Capítulo XXXVIII

Conto de Drexler como (Seguir)

Parte da série O destino de Bruno

Música tema: Vento do Litoral – Renato Russo.

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- Você teve notícia dela? – Perguntei a Felipe, quando me sentia mais calmo.

Despois que recebi a notícia de que Alice havia passado mal após o parto, foi uma tarefa difícil de minha mãe conseguir me acalmar. Eu sequer sabia porque estava tendo uma grise tão grande, apenas sentia me coração apertar, com medo, culpa, preocupação, remorso, e outros sentimentos negativos que me doía o peito.

Como já era noite, achei melhor esperar até o dia seguinte para ir para São Paulo, tendo em vista que a distância era de mais de duas horas. Contudo, no mesmo instante arrumei minha mala para voltar a capital. Minha mãe aproveitou para conseguir algumas coisas de criança, como fraldas, roupinhas, etc., levando em consideração que a recém mãe não teve ajuda da família, senão de André, para a compra do enxoval da criança.

Pude ouvir, superficialmente, que meu pai, enquanto minha mãe resolvia as coisas para a viagem, conversou com Felipe a respeito de Alice, mas não pude tirar conclusões, pois minha cabeça estava fervilhando sobre como seria as coisas dali em diante.

No dia seguinte, eu e minha mãe pegamos um ônibus com destino à capital, pois meu pai, com a definição da data do julgamento, ficou impossibilitado de nos acompanhar. Entretanto, ficou combinado de que ele buscaria minha mãe, Alice e a menina, que ainda não sabiam da notícia que passaria o resguarde em minha casa, com a minha família.

Fomos direto para a casa de Felipe, pois Beatriz estava com André resolvendo os últimos ajustes da estadia de Alice no hospital. Assim que chegamos a capital, eles, Bia e o namorado, foram nos receber, e pude notar o quão abalado estava o primo de Alice, que sequer conseguiu dirigir o próprio carro. Seus olhos estavam vermelhos, como os de alguém que havia chorado muito, além de fundos e com olheiras. Beatriz não estava muito diferente, porém mais calma.

- Ela ainda está no hospital com a menina. – Ele respondeu, mas notei uma troca de olhares entre meu amigo e minha mãe, como se escondessem alguma coisa.

- Ela está melhor, não está? Vocês estão me escondendo algo! – Era perceptível o nervosismo dos dois, como se procurassem palavras para me contar, e eu só poderia supor o pior.

- Filho... – a primeira palavra de minha mãe foi o suficiente para que as lágrimas rompessem a barreira que eu havia construído emocionalmente.

- Quando aconteceu? – Por algum motivo, mesmo com as lágrimas lavando o meu rosto, eu estava calmo, minha voz sequer tremeu. Era como se eu já esperasse por esta notícia, como se eu já soubesse.

- Eu não quis te contar por telefone. – Felipe tinha voz calma, uma tentativa de torna a digestão da notícia mais fácil. Sem que eu esperasse, senti os braços de minha mãe me envolverem, deixando que minha cabeça descansasse em seu ombro. No mesmo instante retribui o gesto e fechei os olhos, recebendo seu alento e conforto. Quando finalmente nos separamos, puder ver que ela também chorava, deixando escapar um soluço. Sem mais delongas voltei-me para Felipe, a fim de saber os detalhes do que havia acontecido.

- Como aconteceu? - indaguei com a voz natural.

- Alice estava sozinha em casa quando a bolsa estourou, mas por sorte um vizinho a encontrou quando ela saiu de casa chorando e a levou a um hospital. Mas ainda sim, ela não estava preparada, não estava totalmente delatada, então tiveram que fazer um cesariana, pelo contrário a criança poderia não resistir. Os médicos fizeram o possível, mas Alice estava muito nervosa, chorando muito. Ela estava sofrendo com a pressão, não sabia onde ficaria, e tudo mais. Todo esta pressão e nervosismo ocasionaram uma hemorragia. Os médicos conseguiram estancar no primeiro momento, mas quando fecharam a cirurgia, ela teve outra hemorragia, dessa vez interna, e os médicos não conseguiram estancar. Ela já estava fraca em consequência da primeira, e ela acabou não resistindo. – mais uma vez fechei os olhos, sentindo as lágrimas lavarem meu rosto novamente.

