Capítulo XXV

Conto de Drexler como (Seguir)

Parte da série O destino de Bruno

Quem desejar conversar comigo ou Cesaria Évora sobre a serie ou deixar criticas e comentários privados ou, ainda, sugestões: j.drex@hotmail.com << Responderei todos os e-mails nas Quartas-feiras. Abraços e boa Leitura!

Música tema: Quem é você pra mim - Roberta Campos

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Eu não consegui me mover por alguns instantes. Senti minha respiração parar enquanto assistia aquelas pessoas entrarem no apartamento do meu namorado. Eu ainda não me sentia preparado para encarar Rafael e Marcel, e com o filho do casal, Caíque, e Cristal tudo ficou pior. Mesmo que eles não tivessem feito nada contra mim, a sensação de culpa ainda me corroía.

- Oi Bruno, como você está? – Rafael, como sempre simpático, veio ao meu encontro e me levantei para abraça-lo.

- Tô bem, e você? – tentei, talvez sem êxito, esconder meu desconforto.

- Bem também.

- Oi Bruno. – para minha felicidade, Cristal apenas acenou para mim de longe ao que eu retribui o gesto. Marcel apenas cumprimentou-me com um aceno de cabeça.

- Deixe-me pegar esse garoto! – Carlos quebrou o silencio que se instalou no ambiente e logo segurou Caíque no colo abraçando e esfregando o nariz nas bochechas e pescoço do menino, o que arrancou muitas gargalhadas. – Tudo bem Caíque? – o garoto apenas afirmou freneticamente com a cabeça ao mesmo tempo em que roía a unha do dedo indicador. – Você sabe quem sou eu? – encarou risonho o menino que negava com a cabeça tímido. – Sabe não? Oh, meu nome é Carlos, sou seu amigo. – o menino olhou para o pai em um pedido silencioso para tira-lo daqueles braços, o que foi logo atendido.

- Como foi à viagem e o congresso? – Perguntou Marcel com o garoto nos braços.

Enquanto Carlos, Rafael e Marcel discutiam sobre os debates, minicursos, meses redondas e adjacentes que participamos no Congresso de Paris, permaneci apenas observando a conversa, ainda que Rafael insistisse em me perguntar e interagir comigo. Além disso, mesmo que eu não a olhasse, sentia o que Cristal me encarava também em silencio. Em nenhum momento tentou falar comigo, ao que agradeci por isso.

Por fim, Carlos presenteio-os com algumas bugigangas que compramos em Paris e um vinho para o casal e outro para Cristal. Acabamos indo para a cozinha, aonde Carlos abriu uma garrafa de um legitimo Champanha, um vinho branco espumante. Abriu alguns frios continuaram a conversar, enquanto o garoto, que havia pegado no sono, dormia no quarto de meu namorado. Sentei na lateral da mesa da cozinha ao lado de Carlos, a nossa frente ficou Rafael e Marcel e na ponta, longe de mim, Cristal.

- Eu preciso conversar com vocês. – Disse em um tom serio. Senti que as palavras de Rafael foram mais para mim e Carlos mesmo que tivesse olhado para cada uma da mesa.

- Sobre? – Carlos perguntou enquanto pegava mais um petisco e degustava um gole de seu vinho e em seguindo da água.

- Eu não sei como falar isso... – Rafael estava completamente perdido com as palavras.

- Amor... – O som daquela palavra saindo da boca de Marcel me fez inchar de raiva.

- A gente já conversou. – disse ríspido para o outro. O clima havia mudado completamente. Rafael não olhava mais para a face de seu marido e Cristal mantinha a cabeça baixa. Eu já podia prever que o adultério havia sido descoberto. - Vocês sabiam de tudo, não era?

- Rafa...

- Não Carlos, tudo bem, eu te entendo. Eu no seu lugar também não teria falado nada.

- O que você pensa em fazer? – Carlos perguntou preocupado e com cautela. Ninguém ligava mais para a bebida nas taças, ao mesmo tempo em que eu mantinha-me calado e remoendo-me de irritação.

- Não sei... Será que podemos conversar a sós? – Carlos apenas consentiu com a cabeça e levantaram-se me deixando com Marcel e Crista. – Bruno. – olhei assustado para a figura na porta. – Poderia vir também? – levantei-me lentamente e o acompanhei para o quarto de hospede onde Carlos esperava na porta.

