Dois - Fantasma de Um Passado Morto

Conto de historiador como (Seguir)

Parte da série Ensina-me a Amar

Ensina-me a Amar

[Capítulo 2 - Fantasma de Um Passado Morto]

“Não quero que você sofra por minha causa. Não quero ser aquele que juntou os cacos do seu coração, o concertou e o quebrou novamente em pedaços microscópicos. Eu não tenho um bom histórico emocional, talvez eu não saiba amar, nem sequer sei o que é o amor… Mas estou disposto a aprender, se você estiver disposto a me ensinar. Eu posso não saber de muita coisa, mas uma coisa da qual eu tenho certeza é que eu não vou desistir de você, não vou deixar você partir. Eu posso até estar enganado, mas dane-se, prefiro me equivocar e errar, nas não posso deixar de dizer o quanto eu amo você.”

Às vezes as pessoas se perguntam como foi que as coisas mudaram tanto, e como fazer para voltar a ser como já foram antes. Eu sei exatamente como minha vida mudou para o fiasco em que está agora, mas não sei como fazer para voltar a ser como já foi um dia.

Estar no meu quarto na situação em que eu estava não era meu passatempo favorito, mas chorar era aliviante, e eu me encontrava nessa situaçao contraditória, que eu não queria chorar por motivos idiotas, mas precisava chorar para aliviar todas as minhas tensões emocionais.

Mas o fato é que não importa quantos litros de lágrimas ou quantos rios meus olhos conseguissem formar, minhas tensões emocionais nunca se dissipariam, porque elas estão cravadas como estacas e cicatrizadas como cortes no meu coração, o único lugar que não pode ser curado, já que não pode ser tocado.

Esfreguei os olhos e sequei minhas lágrimas. Fingir estar bem era minha segunda melhor habilidade. A primeira era não me importar com os sentimentos alheios. Sim, eu era bom nisso.

Respirei fundo e comecei a me vestir, afinal, quando você decide morar sozinho tem que arcar com a responsabilidade de sustentar a si mesmo e às despesas da sua casa. Coloquei um jeans skinny preto, uma camiseta socia branca e um sapatenis preto.

Moro em um apartamento na Zona Sul de São Paulo, e trabalho Eu trabalho como estagiário-barra-secretátio-barra-atentende-barra-administrador no escritório de advocacia do meu melhor amigo, no litoral.

Penteei meu cabelo para o lado com os dedos porque estava com preguiça de arrepiar. Em plena segunda-feira e eu tinha que percorrer cerca de 115 quilômetros para ir trabalhar.

Saí do apartamento e fui em direção ao estacionamento. Eu tenho um Jeep Compass preto que ganhei dos meus pais quando fiz dezoito anos de idade.

Por um instante senti falta das broncas caretas, e da minha mãe que sempre me pedia para me cuidar. Eu sempre fui um garoto cuidadoso, mas sempre dobrava minha atenção quando mamãe dizia "Se cuida, fica com Deus".

Sorri lembrando dos velhos tempos e adentrei no meu Jeep.

Coloquei o cinto de segurança, engatei a primeira marcha e pisei na embreagem. Soltei o freio de mão e pisei no acelerador. Eu não tenho o costume de dirigir rápido, mas eu estava num dia anormal hoje, então corri à 90 quilômetros por hora na terceira marcha. Nesse ritmo, eu chegaria ao escritório em menos de uma hora e meia, trajeto que geralmente demora mais de duas horas.

Conectei meu pendrive no aparelho de som do Jeep e deixei minhas músicas favoritas tocarem.

- " This time, this place

Misused, mistakes

Too long, too late

Who was I to make you wait?

Just one chance, just one breath

Just in case there's just one left

'Cause you know, you know, you know" - eu cantava descontroladamente, sentindo minhas lágrimas se formarem novamente no canto dos meus olhos.

Eu atraí por onde passava alguns olhares de estranhamento, outros de admiração, mas no geral, eu simplesmente atraí muitos olhares. Povinho sem vida.

Cheguei no escritório quase rouco e com os olhos num tom quase imperceptível de vermelho.

- Bom dia! - Disse Felipe, meu melhor amigo.

Ele me abraçou e passou a mão no meu cabelo, bagunçando ele.

- Bom dia... - Falei sem muita vontade, mas consegui ser convincente. Afinal, em plena segunda-feira não tem como ter um bom dia.

Fui para a minha mesa e Felipe me seguiu com algumas pastas e papéis nas mãos.

- Noite ruim? - Ele perguntou, sentando na minha mesa.

- Noite maravilhosa! - Falei me lembrando de Gabriel.

- Hm, deve ter dado muito. - Felipe disse com cara de sonhador, fingindo imaginar a cena.

- Ai nojento! - Falei rindo - Ele era lindo, gostoso... Perfeito!

- Pegou o número dele?

- Sabe que eu não mantenho contato com os meus crushes.

- Crushes? - Felipe estranhou a expressão.

- Sim, melhor que falar... Deixa quieto!

Felipe riu e ficou sério.

- Anjo, você não pode se prender ao passado... Tem que superar o que aconteceu. Ou não vai ter uma vida emocional jamais.

- Eu já superei - Falei - Mas não me peça para acreditar em amor, por que eu simplesmente não acredito! Não amor entre dois homens.

- Não estou pedindo para acreditar. Se não acredita em amor tudo bem, mas pelo menos se entregue à paixão.

