Capítulo XXVI

Conto de Drexler como (Seguir)

Parte da série O destino de Bruno

E cá estamos nós de novo, antes do previsto. Tive um tempinho livre esse final de semana, e resolvi adiantar mais um capítulo. Boa leitura, amados!

Música tema: Eu não existo sem você – Tom Jobim.

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“Boa tarde Bruno Bernart

Segue em anexo dois arquivos pertinentes a nossa ultima discursão para fortalecer o desenvolvimento de nossa pesquisa e melhoria de seu artigo. Além disso, um pequeno exercício para que possa fixar melhor o conteúdo. Por fim, peço que elabore um pequeno resumo geral dos dois textos para que possa me entregar, todas as atividades requeridas, em nosso próximo encontro, que deverá acorrer nesta sexta-feira (27/08).

Atenciosamente,

Prof. Dr. Carlos Xavier.”

- “Que ótimo!” - pensei.

Havia se passado 15 dias desde meu desentendimento com meu namorado. Muito embora Claudia tivesse insistido para que eu conversasse com Carlos, não tive coragem de fazê-lo. Contudo, ele veio até mim, mas não conversamos muito, pois logo ficamos sem assunto, já que eu tentava evitar qualquer aproximação do ocorrido. Meu professor também se mostrou um pouco desconfortável com isso e rapidamente nos despedimos, sem abraço, sem beijo, sem selinho, apenas um sorriso amistoso, como aluno e professor, orientador e orientado.

Nossa relação profissional, como eficiente, ético e responsável que Carlos é, permaneceu inabalada. Reuníamo-nos na universidade diariamente, discutíamos, lanchamos juntos etc. Mas tudo voltado só e exclusivamente, ao nosso compromisso com a pesquisa cientifica.

Chorar tornou-se um habito diário meu. Acordava, e logo a dor e a angustia surgiam no peito e o choro era inevitável; na hora de dormir era a mesma coisa. A tristeza, mesmo que eu tentasse escondê-la, era visível. Nos últimos dias trabalhar e estudar eram as únicas coisas que me distraiam. A depressão, mais uma vez, estava me levando para meu destino final: a morte. Mas dessa vez, eu não tinha Carlos para me ajudar.

Reservei-me de todos o máximo que consegui. Depois que voltei de Paris, apenas duas vezes falei com meus pais. Todos os dias eu recebo mensagens deles querendo falar comigo, mas sempre invento qualquer desculpa para não ter que falar a verdade para eles. Com Felipe, apenas uma vez conversamos. Ele percebeu meu estado, afinal ele é o meu melhor amigo, e me conhece melhor que muitos. Apesar disso, ao que falei que não passava nada, não insistiu no questionamento. Embora agradecido por sal atitude, conclui que ainda está afetado pelo ocorrido alguns meses atrás com Beatriz, cujo contato só acontece por mensagens raramente. Claudia, por outro lado, está sempre tentando melhorar meu estado de espirito para melhor, mas sempre me recuso.

- Bruno você não pode ficar trancafiado nesse quarto dia e noite! – disse sentando na poltrona próxima a minha cama. Eu estava deitado sob uma colcha protegendo-me do frio que acompanha o outono que chegou, e com o meu computador sobre minha barriga, onde acabará de receber a mensagem do meu professor, Carlos.

- Não tenho nada melhor para fazer. – rebati.

- Bruno... – Claudia falou suspirando e se aproximando mais de mim e tomando minha mão entre as suas me fazendo finalmente encara-la. – Eu sei que já falei a mesma coisa milhões de vezes, mas vai falar com Carlos. Não aguento te ver mais assim.

- Eu... – fechei os olhos por alguns segundos procurando as palavras certas. – Eu não consigo. – falei olhando em sues olhos, mostrando o quão sinceras eram minhas palavras.

