32- Um Único Coração (Final)
Parte da série Entre Dois Corações
É isso gente, finalmente chegamos à conclusão da série. Nosso último capítulo, nosso desfecho.
Nem sei como me despedir, nem mesmo como me desfazer de uma série que aos poucos se tornou o meu maior prazer, meu orgulho e meu meio de me comunicar com vocês.
Obrigado a todos vocês que me acompanharam e que me incentivaram a não desistir da série. Esse capítulo é dedicado a vocês.
†NillDidas» Aos poucos as pessoas perdem sua juventude e sua vida, se aproximando da morte a cada segundo. Na vida tudo se perde. Materiais, amigos, familiares, amores... Mas quando você tem o dom de usar as palavras, você morre com ele. É assim que eu te defino. Obrigado pelo seu tempo, obrigado pelas suas palavras, e obrigado pela sua devoção, mesmo que eu não ache isso devidamente merecido, eu agradeço por todo esse tempo que você perdeu lendo a minha série, e que bom que você conseguiu ver muito mais que um romance nas minhas palavras, é gratificante saber que a minha mensagem chegou exatamente como eu queria. Será realmente uma pena me distanciar de um leitor como você, mas espero sim que nós nos encontremos novamente em palavras, e não se preocupe, o Ethan estará sempre entre seus dois corações, eu o eternizei, e eternizei você junto com ele. Obrigado por tudo, um grande abraço. Te espero nesse capítulo então.
†Fagner» É extremamente difícil encontrar uma palavra que possa definir o que eu sinto, por que gratidão se tornou apenas um pequeno fragmento do meu sentimento por você, por essa série... Eu queria poder te responder à altura, mas não há dicionário que possa me ajudar nesse momento. Obrigado Fagner, obrigado por se tornar uma pessoa especial e se tornar um leitor mais do que querido. Aliás, obrigado por se tomar bem mais que um leitor querido. É muito importante pra mim saber que minha mensagem tenha sido entregue com sucesso, e eu espero que você a leve para a vida, por que a vida não é um mar de rosas, e eu sei que muitos leitores estão aqui para tentar se afastar do mundo cruel lá fora, mas eu quero que vocês vejam que o mundo não é tão cruel quando interpretado, e que há coisas que valem a muito a pena agradecer, mesmo que pareçam insignificantes. Obrigado, obrigado para sempre, eu te adoro demais.
≠BOA LEITURA (comentem)≠
<ENTRE DOIS CORAÇÕES>
Capítulo XXXII [Um Único Coração]
- Ethan você não pode ir. - Mamãe disse como se fosse algo óbvio, e é claro que era óbvio. Como é que alguém cego poderia sobreviver sozinho? - Você está... Doente.
- Cego mãe! - Eu falei talvez num tom agressivo de mais - Eu estou cego, é essa a minha realidade, e não pense que com palavras você vai mudar as estatísticas.
- Estatísticas? - Mamãe perguntou com a voz falha e trêmula - Do que você está falando?
- Por favor mãe... Depois de tudo isso você ainda quer guardar segredos? - Eu estava indignado, e só não me levantei por que não sabia qual direção deveria tomar, e mesmo se tomasse a direção que eu queria, como iria atravessar a rua? Se é que eu conseguiria chegar até ela - Estou falando do que o doutor disse pra mim, e que ele disse para você também.
- Carmen... - A voz de papai quebrou o silêncio que a minha frase havia provocado - Que estatísticas são essas? Do que ele está falando?
- O Ethan tem apenas 10% de chances de voltar a enxergar. - Mamãe disse - Eu não queria que você, nem os amigos dele perdessem a esperança, dói muito em mim saber que o meu filho pode perder a visão para sempre.
- Sou eu quem vou ficar cego para sempre e é em você que dói? - Meu sarcasmo venenoso pairou no ar, e eu tive a impressão que todos ali estavam me olhando - Sabe por que dói em você mamãe? Por que você se sente culpada, assim como a maioria dos que estão aqui sentem culpa! Por que afinal, eu não fiz nada para merecer isso... Fiz? Mas os segredos de vocês me atingiram mais do que era para me atingir, mais do que vocês queriam que me atingisse. Vocês sabiam que o tempo todo o alvo era eu, e mesmo assim me deixaram exposto e vendado, sem poder ver vocês, sem poder me direcionar... Eu era um alvo fácil, e as flechas que mais me atingiram foram vocês.
Eles não sabiam o que falar, por isso ficaram em silêncio. Minhas palavras dançavam pela sala de estar, e como um veneno se infiltravam em todo o organismo dos que estavam naquela sala. Entre eles o meu.
