Agarre-se aos 16 - Parte 2

• Agarre-se aos 16 - Parte 2

Eu ainda estava apavorado com a cena quando ouço:

– Você está bem? Ele te machucou?

Não respondi nada. Ainda estava petrificado com a situação.

– Responde caralho!? Você está bem?

O tom mudou de preocupação para preocupação, raiva e medo. Quando me dei conta da situação consegui responder:

– Sim, estou bem... E obrigado.

Vi a sombra indo em direção a mim quando Eu, em tom de misericórdia disse:

– Por favor, não me machuca!

A voz rouca me respondeu:

– Eu não vou fazer nada com você. Não bato em pessoas como você.

Ao ouvir isso consegui ficar de pé e sair da cabine. Não acreditei no que vira, era José. Estava arfando de raiva. Eu não sabia o que fazer. Quando ele se aproximou de mim Eu não tive outra reação a não ser dar um passo para trás. Ele se aproximou de novo e em um ato reflexo fiquei na ponta de pé e abracei-o. Não sei como ele reagiu naquele momento, mas ele não me tirou do abraço. Ele não me apertava, não teve reação. Então tive coragem de olhar para o rosto dele e friamente ele me disse:

– Nunca mais faça isso, entendeu?

Só podia dar uma resposta naquela hora:

– Você me salvou de um nojento e Eu só quis agradecer...

Ele me interrompeu dos agradecimentos e disse friamente:

– Nunca mais faça isso, entendeu?

Meus olhos encheram de lágrimas e sai correndo com medo daquele José que Eu vira. Uma coisa era certa: Ele me salvara duas vezes de muitas situações constrangedoras, mas sempre que iria agradecer, ele me tratava como um lixo. Era algo normal? Eu não sabia, Eu queria realmente entender o que se passava na cabeça dele. O que ele realmente queria.

A semana passou voando e Eu não queria puxar assunto com o José. Ele não me olhava, não falava, evitava qualquer tipo de contato comigo.

...

No ultimo dia de aula (Num sábado. Sim, havia aulas aos sábados), meu pai me deixou e encostou o carro no estacionamento. Ele nunca fizera aquilo. Era a primeira vez. Fui para a minha sala e sentei em minha cadeira, olhei para José e... Nenhuma reação nos olhos dele.

A professora entrou na sala com o sorriso de um canto da boca ao outro e meu pai a seguia. Pensei comigo: "Que merda meu pai vai fazer?... Apenas sorria e concorde.".

Meu pai também abriu um sorriso que conseguia ser maior que o da professora e começou a falar:

– Na terça feira haverá uma festa em comemoração ao 16º aniversario de meu filho – Nessa hora abaixei a cabeça. Não estava envergonhado pelo meu pai, estava envergonhado por não ter amigos – terá tudo do bom e do melhor.

Na hora Sofia sorridente perguntou:

– Mas quem é seu filho, Senhor Geraldo Almeida?

Eu ouvia uma voz orgulhosa na voz de Sofia, sabia que meu pai era importante naquela cidade, mas não ao ponto de fazer as pessoas se orgulharem em ter a oportunidade de falar com ele, quando ele diz:

– O Walmir Almeida Paiva.

Todos olhavam para mim. Encarei cada um e meu pai disse:

– E então quem vai?

Todos responderam como que em um coral:

– Eu!!!

Meu pai foi em minha direção, me deu um beijo na testa e disse:

-Fica com Deus meu filho.

Falando isso ele se foi. Eu estava morto, não pelo seu beijo, mas sim pela falsidade de alguns para comigo. Vi quando Sofia se levantou e disse:

– Não acredito que ele é seu pai! Você se veste como um pobretão.

Não dei ouvidos ao comentário dela. Mesmo depois de quase de uma semana naquela escola, muita coisa havia acontecido. E por mais que meu pai quisesse comprar roupas de marca pra mim Eu não ligara para luxuria e me contentava com o pouco que tinha.

Lembro-me de ter pensado: "Já que eles vão à festa, Eu tenho que ao menos deixa-los de queixo caído".

Era a hora do intervalo quando recebo uma daquelas cartas infames. Abri a carta e vi escrito: "José, banheiro, hora da saída. Rasgue isso!".