- Consegue! Logo que você chegou aqui me falou, em outras palavras, a mesma coisa, mas nós... – ela enfatizou o pronome no plural - ...conseguimos vencer o seu medo. Você estava mais sorridente, alegre. Feliz. Você sabe que consegue, que Carlos te ama, que você o ama. Então não fique se lastimando, converse com ele. Você já deu o primeiro passo, reconheceu seu erro, mas não para a pessoa certa. – em nenhum momento desviamos os olhos um do outro ou e Claudia solto ou minha mão.

- O que a senhora quer que eu diga? Que eu quero seu perdão, mas que nunca teria um filho com ele? Nunca realizaria seu sonho? E... Eu nã... Eu não posso. – minha voz quase não saiu embargada pelo chora. Minha visão estava turma, e logo um soluço escapou por meus lábios. Mais do que depressão, Claudia sentou-se na cama me acolhendo em seus braços.

- Bruno... – ela me chamou depois de um tempo. – Bruno, me responda. – ela segurou meu rosto mais uma vez entre suas mãos me fazendo encara-la. – Alguma vez ele mencionou que queria ter filhos? Com você? – hesitei um instante antes de responder.

- Não.

- Então. Você está tirando conclusões precipitadas criança.

- Por qual outro motivo ele estaria tão distante de mi, senão pelas coisas horríveis que falei para Rafael?

- Posso estar errada, mas pelo que você me contou, ele está magoado por acreditar que você tem vergonha de sua sexualidade.

- Mas eu não tenho. – disse quando mais um soluço ecoou pelo quarto. – Eu nunca tive.

- Eu sei criança, mas ele não sabe. E é por isso que tem que falar com ele. Você precisa falar com ele. Hoje.

- Eu não tenho coragem. – disse encarando a tevê na parede e lutando contra as lágrimas.

- Ok, tudo bem. Gabriel vai para uma festa hoje à noite, você irá com ele. – Claudia falou determinada enquanto levantava-se da cama.

- A senhora sabe que não tenho ânimo para... – como se ela lesse mentes, cortou-me antes de concluir minha frase.

- Festa? Você não tem ânimo para nada nos últimos dias. – disse olhando para mim uma ultima vez antes de fechar a porta do quarto e me deixar sozinho no cômodo.

Tão misteriosamente quanto Gabriel começou a me tratar com indiferença, para não dizer raiva, ele voltou à antiga preocupação que tinha comigo. Sempre que eu estava sozinho no quarto, ele aparecia questionando sobre como eu me sentia e tentava me animar e puxar assuntos aleatórios comigo. Não questionei o motivo de sua mudança de humor repentina, como também não protestei ou falei qualquer coisa com sua mãe. Apenas retribuí a amizade oferecida.

Deixando meus pensamentos de lado e limpando meu rosto das lágrimas que finalmente sessavam, relutantemente, decidi mandar uma mensagem ao meu primo Patrick querendo conversar com meus pais sobre os últimos acontecidos. Não demorou muito para que o mesmo respondesse que já estava indo para o escritório com meus pais. Mais rápido ainda os três apareceram na tela no meu computador enquanto eu me apoiava sobre a cabeceira tentando retribuir os sorrisos que eu recebia.

- Oi pai. Oi mãe. Oi Patrick.

- Finalmente lembrou que tinha família. – ironizou minha mãe ao que os demais me saudavam. Apenas revirei os olhos.

- Estava com problemas. – confessei.

- O que aconteceu galego? - perguntou meu pai serio com a voz carregada de preocupação. Os encarei por um instante com o objetivo te tomar coragem antes de começar a falar.

- Fala logo Bruno! – quase gritou minha mãe.

- Eu briguei com o Carlos. – disse em um sussurro desviando o olhar rapidamente.

- Com o professor? – ouvi a pergunta do meu primo, confuso. Certamente meus pais nunca contaram para ele.

- Sim.

- O que aconteceu filho? – indagou minha mão com a voz mansa.

