[1x4] "Amigos"

Conto de Lincon como (Seguir)

Parte da série Dança Comigo

"Às sete, no anfiteatro da escola."

Quando o ônibus abriu as portas me deparei com um estacionamento deserto e escuro. Mais ao longe conseguia ver as luzes dos corredores da escola acesas. Quando entrei segui direto para o anfiteatro que ficava próximo a porta de saída para o grande campo. Lá dentro não havia ninguém então desci as escadas rumo ao palco. As luzes das escadas estavam acesas e alguns holofotes do urdimento também. Tirei meu calçado e fiquei descalço. Na minha bolsa havia um CD com todas as músicas apropriadas para as aulas. Pequei o som no grande armário dos bastidores e o ligando já comecei o aquecimento. Pouco depois Eduardo adentra no local descendo as escadas rapidamente. Observei toda a ação enquanto o garoto resfolegando pedia desculpas pelo atraso.

- Está aqui a muito tempo?

- Não, na verdade foi só o tempo de eu ligar o som é colocar o CD tocar. Podemos começar?

Ele praticamente arranca os calçados dos pés e arremessa para a parte ocidental do palco, depois olha para mim e diz finalmente.

- Podemos.

E foi então que minha mente não conseguiu evitar trazer a tona os flashbacks do sonho na noite passada, onde eu me aproximava tomando sua mão e guiando alguns passos. Então para evitar decidi fazer diferente.

- Hoje vamos praticar somente passos para músicas agitadas.

Corri até o som e troquei a faixa que tocava. E assim fomos de Songs About Jane do Maroon 5 a Hey Ya! do Outkast.

- Na maioria das vezes o digamos, sucesso, quando dançamos uma música agitada vem de pequenos gestos que fazemos. Veja, acompanhe o que eu faço.

Me inclino um pouco para frente e começo a mover os pés de um lado para o outro enquanto estalava os dedos acompanhando o ritmo da canção. Com movimentos duros e cintura presa Eduardo tenta fazer como eu. Digamos que não funcionou muito, mas ao menos o estalar de dedos tinha saído perfeito.

- Posso te dar uma dica? Acredito que você está com um pouco de vergonha. Falta se soltar mais. Se quiser feche os olhos, e faça o que o seu corpo sentir vontade, finja que nem estou aqui.

E lá foi ele, fechou os olhos e começou a se mover em um movimento sem sustentação. Não eram movimentos bonitos, mas ao menos ele estava se soltando e sua cintura não estava mais tão presa, isso indicava de já havíamos evoluído em algo.

- Tente balançar um pouco os ombros. E tente seguir o ritmo da música, mas sempre ciente do que você está fazendo.

Vi que ele estava quase lá, mas sua cintura ainda não tinha ritmo. Me aproximei e coloquei as mãos um pouco acima de sua cintura para lhe ajudar a guiar o movimento quando ele dá um salto fugindo do meu alcance.

- O que foi isso?

Suspirei. Sabia que algo parecido aconteceria.

- Ei, tenha calma, estou te ajudando. É que o movimento da sua cintura está sem ritmo. Ela está solta, parece que você perdeu um pouco da vergonha, mas falta o "saber o que você está fazendo." Façamos o seguinte, amanhã vou ver se trago alguns bambolês para você ter um maior controle sobre isso aí. Se não se importa acho que por hoje já deu. Podemos ir?

Ele então olha para mim suspirante e diz.

- Pode ser, amanhã ensaiamos mais então.

Ele se senta e começa a calçar os tênis. Pego o som e o levo para guardar. Quando volto com meus calçados em mãos me sento para colocá-los enquanto Eduardo permanecia de pé esperando algo. Olho para ele.

- Sim?

- Estou lhe esperando.

- Para?

- Para te dar uma carona oras. Já viu as horas? Não custa nada. Te deixo na sua casa.

Dou um leve sorriso e faço um sinal afirmativo com a cabeça.

Quando chegamos no estacionamento, uma única camionete azul estava parada quase perto da saída do pátio. Eduardo aciona a trava do controle e momentaneamente os faróis do veículo piscam. Por dentro todo o estofado era forrado de couro. Do espelho retrovisor pendia um rosário com uma cruz na ponta. O garoto deu partida no carro e guiou o veículo rumo a saída do estacionamento, antes de pegar a rotatória logo em frente ligou o rádio e uma música do Kings of Leon continuava tocando de onde havia parado.

- A aula foi boa, muito obrigado. Vou ver se prático um pouco em casa.

- Pode acreditar que isso ajudaria muito.

Ele sorri.

- Já jantou?

- Lá em casa o jantar sai às oito.

Puxei a manga da blusa para que o relógio ficasse a vista.

- A está hora devem estar se aprontando para ir dormir.

- Hmmm...