Não sei se eu realmente queria ter os acompanhado ou ficado na cozinha com o adultero e a outra, a amante. Minha única certeza era que eu preferia estar na casa de minha segunda mãe, Claudia, falando com minha mãe, Vitoria, e meu pai por web-vídeo, contando sobre cada detalhe da viagem, sobre minha tia, sua filha, mostrando tudo que havia comprado para eles e para mim.

- Então... – Rafael começou. Ele andava de um lado para o outro do quarto, enquanto eu e meu namorado estávamos sentados lado a lado na cama. – Estou com medo...

- Medo? – Tanto eu quanto Carlos mantínhamos uma expressão de curiosidade.

- Sim. Medo de me arrepender.

- De que? – Carlos motivou que continuasse quando se fez silêncio.

- O que vocês fariam no meu lugar? – Rafael parou em nossa frente e nos encarou com os olhos em lagrimas.

- Como assim? – eu mantinha-me calado, sem saber ao certo qual era a sensação que sentia.

- Eu amo o Marcel. Temos um filho juntos.

- Não estou entendendo aonde você quer chegar.

- Vou explicar. – ele suspirou pesadamente e fechou os olhos antes de continuar. – Carlos, você conhece minha historia com o Marcel, sabe que ele nunca havia se envolvido com outro homem antes de mim. – a noticia me deixou um pouco em choque, pois era a primeira vez que eu conheceria a historia daquele casal. – Ele terminou o noivado de anos por mim.

- Sim, lembro.

- Então lembra que ele traiu a namorada comigo. Percebe? Ele a deixou depois que começamos a sair. Esta se repetindo. Não quero perde-lo. – fartas lágrimas já brotavam nos olhos de Rafael ao que ele levava as mãos aos cabelos e puxava-os em desespero.

- Então não o deixe ir.

- Mas ele nunca será só meu. Esse é o meu medo: ele era hétero, sempre gostou de mulher. Ele sempre vai ter a necessidade de algo que eu nunca vou ter. Que eu não posso dá-lo.

- Desculpa. – tomei a palavra pela primeira vez. – Eu entendo seu pensamento, e na verdade não discordo em tudo. Acontece que o fato dele ser bissexual agora não quer dizer que ele tenha de materializar esse desejo. Rafael, entenda que eu não quero influenciar em sua escolha, só quero deixar minha opinião clara. Eu sou bissexual. – disse olhando brevemente para Carlos que mantinha um olhar curioso. – Mas não é por isso que eu tenho que sair com mulheres só porque Carlos não tem... Alguns atributos. Ou se eu estivesse com uma mulher, sair com um homem. Não faz sentido.

- Eu concordo, mas me sinto inseguro por ele olhar para elas com desejo.

- Independente de sua sexualidade isso irá acontecer. Eu sou bi, e mesmo namorando o Carlos, vou sim sentir atração pelas mulheres bonitas ou pelos homens. Assim como Carlos, que é gay, irá achar outros homens atraentes. Ou ainda uma mulher hétero vai achar outros homens bonitos e irá deseja-los ou vice versa. Não importa a sexualidade ou o estado civil, a atração física sempre irá acontecer. – disse lembrando-me do dialogo semelhante que tive com Aline ainda no Brasil.

- Uau Bruno – Carlos exclamou surpreso. – Isso quer dizer que você não se incomoda de eu olhar para outros homens?!

- Me incomodo sim. Nunca faça isso, e se fizer, faça de maneira que eu não perceba. – disse com os olhos semicerrados. Meu professor apenas levantou as mãos em rendição.

- O que você faria se Carlos te traísse? – Rafael perguntou sentando-se ao meu lado.

- Eu não sei... Veja, eu também am... – a palavra ficou presa em minha garganta, não consegui dizer para outra pessoa que não fosse o próprio. Apenas limpei a garganta e continuei. – Eu nunca suportei a ideia de traição. Eu acho que não perdoaria.

- Acha?

- Sim. Depende da intensidade do que eu sinto. Além disso, minha vó sempre dizia: “nunca diga nunca”.

- E você Carlos?

- Acho que o mesmo vale para mim. – respondeu me olhando nos olhos. – Mas prefira nunca descobrir Bruno. – acrescentou e eu sorri como resposta, pois esse era o mesmo pensamento que eu tinha.

- O que você pretende fazer? – Rafael suspirou fundo antes de me responder.