Eu me senti mal por culpá-los pelo que aconteceu comigo, mas não me arrependi de tê-lo feito. Eles eram sim culpados por tudo, e eu não amenizaria nada, não deixaria passar em branco.
- Eu só quero recomeçar a minha vida. - Falei me levantando - E é hipocrisia de vocês não deixarem que eu o faça, me manter perto das pessoas que destruíram a minha vida. Eu quero me afastar de vocês, e quero que vocês se afastem de mim. A festa de aniversário que está para acontecer será uma festa de despedida, quer vocês aceitem ou não. - Deixei minhas palavras no ar por mais uns segundos e respirei fundo - Eu quero ir para o meu quarto.
- Eu levo você. - Robert disse, é segundos depois pude sentir mãos grandes na minha cintura - Me acompanha.
Coloquei a minha mão sobre a de Robert e deixei que ele me conduzisse. Ele me segurava com uma delicadeza apaixonante, e novamente me peguei olhando para o passado e para a nossa vida que sempre fora perfeita. Os nossos beijos molhados, as brigas bobas por eu ainda ser virgem, minhas tentativas de transar com ele... Talvez fosse por isso que ele insistia em não ter uma vida sexual ativa comigo. Mesmo que ele realmente tivesse se apaixonado, ele só entrou em minha vida por que deveria entrar.
Foi meio complicado subir as escadas, e Robert insistiu para que eu o deixasse me levar no colo até o meu quarto, mas eu neguei. Eu precisava me orientar, precisava aprender as coisas simples o mais rápido possível.
- Tô abrindo a porta. - Robert narrava suas ações, sempre com as mãos em minha cintura - Vou ver algum DVD pornô em cima da sua cama?
- Não sei, não lembro de ter deixado algum sobre ela, mas é sempre melhor verificar. Espera que eu vou ver. - Meu trocadilho fez Robert se calar e dar uma risada nervosa.
Entrei no quarto me apoiando na porta. Eu dava passos lentos e altos, para não tropeçar. Parecia que eu estava aprendendo a andar novamente, e de certa forma eu estava. Eu teria que me adaptar ao mundo, queria conviver em paz com os meus defeitos, e para isso eu teria que nascer de novo, eu sentia que havia nascido.
- Obrigado. - Falei - Vou dormir um pouco, amanhã tem muitos exames para poder fazer.
- Ethan... Eu sei que você está me evitando, mas você sabe que uma hora ou outra você vamos ter que conversar. - Robert disse sério, sua voz me deixava desconcertado, e eu tinha medo do que poderia acontecer. Sim, eu estava evitando falar com ele, por que eu estava evitando dizer para ele o que eu tinha a dizer - Pode ser agora?
Respirei fundo e assenti. Desencostei da porta e desequilibrei, cambaleando para trás. Tentei me segurar em algo, mas parecia que eu estava num vão, sem nada para me apoiar, e a escuridão dos meus olhos apenas piorava a situação. Ouvi os passos rápidos de Robert, e logo em seguida as suas mãos envolveram minha cintura.
- Tudo bem? - Robert perguntou, seu hálito quente banhando o meu rosto, e pouco a pouco eu sentia sua boca se aproximar da minha.
Eu estava assustado e ofegante, mas tive astúcia e velocidade para colocar a minha mão entre as nossas bocas. Meu polegar contornava os lábios carnudos de Robert, sentindo a boca suave dele, e a desejando na minha boca.
Ele me beijou, e eu correspondi. Nossas bocas se beijavam loucamente, matando toda a saudade e a vontade. A língua de Robert tentava invadir a minha boca e eu dava risada da tentativa falha dele. Separei nossos lábios rindo tateei o peito de Robert. Finalmente, agora eu tinha certeza do que diria, e convicção do que eu queria.
- Deixa eu ir para o Brasil com você. - Robert disse feliz - Vamos recomeçar! Vamos reatar o nosso noivado, vamos nos casar. Ethan, eu quero passar a minha vida toda ao seu lado, vamos...
- Robert. - Eu o interrompi sorrindo - Eu não posso ficar com você. Nem aqui, nem no Brasil... Eu não amo você Robert... - Silêncio - Sinto muito Robert, mas não dá pra recomeçar do meio. Você foi o primeiro na minha vida. Meu primeiro namorado, a minha primeira transa, o meu primeiro amor... Mas eu quero mais. Quero namorar mais, eu quero amar mais, eu quero... - Dei uma risada boba - Quero transar mais. Eu quero viver.
- Ethan... Nós... Eu e você... - Robert não sabia o que dizer, e eu tentava entender ele.
