13. Abstinência

Conto de Luã como (Seguir)

Parte da série Dia a dia, lado a lado

Agora eu sei o motivo de eu ser alertado sobre Gustavo, antes de entrar na agência. Quando eu soube que os últimos três funcionários que tinham entrado e sentado perto de Gustavo, mantendo assim um contato mais próximo com ele, acabaram pedindo transferência, eu achei loucura. Mas agora eu entendo. Provavelmente ele deve ter seduzido-os, usado-os e depois cuspido fora, dizendo que o que ele queria era apenas sexo. O fato de eu estar me sentindo usado me dói tanto quanto o fato de eu estar sentindo a falta dele. São dois tipos de dores distintas, de um lado a mágoa e de outro a falta da companhia, do beijo, das carícias, de tudo que me parecia tão novo ao lado dele é que ele fez questão de me tirar. É como de eu estivesse voando alto nas últimas semanas, ignorando a gravidade e me sentindo em outro mundo. Voar a essas alturas me parecia tão doce, mas aí eu acabei caindo. Por mais racional que uma pessoa possa ser, quando ela se apaixona esse sentido tende a falhar miseravelmente, fazendo você acreditar em palavras, em mentiras; foi isso que aconteceu comigo e agora eu estou em uma espécie de reabilitação.

Mais um dia inteiro procurando por emprego e nada. Saio do ônibus e sigo em silêncio rua abaixo, caminhando com as mãos nos bolsos em direção ao apartamento. Já anoiteceu e faz um pouco de frio, o que me obriga a enlaçar meus braços ao redor do meu corpo. As ruas estão movimentadas e eu volto a pensar nele. Não necessariamente nele, mas na possibilidade de eu ter ficado um pouco mais na agência, até conseguir outro emprego. Penso que talvez eu não conseguisse, já que ficar perto dele com a nossa situação se complicando cada dia mais seria quase impossível, mas pelo menos agora eu não estaria sem emprego e sem carro. Me vem um aperto no peito ao lembrar que eu me desfiz do meu Chevette há alguns dias, bem antes de eu e Gustavo termos brigado. Pra ser sincero, eu nunca deveria ter me desfeito, muito menos ter aceito o Elantra, eu estava muito bem com a minha querida lata velha, mesmo com todos os poréns. O porteiro destrava o portão pra mim e eu entro, cumprimento-o com o máximo de cordialidade que eu posso e então sigo para o prédio, me sentindo mais confortável depois de sair do ar frio e sentir o calor do hall de entrada.

Assim que entro na sala, a música baixa vinda do home theater e o cheiro de cebola e alho fritando fazem eu pensar que Samuel está em seus dias produtivos. Vou até a cozinha e vejo ele no meio de vários pratos com vegetais picados, formando um leque de cores bonito e atrativo, abrindo ainda mais meu apetite.

- alguém acordou inspirado hoje?

- eu sou a inspiração em carne e osso, lindo! - ele se vira e me solta um sorriso largo. – conseguiu alguma coisa?

- nada. – passo por ele e vou direto até a geladeira, abrindo a porta e tomando um pouco de suco direto da jarra e tentando ao máximo disfarçar minha desanimação. Porém, após eu dar meu sorriso chocho e perceber que eu havia levantado suspeitas, ele arqueia a sobrancelha e me olha com um misto de desaprovação e seriedade repentina. É, eu estou ferrado.

- Arthur...

- eu sei, Samuel. Eu já to melhor, de verdade. Só preciso de um tempo pra digerir tudo.

- eu te conheço há anos, cara, você acha que eu não sei o que você sente? Eu sou teu melhor amigo, poxa... Desde que aconteceu isso você se fechou e só fica com esse disco arranhado de “eu to bem, eu to melhor, eu só preciso de um tempo, sou desprovido de sentimentos e tá tudo legal.”