- Quando você me ligou ontem... – comecei, mas ele logo entendeu minha pergunta.

- Já tinha acontecido.

- Sobre a família dela, eles não foram vê-la mesmo? – Rapidamente meu amigo olhou para minha mãe, pedindo ajuda, mas eu entendi tudo, eles realmente não foram visita-la. - Eles já sabem?

- André avisou aos pais e pediu que contassem aos pais de Alice.

- E ainda sim ninguém...

- Apenas a mãe de André. – Felipe respondeu com um suspiro.

- Bruno... – minha mãe começou, mas eu queria saber de tudo, de uma vez, por isso não a permiti continuar.

- Quando será o sepultamento?

- Será hoje. – Meu amigo respondeu e minha mãe completou.

- Eu e seu pai resolvemos tudo. Ela ficará na funerária até o cortejo.

- E onde ela será enterrada? – Inevitavelmente, um soluço de dor cotou minha garganta, mas logo tratei de conter a crise de choro que queria surgir.

- André e a mãe conseguiram convencer a família de Alice de deixarem sepulta-la na cova da família.

- Pois se depender de mim, ela sequer ficará nesta cidade! – Disse já me exaltando, ao mesmo tempo em que me levantava, com raiva de toda situação.

- Se acalme Bruno... – pediu minha mãe e a olhei incrédulo. – Você não é nada dela, a família quem deve...

- Família? A família que a expulsou de casa? Que a renegaram como filha? Que não apoiaram na gravidez, um momento sensível, apenas por ela não querer revelar quem é o pai? A mesma família que sequer se interessou em pelo menos visitar o cadáver da filha? Isso é família? Me pergunto se em algum momento na vida, eles tiveram algum sentimento verdadeiro e positivo para com Alice. – Gritei tudo de uma vez, não dando espaço para que nenhum dos dois.

- Brun...

- Não posso mãe! Simplesmente não posso aceitar que chame estas pessoas de família. Eu não consigo sequer acreditar que estranhos não se sensibilizariam com a morte, ainda mais os próprios pais. Me pergunto como é possível existir pessoas deste tipo.

Não fiquei mais na sala para ouvir o que ainda tinham para me contar. Segui para o quarto de hóspedes na tentativa de conseguir digerir toda aquela situação. Se antes eu não sabia como seria a vida da criança e Alice, que não conseguiria sustentar a sua filha, agora tudo pioraria. Mesmo eu sabendo que minha mãe encaminharia a menina para um bom orfanato, ou uma boa família, a ideia de ela crescer sem um pai e uma mãe era terrível, inadmissível.

Eu lembrava de minha promessa a Alice, de não contar nada a Fernando, mas devido as circunstâncias, eu não via outra possibilidade, eu teria que contar. Como eu havia tentado argumentar para ela, a família dele, e com isso quero dizer seus irmãos, tinha condições de cuidar da criança, dando-lhe conforto e amparo verdadeiro. Além disso, eu sabia que a criança seria uma boa oportunidade para ajudar Fernando, um incentivo para deixar a drogas.

Não consegui refletir por muito tempo, logo que deitei sobre a cama, adormeci. Eu estava muito abalado com todos aqueles acontecimentos e com medo por tudo que ainda aconteceria. Eu sequer pensava no julgamento, em ter de encarar o tio-estuprador de Bárbara, ou a família dona do dinheiro. Tudo que vinha a minha mente era a filha de Alice, como seria a vidinha daquela pobre criatura, agora sem mãe.

Não sei por quanto tempo dormi, mas tinha a impressão que tinha acabado de pregar o olho quando Carlos chegou m chamando. A única coisa que consegui fazer foi abrir os olhos e encara-lo. Vagarosa mente ele caminhou e sentou-se a cama, ao meu lado, acariciando meus cabelos, me confortando. Não trocamos nenhuma palavra no primeiro momento, somente fechei os olhos e apreciei seu carinho em meus cachos. Afinal eu sabia o motivo de ele star ali.

- Como você se sente? – Ouvi sua voz grave e finalmente abri os olhos para encara-lo.

- Preocupado. – Minha voz saiu como um ruído, e tive dúvidas se ele realmente me ouviu.

- Não fique, se aconteceu, é porque tinha que acontecer.

