Capítulo 7: Me Beije Uma Vez
Parte da série Verão Em Vermont
Fico tentando imaginar o porque das pessoas usarem drogas. Existem das mais variadas. E não me refiro as drogas e sim as pessoas. Ricos, pobres, brancos ou negros. Todos usam drogas. A verdade é que não existe um motivo. Tédio? Talvez. A hipocrisia das pessoas são muitas. Muitos tomar comprimidos para curar suas doenças das mais variadas. Acho que a pior de todas é a depressão.
A verdade é que você pode tomar quantas pílulas quiser, mas não existe droga nesse mundo que te livre de você mesmo. O pior mal que pode ser causado a você é feito por você mesmo. É feito por suas escolhas. É claro que meu pai me causou muita dor, mas a dor a que me refiro é a que está dentro. Eu senti muita dor no meu coração. A pior dor de todas é a da alma. Chegou em um momento da minha vida onde eu precisava escolher entre ficar ou partir.
Para mim a droga mais poderosa do mundo é o amor. Ela transforma seu corpo de faz você se sentir alto e feliz sem motivo aparente. Porque será que as pessoas não usam e abusam dessa droga?
Estava nevando lá fora. Tinha esfriado muito mais desde a tarde, mas isso não impediu que os convidados de Tobias e Harold viessem para o jantar. Eles haviam insistido para que eu participasse, mas eu preferi ficar no quarto. Estava entusiasmado com a televisão. Assisti a tantos filmes e séries naquele dia. Era um mundo novo que se abria para mim.
O que parecia ser bobeira e normal para todas as pessoas ao meu redor, era algo inusitado. Até a comida era diferente. Harold havia feito em excelente almoço e eu comi tudo duas vezes. Diferente de lá em casa. Geralmente não tinha muito ânimo nem para ir a mesa de jantar. Quanto mais saborear a comida.
- está tudo bem com você? – perguntou Tobias entrando no quarto.
- está sim. Obrigado.
- você está com fome?
- eu estou bem, mas me atrevo a dizer que o que comi aqui hoje estava excelente. De muito bom gosto.
- vou avisar Harold que você gostou.
- por favor. Diga a ele que ele tem mãos mágicas.
- espero que você também goste da minha comida.
- é você que está fazendo o jantar?
- Harold está me ajudando, mas hoje eu sou o chef.
- já estou ansioso para poder comer.
- na verdade eu vim para tentar mais uma vez te convencer a descer as escadas e ficar na companhia de todos. Acho de verdade que o contato com pessoas será bom. Você via se sentir melhor.
- eu realmente não quero ser um “pé no saco”.
Tobias deu uma risada quando falei isso.
- desculpa o palavreado. É que eu vi esse palavrão em um filme que eu assisti.
- Sem problema. Só achei engraçado.
- posso te fazer uma pergunta Tobias?
- pode.
- você tem AIDS?
Eu vi que a expressão dele mudou quando fiz essa pergunta.
- porque está me perguntando isso?
- meu pai sempre me disse que apenas os gays e negros pegam AIDS. Ele disse que é a maldição que deus lançou no mundo pelos atos pecaminosos que eles cometem.
- tudo bem – falou ele se aproximando – isso é mentira Oliver. Todo mundo está sujeito a contrair o vírus. E não, eu não tenho. Harold também não.
- tudo bem.
- olha, você não deve perguntar isso para as pessoas OK? Não me leve a mal, só estou tentando de ensinar.
- sem problema, afinal eu não tive muito educação em casa.
- então… você não respondeu a minha pergunta.
- eu prometo que se ouvir uma próxima vez eu desço para ficar com vocês, mas hoje eu me sinto melhor e mais confortável aqui em cima. E além do mais eu não quero deixar vocês constrangidos.
- do que está falando?
- eu tenho medo de vomitar se ver vocês se beijarem;
- tenho certeza que você não vai mais vomitar e mesmo que você o faça nós entendemos o porque. Com o tempo você vai se acostumar e essas lembranças ruins irão desaparecer.
- espero que sim.
- você só precisa associar o beijo á algo bom. Você precisa associar o beijo a uma lembrança boa. Duvido que você vai vomitar depois de fazer isso.
- quem sabe no futuro – falei envergonhado.
- será que agora eu posso te fazer uma pergunta?
- pode.
- você é gay?
Por alguns instantes eu hesitei. Realmente não sabia a resposta daquela pergunta. Não sei bem o que sinto dentro de mim. Na verdade não tive motivos nem razões para me sentir atraído por nenhum dos sexos. É claro que eu me sentia impressionado por homens, mas eu acho Amy bonita.
- não precisa responder – falou Tobias.
- eu não sei. Estou sendo sincero com você. Não sei se sou gay. Como você sabe que é? Quer dizer, como você descobre e diz para sí mesmo que é gay ou hétero?
- a maioria das pessoas responderia essa pergunta dizendo o seguinte: você fica excitado quando vê uma mulher pelada? Ou quando vê um homem pelado?
- e qual a resposta certa?