Depois de tomar bastante folego, conte-lhes toda a verdade. Lhes narrei sobre meu preconceito sobre a adoção por pessoas do mesmo sexo, meu medo que estes possam fazer mal, tanto fisicamente – estupro, violência, etc. – como moralmente e psicologicamente. Disse sobre o desentendimento com meu namorado e, superficialmente, sobre o lema de Rafael, Marcel e Cristal, pois eu não teria o direito de contar para terceiros, por mais que estes fossem meus pais e meu primo, os quais confio minha alma. Por fim, contei sobre o medo que Carlos aparentou ter de eu não aceitar minha sexualidade.

- Porra primo, eu já suspeitava, você sabe disso, magoou o fato de não ter me contado que havia assumido o namoro com teu professor. – A brincadeira, desnecessária, acarretou em um tapa certeiro de minha mãe no pescoço de Patrick, que guinchou de dor.

- Primeiro: não fale palavrão. Segundo, sem piadinha. – disse minha mãe ríspida. – Bruno, você já conversou com ele depois disso? – perguntou voltando a me encarar e falando com a voz doce, como ela só ela tem. Apenas neguei com a cabeça, pois estava mais concentrado em não deixar as lágrimas, mais uma vez, lavarem meu rosto e ouvi-la. – E posso saber o por quê? – fechei os olhos e suspirei três vezes pesadamente tentando me acalmar.

- Nós só temos nos falado quando se trata de algo sobre a faculdade. Eu tenho medo de falar algo e magoa-lo ainda mais.

- Você... – antes que meu primo disse qualquer coisa, meu pai, para meu espanto, o reprendeu bruscamente.

- Se for abrir a boca para fazer mais piadinhas, saia daqui.

- Ok. – disse levantando as mãos em rendição. – É só que é um pouco estranho um gay ser contra a adoção por pessoas do mesmo sexo. - mais uma vez, meu pai lhe lançou um olhar de advertência. Mas fui eu quem falou.

- Não sou gay, sou bi. – lembrei.

- Dá no mesmo. Você namora um homem. – meus pareceram desconfortáveis com tal afirmação, assim como eu também fiquei ao os ver olhando para pontos aleatórios. - Mas o que eu quero saber qual é o motivo da briga de vocês, o fato de ele não concordar com sua opinião sobre a adoção ou a passagem de ele achar que você não aceita a sexualidade.

- Não sei... – confessei.

- Talvez devesse pensar mais nisso.

- Por quê?

- Porque se for o fato de você não aceitar sua sexualidade, não faz sentido a briga de vocês. Já passou pela sua cabeça que se você não se aceitasse, você não teria contado às seus pais? – disse Patrick piscando para mim. – Por outro lado, se for por consequência de seu discurso preconceituoso, fica complicado.

Quiçá meu primo estivesse com a razão. Quiçá Carlos estivesse duvidoso quanto a isso. Talvez eu realmente devesse lembra-lo para que possamos reconciliar, só não posso continuar sem ele do meu lado.

Conversar com meus pais e Patrick foi realmente uma boa ideia. Diferente de quando eu converso com Claudia, conseguiu me acalmar, afinal eles são minha verdadeira família. E que saudade eu sinto de estar perto deles, de abraça-los, das risadas de quando nos reuníamos aos finais de semana em que eu ia visita-los, dos momentos de descontrações. De tudo.

Passei o resto da tarde conversando com minha família no Brasil. Segundo meu pai, o caso de Bárbara está correndo bem, mas não havia mais nenhuma nova informação relevante. Patrick, depois de meses enrolando uma garota, a mesma que ele saiu na noite que fui visitar meus pais em nossa cidade natal para dar a noticia de meu intercambio em Portugal, a pediu em namoro e a apresentou a meus pais, que a amaram. O Senhor Flavio, meu pai, pareceu um pouco triste, pelo fato de eu, seu filho legitimo, namorar outro homem, mas nada disse e tentou sorrir o mais verdadeiramente possível. Por outro lado, meu pai surpreendeu-me ao dizer que já estava se acostumando com a ideia de eu namorar Carlos, se é que ainda namorávamos. E pediu, depois que conversássemos, para falar com ele. Todos nós.