- Carlos... – não era fácil pensar nisso e contar para outra pessoa era muito pior. No mesmo instante as lágrimas desceram sobre meu rosto, e tive dúvidas se conseguiria me abrir com meu professor. Contudo, ele esperou até me acalmar e finalmente pude contar-lhe tudo.

Não foi fácil, minha voz estava falha, soluços insistiam em tapar minha garganta, grossas lágrimas lavavam meu rosto sem sessar. Mas ainda sim, eu consegui confessar minha última confessar com Alice. Narrei toda a situação em que me encontrava e me culpava, desde minha despedida quando fui para Portugal, a tentativa de me provar sobre a infidelidade de Fernando e a consequência que isso ocasionou: a gravidez, expulsão de casa, rejeição da família, a revolta de André no dia que fomos ao bar. Não precisei entrar em detalhes sore meu envolvimento com Fernando no passado, era certo que ela já conhecia este fato. Tão pouco precisei contar sobre o desespero em que Alice se encontrava.

Como sempre, Carlos ouviu tudo em silencio, esperando o tempo certo para proferir as palavras certas, de conforto, na tentativa me aliviar a pressão. Contudo, desta vez não foi fácil. Ao contrário do que aconteceu quando recebi a notícia, não consegui aguentar a dor no peito, como uma bala tivesse rompido minha alma.

Quando finalmente me senti mais tranquilo, decidi tomar um banho, para relaxar mais o corpo e tirar a tensão de meus músculos, e comer alguma coisa antes de ir ao velório, mesmo que minha mãe e Carlos pedisse o contrário.

Já era quase duas horas da tarde quando chegamos a funerária, onde o corpo estava sendo velado. Não havia muita gente no local, apenas alguns amigos da faculdade, pude reconhecer dois professores que cumprimentaram Carlos, as amigas que acolheram Alice, Raissa que trabalhou comigo na biblioteca quando eu era bolsista, além de outras poucas pessoas que não reconheci. Contudo, a figura que mais me chamou atenção, foi a de André. Ele estava ao lado do caixão, de costas para mim, admirando o rosto de sua prima, ao mesmo tempo que o acariciava. Beatriz estava ao seu lado, abraçando seus ombros.

Assim que entramos no ambiente e Beatriz nos percebeu, ela falou alguma coisa no ouvido de seu namorado, que nos olhos. Não consegui ver seus olhos, pois estava de óculos escuro, mas ainda assim pude, ao que nos aproximamos, perceber como suas bochechas estavam vermelhas, além de que com marcas de lágrimas secas. De todos, ele era quem mais estava sofrendo com a perda, e isso era evidente.

Ao lado de Carlos, fui até onde estava o corpo de Alice. Não falei nada com nenhum dos dois, apenas admirei aquele rosto familiar a minha frente, agora pálido e sem expressão. Ela mantinha as mãos apoiadas sobre o abdome, com os dedos cruzados e segurando um terço de ferro com pedras rosas; suas pernas e parte do tronco, além de toda a lateral do corpo, estava coberto por uma manta de flores brancas e amarelas; e em seu rosto, uma renda branca, que estava levantada.

Foi instantâneo, assim que pus meus olhos naquele rosto, as lágrimas molharam meu rosto, e senti a mão de meu professor segurar e apertar a minha. As lembranças de tudo o que passamos, sobretudo os momentos bons que passei ao seu lado, os risos e amassos, conversas e brincadeiras, vieram à minha mente. Mas tudo que eu conseguia pensar era no destino da criança que era deixou no mundo, que possivelmente iria para um orfanato.

- Vem Bruno. – Senti Carlos me puxar em direção um sofá onde minha mãe estava sentada junto a Felipe e conversando com outra mulher que não conheci.

Não questionei, tão-somente o segui. Sentei-me ao lado do meu amigo, calado apenas pensando no quão difícil estava sendo, e continuaria sendo, aquela situação. Carlos ficou de pé, ao me lado e segurando meu ombro, na intenção de me tranquilizar, o que realmente estava acontecendo, pois pude concretizar que poderia contar com ele em todos os momentos, até nos mais difíceis.

Sem que eu tivesse a intenção, consegui ouvir a conversa que minha mãe estava tendo com a mulher, uma loira magra e gorducha, usava óculos caído sobre o nariz e os cabelos razoavelmente curtos amarrados em um rabo de cavalo. Pude entender, pelo foco da conversa, que a senhora era alguma funcionaria do hospital, pois conversavam sobre a situação da criança, a qual eu ainda não sabia o nome.

