Atraídos pelo NORMAL (1x01)

Conto de escritor xXx como (Seguir)

Parte da série Adolescência a flor da pele

Você sabe como é o primeiro dia de faculdade, não é? Caso você não saiba eu irei lhe dizer agora. Chato. É isso mesmo, é um dia em que você fica se apresentando e dizendo o porquê escolheu o curso, mas você nunca diz a verdade... As outras pessoas – os seus queridos colegas de classe –, também não. Eu não diria “escolhi o curso, porque era o único que a nota de corte do Prouni permitiu que eu entrasse”. Então disse que era um ótimo curso, falei coisas como “ele é muito amplo” e “e é o que eu realmente quero”, pura mentira.

Digamos que fazer faculdade de Administração nunca foi o que eu quis. Sempre quis algo relacionado com a escrita. É isso, eu sempre quis ser escritor, mas como no Brasil ninguém realmente lê, então, as coisas são complicadas para quem tem um sonho parecido com o meu. Voltando a faculdade de Administração, é um bom curso, mas ao mesmo tempo o sentimento que tenho a assistir uma aula – por mais agradável que ela esteja sendo –, é que estou desperdiçando tempo com algo que sei que não irá para frente.

Pior que ter que ir para um curso do qual não é nem a sua segunda opção, mas a décima... é ter que se deslocar até o outro lado da cidade para ir trabalhar. E se você não tem carro, então fará isso igual a mim, com o maravilhoso “só que não” Transporte público.

Mas existe algo interessante sobre transportes públicos. Ele, às vezes, contém pessoas bonitas, mas isso é raro. Geralmente as pessoas que se sentam perto de você estão fedendo por falta de desodorante, talvez elas usem Rexona, enfim, não sei. Mas um dia desses, para ser mais exato foi antes de ontem, eu encontrei um garoto bonitinho, ele aparentava ter a minha idade, por volta de dezoito. Mas como sou ruim de deduzir a idade não me surpreenderia se ele tivesse vinte e cinco.

É, eu sou aquele que odeia com todas as forças matemática, mas mesmo assim entra para o curso de administração. Aquele que pode parecer tímido, mas de tímido tem apenas o modo de andar. Como o modo de andar de alguém é tímido? O meu é, eu costumo ser um pouco desajeitado e não gosto de circular onde tem várias pessoas, é desconfortável.

E todas essas coisas acima são os meus pensamentos, óbvio. Mas estou no meio da rua, pensando essas coisas.

Opa, o sinal ficou verde.

Eu corri para o outro lado da rua. Não corri literalmente, andei rápido e também tropecei, as pessoas ficaram encarando e eu morrendo de vergonha. Sabe quando você tropeça e finge que está correndo? Então, vou te contar um segredo amigo: as pessoas sabem que você tropeçou, essa técnica infalível é mais falha do que o sinal da TIM. É, realmente, virou modinha falar mal do sinal da TIM.

Após entrar no prédio onde – infelizmente “mente” (acrescentado para dar mais drama ao texto) – eu trabalho fui direto para a minha sala. Pegadinha do malandro. Eu não tenho uma sala, mas uma mesa ao lado de várias outras mesas de outras pessoas. Não, não sou telemarketing, mas... É eu sou sim.

O meu telefone tocou assim que em sentei. “é destino”, pensei. “Um péssimo e horrível destino”.

- Escritório de Oliver Creer. Como posso ajudar? – perguntei com toda a disposição do mundo.

- Eu preciso que o boleto seja enviado para o meu e-mail – disse a voz irritante do outro lado da linha.

“É claro que precisa sua vaca”, como eu queria ter dito.

- Eu irei enviar, tenha um ótimo dia.

E o dia se estendeu de várias coias chatas que fazemos para ganhar dinheiro para sobreviver. A verdade é que você termina o colégio pensando que terá o trabalho que sempre quis, mas não é bem assim. É bem provável que você sirva café em uma lanchonete próxima a sua casa.

Quando deram seis horas eu me dirigi para fora do prédio, corri até o ponto de ônibus. O ônibus estava atrasado, ou seja, eu chegaria atrasado à minha faculdade. O ônibus chegou, eu tive que ir de pé até o terminal. Só rezava para que no próximo eu fosse sentado.

Quando a porta do ônibus abriu, eu me senti um participante dos Jogos Vorazes e fui furando fila, quase passei por cima de uns e assim garanti um acento no busão. Ao meu lado estava um garoto dormindo. “Como alguém dorme em um ônibus? E se alguém roubar as suas coisas?”.

As pessoas ainda me encaravam com fúria nos olhos, nada que eu não merecesse, mas eu precisava do banco, então, não me arrependi de nada. Olhei para o garoto dormindo.