Não fiz muita coisa relevante depois que me despedi de meus pais. Felipe, Beatriz ou sequer Guilherme estiveram disponível para que conversássemos, por isso dediquei-me a tocar alguns sambas em meu violão, o qual eu não fazia há um bom tempo. Gabriel, que não conhecia o ritmo, acabou por me fazer companhia. Tentei, em vão, ensina-lo a sambar, o que rendeu boas gargalhadas e vídeos que ameacei disponibilizar na internet, mas apenas mostrei a sua mãe. Pela primeira vez, em 15 dias, eu consegui passar um tempo sem pensar em meu namorado.

Finalmente, quando a noite chegou, Claudia, mais uma vez me obrigou a ir à festa com Gabriel. Seria em uma boate onde um amigo dele tocaria. Vesti uma causa calça jeans azul escura, uma camisa com gola em V juntamente com um casaco de lã cinza, um tênis vans, pois devido ao outono, Portugal começou a fazer mais frio. Gabriel não estava diferente de mim: calça jeans, casaco e tênis vans.

Rapidamente chegamos à dita boate. Já estava meramente lotada, mas para minha sorte, o nome de Gabriel esta na lista dos Vips, e eu, como convidado dele, pude entrar com tranquilidade. Logo que entramos, Gabriel foi cumprimentar seu amigo DJ. Assim como meu companheiro, o rapaz, que conheci por Rafael, tinha um pince no nariz e um alargador em cada orelha. Além de ser bastante receptivo. Contudo, não ficamos muito tempo com tal rapaz, pois em seguida dirigiu-se a mesa de efeitos. Com isso, restou-me acompanhar Gabriel até o bar, onde mais uma vez encontrou conhecidos, mas também não demorou muito com eles.

- Vai beber alguma coisa? – perguntou- me gritando para que eu o ouvisse.

- Eu não bebo. – assegurei sorrindo no mesmo tom de voz.

- Há drinks sem álcool.

- Não conheço as bebidas daqui.

- Não acredito que seja diferente das do Brasil. – disse me encarando e apenas de ombros. – Ok, vou pedir um Cranberry Frong. – suspendi as duas sobrancelhas em surpresa.

- Tudo bem. – respondi sem saber o que era. Seguindo os movimentos de Gabriel, sentei-me em um dos tamboretes que havia ao redor do bar enquanto fazíamos o pedido ao Barman. – Você frequenta muito esta boate Gabriel? – tentei puxar assunto ao que esperávamos nossas bebidas ficarem prontas.

- De vez em quando. E você? – apenas o encarei com o olhar séptico. – Digo, no Brasil, vai muito para as boates?

- Não. Nunca fui muito fã de festas. Só ia quando Meus amigos me forçavam ou íamos a uma danceteria de samba. – confessei lembrando-me de Gabriel, Pedro e Zé Carlos. Havia meses que eu não falava com qualquer um dos meninos, e eles, iguais a muitos de meu país, me fazia falta.

- Nunca mais me faça dançar samba. – Gabriel tentou soar serio, mas logo caiu na gargalhada ao que eu o corrigi.

- Sambar!

- Que seja. – disse tentando conter as risadas. – Mas eu gostaria de ir em... - perguntou-me com o olhar e sorri em retribuição.

- Roda de samba!? – indaguei.

- Exatamente. Deve ser legal.

- É muito. – disse recebendo meu drink.

Receoso, tomei um pequeno gole da bebida e espantei-me com o gosto. É realmente gostoso. O gosto da laranja e de alguma fruta que eu não sabia qual o nome até Gabriel me falar ser Cranberry, formam uma combinação perfeita. O cranberry esconde a acidez da laranja e adocica os lábios.

Quando voltei meu olhar para o outro lado do bar, por mais rápido que tenha sido, percebi que estávamos sendo observado por uma garota. Ela era loira, com cabelos compridos arranjados em uma trança vertical sobre seu busto. Sem duvida, ela era uma linda uma bela mulher. Antes de desviar o olhar para Gabriel, trocamos um rápido sorriso.