- quando você fecha os olhos e imagina o seu futuro. Você começa a pensar na pessoa com quem quer passar o resto de sua vida. Deixa eu ser mais claro – falou ele pensando um pouco – Tem a ver com o que sente no coração não nas partes íntimas. Quando você tem vontade de beijar uma pessoa e finalmente beija. O que você sente durante o beijo é a resposta.
- não sei se entendi muito bem, mas eu prometo que quando eu tiver a resposta eu de digo.
- OK – falou ele se aproximando da porta – assim que o jantar ficar pronto eu trago pra você.
- obrigado – respondi quando ele saiu do quarto.
Voltei a assistir um programa na televisão e logo percebi quando os convidados chegaram. Eles conversavam e riam bastante. Era bom estar em uma casa onde as pessoas sorriam e conversavam. O ambiente estava me influenciando e muito. Apenas o fato de estar lá, mesmo não estando lá em baixo me deixou mais feliz.
Harold trouxe o meu jantar.
- espero que goste – falou ele trazendo em uma bandeja.
- você bebe cerveja ou prefere refrigerante?
- refrigerante – falei me arrumando na cama.
Depois que Harold trouxe algo para beber eu comi toda a comida. Estava realmente deliciosa. Repeti novamente apesar de estar envergonhado. Afinal eles tinham visitas, iriam pensar que eu estava passando fome. O desejo falou mais alto e eu repeti. Depois que terminei Harold levou tudo para baixo.
Depois que comi, fui até o banheiro e escovei meus dentes. Ainda bem que havia tomado banho mais cedo, porque o clima não estava favorável. Uma nevasca se aproximava e o aquecedor teve que ser colocado no máximo.
Tobias veio até meu quarto com uma latinha de cerveja na mão.
- o que achou da comida?
- adorei, estava realmente deliciosa.
- melhor do que a do Harold? – perguntou ele tomando um gole da cerveja.
- Realmente não tenho resposta para essa pergunta.
- pode dizer que a minha é mais gostosa – falou ele brincando.
- mas é sério. Estava muito bom. Não em lembro a última vez que comi tão bem.
- se você quiser dormir é só apagar a luz OK? Nós vamos fazer menos barulho lá em baixo.
- não precisa. Não vou dormir. Não estou com sono.
- sua perna não está doendo? Quer tomar o remédio que o médico te passou?
- melhor não. Não gosto de tomar remédio sem precisão.
- você rachou a fíbula. Acho que você está precisando.
- dói um pouco, mas nada que eu já não tenha sentido em dosagem bem maior.
- se você está dizendo – falou ele sorrindo – bom vou lá em baixo.
- obrigado por tudo Tobias.
- por nada – falou ele saindo do quarto.
Voltei a assistir televisão.
As horas se passaram e pelo o que eu ouvia, parecia que eles estavam jogando algum tipo de jogo. Talvez adivinhação. De vez em quando eles gritavam e riam. Eles pareciam se divertir bastante. Começava a me arrepender de não ter aceitado o pedido, talvez eu tivesse me divertido, mas eu com certeza teria outra chance.
Quando deu onze da noite resolvi me deitar. Me levantei e apaguei a luz. Me deitei e me cobri até o pescoço. Estava muito frio. Mal tinha me deitado e alguém abriu a porta do quarto e acendeu a luz do quarto. Levantei a cabeça assustado e vi um homem de olhos azuis parado na porta.
- me desculpa, pensei que aqui fosse o banheiro.
- sem problema – falei esperando ele fechar a porta e sair.
- Ei! Você é Oliver, certo?
- sou eu, porque?
- Tobias me disse que você estava aqui – falou ele entrando e fechando a porta – desculpa ter te acordado.
- sem problema – falei me sentando na cama outra vez.
- meu nome é Frank Fitzgerald – falou ele estendendo a mão e eu a apartei. Ele tinha um aperto de mão forte.
- eu sou Oliver Maxfield.
- sinto muito por tudo o que você passou. Tobias me contou.
- ele contou pra vocês o que aconteceu comigo?
- não. Só pra mim.
- eu confiei nele. Ele me disse que não contaria a ninguém.
- não fique bravo com ele. Nós nos conhecemos desde pequeno.
- tudo bem. Eu confio em Tobias e se ele confia em você. Também confio em você.
- que bom – falou ele sorrindo – quando ele me contou o que seu pai fez com você eu achei tudo tão horrível. Deve ser difícil ter tido um pai como esse.
- é sim – falei sem muito assunto.
- posso me sentar com você? Parece tão aconchegante.
Antes que eu respondesse ele deu a volta na cama e se meteu debaixo das cobertas comigo.
- assim está melhor – falou ele olhando para mim e sorrindo. Senti um calafrio e um enjoo no estomago.
- você está bem?
- estou – falei tentando relaxar.
- você trabalha com Tobias né?
- sim e você? Qual o seu trabalho?
- sou engenheiro. Tenho trabalho aqui sabe, mas costumo viajar pelo menos uma vez no mês para alguns trabalhos em outros estados.
- nossa. Você já deve ter o país inteiro.
- sim. Praticamente todo ele.
