[1x3] Loja de Grife

Conto de Lincon como (Seguir)

Parte da série Dança Comigo

A valsa erudita tocava no fundo do salão. Apenas os holofotes centrais do anfiteatro estavam ligados. Eu estava com meus sapatos pretos e bem polidos enquanto Eduardo usava apenas seu sapatênis com um blusão de toca e bermuda. Não havia ninguém na escola e a sala parecia ouvir silenciosa a valsa que vinha do rádio. Juntei meus pés e olhei bem nos olhos do quarterback. Ele parecia meio sem graça e claramente muito nervoso, gotas de suor ameaçavam descer de sua fronte enquanto ele mexia incontrolavelmente os lábios. Flexionei os joelhos lentamente como em um movimento clássico das aulas de balé.

- Então é simples. Nas músicas agitadas você não precisa estabelecer um ritmo, basta movimentar seus pés em algumas direções aleatórias enquanto seus braços e cintura parecem seguir o ritmo. Nesta hora ninguém repara se você dança bem ou mal.

Me aproximei dele posicionando minha mão esquerda em seu ombro enquanto minha mão direita descia à altura de sua cintura para encontrar sua mão. Levantei meu braço enquanto nossas mãos se seguravam, palma a palma. Cheguei meu corpo mais próximo ainda e ele nem ao menos parecia respirar.

- Mas quando se tratar de música lenta, aí sim você deve mostrar que é um pé de valsa bem treinado. Mas lembre-se de respirar.

Sussuro em seu ouvido, notando que o garoto por nervosismo parecia ter esquecido de continuar respirando. Ele solta a respiração e nossos corpos estavam tão próximos que eu sentia a aceleração de seu coração.

Guiei o movimento passo a passo, de um lado para o outro. E o movimento das pernas ficava meio que assim: perna pra trás, separa e junta. Sempre em direções aleatórias. A melodia mostrava se calma, propícia para uma boa conversa.

- Na hora, lembre-se de surpreender seu par de dança.

Disse dando mais uma dica. A mão de Eduardo segurava minha cintura e como que em treinamento ele me puxa mas para junto de si, e neste exato momento estávamos colados. Não consigo reprimir um pequeno gemido. Afasto meu rosto para olhá-lo nos olhos surpreso e ele não consegue evitar um sorriso de canto de boca. Toda a claridade do palco parece diminuir e agora a música True deixava um clima mais calmo, romântico e até descontraído no ar. Sem aviso prévio Eduardo vira a cabeça e beija meu rosto. Havia algo de errado, eu não conseguia me mover, nem mesmo para me esquivar do beijo. Foi então que descobri o porque. Eu não queria me esquivar do beijo, então seu lábios foram se aproximando, mais e mais, ele beijou meu queixo e então atingiu meus lábios. Lentamente nossos lábios roçavam enquanto ele já se adiantava e abria o zíper da minha blusa de frio. Esquivei me de sua boca e meus lábios foram em direção à seu pescoço. Como ele cheirava bem. O que antes era calmo agora era frenético. Eu esfregava minha barba em seu pescoço e ele soltava baixos gemidos. Levantou os braços e eu tirei seu blusão. Nos deitamos no chão, ele sobre mim e com grande intensidade nos beijavamos e nossos corpos se atracavam.

De repente ouve-se aplausos e os assentos do auditório antes vazios agora estavam ocupados por uma multidão que não parava de nos olhar. Enquanto uns aplaudiam, outros comentavam e alguns até gritavam elogios e xingamentos. Mas eu e Eduardo não parecíamos ligar. Continuamos nos beijando. Nossos corpos se esfregavam tanto que de repente sinto uma forte sensação de prazer, meu membro então rijo começa a pulsar...

Pulo na cama ofegante e suado. Quando olho para os lados, não havia ninguém, eu estava só e com a cueca um pouco melada lá em baixo. Ahh não. Caí exausto no travesseiro. Abri os olhos e pude ver no despertador por cima do criado que eram quatro da madrugada. O que havia sido aquilo? Um sonho quente? Com o quarterback? Como aquilo seria possível? O choque no meio da noite fazia meu coração disparar no momento, mas estava tão tarde - ou tão cedo - que ainda não era hora de eu acordar e antes que pudesse pescar outro pensamento eu já havia adormecido de novo.

[...]