Eu paro e olho pra ele por alguns instantes, então como se eu não tivesse mais como segurar, eu fecho os olhos firme e começo a chorar. Droga de homem idiota que tá me fazendo agir feito um garoto! Eu ouço Samuel suspirar um “ai, Arthur” e vem em minha direção, me abraçando em seguida.

- que droga Samuel, porque você tem que fazer isso comigo? – eu choramingo, achando que não é justo ele saber tanto sobre mim. Eu estava indo bem até agora.

- porque eu não gosto de te ver assim, meu amigo. E você precisa desabafar, tirar isso aí pra fora. Chorar faz bem, lava o teu interior, deixa tudo leve.

- virou hippie agora, foi?

Eu consigo achar um vestígio de humor entre o drama todo do momento e acabo dando um bom motivo pra nós dois cairmos na risada.

- babaca. Agora vem me ajudar a fazer o jantar, que eu não tenho paciência pra esse lance de cozinha.

- e você acha que eu tenho?

- eu sei que não, mas dois tentando fazer algo direito tem mais possibilidade de sair alguma coisa boa, né?

Eu sorrio e puxo minhas mangas pra cima, ficando apenas concentrado em planejar o que iríamos comer e na música de fundo, que se eu não me engano é Colors, da Halsey, ao mesmo tempo em que Samuel brinca com a omelete que ele acabara de colocar na frigideira, rodando-a e jogando-a pra cima pensando que de repente ele poderia ser a Palmirinha, então eu rio de sua cara quando tudo quase cai no chão e ele precisa se remexer pra fazer os ovos mexidos voltarem pro lugar certo.

Agora, já com tudo pronto e bastante orgulhoso de nosso trabalho em grupo, que resultou em um risoto de frango com tomate seco, queijo e manjericão, eu termino de comer em silêncio, mas não mais com o humor abalado, como antes. Na verdade, tenho muito o que agradecer a Samuel, por me fazer reagir e sacudir um pouco da poeira, pelo menos por enquanto.

- o que você pretende fazer por enquanto, que tá sem trabalhar?

- continuar procurando algo até achar. – eu solto um pouco preocupado, mas soando divertido.

- por que não passa um tempo lá com os teus pais? Sai um pouco desse caos de São Paulo, esfria a cabeça, sei lá.

Eu paro pra pensar nisso e acabo não achando uma má ideia. Na verdade, acho que seria ótimo.

- é, talvez eu vá passar alguns dias lá. Mas aí eu ficaria preocupado com o nenezão aqui, imagina ele se virando sem mim? – falo claramente me referindo a ele, então ele faz uma careta e me acerta o pano de prato.

- que engraçado você.

Então, me levanto e levo meu prato já vazio para a cozinha e começo a lavar as coisas que sujamos, enquanto Samuel termina de comer.

- mas sei lá, sabe? É estranho ir pra lá com a intenção de ficar alguns dias, sendo que eu já me desacostumei totalmente com o clima de cidade pequena de lá. E eu não quero ficar dando explicações pros meus pais.

- só fala que você não tava se adaptando muito lá no banco e quis achar outra coisa, sei lá. Não precisa dizer nada que você não queira, até mesmo pra não ficar cutucando a ferida.

- é, acho que você tem razão.

- eu sempre tenho, bebê. – ele fala ao chegar do meu lado e deixar sua louça suja no balcão, me olhando com o sorriso reprimido e sabendo que eu iria lhe lançar um olhar duro de reprovação, então ele vai pra sala e eu balanço a cabeça, sorrindo.

Depois de terminar tudo, seco minhas mãos no pano enquanto olho para meu telefone, em cima do balcão perto do cesto de frutas, então vou até ele e disco o número de minha mãe. Após alguns segundos, ela atende.

- filho?

- oi mãe! Tudo bem?

- tudo e com você? Que milagre você ligando essa hora. Aconteceu alguma coisa? – ela já parecia preocupada, sabia que não iria enganar ela assim tão fácil.