- Eu já fiz. Vou perdoar o Marcel. – Eu não soube o que pensar. Mesmo que ele estivesse perdoando o marido por uma traição, não fazia sentido trazer a amante e ainda deixa-la carregar seu filho.

- Você já conversou com ele? – a voz de Carlos tirou-me de meus devaneios.

- Já. Eu descobri tudo há duas semanas. Mandei-o embora de casa e ele ficou hospedado na casa dela. Ele me contou tudo semana passada, quando o chamei para conversarmos.

- Eu sei que esse não é o momento, mas como você descobriu? – mais uma vez meu namorado rompeu o silencio.

- Ele me contou. Marcel disse que Bruno havia descoberto e falado algumas coisas com eles dois. Na verdade ele ficou com medo que Bruno me contasse e preferiu que eu descobrisse por ele mesmo, do que por terceiros.

Era um pouco angustiante ver um homem daqueles, na casa dos 30, doutor, professor universitário e pai, sofrer tanto por amor. Por uma traição de seu marido com a mulher a quem eu apresentei. Eu era o responsável pelo adultério. Se eu não tivesse apresentando-a, em nenhum momento o casamento deles teria entrado em crise como agora. Em nenhum momento Rafael estaria sofrendo tanto quanto agora. Eu, e somente eu, era o responsável por tudo que estava acontecendo no casamento deles.

- O que vocês conversaram?

- Marcel continua insistindo que eu sou único para ele, que ainda me ama e que não saberia viver sem mim. E tudo isso se aplica ao que sinto por ele. Mas Cristal também... Ele não disse que a ama, é apenas atração física, mas que gosta dela, que ela é importante para ele. – ficamos em silencio por um instante antes de Rafael continuar a falar. – Ele propôs vivermos juntos. Nós três. Quatro, contando com meu filho.

- E você aceitou? – quis se certificar Carlos por nós dois.

- Sim. – respondeu em um sussurro. Eu e meu professor trocamos olhares significativos e preocupado antes de Rafael continuar – Ela é uma boa pessoa, eu gosto dela. Não da mesma forma que ele, porque eu sou gay e não sinto nada além de afeição. Cristal tem ajudado a cuidar do Caíque e ele parece gostar muito dela.

- Vocês já estão morando juntos? – perguntei curioso.

- Não, ainda não. Ela passa um tempo lá em casa, mas ainda não está definitivo. Estamos indo aos poucos, sabe?!

- Certo. E como você está se sentindo quanto a isso? – Indagou Carlos com preocupação o encarando nos olhos.

- Ainda é muito recente, não sei dizer ao certo. – respondeu desviando olhar para qualquer canto.

- Você tem certeza que vai conseguir conviver nesse relacionamento? Digo, seu marido com outra mulher, na sua casa. Não será fácil.

- Eu sei Carlos, mas eu o amo demais para me separar dele. Eu prefiro que seja alguém que eu conheça e que sei que é uma boa pessoa. Acho que seria pior se fosse com qualquer uma em qualquer lugar. Tenho certeza que ela não foi à primeira, nem será a ultima. Então que seja alguém certo. Além de tudo isso, tem o Caíque, ele gosta dos dois. Não quero que meu filho cresça sem o contato com o outro pai ou que tenho um pai ausente. – disse ainda sem olhar para nenhum de nós dois.

- Tem certeza que você pensando no seu filho? – perguntei um pouco mais ríspido. – Além do fato de ser criado por dois homens, agora será em uma relação a três? Já passou pela sua cabeça o que irão dizer com ele? O que ele irá sofrer?

- Bruno...

- Não Carlos. Isso é inadmissível. – disse com o tom de voz mais alterada e me levantando da cama para encara-los de frente. – Pode imaginar a confusão que ficará a cabeça daquela criança? Ter dois pais e uma mãe. Primeiro que são dois homens que dormem juntos, ainda tem uma mulher que dorme com eles. Vocês vão o que, dormir os três no mesmo quarto, na mesma cama? Isso é nojento. A cabeça daquela menino vai ficar uma confusão.

- Chega Bruno! – Escutei o grito de Carlos enquanto encarava Rafael que mantinha as mãos cobrindo o rosto chorando um pouco alto. Meu namorado levantou-se da cama e ficou a minha frente. – Olha o que você falando. Não faz sentido. E olha como você está deixando o Rafael. – acrescentou com a voz um pouco mais calma.