Ele apenas murmura. Após isso não ouvia-se nada mais além da música e o barulho que vinha do motor da velha Chevrolet. Fixei meu olhar nas casas da vizinhança. Todas quietas, abrigando seus moradores prestes a irem se deitar pois no próximo dia a jornada começava toda de novo. Continuamos sem nos falar quando Eduardo quebra a direita e alguns metros a frente me deparo com outro longo e quase vazio estacionamento.

- O que estamos fazendo aqui?

Acima de mim do meio do pátio se erguia um longo pilar sustentando um letreiro piscante com o logo do Pizza Hut.

- Temos que comer. Meu estômago já está roncando mais que o motor deste carro.

- Não sei cara. Eu estava louco para tirar um cochilo.

Eu respondo fazendo cara de desânimo.

- Ahh qual é, vamos lá, a gente come e depois vai embora.

Meu olhos pesaram, meu corpo estremeceu e naquele momento eu parecia mais cansado do que nunca, mas meu estômago também roncou. Não sei se eram as benditas borboletas ou fome, mas acabei sussurrando um sim.

A porta se abriu sozinha e se fechou atrás de nós quando entramos. O ar condicionado estava exageradamente frio. Suspirei e, Eduardo indo na frente pegou a mesa no canto do estabelecimento. As paredes de vidro permitiam uma ampla visão do escuro estacionamento. Com o menu em mãos concordamos que iríamos pedir a pizza portuguesa acompanhada de grandes copos de coca cola. Não havia quase ninguém ali. Apenas um jovem com sua pizza quase acabada e fones de ouvido. Mais ao lado um casal estilo Martin e Elena se acabavam em beijos em meio a mordidas nas fatias de pizza.

Quando nossa pizza finalmente chegou meu estômago pareceu roncar mais forte e eu mais que depressa peguei uma fatia. Eduardo vendo meu desespero solta um riso abafado que quando noto me provoca um breve sorriso.

- Vem sempre aqui?

Perguntei.

- Nem sempre, houve uma época em que eu vinha mais. Agora isso é raro. Senti saudades da pizza daqui.

Quando ele pegou sua fatia uma longa linha de mussarela ligava seu prato a tábua de pizza.

- É um ótimo lugar para você trazer a Dafine.

Eu disse especulando.

- Ahh, não. Ela não gosta de coisas com alta caloria. Segundo ela mesma ela leva um estilo de vida "fitness". Sua dieta se resume em folhas. Tudo isso para entrar no vestido no dia da formatura.

Ele disse sorrindo e dando uma mordida na pizza.

- Ela não sabe o que perde.

Ele sorri. Peguei meu copo de coca cola e bebi. Ele me olhava fixamente.

- Lucas, novamente. Obrigado pela ajuda que você está me dando. Sério.

Paro de beber meu refrigerante e coloco o copo na mesa para responder.

- Por nada. É isso que os "amigos" fazem.

Digo fazendo o gesto de pequenas aspas com os dedos. Ele gargalha.

Era bom passar um tempo com Eduardo. Ele era amigo do meu irmão a muitos anos, sempre frequentava minha casa, mas ainda assim eu nunca tive a oportunidade de uma boa conversa com ele. E agora que a tenho, vejo que é algo bom, ele é uma boa pessoa. Eu conseguia notar isso, ao menos quando meu cérebro não ficava todo fora de ordem com sua presença. Estava tão convicto nesse pensamento que acabei deixando fugir.

- Você é legal, quem sabe a gente não vira amigos de verdade?

Corei quando vi o que tinha acabado de dizer.

- Se você prometer não fazer essas aspas quando disser a palavra amigos de novo. Estou disposto.

Ele ri. Não digo nada, apenas tomo meu refrigerante.

[...]

Após nos empanturrarmos com várias fatias de pizza, pagamos a conta e fomos embora. Na volta já demonstravamos mais intimidade. Eduardo ria e contava casos de momentos nos treinos de futebol, de trotes que ele e os amigos faziam com os professores e até de namoricos que já teve no colegial ou no primário. Eu apenas ouvia e sorria. Quando ele contava uma lembrança que eu havia vivido algo semelhante eu acabava contando também. E o papo estava tão descontraído que nem vi quando chegamos em minha casa.

- É, chegamos.

Olhei pelo vidro do veículo e vi que as luzes da casa estavam apagadas.

- Como imaginei, todos dormindo. Olha, obrigado pela carona. Amanhã nos vemos na escola.

- Ok então, amanhã nos falamos mais. Boa noite. Amigo.

Não consegui segurar o riso.

- Amigo.

Então depois de eu ter saído do carro ele dá partida na caminhonete e os faróis traseiros e vermelhos do veículo se perdem na noite.

Comentários

Há 2 comentários.

Por Henry Thorne em 2016-04-11 08:49:53
Cadê a continuação em nome de Jesus, estou amando a série, muito bem escrita e montada, continua por favor.
Por Nicolas2 em 2016-03-31 01:21:45
Muito bom, estou adorando...