- Nós... Você e eu... Foi uma fase maravilhosa da minha vida. - Falei me soltando dos seus braços - Mas foi só uma fase. E fases acabam. Seja livre Robert, e me deixa ser livre. Por favor.
- Se você soubesse o que eu fiz pra poder ficar ao seu lado... - Robert passou a mão no meu rosto - Mas tudo bem, eu posso esperar. Eu amo você, e se um dia você quiser voltar eu estarei esperando você.
Suspirei e assenti. Eu não queria discutir sobre o futuro, só queria viver o meu presente, a presente que poucas pessoas têm o privilégio de viver, o meu presente era um renascimento.
- Agora eu realmente preciso dormir. - Falei - Pode me levar até a cama?
Robert apenas suspirou e me conduziu até minha cama. Eu me despedi dele com um boa noite e fechei os olhos, mesmo que não fizesse diferença alguma. Agradeci novamente a Deus por cada detalhe que eu ainda podia viver. Pelo lençol frio e pela noite lá fora, que eu não podia ver, mas eu agradeci pelas pessoas que estavam vendo e não agradeceram por isso. Agradeci por tudo o que minha mente permitiu que eu agradecesse antes de adormecer.
(...)
A semana se passou numa velocidade absurda, e eu passei quase todo o tempo aprendendo a me locomover sozinho. Gabrielly finalmente estava voltando a ser a mesma de sempre, e até caçoou da minha cegueira. Ela me deu uma bengala para deficientes visuais e disse que era meu presente de aniversário.
E falando em aniversário, lá estava eu, envolto de gente que eu não conhecia e sendo bajulado por todos que passavam por mim. Eu dava risada e tentava parecer menos cego para não receber os elogios falsos e carregados de compaixão. Eu até me fingi de surdo algumas vezes, e fingi não ouvir o senhor Fernandez e o senhor Kile contando a minha deficiência.
- Acha que ele está surdo também? - Reconheci a voz de Katherine mesmo entre os risos.
- Não sei, talvez. - Essa era a voz de Arthur.
- Não estou aleijado. - Falei - Ainda posso socar a cara de vocês dois.
Eles sorriram e vieram me abraçar. Katherine me contou as novidades sobre ela, que estava em um relacionamento sério, e até estava usando aliança no dedo. Arthur contou que estava namorando também, mas que a garota era de outra cidade. Eu até pensei na possibilidade deles estarem ficando entre si, mas lembrei que Katherine também era homossexual. Eu contei que iria para o Brasil e que iria recomeçar e etc.
- Filho... - Mamãe disse sorrindo - Esse aqui é o oftalmologista que eu contratei para você. Doutro Thiago, esse é o meu filho.
- Mãe, pensei que já tínhamos conversado sobre isso, e eu iria me tratar no Brasil. - Falei - Desculpe doutor Thiago, acho que seus serviços não serão necessários.
- Sem formalidades Ethan. - O doutor Thiago me deu uma sensação de flashback, mas eu ignorei - Não lembra de mim? Do jantar de negócios com o seu pai... Thiago... Filho do Fernandez...
- Thiago? - Eu perguntei surpreso - Caraca eu não sabia que você era oftalmologista, eu nem sabia que você já tinha diploma e tudo, caramba.
- Eu falei que estava cursando medicina, mas não falei em que área estava me especializando não é mesmo? - Thiago disse enquanto eu ria - Então, em relação à sua viagem ao Brasil, eu sinto em lhe informar que sua mãe me contratou antes de você fazer dezoito, então... Bem, você só poderia viajar com um laudo médico.
- Que você com certeza não vai me dar por pedido da minha mãe. - Falei chateado, e de repente toda a alegria da festa pareceu se esvair.
- Foi exatamente o que a sua mãe me pediu, mas eu a convenci a deixar você voltar para o Brasil e viver por lá - Ele disse e eu me animei - Se... Você permitir que eu vá com você. Sua mãe e eu já até achamos uma casa especial para você poder se adaptar.
- E por que você quer ir comigo? - Perguntei meio desconfiado.
- Pra começar porque você é meu primeiro cliente, já que eu me formei agora no final do ano, e por que sua mãe me pediu pra ficar de olho em você.
- E se hipoteticamente eu aceitar... Quando nós vamos poder ir?
- Hipoteticamente quando você quisesse. - Thiago disse rindo - A casa já está mobilada, e minhas passagens já estão comigo.
(...)
- Tá tudo pronto? - Mamãe perguntou - Roupas de frio, de calor, dinheiro... Tem alguma coisa aí pra comer durante o vôo? A comida do avião é uma bela porcaria. Toma, leva esse salgadinho e esse suco, eu comprei por que sabia que você ia se esquecer.