- Ela é bonita. – Gabriel disse ao que o encarei. Ele continha um sorriso de lado e provocador. – E parece estar interessada.

- Mas eu não estou. – falei olhando para qualquer lugar.

- Ela não para de olhar para você.

- Estou aqui para descontrair, não para ficar com uma garota. Até porque tenho namorado. – falei serio, agora admirando as pessoas que dançavam no ritmo da musica na pista de dança.

- Que eu saiba você está aqui para esquecê-lo. – falou desafiando-me. Com o olhar repreensivo, encarei Gabriel.

- Não estou aqui para esquecê-lo, apenas para descontrair. Amanhã eu vou falar com ele.

- Ele só te faz mal, não percebe? – acabei gargalhando exageradamente e com ironia.

- Mal? – sorri negando com a cabeça e tentando deixar aquele assunto morrer.

- Vou ao banheiro. – disse depois de um tempo em silencio e com meu aceno de cabeça, deixou-me sozinho no bar.

Acabei por olhar mais uma vez para a garota do outro lado do bar. Mais uma vez trocamos sorrisos. Fiquei distraído olhando as pessoas dançando, namorando e se divertindo na pista de dança. As pessoas pareciam alegres e descontraídas, jogando seus braços para o alto rebolando, jogando-se de um lado para o outro no ritmo da música. Mas ao que voltei a procurar à loira, não a encontrei a minha frente, mas ao meu lado, sentada no lugar que antes era ocupado por Gabriel.

- Procurando por alguém? – perguntou- me sorrindo. Ela vestia um vestido azul marinho estampado com pequeninas até metade das coxas. Eu não fazia ideia de como ela havia aguentado vir para a boate com tal roupa, pois mesmo que dentre estivesse fazendo calor, o lado de fora estava completamente o contrario.

- Esperando meu amigo. – sorri simpático.

- Amigos e suas manias de nos abandonar. – brincou.

- Pois é. – estava começando a ficar desconfortável com aquela situação. Evidentemente a garota esta dando em cima de mim, mas eu não estaria sendo justo com Carlos, tão pouco comigo mesmo, se saísse com a garota.

- Patrícia. – disse estendendo a mão.

- Prazer. Bruno. – cumprimentei-a.

- Prazer. – Sem mais, Patrícia aproximou-se e beijou-me cada lado do rosto. E ao se afastar, mordeu os lábios inferiores e sorrindo largamente.

- Está acompanhada? – tentei não ser deselegante.

- Não... Até te conhecer. – sorri nervoso. – Me paga uma bebida? – disse rindo. Demorei alguns segundos para responder admirando sua face: lábios salientes e sorriso sedutor. Devido à luz, não consegui ver qual a cor de seus olhos, mas acredito que sejam escuros.

- Claro. – suspirei pesadamente preocupado. – Qual você deseja?

- Que tal um Tom Collins com gin? – não protestei, apenas chamei o barman e fiz o pedido da garota. – Você não é daqui, não é?

- Não, sou brasileiro, estou em um intercambio.

- Que legal. E o que estudo? – perguntou ao mesmo tempo em que recebia sua bebida. Fiquei ainda mais desconfortável quando ela puxou o assento para mais próximo de mim.

- Pedagogia. E você, estuda?

- Sim, engenharia ambiental. – disse sugando pelo canudo e me encarando com um sorriso contido.

- Interessante. – O silencio que se segui foi constrangedor. Tentei focar meu olhar nas pessoas e procurar por Gabriel pela multidão, mas nada. - É... Eu... Eu não quero parecer desagradável... – disse ao que ela tentou me beijar e desviei o rosto. – Sou compromissado. – confessei mostrando-lhe a aliança prata igual à de Carlos.

- Oh! Desculpa. – falou afastando-se.

- Sem problema. – tentei sorrir ver simpático.

- Ela está por aqui? – indagou tomando mais um gole de sua bebida. Repeti o gesto antes de responder.