Eu esperava ansiosamente para a hora da saída. Eu não sabia o que estava sentindo. Era tudo muito novo para mim. Pensei: "Será que ele vai me achar feio?" e a ficha caiu: "Por que Eu me iludo tanto?".

O sinal tocou e Eu esperei um pouco até que todos foram embora.

Eu cheguei ao banheiro procurando por José, ele não me respondeu. Quando saí, vi Marcos, que falou:

– Hoje você não me escapa!

– Por favor, não me estupra nem me beija. – Disse num impulso.

Marcos então disse:

– Eu não vou fazer isso. Vou descarregar minha raiva em você. Vou te espancar, seu veado de merda.

Na hora Eu chorei, gelei e senti sua tapa em minha cara. Eu caí e estava escuro quando ele me deu uma ponta pé na minha barriga que cheguei a ficar sem ar. Quando ele me puxa pela gola da camisa e me acerta um soco no meio do rosto que me fez desmaiar.

...

“É o meu fim” Eu pensava.

...

Eu ouvia uma voz preocupada chamando meu nome:

– “Walmir? Walmir? Você se sente bem?".

Enfim consegui abrir meus olhos. Vi um homem vestindo uma roupa toda branca e com um sorriso na cara. Na hora, meio que inconsciente, perguntei:

– Estou no céu?

Sei que foi uma idiotice, mas foi a única coisa que saiu. O homem olhou meu estado e disse para alguém que estava ao seu lado:

– Ele está bem. Está voltando ao normal. Não o force a falar nada. Ele vai se recuperar aos poucos. Se você não o encontrasse talvez ele estivesse pior. Parabéns rapaz. –Houve uma pequena pausa quando o medico concluiu: – Vocês são irmãos... Primos... Parentes?

Uma voz rouca e firme respondia:

– Não. Sou amigo dele. Vou ficar aqui até o pai de ele chegar.

Eu sabia de quem era a voz. Era José. E não tinha como negar, Eu estava feliz por ele e não meu pai ou minha mãe estarem ali.

O médico nos deixou a sós. José nada falou e Eu não queria assustá-lo.

Eu criei coragem e enfim perguntei:

– Por que me salvou? Você sabe o que ele fez comigo?

Não ouvi nada. Até que uns dois minutos depois ele me responde:

– Te salvei por que sabia que algo havia acontecido. Marcos estava todo sorridente quando me disse: "É né cara? Tem que aliviar a tensão em otários pra não machucar as minas.". Como você não tinha saído, percebi que ele tinha feito algo com você. Corri pelos corredores da escola. Procurei sala por sala, quando me lembrei do lugar onde Marcos te fez de vitima: O banheiro. Corri até lá e te vi caído no chão. – Ele alterou seu tom de voz - Eu fiquei puto. Minha vontade era de bater na cara dele, mas estava com medo de que acontecesse algo com você. Pus-te em meu carro e te trouxe pra cá. Eu vou matar aquele desgraçado!

Eu estava feliz ao ouvir aquilo. Ele realmente se importava comigo. Criei coragem e perguntei:

– Você me esperou até a hora da saída?

– Sim. Se algo acontecesse com você, Eu não me perdoaria. Eu não sei o porquê, mas tenho medo de te ver magoado. – José falou no mesmo instante

Eu sorri. E por mais que parecesse besteira, Eu me sentia amado. Por mais que José não quisesse nada comigo, Eu o amava e ponto final.

José esperou até que meu pai chegasse. Meu pai o agradeceu e disse que haveria uma homenagem para ele em minha festa. Não sei como José ficou, mas Eu fiquei feliz.

Meu pai me levou para o carro e começou todo o interrogatório:

– Quem te fez isso e por que fez? Tem algum motivo? Você se envolve com drogas? Não quero te ver em brigas! Quando Eu descobrir quem te fez isso, vou colocar esse marginal na cadeia...

Eu interrompi meu pai:

– Pai! Eu estou bem, isso é o que importa. Obrigado pela preocupação. Eu te amo.

Meu pai sorriu feliz. Era a primeira vez em quase dois anos que ele ouvira aquilo.

...

Era domingo de manhã, tomamos café Eu, meu pai e minha mãe. Estávamos felizes e meu pai contando tudo o que havia ocorrido a minha mãe. Ela estava horrorizada com tamanha violência e estava indignada com o meu silêncio. Antes que começasse o interrogatório falei ao meu pai:

– Teremos uma festa e preciso estar bem vestido.

