífero, de nossa conversa, do beijo. Minha expressão se fecha. Ela percebe que há algo a mais, arqueando aquela sobrancelha e me olhando como se estivesse me pedindo pra contar tudo.

- o que foi? – me faço de desentendido, mesmo sabendo que não seria convincente.

- eu que pergunto.

Eu suspiro, tenso. Preciso mesmo desabafar com ela. Ela sempre sabe o que dizer, e eu preciso tanto de um conselho dela, para as coisas se esclarecerem na minha cabeça.

- eu achei um envelope vazio de sonífero no chão da cozinha dele.

Ela me olha surpresa.

- e você acha que foi o Caio?

- eu não sei. É difícil saber. Você acha que tem possibilidade do Felipe ter armado isso para eu cair e voltar pra ele?

- bom, eu não sei Edu. Você conhece ele melhor do que eu. Mas acho que ele não seria capaz de tanto.

- é, você tem razão. – eu estou com meus dedos entrelaçados em cima da mesa. – a gente se beijou.

- eu sabia que isso ia acontecer. Você gostou?

Balanço a cabeça que sim, reprimindo um sorriso.

Ela me olha por alguns segundos, e depois suspira, pousando sua mão em minha perna.

- faz o que você achar melhor meu amigo. Eu vejo o quanto você ainda gosta dele. Seja feliz.

- eu sei, mas agora tá tudo tão confuso. E tem o Bernardo também. Não quero deixar ele sofrendo.

- eu sei. Eu não vou negar que eu amava a ideia de vocês ficarem juntos. Ele é meu irmão e eu o conheço bem, sei que ele te faria muito feliz. Mas a escolha é sua, e eu sei que você já escolheu.

Eu a olho sentimental, e como sempre ela tem razão. No fundo, eu nunca deixei de gostar de Felipe um segundo sequer. Eu não sei o que vai acontecer entre eu e Bernardo, mas meu coração pertence a Felipe. Isso é inegável. Ela me da um abraço apertado, me acalmando e me tirando dos meus pensamentos angustiantes.

- obrigado.

- não tem de quê, caipira.

Quando me desvencilho dela, meu celular toca. É Felipe. Eu a olho, hesitante. Ela faz um gesto com a mão, me encorajando a atender. Eu respiro fundo e deslizo a tela para a direita.

- oi.

- Edu? Oi.

- tudo bem?

- tudo. Eu só queria te pedir um favor.

- o que foi?

- você se importa se eu te buscar agora? Eu preciso te mostrar uma coisa.

- mas agora? O que houve?

- eu te explico no caminho. Posso?

- claro.

- ótimo. Daqui a pouco eu estou ai.

Eu desligo e meu coração está aos pulos. O que será que aconteceu?

Preciso me arrumar rápido. Depois de alguns minutos eu já estou com outra roupa, substituindo a calça de moletom e a camiseta branca de dormir por algo melhor. Estou esperando ansioso na sala, com o telefone na mão. Eu havia mandado uma mensagem com o endereço pra ele. Ouço a buzina em frente à casa, e vou ao seu encontro. Entro no carro e ele está bem vestido, perfume de sempre, barba feita. Acho que nossa conversa fez bem pra ele.

- ei.

- ei, tá tudo bem?

- tá sim, eu só acho que hoje as coisas vão se esclarecer.

- por que?

- chamei o Caio pra conversar lá em casa.

Meu estômago se embrulha.

- você fez o que?

- eu o chamei. Mas você não vai estar junto na conversa. Nem ele vai saber que você está lá. Quero que ele confesse tudo, e você vai estar junto.

- Felipe, isso é loucura. E eu não quero ver esse cara na minha frente.

- mas eu preciso de explicações. E eu quero que você esteja junto. Posso contar com você?

Eu não consigo me acalmar. Estou nervoso, só de pensar que vou ver ele na minha frente de novo meu sangue já ferve. Mas isso é importante. Eu também quero ouvir o que Caio tem pra dizer, qual sua explicação pra essa barbaridade que ele provavelmente fez.

- tudo bem Felipe, mas eu não quero falar com ele. Vou ficar escondido ouvindo tudo. E é melhor você ter cuidado. Se ele me ver lá vai ficar com raiva, e eu não sei do que esse cara é capaz.

- esse é o meu plano. Se ele te ver ele não vai falar nada. Temos que ser rápidos e discretos.

- tudo bem.

Seguimos em direção ao apartamento, enquanto Felipe praticamente voa com o carro. Ele está indo rápido. Tenho um pouco de medo, mas essa não é minha principal preocupação. Caio vai estar no mesmo lugar que eu. Não gosto dessa ideia. Espero que eu consiga me controlar. Não quero que as coisas se compliquem, porque se eu colocar as minhas maos nesse verme eu não solto enquanto ele não tiver levado uma bela surra. As ruas estão quase vazias, o que me espanta por ser domingo à noite.