- Não, tivemos um desentendimento. – confessei sem olha-la.

- E veio para uma festa?! Acho que ela não vai gostar muito disso. – suas palavras chamaram-me a atenção. O que Carlos diria se soubesse que vim para uma boate? Que provas eu teria que não sai com outra pessoa? – Talvez... – disse passando o dedo indicador sobre meu peito. – Talvez pudéssemos aproveitar a ausência dela. – Patrícia entrelaçou seus dedos sobre meus cabelos e foi me puxando para mais próximo dela e fechando seus olhos.

- Desculpa, não vai rolar. – falei convicto afastando-me dela. – Eu o amo demais para isso. – sorri surpreso com minhas próprias palavras.

- O ama? – indagou enfatizando o pronome oblíquo átono.

- Sim. – falei tentando conter o sorriso provocado por minhas palavras.

- Você é gay? – perguntou confusa e surpresa me fazendo finalmente encara-la.

- Não, sou bi. Mas eu amo meu namorado. – Patrícia permaneceu seria por alguns instantes, o que me fez pensar que iria me menosprezar pela minha preferência, como o taxista parisiense. Ao invés disso, abraçou-me.

- Que lindo! – disse ao meu ouvido. – Ele é aquele rapaz que estava com você?

- Não... – ri. – Ele é só um amigo.

- Está mesmo brigado com ele? – perguntou quando finalmente sentou-se em seu tamborete novamente.

- Sim, infelizmente. – suspirei cansado.

- Você não deveria estar aqui. – aconselhou-me erguendo uma sobrancelha. Mas antes que ela ou eu pudéssemos dizer qualquer coisa, Gabriel apareceu novamente. Pela sua cara, percebi que alguma coisa havia acontecido.

- Estou indo embora. – avisou já me dando as costas.

- Ei, o que aconteceu? – indaguei segurando seu braço.

- Nada demais. Vai ficar por aí? – perguntou olhando para mim e Patrícia.

- Vim contigo, vou contigo. – virei-me para a garota loira ao meu lago e dei um abraço apertado na mesma me despedindo. – Foi um prazer te conhecer.

- Eu digo o mesmo. Pode me dar seu contato? Quero conhecer seu namorado. – disse segurando minhas mãos. Sorri verdadeiro para ela e trocamos contatos e mais um abraço acompanhado de um beijo na bochecha antes de eu sair atrás de Gabriel.

Encontrei Gabriel na entrada da boate acenando para um taxi. O rapaz parecia um pouco estressado com alguma coisa que eu não pude fazer ideia do que fosse. Sem dizer uma palavra, entramos no taxi e seguimos para casa. Para minha felicidade, o carro tinha barreira que permitia mais privacidade para os passageiros, então eu poderia certificar-me o que havia acontecido.

- Ok. Agora pode contar-me o que aconteceu. – disse o encarando depois de alguns minutos em silencio.

- Não foi nada. – respondeu-me olhando pela janela.

- Nada? Quando você me deixou sozinho no bar, estava alegre, e quando voltou, depois de horas, aparece emburrado e querendo ir embora. Alguma coisa muito seria aconteceu – argumentei tentado ver sua feição.

- Foi apenas um inconveniente.

- E posso saber o que foi? – mordi meu lábio inferior com medo de uma resposta indesejada.

- Um cara deu encima de mim. – respondeu-me com a voz calma ao que juntei minhas sobrancelhas em com fusão.

- O que tem de mais? Ele era feio? – perguntei rindo fracamente e ganhei um olhar fumegante de raiva de Gabriel.

- Não sou da laia do teu professor. – sua voz transmitia ódio.

- Primeiramente: respeite meu namorado. Depois, o que Carlos te fez para você ter tanta raiva dele? – perguntei calmo.

- É gay! – Gabriel jogou o corpo sobre o estofado do transporte e voltou a admirar as ruas pela janela do carro em movimento.

- Você também.

- Eu sou hétero! Eu gosto de mulher! – disse quase gritando.

- Sua mã...