Acordo assustado e de pulo com jatos de água gelada encharcado minha cara e meu travesseiro. De forma difícil tento abrir os olhos para ver o que estava acontecendo.

- Acorda seu idiota. Já está na hora de se arrumar. Está pensando que isso são férias de verão?

O garoto de pé em minha frente vestia uma blusa vinho de mangas compridas e enquanto segurava uma banana mordida na sua mão esquerda com a direita espirrava jatos gelados com uma pistola d'água em mim. Ótimo, acordar sendo trolado por meu irmão. Isso indicava que seria um ótimo dia.

- Cara, eu acabei de me recuperar de um resfriado. Já estou indo seu trouxa. Agora sai daqui.

- Maricas... Espero não me atrasar por sua culpa.

Ele então sai do quarto e desce as escadas. Me sento na cama e taco o travesseiro do outro lado do cômodo para que minha mãe colocasse secar depois...

Quando chego na escola calafrios percorrem meu corpo, ver aqueles rostos me trazia uma má sensação. Me lembrava que a poucas horas - mesmo que em sonho - algumas daquelas pessoas riam de minha cara ou aplaudiam por eu estar me agarrando ao capitão do time de futebol. Corri para sala de aula e tudo o que pude fazer foi sentar e apoiar minha cabeça sobre a mesa e esperar pelo começo da aula. Ao menos comecariamos com literatura. Nem deu tempo para que eu fosse ver Olivia. Ela deveria me esperar até o intervalo. Já estávamos no meio da aula quando notei em Marc sentado do meu lado. Olhei para ele e sorri em cumprimento. O professor de literatura se chamava Edson e parecia mais um personagem de livro trajando seu paletó de tweed marrom com um lenço bem dobrado no bolso. E enquanto alguns dormiam eu devorava cada informação que o professor passava sobre Lord Byron.

No intervalo Olivia atravessou o refeitório mais que correndo trazendo consigo um enorme sorriso no rosto. Se eu bem a conhecia havia novidades a contar. E tudo o que eu esperava é que isso não "nos" levasse novamente a uma bebedeira descontrolada.

- Lu, como você está?

Ela se aproxima e me dá um forte abraço quando me levanto.

- Estava morrendo de saudades. Ontem foi difícil passar o dia sem você.

Ela acrescenta.

- Morrendo acredito que você não estava, mas com saudades pode até ser, afinal uma pessoa amável como eu... Impossível não sentir falta.

Dei um leve sorriso bobo e ela retribui.

- Besta.

Nos sentamos e logo ela pega seu celular no bolso. Quando ela pegava o celular e fazia aquela cara só podia indicar duas coisas: ou havia músicas novas ou realmente, havia novidades.

- Pode falar, estou pronto para ouvir...

- Lembra da Mariana?

- Sim, a que te impediu de ir me visitar ontem. Bleh, chata.

Ela gargalha.

- Essa mesmo. Ontem ela foi lá em casa ver meu portfólio de vestidos de outono. E ela adorou, disse que ia pegar alguns para levar para a mãe dela. Sabe que a mãe dela tem uma grande grife no centro da cidade né?!

- Acho que sei.

- Então, você está falando com uma estilista em ascenção. Logo presidirei grandes desfiles pelo mundo. E eu é quem vou ter que reservar acentos para você nos meus grandes desfiles.

Quando Olivia estava feliz ela não era nada modesta. Meio maluquinha, mas uma amiga de coração mole que a anos me ajudava a levar essa correria de vida mais tranquilamente. Sem contar das prosas ou das responsabilidades que ela já teve que assumir por mim. A garota anorexa de olhos fundos era mais importante para mim do que eu demonstrava. Estava rindo da humildade de Olivia quando as borboletas do meu estômago resolvem sair de seus casulos e fazerem uma festa. Do outro lado Eduardo entrava no refeitório com Martin e Theodoro. Fixo meus olhos nos lábios de Olivia e fingia fazer leitura labial, o que se caso eu conseguisse seria útil já que eu também não conseguia ouvi-la. Meus sentidos embaçaram e meu coração parecia querer correr para o cérebro e sussurrar: "ignore que ele acabou de entrar, foi só um sonho e ele não está vindo para cá"; O que seria também ótimo, caso meu coração estivesse certo, mas não estava. Droga, droga, droga. Eles estavam vindo para cá. Minha vontade era de sair correndo, mas não havia como e aparentemente não havia também um porquê, porém isso era tudo o que meu corpo pedia para mim fazer. Então coloquei minha máscara de ator, respirei fundo e disse aos meus sentidos para se concentrarem em Olivia.