- A avó foi visitar, mas eu não sei se ela vai cuidar. – Comentou a mulher em tom baixo para minha mãe.

- E se não for? – Mamãe respondeu no mesmo tom de voz.

- Ela será encaminhada para a assistência social.

- Ela não revelou quem é o pai?

- A amiga que estava com Alice disse que entraria em contato com ele. Contudo, ele ainda não foi ao hospital.

- Bruno... – Beatriz apareceu a minha frente chamando fazendo-me deixar de prestar atenção no diálogo que se seguiu. – Posso conversar contigo? – Apenas concordei com a cabeça antes de me levantar e segui-la até uma saleta vazia, apenas com duas rodas de flores sobre uma bancada. – Como você está?

- Estou bem. – Respondi com um suspiro. – E André, como ele está lidando com isso?

- Está muito abalado. – Disse olhando para aporta. – Ele passou tudo com ela, estava com ela todos os dias.

- Eu sei, imagino o quão difícil está sendo para ele.

- Bruno, eu sei que você não...

- Eu não tenho nada contra ele, - disse a verdade surpreendendo a mim mesmo. - Bia, sei que tudo que ele disse naquele dia foi porque ele queria defender a prima, e que ele não sabia a verdade sobre eu não ser o pai. Não o julgo.

- Exatamente. – Ela suspirou, me abraçou forte, e pude a sentir soluçando.

- Não fica assim, Bia. – Pedi acariciando suas costas, já sentindo as lágrimas brotarem em meus olhos.

- Ela... ela sofreu tanto nos últimos dias, Bruno... – ela gaguejou ao falar. Sua voz estava tremula pelo choro, ainda que baixo. – Sempre que eu a via, ela estava chorando sem... sem... sem saber o que seria dela e da filha.

- Bia, eu...

- Eu não estou te culpando, bruno. – Ela me cortou. – Eu só não sei mais o que dizer para André. – falou limpando as lágrimas e olhando para a porta. – Eu não tenho mais forças... Eu tenho tentado ser forte, consola-lo, mas eu... – Ela não conseguiu terminar, desabou no choro soluçando audivelmente desta vez. E foi minha vez de abraça-la apertado.

Em nenhum momento eu havia parado para pensar na situação de minha amiga. Agora eu poderia supor a barra que ela estava passando, acompanhando de perto o momento perturbador de Alice e a angustia do namorado vendo o estado que sua prima se encontrava, sem poder fazer muito para ajudá-la. Enquanto eu me martirizava e tentava esquecer de tudo, pensando somente em meu bem-estar, sendo egoísta, como sempre.

- Desculpa, Bia! – Pedi com a voz embargada. – Me desculpa por não estar ao seu lado, como você esteve no meu.

Ela não respondeu. Mas não precisava. Não era como se ela estivesse me cobrando algo, apenas buscando consolo, afinal ela precisava se mostrar forte para André, pois ele também precisava de alguém que o consolasse. Ela precisava ser forte para ele, assim como eu para ela, assim como Carlos era por mim.

Só agora eu havia percebido a quão mudada estava Beatriz. Ela não era mais aquela garota que conheci a três anos atrás: fútil e que brigava com a mãe por não querer trabalhar. Tudo bem que ela continuava reclamando das obrigações como bolsista da universidade e das responsabilidades financeiras, a qual ela passou dar mais valor. Entretanto, ela estava mais madura, autônoma, responsável e independente. Ela havia mudado, e para um melhor.

Quando finalmente minha amiga se acalmou e nos desvencilhamos, recebi um sorriso molhado de lágrimas, as quais logo foram limpas. Com um sorriso no fraco no rosto e um ‘obrigado’ silencioso, voltamos a sala principal. Minha mãe e Carlos ainda estavam no mesmo sofá, agora conversando entre si, já que a mulher loira não estava mais com eles. Mais ao fundo, em um canto mais isolado, avistei André conversando com Felipe, o que me surpreendeu.

Respirei fundo, segurando a mão de minha amiga, e caminhei em direção aos rapazes. Felipe, que pareceu estar fazendo companhia apenas enquanto Beatriz estava comigo, logo saiu, antes apertando o ombro do outro, que retribuiu com um aceno cordial. Fiquei um pouco sem jeito de estar ali, mas eu precisava superar qualquer desentendimento que houvesse entre nós, e embora não parecesse aquele era o momento.