Ele sorriu e disse:

– Pensei que gostava de se vestir como um filho de mendigo...

Não gostei do comentário, mas sorri para ele. Eu estava feliz. Finalmente me apaixonei por alguém, e de boa? Não importa o que José sentia por mim, Eu estava na dele e isso me interessava.

Meu pai me levou ao Shopping Recife. Foram longas horas de viagem até chegarmos lá. O Shopping é enorme e vi placas de estacionamento que iam do A1 ao G10. Pensei comigo: "Será que alcanço essas oitavas em uma música?". A resposta era obvia: "Claro que não. É um esforço sobre humano até pra mim que acho que tenho coloratura (Talvez esse termo não se aplique a homens), uma vez que alcancei de um E2 a um A6".

Meu pai vira a felicidade em meu rosto. Entrei pela Centauro e lá mesmo comprei uns sapatos bacanas. Adorei os tênis da Qix, Adidas, Nike, Puma e All-Star. Os únicos sapatos que usara antes de viver com meu pai eram aqueles sapatos de velhos e um All-Star. Depois fomos a C&A, Renner e Riachuelo. Além das lojas masculinas que Eu nunca tinha ouvido falar (Marcas não são meu forte). Comprei, comprei e comprei.

Meu pai liberou o cartão e Eu não tive pena. Comprei até roupa para ficar em casa. Eu estava tão feliz. Parecia pinto no lixo de tanta felicidade.

...

Voltamos para casa. Eu havia dormido a viagem inteira. Meu pai havia comprado presentes para a minha mãe. Depois de dois anos sem gostar daquilo, Eu realmente estava adorando ver os dois juntos.

À noite tomei banho e decidi ir à praça. Eu nunca havia feito isso. Sair pra me divertir. Eu estava muito feliz. Queria ligar pro José para conversar, mas não tinha seu numero. Não tinha o numero de ninguém daquela sala.

Vesti-me, pus uma das roupas que havia comprado. Era uma calça preta xadrez, Eu adorei. Ao me vestir ela ficava apertada. Assim como a maioria das roupas minhas roupas. Decidi por uma camisa branca de manga comprida e, por cima dela, um colete xadrez preto (Podem até pensar que Eu não me vestira bem. Não tenho senso de moda. Mas aquele conjunto era perfeito). Eu estava me amando aquela noite. Pedi para meu pai me levar até a praça. Ele me deixou e me mandou ter cuidado. Deu-me dinheiro e um beijo na testa. E falou:

– Se divirta, a noite é sua!

Eu saí todo sorridente e estava tocando umas músicas eletrônicas bem legais. Quando avisto de longe a Sofia. Ela estava no poste esperando alguém. Eu estava tão feliz que não me importara de dançar com qualquer pessoa. Começou a tocar "I Wanna Dance With Somebody" aí Eu me alegrei e a convidei-a para dançar. Ela disse:

– Estou esperando meu namorado.

Eu olhei pra ela e respondi:

– Não sabe o que tá perdendo.

Quando dei as costas sinto uma mão em meu ombro e Sofia fala:

– Então... O convite tá de pé?

Eu agarrei a mão dela e fui dançar no meio da pista. Começamos a cantar na parte do "Oh! I wanna dance with somebody! I wanna feel the heat with somebody...".

A música terminou e Eu estava apertado, precisava urinar. Sofia então me disse que o pai dela era dono de um bar famoso que fica próximo à praça. Fui ao bar, urinei, pedi um copo de 350 ml de coca com limão e um pouco de álcool, e quando volto para festa, vejo Sofia agarrada aos beijos com o José (que estava vestindo uma calça jeans e um casaco preto da Gran Sasso feito na Itália).

José beijando Sofia. Era a única coisa que Eu via. Estava arrasado. Aquela era a minha noite. Foi quando me veio a lembrança: Sofia recebendo ordens de José, ela era totalmente submissa a ele. Agora Eu entendia a relação José-Sofia.

Eu não estava feliz com a cena, porém não demonstrava nenhum sentimento. Sofia se desprendeu do beijo de José e falou uma coisa que soou meio que:

– Calma! Vou ao bar do meu pai resolver umas coisas com ele e hoje a noite é nossa.