Mal cruzamos a porta da sala e o interfone toca. É ele. O porteiro anuncia que há alguém querendo subir, um amigo. Amigo é a merda. Meu coração sobe até a entrada da garganta e desce novamente.

- é ele. Eu já havia chamado para vir. Fica escondido na sala de jantar, e tenha cuidado pra ele não te ver.

Eu concordo com a cabeça, e ainda não acredito que estou metido nessa loucura. Será que vai dar certo? Eu não sei. Vou até a sala de jantar e fico perto da porta, espiando para vê-lo. Quando ele chega, o impulso quase fala mais alto e meu corpo quer avançar e lhe encher de socos, mas eu firmo meus pés no chão. Ele está bonito como sempre, mas agora sua beleza é contrastada com sua insanidade. Até onde ele seria capaz de chegar para me separar de Felipe? Ele o olha com os mesmos olhos de cobiça, mas Felipe está com a expressão fria. Acho que ele deve estar se esforçando muito para fazer isso sem o colocar na parede logo de início e o fazer confessar a força. Sei disso porque também quero isso. Não gosto desse jogo de gato e rato. Meu corpo está elétrico, e eu estou com uma mistura louca de adrenalina, medo, ansiedade e raiva. Eu não sei onde isso vai dar, mas hoje as coisas vão se acertar.

- o que aconteceu?

- queria conversar com você.

- nossa, que serio. – ele sorri arrogante, com o mesmo jeito sensual de sempre.

- quer algo pra beber?

- sim, por favor.

Felipe olha cínico para ele, se vira em seus calcanhares e anda até a cozinha, que é do lado da sala de jantar. Ele me olha pelo canto do olho discretamente. O que será que ele vai fazer? Eu estou quase passando mal de nervoso. Pouco tempo depois ele volta com dois copos de suco, e vai de encontro a Caio, que está sentado no sofá da sala. Felipe coloca os dois copos na mesa de centro, e retira um envelope de rohypnol do bolso, abrindo um comprimido e colocando dentro de um copo.

- toma.

Caio o olha perplexo. Acho que estou com meu queixo lá embaixo.

- por que? O que é isso?

- você não reconhece? Rohypnol, 1 mg.

Felipe está irreconhecível. Sua voz é suave, calma, mas a tensão é palpável. Minhas mãos estão suando. Caio está sem falar nada. Parece que pegamos ele de guarda baixa, e eu estou adorando isso.

Comentários

Há 8 comentários.

Por Dougglas em 2015-12-25 23:21:17
As coisas tão voltando aos eixos. Espero que tudo dê certo. Que filho da puta esse Caio. Vontade de pular no pescoço dele e dar uns belos tapas. Luã, tu tá despertando alguém violento em mim kkkkkkkkkkkkkk. Quero muito ver o desenrolar dessa história, e ver o que o Caio tem a dizer. Acho fofo o Bernardo, mas não conseguia ver ele com o Edu. Enfim, correndo pro próximo e ver no que vai dar.
Por Luã em 2015-09-18 02:47:43
Oi gente! Fico feliz que vocês estejam gostando e interagindo com o rumo que as coisas estão tomando. Às vezes é difícil encaixar tudo, mas nada como um pouco de calma para tudo se encaixar como quebra cabeça! Essa é uma das coisas mais lindas em escrever; encaixar os destinos dos personagens. E outra coisa que é incrível é acompanhar os comentários de vocês. Sério, isso é muito gratificante pra mim. A opinião de vocês é importante, de verdade. Ah, e acabei de postar outro capítulo. Acho que vocês vão se surpreender no final dele. Abraços! (:
Por Felex11 em 2015-09-17 13:40:38
Heita gostei de mais posta logo o proximo
Por diegocampos em 2015-09-17 00:27:26
Também estou feliz luan apesar de achar que o caio ainda não vai sumir da vida deles tão cedo
Por luan silva em 2015-09-16 22:53:21
alguem me da um beslicão (brincadeira ñ precisa) minha teoria estava 98% certa diego haha, espero q o plano d certo e q esse infeliz suma da vida deles e q o edu volte pro felipe logo e em relação ao bernado é uma situação bem chata.. muito ansioso pelo proximo.
Por diegocampos em 2015-09-16 12:05:11
Amei o capítulo espero que o caio seja desmacarado eo Felipe volte para o Eduardo super ansioso para o próximo capítulo sinto pena do bernado mas gosto muito Felipe
Por Juju em 2015-09-16 00:54:57
Nossa anciosa para o proximo capitulo!!!!!! Posta logo!!! Muito bommmmmmmmmmmm Perfeito!!!!!!!!!!!!!!
Por Niss em 2015-09-16 00:42:15
Caiiooooo filho do Satanás....... aí gente que odio.... no fundo eu sabia que tinha alguma coisa errada. Mas tbm me preocupo com o Bê... Realmente é muito difícil. Espero que de tudo certo. Kisses , Niss. PS: Eu nem ia ler agora mas quando eu vi o teu comentário no capítulo passado falando as emoções hahaha me descontrole.... Incrível o poder dessa história