- Não existe paixão depois da primeira noite de sexo. - Falei.

Felipe se inclinou em minha direção, deixando seu hálito refrescante banhar o meu rosto.

- Passa uma noite comigo e eu faço você mudar de opinião. - Ele falou com convicção.

- Sai daqui! - Falei rindo e o empurrei.

Felipe gargalhou e fez cara de sexy.

- Vai recusar um homão desses?

Me levantei rindo, como se Felipe tivesse dito alguma piada realmente efetiva. Mas não era piada. Felipe era realmente lindo. Olhos azuis marcantes, cabelo negro arrepiado e barba mal feita. Seu corpo era o de um atleta. Barriga trincada, cheia de gomos e braços fortes.

Felipe desabotoou os dois primeiros botões da camisa social, deixando à mostra grande parte do seu peitoral liso e forte. Me aproximei e abotoei sua camisa.

- Preciso que você carimbe essas folhas e faça um cheque no valor de seis mil. - Felipe me pediu entregando as pastas.

Peguei e me sentei. Molhei o carimbo na tinta e comecei o meu trabalho.

- Seis mil? - Estranhei o valor alto do cheque.

Felipe assentiu sem dar satisfações sobre o valor e foi para a sua sala.

Eu olhava de relance as folhas enquanto as carimbava. Imposto de renda, conta de água, energia elétrica, aluguel, telefonia, internet... Pouco depois eu concluí o serviço e levei as folhas até a sala de Felipe.

- Já pensou em um concurso público? - Perguntei assim que entrei na sala - O governo paga muito bem por advogados e promotores públicos.

- Não vou fechar o meu escritório. - Felipe disse simpático - As coisas vão melhorar.

- Não seja idiota Felipe! - Falei bravo - Sei que estamos passando por uma crise, e eu não estou falando de fechar o escritório, só fazer uma reforma.

- Fora de cogitação Thiago!

Ficamos em silêncio e Felipe respirou fundo.

- Sei que você está fazendo isso por mim, mas não precisa. - Felipe disse.

Permaneci em silêncio.

- Hey bebê... - Felipe se levantou e me abraçou - Não fique assim. É só uma fase.

- Ok.

- Ainda te amo! - Ele sussurrou - Queria não ter te deixado antes.

- Não vamos tocar nesse assunto - pedi desconfortável - e não, você não me ama. Você ama a sua noiva e essa criança que está por vir.

Me soltei do abraço dele e voltei para a minha mesa. Joguei anúncios de advocacia no Google, procurando algum caso que precise de um advogado, mas aparentemente as pessoas não buscavam mais advogados particulares.

Respirei fundo e concluí que meu cérebro estava com menos oxigênio que deveria ter, mas se Felipe não queria se salvar da falência, eu o salvaria. Mesmo que meu orgulho tivesse que ser ferido.

Deixei um bilhete na mesa avisando que eu voltaria em breve e saí do escritório.

Conduzi meu Jeep até a praia, que ficava a 15 minutos do escritório. Eu sentia meu coração acelerar a cada centímetro que me aproximava daquele lugar onde eu jurei nunca mais colocar os pés.

Estacionei o Jeep perto da praia e me aproximei da casa que antes era um rio de realizações, e hoje se tornara parte do meu tormento. Bati na porta sentindo cada detalhe da madeira autêntica. Do lado de fora deu para ouvir o “ja vai” de uma voz feminina.

A porta se abriu lentamente, e um homem apareceu sem camisa, descalço e com uma bermuda. Um sorriso cínico brotou no rosto perfeito dele - o sorriso pelo qual eu me apaixonei a quatro anos atrás.

O primeiro olhar foi de estranhamento, mas logo o sorriso dele quis me contagiar como fazia antigamente.

- Você está diferente. - A voz dele era como o sussurro de um fantasma para mim - Está lindo. Mais lindo quero dizer.

- Obrigado. - Tentei não ser frio com as palavras.

- Pensei que você me odiasse.

Eu odiava, mas ele estava lindo como nunca. Os olhos castanhos brilhavam e sua boca era tentadora, seu corpo permanecia a escultura que eu sempre idolatrei, com músculos na medida certa. Ele deixou a barba crescer e cortou o cabelo num estilo militar. O desenho de uma cobra envolvia seu braço esquerdo, sua pele era bronzeada ele parecia mais homem, mais perigoso. Um homem que por muito tempo eu chamei de meu. Ele estava completamente sexy e tentador.

- Eu odeio. - Confessei - Mas preciso da sua ajuda.

Leonardo abriu um sorriso safado e se apoiou no batente da porta cruzando os braços sobre o peitoral desnudo.

- Também pensei que não precisava de mim e que nunca mais fosse me procurar.

Eu o odiei mais por isso. Odiei por ter que procurá-lo e por ele ser a única pessoa que podia ajudar o meu melhor amigo. O odiei por estar lindo e despertar em mim um desejo que eu jurei exterminar. O odiei por me fazer quebrar todas as minhas juras e promessas.

[contínua]

É isso gente, mais um capítulo que se acaba, e espero que tenham gostado.

A música que o Thiago canta é { Far Away - Nickelback }

Obrigado a todos

Contato [luccipriano@gmail.com]

U

Comentários

Há 1 comentários.

Por gatinho07 em 2014-11-18 15:21:46
Muito bom sua historia , camarada. Bastante complexa, mas tenho certeza que aos poucos vamos intender o pq de tanta mágoa. Continua.