- Ela mentiu. Eu já te falei isso.

- Ok. Digamos que tenha razão. – falei mudando minha abordagem. – Sua mãe mentiu. Você tem raiva de Carlos por ele ser gay, porque você é um homofônico. – disse calmo o fazendo voltar a me olhar. – Por que não sente raiva de mim? Eu namoro o Carlos, um homem.

- Você não é gay. – acabei rindo de sua afirmação, que não deixava de estar errada, mas sem sentido.

- Então você não tem preconceito com bissexuais? – indaguei incrédulo e tentando não rir.

- Você não é bissexual, só está confuso, como eu estive. – gargalhei ainda mais alto ao ouvir suas palavras. – Eu vi você conversando com aquela garota e sinto muito por ter estragado seus planos para hoje.

- Não estragou nada, porque não iria acontecer nada. Ela sabia que eu tinha namorado. – disse fechando os olhos e escorando minha cabeça no estofado.

- Você é um babaca.

Dona Claudia não estava mentindo quando disse que seu filho era gay, disse eu tive certeza. Talvez o fato de Gabriel ter sofrido muito preconceito em seu período de aceitação o tenha afetado. Claudia já havia me contado de pelo menos dois incidentes graves que fizeram Gabriel se sentir acuado por ser homossexual, do qual um quase o matou. Como consequência, o rapaz criou uma repulsividade com os semelhantes. Assim como muitos, Gabriel deixou de vivenciar sua homossexualidade, mesmo que clandestinamente, com medo da punição social.

Quando finalmente chegamos em casa, decidi o que poderia fazer para ajudar o garoto. Depois disso conversaria com sua mãe e Carlos para que, juntos, pudéssemos abrir os olhos de Gabriel. Claudia sempre mostrou ser uma mulher de mente aberta e que entendeu e apoiou à condição sexual de seu filho.

Com toda a ajuda que recebi dessa família, ajudar Gabriel a se redescobrir, seria apenas uma parcela de tudo que devo para eles. Eu estaria morto, ou perdido, se eles não tivessem me resgatado quando tentei suicídio. Não estou completamente curado, mas poderia nunca ter tido uma melhora consideravelmente rápida se não fosse por eles. Eu faria isso por eles, como eles fizeram por mim.

- Gabriel! – chamei quando ele fez menção de abrir a porta da casa. Como ele estava com raiva ainda em consequência da tal cantada na boate, havia saído apressado do taxi me deixando para trás. – espera, quero falar uma coisa. – depois que finalmente o acompanhei, respirei fundo antes de continuar. – Você disse que não é gay, que foi só uma fase. Sua mãe discorda. Ela me contou muita coisa de você, por exemplo, sobre o seu primeiro namorado, um carinha bem mais velho que você.

- Ela falou o quê? – ele tenteou controlar a voz para não gritar e perturbar os vizinhos, ao que me encolhi com certo medo.

- Ela estava tentando me ajudar, por isso ela me contou. Não diga para ela que te contei, eu só queria...

- Ok. Fala logo o que você quer. – falou irritado e me dando as costas.

- Que me prove que você não é gay. – falei de uma vez olhando ele virar-se de repente para mim. Sua face era um misto raiva e curiosidade.

- Como assim? – indagou com a voz mansa e os olhos semicerrados.

- Me beije... – não tive tempo de dizer nada mais, quando dei por mim, Gabriel segurou minha cintura puxando-me para si e unindo seus lábios aos meus iniciando um beijo acelerado. Depois de alguns segundos tentando raciocinar, finalmente fechei os olhos e segurei em sua nuca agarrando em seu cabelo e introduzi minha língua em sua boca brincando com sua língua.

Comentários

Há 2 comentários.

Por Niss em 2015-07-12 23:54:43
Noooossa que doideira. Gostei da garota da boate, nem pra muitas terem essa mesma compreensividade. Amei. Bjs Niss.
Por CarolSilva em 2015-07-12 22:52:15
Que ideia foi essa??? Que loucura!