- não, tá tudo bem! Só queria te dizer que eu vou passar uns dias aí com vocês. – eu sinto a antecipação em minha voz na medida que as palavras saem, esperando o que ela falaria em resposta.

- que coisa boa, meu filho! Já vou avisar teu pai e lavar tua roupa de cama, pra deixar tudo prontinho!

- calma, mãe. – eu a seguro, achando engraçado e fofo ao mesmo tempo sua reação instantânea. - Eu não sei quando eu vou ainda, mas é logo.

- ah deixa disso! Vem passar o final de semana, vem na sexta de tardezinha e domingo de noite você volta pra aí pra trabalhar.

Eu engulo em seco e penso “eu não tenho mais emprego pra ter que voltar no domingo, mãe”, mas decido manter isso em segredo e apenas dizer:

- claro, eu vou ver aqui e te ligo pra confirmar. Eu tenho que ir agora mãe, vou tomar um banho e depois dormir.

- tá bom, boa noite e se cuida, filho.

- a senhora também. Beijo.

Desligo e fico com o celular encostado na boca por alguns segundos, pensando se talvez fugir dos meus problemas seria o melhor. Mas, em todos os casos eu estou indo ficar com meus pais, então isso já é um ótimo motivo pra me fazer parar de pensar em tudo isso e tocar minha vida adiante.

Dou boa noite para Samuel, que agora está na sala preparando a televisão pra assistir Game of Thrones e então vou tomar um banho para ir dormir. Embaixo da água morna, me sinto um pouco mais relaxado, enquanto passo a mão em meu pescoço e sinto a tensão querer ir embora. Fecho os olhos e então jogo a cabeça pra trás, molhando meus cabelos e parte do meu rosto, então os pensamentos de Gustavo começam a me atormentar novamente. Será que eu vou conseguir superar isso algum dia? É claro que vou, mas isso me parecerão fora de alcance agora que me deixa agoniado. Eu sinto muito sua falta. Falta de seu toque, de seu cheiro, de seu beijo. Ele é um cafajeste de marca maior, mas ainda assim eu sinto sua falta. Prova disso é o fato de eu começar a me sentir excitado ao lembrar de nossos banhos juntos, do jeito que ele me fazia dele, de sua mão passando por mim. Tento imitar seus movimentos, ainda de olhos fechados, então deslizo meus dedos pelo meu abdômen em direção a minha virilha, indo até a metade da minha coxa e depois subindo novamente, indo direto para meu penis. Eu suspiro fundo ao sentir o toque e de imaginar que seria Gustavo que estivesse o fazendo. Seus olhos castanhos me fitando firmes e calorosos, a pele molhada, o cabelo pra trás, o calor emanando em nós. Esses eram momentos em que eu me sentia como um vulcão prestes a entrar em erupção e eu não me importava com isso. Não me importava com os estragos que isso causaria. Agora, eu preciso aguentar isso sozinho. Porém, meu pensamento faz uma reprodução fiel dos momentos íntimos em que eu e Gustavo nos amamos, no tempo relativamente curto em que ficamos juntos, enquanto eu começo a me masturbar. Eu abro minha boca e sinto a água entrar, enquanto eu fico um pouco sem fôlego pela intensidade do momento. O beijo de Gustavo em minha mente me faz morder meu lábio inferior e imaginar fielmente o gosto disso. A pele quente e convidativa dele me faz ficar com mais calor ainda, enquanto eu continuo a me dar prazer. Depois de alguns segundos fazendo isso com o máximo de intensidade que eu posso, devido ao meu desejo estar aflorado ao máximo, sinto meu orgasmo chegando gradualmente, mas avassalador. Acabo gozando no vidro do box, sentindo meu corpo se arrepiar e tremer de prazer e minha respiração voltar a ficar descompassada. Porém, logo a frustração volta a me bater, pois era nesse momento que Gustavo me beijava e me levava pra dormir, então eu ficava em seus braços o resto da noite. Como eu posso simular que ele está comigo, se no final tudo está como antes? Afasto esses pensamentos quase que no modo automático, pois isso é tudo o que eu tenho feito nos últimos tempos. Limpo a sujeira que eu fiz e então sigo para o meu quarto, me sentindo limpo e pronto pra abraçar meu travesseiro enfim.