- Só uma observação sobre a parte do reservar lugares. Quero acento VIP, de preferência um camarote com o espumante mais caro. Obrigado.

Novamente ela gargalha. Hoje ela estava mais feliz do que o normal. Eu sem motivo gargalho também, o nervosismo estava mais do que o normal... Ia já fazer outra piada quando meu irmão e sua "trupe" chegam a mesa.

- Ei Aquaman... Olivia, está cada dia mais linda.

Ele diz olhando para mim e em seguida pegando a mão de Olivia e beijando. Martin se sentou ao meu lado e Theodoro ao lado dele. Eduardo deu a volta e se sentou a minha frente.

Ótimo.

- Então vejo que estão animados, qual a novidade?

Martin, Martin, cadê as líderes de torcida? Porque não vai se sentar com elas e nos deixa em paz?

Pensei seriamente em dizer isso, mas tudo o que disse foi:

- Nada de especial.

- É que eu estava contando para ele que é muito provável que a mãe da Mariana me chame para trabalhar com ela.

Olivia não, não responde. Quem sabe assim eles não vão embora logo?

- A mãe da Mariana? Ah, claro. Ela tem aquela loja de grife no centro com nome de veterinária, como se chama mesmo?

Pois é, escola pequena de mais. A Mariana era uma líder de torcida e estava nas classes de geografia junto com a Olivia, as duas sentavam lado a lado e daí vinha esse vínculo.

- A loja se chama Vêtements. E não tem nada a ver com veterinária. Isso é francês. Mas enfim, ela levou alguns projetos que eu fiz para a mãe dela ver.

Papo vai, papo vem e a minha frente permanecia um calado Eduardo.

- Tá, enfim... Vamos, logo o intervalo acaba e ainda tenho que comprar um shake. Aliás, Lucas, depois da escola eu pretendo passar no shopping. A Elena disse que precisa trocar umas roupas que ganhou da tia dela e perguntou se eu podia levá-la. Então prepare-se para ir com a gente.

O que? Sair com esses dois melosos? Sim, sair com meu irmão e com a Elena era terrível. Eles ficavam aos milhões de beijos enquanto eu segurava vela. Eu poderia dizer que não, e que pegaria o ônibus. Tinha certeza que dessa vez não me daria tão mal como na última tentativa, mas tinha que comprar umas camisas e talvez um relógio novo então decidi que iria com eles.

- Ok. Até o final da aula.

- Beleza então. Bora galera.

Meu irmão começa a se afastar e Theodoro já havia se levantando quando Eduardo fala.

- Vão indo, eu preciso falar rápido com o Lucas.

Comigo? Ai essa agora.

Fiquei ali sentado esperando ele falar. Mas o garoto não falava nada. Então entendi o recado e me levantei.

- Tá, vem cá.

Me sentei na mesa ao lado quando ele veio e se sentou em frente.

- Recebeu meu SMS ontem?

Afirmei com a cabeça. Evitava olhar nos olhos dele.

- E sobre os seus materiais de pintura, faltou algo?

Então ergui a cabeça e olhei bem para ele.

- Por que fez aquilo? Sabe bem que não precisava ter se preocupado.

- Quis ser gentil, como você está sendo para mim. Mas apenas queria te pedir que não comentasse para ninguém sobre as aulas. Ele diz olhando para Olivia. Não sei se pegaria bem.

Se pegaria bem? Por acaso havia algo de errado em aprender a dançar? Quem ele pensava que eu era? Mas ao invés de discutir apenas disse:

- Ok. Hoje às sete?

Ele sorri e faz um sinal de jóia com a mão.

Então eu me levanto para voltar para a mesa com Olivia, quando ele levanta a mão para que eu o cumprimentasse do jeito "brother". Então o cumprimento e ele se afasta. Olivia olha para mim com cara de curiosa e estava para abrir a boca quando o alarme soa indicando o fim do intervalo.

[...]