- Estou falando a verdade. E além de tudo isso que falei, ainda tem o fato de que quando ele crescer irá sofrer preconceito por ter dois pais. Ou melhor, por ter pais que vivem um relacionamento aberto. Isso é ridículo. Isso se ele não seguir o exemplo e não for gay também. – expliquei exasperado.

- Como é? – Carlos mantinha uma expressão de incredulidade. – Não posso acreditar nas palavras que você proferiu. Não vindas de você. – disse dando-me as costas com as mãos no quadril. Antes pude ver uma lagrima descer sobre seu rosto. – Não passou pela minha cabeça que meu namorado poderia ser tão preconceituoso.

- Com licença... - eu j á havia me esquecido da presença de Rafael no quarto, até que ele saiu ainda chorando.

- Não falei nenhuma mentira. As pessoas vão sim julga-los. – disse já com a voz embargada.

- Não foram elas que julgaram agora, foi você. – finalmente ele me encarou nos olhos e pude constatar que Carlos também chorava. Senti meu peito arder de angustia. – Me fala a verdade, você sente vergonha de ser gay?

- Eu sou bissexual. – Carlos não disse mais nada, apenas saiu do quarto me deixando só. Antes que eu pudesse acompanha-lo, limpei as lágrimas que começavam a descer.

Quando finalmente cheguei à sala, encontrei Carlos abraçado a Rafael enquanto falava alguma coisa em seu ouvido ao mesmo tempo em que Cristal também tentava acalma-lo acariciando suas costas consolando-o. Antes que eu pudesse procurar por Marcel, ele apareceu atrás de mim com o filho nos braços ainda dormindo. Sem sequer olhar para mim, avançou para os demais próximos a porta. Apenas fiquei em silencio os olhando na entrada do corredor lutando com as lágrimas que insistiam em quer descer e a dor que só aumentava em meu peito.

- Obrigado pelas lembranças Carlos, a gente se ver na faculdade. – Marcel disse apertando a mão de Carlos e olhando rapidamente em minha direção antes de sair pela porta que meu namorado abria.

- Não foi nada. E desculpa por tudo.

- Não se preocupe quanto a isso. – Marcel falou tentando sorrir.

- Espero que possamos terminar nossa conversa Rafael. E com vocês também. – Rafael apenas acenou com a cabeça, dando um ultimo e rápido abraço em meu professor e saindo.

- Até mais Carlos. – Cristal disse acompanhando o outro.

Finalmente meu namorado fechou a porta ficando apenas nós dois em seu apartamento. Esgotado, Carlos escorou a cabeça sobre a porta, ainda com uma das mãos na maçaneta. Eu, por outro lado, ainda estático na entrada, deixei que um soluço saísse de minha boca fazendo minha presença ser nota. A dor em meu peito aumentava gradativamente ao passo que meu professor se virou para me encarar. Assim como eu, Carlos tinha os olhos vermelhos e o rosto molhado de lágrimas.

Ele não disse nada, apenas andou e minha direção e passou por mim sem dizer uma única palavra e entrou em seu quarto fechando a porta com um grande barulho. Sua expressão era um misto de cansado, tristeza, decepção e descrença. Mais uma vez eu havia conseguido magoa-lo. Mas eu nada poderia fazer, estas eram minhas concepções e, mesmo que eu quisesse, não conseguiria muda-las para agrada-lo. Desta vez eu tinha estragado tudo não só com Carlos, mas com seus amigos. Com os nossos amigos.

Chorando alto, arrastei-me até o sofá e me joguei nele abraçando uma das almofadas. Não consegui conseguia pensar em nada, se não na tristeza que exalava no rosto de meu namorado. Dessa vez eu deliberadamente o havia feito chorar.

Em meio ao choro e o cansaço, acabei adormecendo ali mesmo. Acordei com o celular, ainda em meu bolso, tocando freneticamente. Contudo, no instante que para olhar o identificador de chamada, parou. Antes percebi que era Claudia e que já tinha mais sete ligações anteriores da mesma. Olhando a hora no celular, percebi que já era um pouco tarde da noite. A casa estava completamente silenciosa e pensei muito antes de ir ao quarto de Carlos vê-lo, porém, já com a mão na maçaneta, desisti. Ele certamente não queria me ver, e isso me causou uma nova crise de choro, mas silencioso.

- Oi – tentei manter minha voz firme ao atender o telefono no primeiro toque já sabendo de quem se tratava. Arrastando os pés, segui para o quarto da frente, o de hospede, e também me tranquei.

