Quando o Redentor Chama - Capítulo I

Conto de Grim3ss como (Seguir)

Parte da série Quando o Redentor Chama

Quando deu 11 horas da noite eu vi que estava na hora do ritual. Ritual? Sim. Eu e meus amigos decidimos dar esse nome ao nosso encontro semanal no bate papo da UOL. Sempre aos finais de semana, nosso grupo composto por 10 pessoas invade a sala de “rockeiros” e ficamos por lá por altas horas. Como eu sempre fui antissocial e nunca soube como iniciar uma amizade no mundo “real” entrar em bate papos se tornou quase que um vício. Fiz muitas amizades por lá. Aliás, conheci todos meus amigos virtuais graças aos chats da vida.

Ligo meu notebook e logo em seguida já digito na barra de pesquisa: bate papo uol. Entro no link principal e navegando no site acho a sala já conhecida e entro. Meu nick usual sempre foi “Satan’s baby”, bem satânico não é mesmo? Nunca consegui entender o porquê, mas sempre tive uma predileção por coisas mais obscuras, e como na sociedade cristã não existe uma figura mais tenebrosa do que a de Satanás eu acabei por ter uma grande consideração pela sua figura. Quando estamos na sala discutimos sobre tudo, mas o foco principal não poderia ser outro se não música. Novos singles que foram lançados, álbuns, bandas novas, tudo se entra nas nossas conversas, até mesmo as brigas que eu tenho com meu amigo Fernando que adora criticar o meu metal gótico. Como alguém pode falar mal de Lacrimosa enquanto escuta Cannibal Corpse?

Entro na sala ‘rockeiros 1” e para minha surpresa está quase que totalmente vazia. Estranho. Aos sábados o chat é extremamente movimentado, então encontrar cerca de apenas 5 pessoas online é de se estranhar. Mas pouco a pouco a situação começa a mudar e Nicks conhecidos como: Barbie from hell, CrazyLuk e CanniFan surgem na tela. O assunto começa a rolar até que o foco se torna o novo álbum do Marilyn Manson. MM era uma das minhas bandas preferidas na adolescência, mas com a mudança de sonoridade, letras e etc, eu meio que fui perdendo o gosto por eles ao ponto de não ter mais aquela excitação de ir escutar algum lançamento. Como eu ainda não havia escutado o álbum pra ter uma ideia real de como estava, decidi por deixá-los debatendo enquanto ia pegar algo para comer. Vou a cozinha, pego um biscoito recheado e quando volto ao meu quarto meu notebook estava travado.

- Merda

Tento mexer o cursor usando o touchpad, mas minhas tentativas não resultam em nada. Seguro por alguns segundos o botão de ligar/desligar e logo depois a tela antes parada fica preta. Tenho feito tanto isso com meu notebook esses tempos que tenho certeza que ele não vai passar desse ano. Por sorte não foi dessa vez que ele queimou. Reabro as páginas perdidas e quando chego no chat noto algo de estranho. Lembro que pouco antes de sair a sala devia ter em torno de vinte e cinco pessoas online, mas agora vejo que a mesma só possui cinco pessoas online e nenhuma delas eu conheço. Entro no Skype, vejo quem está on por lá e não vejo ninguém. Será que minha presença era tão importante que quando eles viram que eu saí todos resolveram sair também? Acho pouco provável. Espero um tempo para ver se eles voltam, mas em vão. Vejo que já passa da meia noite e as mesmas cinco pessoas continuam lá. O mais curioso de tudo isso é que a barra de rolagem da página estava parada desde a hora que eu voltei, como se aquelas pessoas simplesmente não falassem nada ou estivessem apenas mandando mensagens privadas uma para a outra. Com um restinho de esperança resolvo visitar outros sites para passar o tempo enquanto espero aqueles fdps voltaram. Vejo alguns vídeos no youtube e depois de mais ou menos 30 minutos olho mais uma vez a aba que eu havia deixado de lado. E tudo continuava do mesmo jeito. Cinco pessoas e zero mensagens.

Já estava quase saindo do site quando uma nova pessoa entrou na sala com um nick que me chamou bastante atenção. O nick do desconhecido era Fassade, e para quem não sabe esse é o nome de um dos melhores álbuns da banda Lacrimosa. Digito um oi em modo reservado para aquele ser, mas antes que eu conseguisse clicar no enter o mesmo nick me manda uma mensagem contendo um “oi’. Começamos a conversar e aos poucos fui descobrindo quem era aquela criatura anônima.