- eu nunca sai de Vermont. Quem dirá andar de avião.
- agora você pode.
- quem me dera.
- porque não? O que te impede?
- não sei. Só não me vejo saindo daqui.
- não diga isso. Você não pode ter uma visão limitada de você mesmo. Você precisa se imaginar tendo o melhor e fazendo o impossível. Você precisa se ver bem melhor do que agora. Não pode ser pessimista.
- vou tentar – falei rindo – é tão estranho sabe. Em um dia eu estou preso em casa e no outro estou debaixo de cobertas… com outro homem.
Fran k olhou para mim e começou a sorrir.
- você me acha bonito – falou ele.
- não. Não acho.
- acha sim. Você está ficando vermelho. É por isso que está tão nervoso desde que entrei no quarto?
- não estou – falei sério. Não estava gostando do tom dele.
- me desculpa – falou ele percebendo que já não estava levando na brincadeira – não quis te ofender.
- não se desculpe. Eu é que peço desculpas – falei sem olhar para ele.
- olhe pra mim – falou ele levando o braço direito até meu rosto virando-o.
Senti um arrepio quando ele fez isso.
- não se sinta mal. Estava só brincando.
Nesse momento eu fechei os olhos e levei minha mão até a dele e a alisei. Era bom sentir o toque de outra pessoa. Era a primeira vez que sentia alguém me tocar daquela maneira.
Abri os olhos e Frank estava me encarando. Pensei em dizer algo, mas ele aproveitou que tocavam eu rosto e usou essa artimanha para aproximar meu rosto do dele e me dar um beijo. Ele me deu um selo na boca. No inicio eu me apavorei. Pensei que iria vomitar, mas não foi isso o que senti. Seus lábios estavam juntos ao meu e senti vontade de não me afastar.
- me desculpa – falou afastando o rosto – não devia ter feito isso.
- faça de novo – falei levando minha mão até o rosto dele. Hesitei muito e abaixei a mão que estava tremendo duas vezes antes de finalmente tocá-lo.
Nos aproximamos e demos um beijo, mas dessa vez um beijo mais intimo. Ele enfiou a língua dentro da minha boca. Não sabia o que fazer, mas parece que lá no fundo meu corpo sabia exatamente o que fazer. Ele tinha uma barba rala no rosto. Uma barba loira escura assim como seus cabelos que era curtos. Ele tinha braços fortes e era alto.
Beijamo-nos por um bom tempo. Nossas bocas já estavam bem húmidas. Ele parou por alguns instantes e nós respiramos fundo. Pensei que me sentiria mal, mas me senti muito bem. tudo o que meu pai tinha dito era mentira. Não era nojento e não era errado. Meu corpo estavam e dizendo que aquilo era certo. Nunca haviam e sentido dessa maneira na vida.
- você vai embora agora?
- só se você quiser.
- não vou. Só se você quiser.
- não quero. A menos que você queira ir – falei nervoso. Havia um debate dentro de mim. Estava tremendo.
- se acalme Oliver – falou Frank parecendo preocupado – vou ficar aqui com você – falou ele se deitando e mandou que eu fizesse o mesmo.
Ele passou o braço por trás de mim e me puxou fazendo com que me deitasse em seu braço. Ele pegou minha mão e colocou em seu peito. Era grande e forte.
- o que seu pai diria se ti visse agora?
- ele me bateria – falei sentindo uma pontada nas costas. As cicatrizes ainda doíam quando me lembrava dele. Respirei fundo.
- o que foi? – perguntou ele alisando meu rosto com o dedão.
- não é nada, é que minhas cicatrizes doem quando lembro do meu pai.
- você é igual ao Harry Potter – falou Frank rindo.
- quem é Harry Potter?
- o que? – perguntou ele indignado – você não conhece o Harry?
- é uma pessoa?
- um filme. Conta a história de um garoto que é um bruxo… - ele parou por um instante – quer saber? O que você acha de marcarmos de assistir os filmes no fim de semana? Dessa maneira eu tenho motivos para voltar.
- no fim de semana?
- sim. Eu alugo todos os filmes e nós assistimos comendo pipoca.
- tudo bem – falei fechando os olhos. Foi a última coisa que lembro de dizer antes de finalmente cair no sono.
Tobias abriu a porta do quarto e nos viu deitados na cama.
- ele dormiu? – perguntou Tobias.
- parece que sim.
- ele é um garoto carente – falou Tobias.
- eu também seria se tivesse sofrido metade do que ele sofreu.
- você vai passar a noite aqui?
- acho que não tenho escolha – falou Frank rindo – subi as escadas para ir ao banheiro e veja como acabei. Quando ele acordar vai querer me ter ao seu lado.
- você se acha demais – falou Tobias rindo.
Frank sorriu também.
- boa noite – falou Tobias apagando a luz do quarto e saindo.
Pela primeira vez na vida tinha dormido sem antes fazer minhas orações. Meu pai me obrigava a fazê-la todas as noites. Pela primeira vez não tive pesadelos.
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Obrigado a todos. Fico muito feliz com os comentários de vocês. Eles me motivam a escrever todos os dias. :)