No carro eu estava tão imerso em pensamentos que não prestava atenção em uma palavra que Elena falava. A garota tagarelava assuntos que mudavam a cada instante. Em meus pensamentos não estava ninguém além de Eduardo. Por que aquele sonho com o quarterback? Mas o que me preocupava não era o sonho, o que me cutucava era o porque do nervosismo ao ver o garoto. Minhas tripas reviraram e meus olhos lacrimejaram. Eu me conhecia, sabia o que gostava, o que queria. Sonhos nada mais são do que o inconsciente imaginando coisas durante o sono ou talvez a vontade de realização de um desejo reprimido. Será que eu sentia algo por Eduardo? Não que eu tivesse problemas com isso. Sempre fui de prezar mais pelo meu bem estar do que pelo modo como as pessoas me vêem. E o que estava pensando? Se um carnaval acontecia com o meu corpo quando eu via o garoto, para mim estava mais do que óbvio de que eu sentia algo por ele. Mas o que? E por que logo agora? Estava entrando mais a fundo no pensamento quando alguém me puxa pra realidade...

- Lucas, que horas podemos nos encontrar aqui no estacionamento?

"Aqui no estacionamento?"

Quando olho pelo vidro do carro vejo que já estávamos no estacionamento do Metropolitan Mall.

- Eu não vou levar muito tempo, vou apenas comprar algumas coisas. Podemos nos encontrar aqui as cinco e meia.

Desviei o olhar para Elena me certificando de que seria tempo suficiente para a garota completar seu ritual de compras no shopping.

- Tá, as cinco e meia aqui.

Ela confirma.

Sai do carro e caminhamos juntos rumo ao elevador. As minhas lojas preferidas ficavam no 3° piso.

Já havia passado por duas lojas e até então segurava três bolsas. Olhei as horas no relógio e me dei conta de que ainda tinha quase uma hora para escolher meu relógio. Quando entro na loja uma moça usando um uniforme elegante vem me atender.

- Boa tarde. Posso ajudar? O que pretende olhar hoje? Óculos, relógios, outro tipo de acessório?

Dei uma olhada pela loja e disse finalmente.

- Relógio de ponteiro, pulseira de couro, de preferência marrom.

- Tenho uns modelos que tenho certeza que você vai gostar.

Ela se dirigia ao canto nos fundos da loja e pegou três caixas repletas de modelos de relógios de ponteiro. As caixas estavam sobre a mesa quando um outro atendente abre a vitrine por trás da moça para pegar alguns relógios. Observo a ação de canto de olho. O garoto olha para as caixas e desvia seu olhar para mim. Notando que ele me observa sorrio.

Dentre os relógios que estavam em minha frente um me chamou mais a atenção. Seus ponteiros eram pratas e seu fundo preto, mas a pulseira era de couro marrom. Decidi que o levaria.

- Este aqui.

- Uma ótima escolha. Venha comigo que vou fazer o recibo.

Enquanto a seguia até o caixa reparei que o moço continuava a me observar. Fixo meu olhar no chão antes que eu ficasse visivelmente corado no meio da loja. Depois de realizar a compra quando estava para sair dali não me segurei e olhei para ele e como já era esperado ele me observava.

Depois da tarde em compras cheguei em casa e com meu caderno em mãos fazia longos rabiscos controlados desenhando o esboço de minha pintura. Com um pedaço de grafite em mãos fazia rabiscos leves tecendo cada linha e feições dos personagens da minha futura pintura.

Depois disso afastei um pouco o desenho para poder ter uma melhor visão do esboço final. Se pudesse me ver naquele momento diria que meus olhos brilhavam, meus olhos lacrimejaram e um breve sorriso escapou de meus lábios.

No papel o desenho de duas pessoas dançando. Um homem e uma mulher, muito embora a mulher também tivesses feições masculinas, no fundo da tela podia se notar um piano quebrado ao meio e em um canto uma parede cheia de rostos com seus olhos fechados.

Surreal e representativa. Estava perdido em pensamentos observando o desenho quando meu celular vibra me despertando do estado de hipnose. Era o alarme me trazendo um lembrete. Na tela eu podia ler as claras palavras.

"Às sete no anfiteatro da escola."

Isso seria em trinta minutos.

Comentários

Há 1 comentários.

Por Ali T. Jones em 2016-03-28 00:23:51
Que série MA-RA-VI-LHO-SA!!!!! Esperando ansiosamente pelo próximo capítulo!