__

Pela manhã, a ideia de ir visitar meus pais mais cedo começa a me convencer de que sair um pouco de São Paulo, pelo menos por enquanto, é a melhor coisa a se fazer. Decido então pegar minha mala e começar a arruma-la. É isso, eu vou hoje. Por que demorar mais? Não há nada que me prenda aqui. Talvez um tempo na minha cidade natal me faça endireitar a cabeça e talvez voltar mais maduro, mais pronto pra tocar a vida adiante. E se nada der certo, estar perto da família é sempre o melhor remédio pra tudo. Coloco a bagagem em cima da cama e começo a pegar minhas coisas de dentro do guarda roupa, até que eu acho um casaco de Gustavo no meio das minhas roupas. Engulo em seco e consigo lembrar perfeitamente de como isso veio parar aqui. Logo quando a gente começou a sair juntos, em uma das vezes estava fazendo frio durante a noite e então ele tinha esse casaco dentro do carro. Eu fiquei com ele e esquecia sempre de devolver, mas no fundo eu queria ter algo dele aqui comigo. Em um gesto quase involuntário, pego-o firme entre meus dedos e então levo-o até meu rosto, afundando-o em meu nariz e tentando sentir seu cheiro, que já estava quase sumindo. Meu coração se acelera ao associar aquele aroma com o homem que eu amo. Bem, que eu amava. Ou que eu ainda amo mas que eu queria não amar. Suspiro fundo e me pergunto:

“Por que você teve que atravessar meu caminho, Gustavo?”

Por mais que eu saiba que isso possa ter sido a melhor coisa pra mim por certo tempo, agora isso me parece estar sendo a pior de todas e eu não consigo achar forças pra deixar isso no passado.

Comentários

Há 5 comentários.

Por Nivis em 2016-05-16 13:50:46
Alô, Alô, Alô vcs sabem quem sou eu??? Voltei kkkk, kerida a senhora foi destruidora nesses últimos cap. SHOKAD@, eu sei que o Gustavo errou, mas acho que ele merece uma segunda chance, e pff de uns tapas na Amanda.... Bjs de sua Mana Carioca
Por Mister Good Vibes em 2016-04-29 00:06:25
Cadê o capitulooooo??
Por Sirferrow em 2016-04-18 14:53:58
O Arthur ficou muito dependente do Gustavo em tão pouco tempo. Vai ser bom pra ele se afastar um pouco.
Por BD97@ em 2016-04-17 03:13:25
onde está o próximo capítulo miggo?????!! posta por favor!!! esse conto é do bão hhahhahahhahha eu amo esse conto!!! bjs...abraços
Por Niss em 2016-04-05 14:23:39
Pela fé olha... Sinceramente eu acho é bom que ele vá pra PP... Assim quem sabe ele não conhece um boy por lá ou volta revigorado... Já te falei que eu adoro o Samuca né kkkkk eu gosto msm. Ele tem um jeito maravilhoso de lidar com o Arthur, é divertido, é lacrador, grelha, é babado, enfim ele é mara. Quanto ao querido Gustavo... Nada a comentar... Nessas horas que eu fico em cima do muro, pq eu quero que ele volte pra conquistar o Arthur dnv, mas ao mesmo tempo não concordo com o que ele fez e acho que não merece uma outra chance assim como eu não quero que o Arthur sofra por causa dele... ... ... Espero pelo próximo. Kisses Mana Loka Nissan Spears Lacradora.