- André... – o chamei, mas não esperei que respondesse. Sem que ele esperasse, o abracei, compartilhando de sua dor, tentando, de alguma maneira, conforta-lo e dizer que ele não estava só.

Ele não se fez de rogado, correspondendo ao abraço na mesma intensidade, o que me aliviou um pouco mais, pois por mais que aquele fosse um momento de fragilidade, significava que nossas diferenças, seja qual fosse, havia sido deixado de lado.

- Sinto muito pela sua perda. – Falei baixo em seu ouvido, no mesmo instante em que nos separávamos.

- Obrigado. – Respondeu, e tive que fazer um esforço desmedido para compreende-lo, pois, sua voz quase não existia.

Agora que André estava mais uma vez sem óculos, pude ver nitidamente, agora prestando mais atenção, o quão inchados eles estavam. Eu sabia o quão difícil era perder alguém próximo, já havia passado por isso com meus avôs, os quais foram meus pilares em vários sentidos.

Não tive a oportunidade de conversar com André, um homem já de meia idade veio até nós comunicar que o carro que levaria o corpo de Alice até a igreja já estava esperando e que por isso precisavam fechar o caixão para leva-la, pois ainda haveria uma missão e recomendação da alma. Assim foi feito.

O momento em começaram a cobrir o caixão, e que me juntei a minha mãe e Carlos, notei Beatriz abraçar o namorado e tirá-lo do ambiente. As pessoas, agora um pouco mais numerosas, começavam a deixarem o local. Reconheci a mãe de Beatriz e observei a presença de Guilherme e Zé Carlos. Da sala em que estive com minha amiga, vi uma mulher, com a farda da funerária, trazer duas grinaldas, uma com os dizeres “A rosa de nosso jardim. Ass, André Almeida”, em letras douradas. A outra, com rosas lilás e carmim, dizia “Serás eterna. Ass. Seus amigos da USP”, e sorri com o carinho e consideração.

Fui um dos últimos a deixar o local, acompanhado de Carlos, e somente quando saia percebi a sua foto sobre uma bancada ao lado de uma vela e rosas vermelhar. Na foto, ela sorri abertamente, no mesmo instante que colocava os cabelos negros atrás da orelha. E foi aí que me dei conta que não a veria novamente, não a veria sorrir ou até mesmo chorar, que ela havia morrido e que não poderia criar sua filha, que ela havia se ido, para sempre.

As lágrimas vieram como uma barragem estourando, jorrando água sem ter como conte-la. Felizmente, Carlos estava ao meu lado e, como se entendesse o que acontecia em minha mente, me abraçou de lado e me puxou dali até seu carro, onde minha mãe esperava conversando com Felipe. Este apenas comunicou que iria em seu carro juntamente de Beatriz, o namorado e a mãe dela, pois nenhum estava em condições de dirigir. Eu, por outro lado apenas concordei com a cabeça, entrando no carro após ter a porta aberta por Carlos.

Ainda entre lágrimas, vi o caixão ser colocado no corro da funerária e as duas rodas de flores postas sobre o mesmo. Aos poucos as pessoas foram entrando em seus carros e com poucos minutos aquela música, que nos entristece e angustia ainda mais, começou a tocar, dando início ao cortejo. Durante todo o percurso até a igreja, não consegui em nada, minha mente estava nublada, e tudo que eu conseguia ver era uma destorcida imagem de Alice sorrindo, como na foto.

A lentidão do cortejo, aquela sinfonia melancólica e o sentimento de perda estavam me torturando. Quando finalmente chegamos a igreja, fui o primeiro a sair do carro, mas atendendo ao pedido de minha mãe, os esperei para que fossemos juntos até o interior da igreja. Fomos recebidos pela “Oração de São Francisco”, que ecoava pelos megafones da capela. Foi outro martírio ter de ver o caixão, eu já dentro da igreja, entrar pela porta principal e ser posto em frente ao altar principal ainda com as grinaldas. Logo um sacristão apareceu e acendeu duas velas grandes, uma de cada lado, e abrir uma pequena janelinha para que as pessoas pudessem ver o rosto da moça.