Não sabia se era bem aquilo o que ela queria falar/ tinha falado, sou péssimo em ler lábios.

Sofia se afastou de José que enfim me notou. Pela primeira vez o via com cara de quem fez a coisa errada. Ele correu em minha direção. Eu saí andando no meio do pessoal. Era mais fácil para Eu desviar das pessoas, do que para José que é uma montanha de músculos. Eu estava desconcertado, sem querer derrubei o copo de coca-cola que Eu segurava. Eu não sabia o que fazer. Olhei para trás e não o vi mais me seguindo. Uma sensação de raiva e alivio tomaram conta de mim. Quando Eu finalmente chego ao fim da praça, uma mão enorme me puxa e pergunta num tom de raiva:

– O que você está fazendo aqui?

Eu estava assustado e comecei a chorar.

Sinto um abraço pela primeira vez de José. Ele nunca me abraçara até aquele momento. Evitava qualquer tipo de contato comigo. Mesmo com aquele abraço Eu ainda estava assustado.

José me pergunta num tom de raiva:

– Você viu o beijo, não foi?

E me desprendeu do abraço. Apenas assenti com a cabeça. Ele fez uma cara de ira e gesticulou como se fosse me bater. Puxou seu punho para trás e Eu em um ato reflexo ponho a mão em meu rosto (Não é que Eu seja fraco, mas odeio magoar as pessoas, ainda mais aquelas que Eu amo. Além do mais, Eu era ciente de que não podia contra José.). Eu tinha ficado com medo da surra de Marcos. Quando ouço um estalo na parede. Sim, José havia desferido um soco na parede. Eu estava com medo quando enfim consegui dizer, ainda chorando:

– Eu vou embora...

Ele não esperou que Eu terminasse de falar e disse:

– Vou te levar em casa.

Eu o interrompi e disse:

– Não precisa. Volta pra Sofia!

Ele com ar de fúria me interrompe novamente:

– Esquece o que aconteceu entre a Sofia e Eu! Aquilo não foi nada. Vou te levar em casa.

Na metade do caminho para casa ele começa uma conversa que não foi terminada na festa: A relação "Jose-Sofia":

– Olha Walmir, esquece o que você viu! Eu não quero te ver magoado e Eu sei que nesse momento você está bastante. Mas esquece daquele beijo! Pra mim não significou nada...

Eu o interrompi:

– Para! – Disse Eu calmo e silenciosamente - Eu não aguento mais isso. Eu já entendi tudo. Você a ama e estão namorando, como ela mesma disse.

Ele me interrompeu com raiva:

– O que ela disse?!

Eu fiquei com medo e não falei mais nada. Eu não gostava da situação. José continuou:

– Só fale quando Eu terminar de dizer tudo o que aconteceu, valeu?! Voltando, Eu não estou com a Sofia, não como ela te disse. Eu beijei-a sim e com vontade, mas não significou nada. Em momento algum Eu senti algo em nossos beijos. Eu pensava que você estava de cama e no beijo... No beijo (Ele fez uma pausa, parou o carro e abaixou a cabeça) no beijo Eu só pensava em você. Eu não sei como é isso, mas tu mexes demais comigo e com minha cabeça. Desde o dia em que Eu te vi. E não vou mentir, se Eu sentia algo por você logo no primeiro dia de aula, no dia da sua audição para líder de torcida foi que Eu pirei de vez a cabeça. Eu só pensava em você. E quando você tirou a blusa para tirar as medidas Eu senti um tesão imenso por você. Eu não sei explicar. Quando Marcos disse que ia ao banheiro pra te comer Eu fiquei puto da vida e fui lá meter a mão na cara daquele filho da puta. E depois que ele te espancou... Eu só estou esperando o dia de amanhã pra pegar ele e socar até a morte.

Ele olhou pra mim e me viu paralisado. Perguntou enquanto me sacudia:

– Tá tudo bem? Você não vai me responder nada? Eu abri meu coração.

Eu não sei o porquê, mas estava tão assustado que sai do carro.

A ficha ainda não caira. Mas iria cair.

Comentários

Há 2 comentários.

Por J.D. Ross em 2019-10-21 21:31:01
Estou gostando. Parabéns!!!
Por em 2012-12-30 10:49:54
Vc escreve muito bem... Sempre bom ler algo assim :)