O nome dele é Diego, tem 23 anos e por coincidência ele também mora aqui em Fortaleza. Nunca achei ninguém da minha cidade nesses chats, então encontrar alguém daqui foi uma surpresa. Diego ama mais Lacrimosa do que eu, e olhe que eu achava ser o fã número um deles. Ficamos nos falando por bastante tempo. Quando reparei a hora no relógio do computador já vi que passava das 3 da manhã. Despeço-me dele, mas antes que eu saísse ele me pede o número do meu Whatsapp, e como eu nunca tive problema em passá-lo dou a ele. Desligo o aparelho e pouco menos de 5 minutos depois escuto uma nova notificação no celular. Vejo que é um número desconhecido e suponho ser Diego. Desbloqueio a tela e em seguida abro a notificação. Respondo sua mensagem e como é de se esperar clico na sua foto de perfil para ter uma ideia de como esse possível novo amigo seja. A foto do seu perfil quase não é visível, era como se Diego tivesse-a tirado em um local quase que em breu total. Apenas consegui distinguir certas formas sob a escuridão da fotografia quando coloquei o brilho de meu celular no máximo. Peço a ele uma foto mais nítida, mas ele se recusa a mandar, pois segundo ele sua timidez não permitia que ele as tirasse. Como nosso papo continuava a fluir de forma muito boa acabei por aceitar essa sua desculpa. Nos falamos por mais alguns minutos até que vejo que já é muito tarde. Dou tchau a ele e desligo a conexão da internet com meu celular.

Nesta noite tive uns sonhos estranhos. Não eram pesadelos, eram apenas sonhos, mas eram tão sem sentido que não sei dizer se me causaram coisas boas ou ruins. Eram imagens distorcidas, e para piorar era como se meu cérebro as apresentasse não em velocidade normal, mas sim de uma forma bem mais rápida que a habitual. Eu via relances de banquetes, não conseguia entender o que comemoravam, mas via que ao mesmo tempo que as pessoas riam descontroladamente, outras choravam em intensidade bastante similar. Mas o que me chamou mais a atenção foi que entre essas cenas um loop de uma imagem ficava sempre se repetindo. A cena que se repetia constantemente era a mais nítida entre todas elas. Eu e um homem estávamos numa floresta, estávamos como se numa discussão. Eu não conseguia dizer o que falávamos um ao outro pois a língua que usávamos era muito diferente do português usual. Eram sons crus, nem sei se poderiam realmente representar palavras. Sinto lágrimas escorrerem por meu rosto, entretanto não eram de tristeza, eram de ódio. Depois que a discussão se apaziguava, eu saia andando pela floresta, sem rumo algum, mas eu sentia que devia sair dali o mais rápido possível, eu não era bem-vindo.

O despertador toca como sempre as 6 da manhã e me recuso a levantar por alguns minutos. Fico deitado pensando no que sonhei, porem meu foco logo é tomado pelas lembranças da conversa que eu tive com meu novo amigo. Eu devia ter perguntado logo a ele se ele é gay. Admito que mesmo não tendo visto o rosto dele direito, só pelos rumos e pela conexão que tivemos uma pitada de interesse me temperou. Resolvo me levantar e pego meu notebook que havia deixado ao lado da minha cama na madrugada passada. Assim que a internet é conectada entro no Skype para ver se alguém falou algo no nosso grupo. Ainda acho estranho todos terem sumido de uma hora para outra.

Quando entro no grupo noto uma coisa estranha. Várias mensagens perguntavam sobre mim em um espaço de tempo entre meia noite e duas da manhã, no entanto durante esse tempo eu estava online tanto no Skype quanto no chat. Por que essas mensagens não apareceram para mim ontem? O que me deixou mais assustado porém foi quando li algumas mensagens de Fernando e Amanda. Eles falavam que meu nick esteve online no bate papo a noite quase inteira, mas que mesmo mandando milhares de mensagens para mim eu nunca os respondia. Abaixando um pouco mais a conversa vi que havia um print da sala as uma e meia da manhã. Meu nick estava sim lá, e pra deixar tudo mais esquisito haviam trinta pessoas online até aquela hora. Meu corpo estremeceu. Durante todo o tempo que eu estive naquela sala de bate papo o máximo de pessoas que surgiram para mim foram seis, por que as outras vinte e quatro pessoas simplesmente desapareceram?

Comentários

Há 0 comentários.