01X03 - COMPLICADO DEMAIS

Conto de escritor.sincero como (Seguir)

Parte da série A VIDA QUE NÃO ESCOLHI

Jonathan passou meia hora na frente do espelho. Ele ficou com nojo do corpo de Samuel, não entendia, como alguém podia ser tão descuidado com a alimentação. Antes de descer para o café, Jonathan, fez flexões, mas não passou de 14, afinal, Samuel não era adepto de atividades físicas, e Jonathan, conseguia sentir. Ele foi para a cozinha, e encontrou toda a família reunida, os irmãos fizeram um cartaz de boas-vindas, e correram para abraçá-lo.

- Ei, crianças, calma. O Samuel ainda não está 100%. Filho, eu liguei para o diretor Bartollo, levarei o atestado para a escola. Fica em casa até sexta-feira. – avisa Isabella.

- Pestinhas? Vamos. – diz Antonella. – Hoje vocês vão com a tia mais gata desse condomínio.

- Cuidado com o vizinho do 409. – alerta Isabella. – Ah, e valeu irmã, juro que compenso nessa semana.

- Sem problemas. O trem partiu! – exclama Antonella fazendo barulho de trem.

- Vamos! – exclamam as crianças juntos.

Isabella pediu para que o filho pegue duas colheres no armário, mas esse detalhe, Jonathan não havia conversado com Samuel. Ele ficou perdido por alguns minutos, e depois de um tempo encontrou as colheres. Isabella fez um café da manhã especial para o filho, um verdadeiro banquete. Ela colocou os pratos na mesa e estranhou a reação de Samuel, ou melhor, Jonathan.

- Por isso que é gordo. – falou baixinho. – Mamãe, acho que vou pular o café, eu, sei que fez tudo com carinho, mas preciso perder uns quilinhos.

- Filho, já falamos sobre isso. – sentando ao lado de Jonathan. – Você é especial de qualquer jeito, mas se é isso que deseja, tudo bem também.

- Ah, Samuel. – entregando uma calça para Jonathan. – Desculpa, filho, mas não deu para comprar duas calças, eu mandei a costureira arrumar essa.

- Entendi. – falou Jonathan pegando a calça e vendo os remendos.

Jonathan lembrou de todas as vezes que humilhou Samuel na escola. Nem ele mesmo conseguia entender os motivos que o levaram a agir como um idiota com o colega. Após ficar sozinho na casa de Samuel, Jonathan, vasculhou cada detalhe do apartamento. Eram basicamente cinco cômodos, o escritório virou o quarto de Antonella, os gêmeos dormiam no quarto de Isabella, e Samuel, como um adolescente, tinha um lugar para chamar de seu.

- Pelo menos isso. – pensou Jonathan. – Pobre, Samuel, além de gordo é pobre.

Os exames de Samuel saíram e tudo estava perfeito, mas ele não conseguia esquecer a senhora que o visitou na noite passada. Cada palavra era martelada na cabeça do jovem. Wal entrou no quarto com um suco vegano, de acordo com ela, o preferido do enteado. Samuel olhou com nojo para o copo, porém, precisou tomar até a última gota, a madrasta de Jonathan, trouxe cookies sem lactose, Samuel quase engasgou, não sabia o que era pior: o suco ou o biscoito da morte.

- Wal, acha que hoje eu vou para casa? Preciso falar com o Jonatha... digo... o Samuel, o amigo que estava comigo na cápsula.

- Sim, filho, digo, Jonathan. Os médicos vão vir aqui às 12h. Você deseja mais alguma coisa?

- Não. Estou ótimo. – fala Samuel com um sorriso amarelo.

Lana decidiu faltar aula para cuidar de Samuel. Ela chegou cedo com várias guloseimas para o amigo. Jonathan tentava sintonizar a TV a Cabo, mas teve vários problemas, como o controle da televisão que estava quebrado. Lana entra e assusta Jonathan, ela estranha a reação, já que estava acostumada a entrar daquele jeito na casa do melhor amigo. Lana sente algo diferente em Samuel, mas não comenta nada.

- Então? Cara, eu dei uma surra nos amigos babacas do Jonathan. Sabe como eu sou mestre, né? – ela diz fazendo um golpe de karatê. – Só não dei uns tapas na Lorena, por que, fiquei preocupada com você. – abraçando Jonathan.

- Elana, tá tudo bem. Estou 100%. E o coitadinho do Jonathan não teve culpa de nada.

- Coitadinho? Você pirou? Bateu a cabeça forte demais naquele brinquedo, só pode ser isso. O que é dele tá guardado, consegui estragar a participação dele no Anime Plus, vou fazer ele pagar o maior mico na escola.

- Então foi você? Toda aquela história de Boruto,... – questiona Jonathan fazendo uma careta engraçada.

- Qual o teu problema, Samuel?

- Er. Nenhum. Quer dizer, não estou conseguindo conectar a TV a Cabo. – andando até a televisão.

- Que TV a Cabo? Deve ter sido o acidente. Espera aí. – indo até o quarto de Samuel e pegando o notebook. – Vamos assistir ‘Jardim de Meteoros’, estou louca para saber se a Dong vai ficar com o Daoming.