- Mãe... - Falei - Eu tô bem, tá tudo aqui, obrigado pelo aperitivo... Eu te amo.
Mamãe me abraçou pela centésima vez naquele dia, mas dessa vez eu não me importei. Apenas me afastei depois para me despedir dos outros que estavam ali.
- Boa sorte filho... - Papai estava chorando - Eu amo você... Volta logo.
- Eu também te amo pai. Me liga pra dar notícias tá bem? - Falei abrindo os meus braços para um abraço.
Ao contrário de mamãe, aquela era a primera vez que eu abraçava o meu pai naquele dia, e não que eu esteja desmerecendo os abraços de mamãe, mas esse abraço de papai era tudo o que eu mais queria. Sorri ao lembrar que há alguns meses eu não queria nem olhar para ele, e hoje eu precisava dele como nunca. Apesar de tudo ele era o meu herói.
- Se você não voltar logo, eu vou te buscar pelos cabelos sua bixa desgramada! - Gabrielly não conseguiu parecer ameaçadora, mas me fez chorar - Eu te amo muito, por favor não deixa eu viver sem você!
- Para com isso vadia! Se desse tempo de comprar as suas passagens eu te levaria comigo. - Falei - Eu também te amo muito.
- Repete.
- Eu também te amo muito. - Falei estranhando.
- A parte das passagens.
- Se desse tempo de você comprar as suas eu te levaria comigo. - Repeti.
- Ótimo, eu comprei minhas passagens a uns dois dias. - Ela falou feliz - Vou pegar as minhas malas no carro!
Fiquei quieto e sorri. Senti duas mãos pegarem as minhas, e o cheiro de terra molhada e menta me proporcionarem prazer apenas por senti-ços.
Christopher apertou minha cintura e colou nossos corpos como costumava fazer antes. Seu corpo grande ainda se encaixava perfeitamente no meu, e por um momento eu quis desistir de tudo por ele, e para poder ter aquele corpo só para mim.
- Eu amo você. - Ele disse e beijou o meu pescoço, me apertou mais e beijou a minha orelha, depois a minha bochecha - Pra sempre.
- Eu também te amo. - Falei - Para sempre.
Passei a mão no rosto de Christopher e deixei os nossos lábios se tocarem. Eu precisava disso, eu merecia me despedir do amor da minha vida.
Nossos lábios logo começaram a pegar fogo, e eu não estava me importando com quem parava e nos olhava. Eu não podia ver os olhares mesmo.
Nossas línguas se encostaram, causando uma sensação térmica deliciosa na minha boca, e eu quis ter mais. Minhas mãos percorreram as costas de Christopher e desceram, chegando até seu membro e o massageando. Christopher deu um gemido e uma risada e apertou minha bunda.
Nos separamos quando não tínhamos mais ar em nossos pulmões. Dei um sorriso tímido.
- Foi como beijar o meu irmão. - Falei.
- Foi ótimo. Foi como beijar a única pessoa que eu amei de verdade, e a única que eu vou amar.
Chris encostou sua testa na minha e me deu um selinho. Eu definitivamente amava aquele homem.
- Bom gente, vamos? - A voz de Gabrielly surgiu e me fez dar um passo para trás.
- Vamos. - Thiago disse.
Respirei fundo e imaginei como estaria a cena agora. Mamãe e papai lado a lado, Christopher me olhando e sorrindo... Eu não podia vê-los, mas eu sabia que eles estavam ali, e eu amava isso.
- Adeus. - Eu disse e peguei no braço de Gaby, que me acompanhou até o portão de embarque.
Você já se perguntou por que a minha história foi nomeada como "Entre Dois Corações"? Talvez você pense que devido ao amor que eu sentia por Christopher e por Robert, mas na verdade eu nunca fiquei confuso em relação a eles. Eu amei Chris desde a primeira vez que o vi, formalmente vestido no enterro de mamãe. Eu o amei desde sempre. Eu fiquei sim entre dois corações, mas foram os meus corações. O coração de um Ethan sensível e amoroso, que Jamais faria mal a uma mosca, e o coração de um Ethan destemido e sarcástico, que sabia ser frio e fechar os olhos, que sabia atirar e se defender. Ambos os Ethan's fortes, mas de jeitos diferentes.
Qual Ethan eu escolhi ser? Eu escolhi ser os dois, porque os dois eram parte de mim, porque ambos são parte de mim, e ambos se tornaram no fim de tudo, um único coração. O meu coração.
∞ FIM ∞