Ele parecia ter uns vinte e dois anos, mas eu era péssimo em deduzir idade. Continuei secando o garoto com os meus olhos. Ele tinha lábios convidativos, cabelos escuros, olhos eu não sabia, estavam fechados e dote de 20 cen... As pessoas fazem descrições assim hoje em dia, não é? Como se sua parte intima fosse uma descrição necessária em uma rede social.

Os cabelos escuros dele estavam jogados sobre os olhos, seu nariz era bonitinho – Eu invejava o nariz dele, porque o meu é um nariz de coxinha –, os seus braços musculosos estava soltos sobre a sua barriga. Ele era sarado, mas não um monstro de academia.

Sabe quando você está próximo a alguém que te chama à atenção? Aquele ser que te faz sentir “coisas”? Eu estava assim. Já havia até esquecido que chegaria atrasado.

Desviei o olhar, não ficaria secando alguém desacordado, isso soava um pouco errado para mim.

Ele encostou seus dedos nos meus braços, começou a se mexer como se estivesse procurando por algo. Seus olhos estavam abertos agora, eram verdes como as folhas das arvores na primavera.

- Meu celular – disse ele me encarando.

Eu havia entendido direito?

- O que?

- O meu celular, você o viu? – disse ele com um tom alto.

- Não! – eu respondi seco.

- Ele estava bem na minha mão – resmungou ele com o rosto inchado por causa de sua soneca dentro do ônibus.

- Você está insinuando que eu peguei? É isso? – perguntei já sem paciência.

- Não. Você, uma gazelinha? É... Não mesmo.

- De que você me chamou?

- Você viu quem estava aqui perto antes de se sentar aqui? – disse ele mudando de assunto.

- Nem tente mudar de assunto!

- Eu te chamei de gazelinha. Agora, você viu quem estava próximo deste banco?

- Gazelinha é o seu pai. E eu não vou nem dizer o que a sua mãe é, porque profissional do sexo... Ops, é eu disse. P-U-T-A!

Ele me encarou com uma expressão séria. Eu pensei que fosse apanhar, mas em vez disse ele apenas desviou o olhar.

- Acho difícil essa ofensa pegar. Eu sou órfão, perdi meus pais em um acidente de carro quando era criança – respondeu a pessoa ao meu lado sem me encarar.

Droga, que fora hein.

- Isso não foi legal, desculpa mesmo. Eu não sei o que deu em mim... Não sou desses que fica ofendendo os pais mortos das pessoas nos ônibus, enfim, desculpa.

Antes que eu terminasse o meu pedido de desculpas ele começou a rir como se eu tivesse te contado uma boa piada.

- Não creio que você caiu nessa. Ainda te fiz pedir desculpas – Disse ele curtindo com a minha cara.

- Idiota. Eu retiro as minhas desculpas.

- Calma gazelinha.

Tentei me controlar. Olhei para o chão e vi o celular dele caído, eu me levantei e “sem querer” pisei em cima da tela, pisei de novo até quebrar.

- Achei seu celular – disse apontando para os meus pés.

O que aconteceu depois foi interessante. Ele se levantou e eu não me deixei intimidar, afinal, ele estava me chamando de gazelinha. Pensei que fosse levar um soco, mas estava errado, de novo. Ele apenas passou por mim e se dirigiu até a porta. Encarei o celular espatifado no chão e senti uma pontada de culpa.

Um homem se aproximou e se abaixou próximo ao celular espatifado.

- Quem foi que quebrou o meu celular? – disse ele já me encarando. Eu era o mais próximo, então, meio que a distancia dos pedaços do celular me entregava.

- Foi ele – disse um garoto apontando o dedo na minha direção.

Antes de tentar me defender fui empurrado para o outro lado ônibus, bati minhas costas contra o cano de metal amarelo.

- Eu posso explicar – disse com esforço.

E outro empurrão e eu caí. As outras cenas eu não consegui ver muito bem, depois do segundo chute alguém entrou na frente do meu agressor e me defendeu. Demorou até que eu percebesse que o meu defensor era na verdade o cara que me ofendeu. Minha cabeça ardia e ao passar dos dedos no lugar que estava doendo minha mãe se encheu de sangue. A coloração vermelha e preta em minha mãe fez com que eu desmaiasse no mesmo instante.

Quando meus olhos se abriram a única coisa que percebi era que estava em um hospital. Meus braços estavam com curativos espalhados, meu corpo estava muito dolorido, era difícil se mexer.

A porta estava entreaberta e pude notar alguém dormindo em um dos bancos do corredor. Era o dorminhoco do ônibus, o que me ofendeu e em seguida me defendeu.

Novos personagens, novas histórias.

Comentários

Há 1 comentários.

Por flavio em 2014-02-18 21:53:27
Vc escritor x, sempre perfeito. Amei esse começo de serie. Continui.