- Isso é coisa de viado. – comenta Jonathan sem pensar direito.

- Samuel Costa. Que comentário ridículo.

- Desculpa. – diz Jonathan revirando os olhos e sentando no sofá. – Tá, vamos assistir.

Samuel chegou na casa de Jonathan e ficou assustado com o tamanho do lugar. Era uma casa de dois pisos, toda no vidro temperado, um verdadeiro sonho. Gláucio e Wal, o levaram para almoçar no jardim. Samuel quase vomitou quando viu as ostras, segundo Wal, outro prato preferido do enteado. Samuel perguntou se teria outra opção de almoço, e pediu apenas um frango grelhado.

Após comer, Gláucio precisou sair para uma reunião, e Wal, começou os trabalhos de jardinagem. Samuel subiu para o quarto e mandou várias mensagens para Jonathan. Ele acabou se perdendo e entrou em um quarto diferente, uma foto se destacava na parede, era os pais de Jonathan e mais duas crianças pequenas. Samuel decidiu sair e chegou finalmente no quarto do colega. “Que sonho”, pensou Samuel. O quarto de Jonathan parecia ter saído de uma foto do Pinterst. Enquanto um se encantava, o outro chorava.

- Como assim? Isso é tão injusto. – disse Jonathan chorando. – Como eu nunca assisti isso?

- Já assistimos essa série umas cinco vezes. Em todas, a gente chora.

- Adorei a determinação da Dong. Pareço um gayzinho. – rindo e chorando ao mesmo tempo.

- Credo, para de falar assim. Isso é tudo por causa do Nando?

- Que Nando? – Jonathan pergunta enxugando as lágrimas.

- O El Diablo, teu ex-namorado.

- Além de tudo, ele ainda é gay? Cheio de surpresas, hein, Samuel. – pensou Jonathan. – Lana, podemos falar de outra coisa, por favor?

- Sim, meu novo plano para acabar com a reputação do Jonathan.

- Isso de novo, não. Por favor. Podemos ver mais um capítulo de ‘Jardim de Meteoro?

- Sim, mas para de ficar perguntando. Até parece que está assistindo pela primeira vez.

- Não, eu assistindo pela primeira vez? Você me conhece, sabe como sou esquecido. E tem o acidente também. – diz Jonathan nervoso.

A cabeça de Samuel ainda girava, para diminuir a dor, o médico recomendou fortes anestésicos. Na hora do banho, o jovem tomou um susto, o motivo? O corpo de Jonathan era perfeito, tudo no lugar. O banheiro tinha quase o tamanho do apartamento de Samuel, o que lhe chamou a atenção foi uma banheira. No armário, Samuel escolheu alguns sais para deixar aquele momento mais gostoso.

- O Jonathan tem a vida perfeita, e ainda assim, consegue ser um idiota. – pensou ele.

Samuel dormiu na banheira, ele acordou por causa da dor na cabeça. Seus dedos dos pés e mãos estavam engraçados. Ele passou em frente a um espelho e ficou olhando para o espelho, ao verificar os atributos de Jonathan, Samuel começa a pular e rir da situação. “Parece um pêndulo”, pensa o jovem. As surpresas não para por aí, o closet de Jonathan quase faz Samuel desmaiar, o lugar era gigantesco. Vários tênis, óculos de sol, bonés e roupas de marcas famosas.

- Caramba. Acho que nunca vi tanta roupa de marca. – pegando um chapéu e colocando. – Esse cara tem tudo.

Wal levou um lanche para Samuel, a mulher ainda estava arisca, pois, temia a reação dele. Samuel perguntou se eles não poderiam tomar café no jardim, a madrasta adorou a ideia. Apesar de todas as humilhações de Jonathan, Wal, o amava, logo quando ela chegou na casa, o jovem a adorava, mas com o passar dos anos, o desprezo cresceu e a relação entre eles se tornou impossível. Já Samuel sentia a falta da família, e principalmente, de alguém para conversar.

- Você faz um ótimo trabalho com as flores. – comenta Samuel comendo igual um desesperado.

- Obrigada. Pensei que você não prestasse atenção nas coisas que eu faço.

- Wal, eu quero te pedir desculpas, eu nasci para ser um babaca e... eu sei que você é uma boa pessoa. – diz Samuel, depois de muito pensar em uma resposta.

- Eu... – ela falou com os olhos vermelhos. – Com licença.

Durante a noite, Jonathan, jantou com a família de Samuel. O caos de sempre deixou o rapaz zonzo, afinal, Isabella, Antonella e as crianças, podiam ser um pouco barulhentos. Ele foi obrigado por seus irmãos a continuar a história do ‘Pequeno Príncipe’, no início Jonathan ficou desconfortável, mas pegou o jeito rápido, inclusive, para inventar vozes fictícias para os personagens.

- Disse a flor para o pequeno príncipe: É preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas. – lê Jonathan fazendo uma voz fininha. – Bem, agora eu preciso descansar, seus pestes.