Não demorou muito para que o padre viesse acompanhado de dois coroinhas. A missão não foi longa, desejou serenidade e que seu descanso eterno fosse em paz. Além disso, pediu, se ela ouvisse, que protegesse sua filha neste mundo devasso, a guindo sempre pelo caminho da luz, que lhe mostrasse os verdadeiros amigos e que desse pais, de coração, que a amasse igualmente como ela amou sua filha. Por fim, jogando água benta sobre o féretro, fez a recomendação de sua alma, que fosse acolhido junto ao Deus que nos guia, e ao seu Filho, além da Virgem Maria, nos céus.

Quando finalmente teve fim a missa de recomendação de espirito, novamente quatro funcionários da vieram para buscar o caixão e levaram de volta ao carro, depois de pôr novamente a tampa da janelinha. Do mesmo modo, todas as pessoas começaram a deixar a igreja, mas dessa vez não entraram nos carros, pois o cemitério era ao lado. Seguimos ao som das mesmas músicas melancólicas, ao mesmo tempo em que era rezado o terço. Segui o cortejo acompanhado de Carlos e minha mãe, que me abraçou de lado. Beatriz ia um pouco mais a minha frente acompanhando o namorado, também o abraçando, e que mais uma vez usava os óculos escuro, assim como o meu professor. Felipe, por outro lado, estava com Guilherme, Zé Carlos uma das amigas de Alice.

Não demoramos a chegar ao nosso destino, literalmente. O carro fúnebre, que vinha a frente de todos, foi o primeiro a chegar. Como era impossível entrar dentro do cemitério, as coroas de rosas foram entregues uma a Felipe e outra para outra mulher cujo eu não conhecia, mas que parecia um pouco abalada. Em seguida, os mesmo quatro homens pegaram o caixão e caminharam lentamente com o mesmo para dentro daquele local indesejado, seguindo até uma cova aberta, no meio do cemitério.

O Padre, que vinha nos acompanhando desde a igreja, se posicionou em frente a cova e percebi os quatro homens segurarem correntes de ferro, amarrando-as nas laterais do caixão. Aquele seria o momento mais difícil, pois aquela seria nossa despedida de Alice.

Aos poucos fui me aproximando de André que chorava alheio a todos, segurando na mão de Beatriz, que também chorava, porém mais controlada que o namorado. Eu também não estava preocupado com quem estava me vendo chorar, aquilo doía, muito. Não era apenas a dor da perda, ou pelo que vivemos, mas por preocupação, remorso, culpa, compaixão, receio do futuro de sua filha.

Outra vez o padre fez recomendações, abençoando sua jornada e descanso eterno. O que se seguiu, para alguns, poderia ser descrito como teatro ou drama, mas eu sabia e entendia a dor de André. Sabia, mesmo que superficialmente, o que ele tinha passado ao lado de sua prima. Lembrava o drama que havia passado aquela jovem e o quão forte ela foi, graças ao primo que estava ao seu lado, para suportar toda aquela pressão e angustia que teve sua vida nos meses.

No instante em que colocaram o caixão na cova e despejaram a primeira pá de terra, André caiu sobre os joelhos, chorando abertamente, quase gritando, enquanto Beatriz tentava segura-lo. Quando pensei em fazer algo para ajudar, fui segurado pela minha mãe, enquanto Felipe e Guilherme correram para ajudar. Além deles, a mulher que momentos antes vi receber um dos arranjos de rosas, seguiu até o rapaz ajoelhado, o abraçando e o levantando, com ajuda dos rapazes que seguravam em seus braços.

André estava esgotado, era fácil perceber. Aquilo tudo era uma tortura para ele. Entretanto, seu choro logo sessou no mesmo instante em que seu corpo se amoleceu nos braços de Guilherme e Felipe, desmaiado. Pude ver o desespero de minha amiga e da mulher, que mais tarde descobri ser a mãe de André, tentando reanimar o rapaz, ao mesmo instante que era tirado do tumulto de gente.

Minha vontade era de acompanha-los, acalmar minha amiga, dizer que estava tudo bem. Mas não pude. Não porque não quis, mas porque fui impedido por Carlos e Dona Vitoria, minha mãe. No instante em que eram colocadas as últimas pás de terra, fui puxado pelos dois, mesmo sobre protesto. Contudo, pedi que meu professor fosse se certificar de que André, que estava sentado no carro dele enquanto era abanado pela namorada, estava bem.

Quando finalmente confirmei, aderido que ele seria levado ao hospital para ser medicado, fui levado, junto a minha mãe, para a casa de Cristian, a qual só estava a esposa e a filha. Eu me sentia exausto. Todas aquelas situações haviam me enfadado de tal maneira, que nem o sorriso e perguntas constantes da sobrinha de Carlos, seus constantes porquês, me fizeram relaxar.

Depois de tomar um banho e comer algumas coisas, forçado por todos, acabei por adormecer na cama que me foi oferecida, no quarto onde Carlos estava hospedado. O sono veio instantâneo, ao mesmo tempo em que descansei meu corpo sob os lençóis. Seque percebi se havia sonhado, acordei com alguns fracos puxões do lençol. Apenas vi o contorno de uma cabecinha escondida no pé da cama: Belzinha (REVER O NOME DELA), como Carlos costuma chama-la. Ainda me encontrava baixo astral, mas foi impossível não sorrir, mesmo fraco, com aquele jeito espontâneo dela.

- Izabelli... – a cunhada de Cristian apareceu na porta falando baixo. – Desculpa Bruno! Venha para cá! – Disse com a menina, que correu para fora do quarto, fugindo da mãe, no instante que a mesma fez menção de segura-la.

- Está tudo bem. – Minha voz estava mais grossa que o normal. Estranha, eu diria.

- Pode voltar a dormir. – Falou aludindo que sairia do cômodo, mas logo neguei.

- Não, está tudo bem. Já está na hora de eu levantar. – Sorri fraco já tirando a coberta de sobre mim.

- Então venha, sua mãe está na cozinha. Ela é sempre trabalhosa daquele jeito? Mesmo eu negando, insistiu em fazer o café, imagino que ela pensou que eu não saberia fazer um bom. – Ri mais uma vez do seu jeito brincalhão, mesmo parecendo tão séria. Ao mesmo tempo que falava gesticulava as mãos no ar e colocando-as na cintura por fim.

- Ela é sempre assim, trabalhosa.

- Menos mal, achei que ela tinha tido uma impressão errada de mim. Eu sou super prendada.

- Não é o que Cristian diz. – Carlos apareceu na porta, enquanto procurando meus chinelos no chão, de cabeça baixa, e o olhei assustado por sua presença repentina, ele por sua vez me sorriu fraco. – Bom dia.

- Desnecessário seu comentário. – Julia disse antes de sair do quarto, me fazendo rir.

- Se sente melhor? – Concordei com a cabeça, ao mesmo tempo em que ele caminhava em minha direção e sentou-se ao meu lado. – Falei com a Beatriz agora a pouco.

- Como está ela e André? – Minha voz continuava grogue, mas não dei importância.

- Ela está bem, e André já está em casa, tomou apenas um soro e um calmante.

- Como serão as coisas agora? – A pergunta foi mais uma reflexão de mim para comigo mesmo, me referindo a como eu me sentiria dali em diante, a situação da filha de Alice, como eu agiria sabendo da paternidade de Fernando, visto que eu havia feito uma promessa.

- Sua mãe irá ao hospital agora, ela tentará levar a menina para casa. – Carlos respondeu.

- Para a minha casa? – Perguntei assustado.

- Sim. Ela tentará ficar com ela até que a adotem, ou esteja maiorzinha para que seja lavada para um orfanato. – Suas palavras foram como uma flecha em meu peito., eu não poderia aceitar isso. Estava decidido, eu iria atrás de Fernando.

- Eu sei quem é o pai.

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Emoção.

Continuem enviando perguntas. Beijos Amados, até a próxima.

Comentários

Há 2 comentários.

Por Niss em 2015-10-14 00:49:58
Nossa. Muito triste esse capítulo.... Pelo menos o Carlos ficou com o Bruno o tempo todo e ele conseguiu fazer as pazes com o André. Espero que tudo dê certo com o Fernando e que ele consiga criar a filha. Senti Saudades Drex. Me desculpe a demora pra comentar. Espero pelo próximo. Kisses, Niss.
Por H.Thaumaturgo em 2015-10-13 00:03:40
Ai meo deos, quero ver como que o fdm do pai da criança vai reagir quando souber que msm sendo gay acabou com a vida de uma mulher por querer se vingar de um cara --'