- Samuel, obrigado. – agradece Silvio.

- Não precisa. Agora vai dormir.

Ao entrar no quarto, Jonathan, ligou o computador e acessou um aplicativo de conversa por vídeo. Não demorou muito e Samuel entrou em contato. Os dois não tinham nenhuma pista sobre o que aconteceu no ‘Ciência Maluca’, até que Samuel lembrou da velha no quarto do hospital. Jonathan achou a história um tanto irreal, mas na situação em que se encontrava, qualquer coisa era uma informação válida.

- Samuel. E se a gente trocar enquanto estiver dormindo? Quem sabe?

- Eu não quero ficar preso no seu corpo para sempre. A minha família precisa de mim. Espero que não tenha dado bandeira com ninguém.

- Claro que não, tá maluco. Só a Lana que estranhou a minha reação, fui obrigado assistir um dorama hoje.

- Sério? Qual?

- O Jardim de Meteoros ou algo do tipo. Enfim, e você acha que eu quero ficar preso no corpo de alguém....

- De alguém, gordo, né? Você é muito ridículo. Escuta, assim que der a gente volta naquele maldito parque e faz a troca, ok?

- Samuel, não fica bravo, eu sei que sou um babaca, tá. A gente vai sair dessa, eu prometo.

- Filhinho. – diz Wal entrando com um copo de leite. – Eu trouxe para você tomar antes de dormir, li em um artigo que faz bem para pessoas que bateram a cabeça. – deixando o copo na mesinha de Jonathan.

- Tudo bem, boa noite e obrigado. – agradeceu Samuel.

- Tchau, filhinho e amanhã conto com sua ajuda no jardim. – comenta Wal antes de sair.

- Pode deixar.

- Você vai ajudar a Wal? Sabe há quanto tempo eu trato essa mulher mal? Anos... anos...

- Qual é, Jonathan. A Wal não é sua inimiga.

- Samuel, não se mete na minha vida, ok? Eu estou fazendo de tudo para deixar suas coisas no lugar. Não fique amigo dela.

- Eu... eu não sei destratar as pessoas Jonathan, mas prometo que vou manter distância. – assegurou Samuel, mesmo sabendo que não conseguiria cumprir a promessa.

- Ótimo. Amanhã a gente se fala. Vou aí em casa para conversamos melhor.

Na madrugada, Samuel sonhou com a senhora que encontrou no hospital. Novamente, a mulher falou que ele era responsável por tudo o que estava acontecendo. Samuel acordou assustado e começou a chorar copiosamente. Enquanto isso, Jonathan, teve um pesadelo com o acidente no brinquedo. O jovem sentiu todas as emoções possíveis, e no fim, viu seu corpo caído no chão. Ao acordar, Jonathan, pegou na pancinha de Samuel, e percebeu que continuava no corpo do colega.

- Merda, mais um dia preso aqui. Que raiva. Pelo menos não preciso estudar. – levantando.

Já na casa de Jonathan, as coisas estavam divertidas, Wal e Samuel, preparavam o café da manhã juntos, aquilo era inédito para a família Godoy, Gláucio ficou surpreso com a atitude do filho. Samuel decidiu fazer panquecas no estilo americano para os pais de Jonathan. Durante o café, eles riram bastante, Samuel adorou conhecer mais histórias embaraçosas do colega de classe.

- Bem, eu preciso ir. Jonathan, juízo, por favor. – pediu o patriarca.

- Pode deixar pai.

- Pai? – questionam Wal e Gláucio juntos.

- E o que aconteceu com o papai? – perguntou Wal.

- Claro, pode deixar, papai.

Jonathan esperou a família de Samuel sair. Depois, ele desceu o prédio e pegou o metrô. Enquanto esperava o vagão, Jonathan, foi abordado pela misteriosa senhora. A mulher dessa vez, vestia trapos e não parecia tão amistosa quanto antes. Ela afirmou que o caminho de Jonathan seria doloroso, e se ele não confiasse em Samuel, as coisas ficariam complicadas.

- Existe beleza na sua dor, mas não pode deixar isso te consumir. O seu amigo, o Samuel, tem muita coisa para te ensinar, não o deixe escapar. – ela disse se afastando e sumindo no meio da multidão.

- Que doideira. Quem é essa maluca? Será que ela é a culpada de tudo?

Quando saiu da estação, Jonathan, viu um antigo conhecido, o nome do rapaz, Oliver, eles estudaram juntos, mas Jonathan repetiu de ano e não entrou para a universidade. Por pouco, os dois não se cruzaram na rua. Oliver seguia para um bar, em plena luz do dia. Ele entrou e deixou todos os pertences em uma espécie de armário. Em seguida, o jovem retirou toda a roupa, em nenhum momento se constrangeu com as pessoas que passavam.

- Oi, gostosão? – perguntou um homem de mais ou menos 50 anos.

- E aí, coroa? Qual é a boa? – perguntou Oliver.

- A boa? É essa. – disse o homem se abaixando.

- Eu... – Oliver tentou falar, mas apenas fechou os olhos e curtiu o momento.

Comentários

Há 0 comentários.