- Oi Bruno. O que aconteceu? – Claudia tinha a voz preocupada na voz, o que me fez me perguntar o motivo de ela estar ligando a quase meia noite.

- Nada. – menti tentando abafar o choro insistente. – Mas eu que pergunto: o que aconteceu para estar ligando essa hora à noite?

- Não minta para mim Bruno. O que aconteceu? – perguntou com a voz firme. Sem o meu consentimento, um soluço escapou pelos meus lábios. – Diga Bruno!

- Eu briguei com Carlos. – disse quase em um sussurro.

- Oh meu Deus Bruno. O que aconteceu? – antes que eu pudesse dizer qualquer coisa ela continuou. – Não! Onde você está?

- Na casa dele.

- Estou indo te buscar.

- Não precisa Claudia. Eu estou bem. – disse fungando e com lágrimas incessantes.

- Pela sua voz estou percebendo a sua tristeza, e você ainda diz que estar bem?!

- Fique tranquila, vou ficar bem.

- Bruno... – sua voz era de suplica, mas não deixei continuar.

- O que fez a senhora me ligar a essa hora? Aconteceu algo?

- Aconteceu, você brigou com Carlos.

- E como a senhora soube? – perguntei confuso.

- Não importa. – eu sabia que havia algo que ela não queria me contar, por isso fiquei em silencio sentindo minhas lágrimas lavar meu rosto. Depois do que pareceram horas em total silencio, finalmente ela me revelou. – Carlos me avisou. Tentei ligar para você antes, mas você não me atendia.

- Estava dormindo.

- Estou indo te buscar.

- Não Claudia, já disse, não precisa.

- Não posso deixar você assim criança.

- Não há nada que o sono não melhore.

- Tudo bem. Pelo menos me prometa que virá logo cedo para cá. – Consegui rir um milímetro com sua preocupação.

- Prometo. – disse balançando a cabeça como se ela estivesse ao meu lado.

- Tudo bem. Vou desligar, até amanhã.

- Até, beijos. – disse desligando posteriormente.

Como eu já estava sentado à cama, apenas desabei com o corpo para trás esparramando-me sobre a mesma com os braços esticados. Fechei os olhos tentando impedir que as insistentes lágrimas continuassem a cair. Depois de algum tempo, com muito esforço, arrastei-me sobre o móvel e me enrolei no lenço da cama e, sem nenhum ânimo, adormeci.

Não sei por quanto tempo eu dormi, mas não pareceu ser muito tempo. Sequer olhei a hora no celular ou em qualquer outro canto. Ao sair do quarto, percebi que o quarto da frente continuava com a porta fechada. Tão-somente, rumei para o banheiro no fim do corredor a fim de fazer minha higienização matinal. Ainda vestia a mesma roupa da noite passada e o mesmo desanimo e angustia enchiam meu peito de dor.

Abatido, deixei o apartamento sem sequer ver meu “namorado”. Peguei o elevador e, para pirar minha aflição, ao chegar ao terceiro andar, ele parou para que Cristal entrasse me saudando. Não consegui ficar com ela no mesmo ambiente e sai no mesmo andar. Não era somente pelo motivo de eu a ter apresentado minha amiga a Rafael e Marcel, mas por não ter coragem de olhar em sua face depois de tudo que eu disse. Vergonha. Eu sentia vergonha de encara-la e ao mesmo tempo raiva da situação.

Depois de esperar alguns minutos, o elevador chegou novamente. Peguei um taxi assim que atravessei o piso térreo e cheguei à rua. Sentia que parte de mim estava sendo ficando para trás. Eu estava sendo dilacerado por mim mesmo. Eu tinha certeza que Carlos não iria querer nada mais comigo por achar que eu tinha vergonha de minha sexualidade, sendo que eu era muito bem resolvido. Poderia ele achar que eu me denominava bissexual por vergonha de me assumir definitivamente gay?

Não era isso. Eu sabia que não. Mas o fato de eu não aceitar a adoção por casais do mesmo sexo o havia magoado. A alegria com que Carlos brincou com Caíque em seu apartamento me fez ter certeza que ele gostaria de ser pai. Eu queria ser pai. Imagino que é ser pai/mãe é um sonho quase universal. Mas eu não poderia ter um com Carlos. Não por ser ele, mas por ser homem. Eu não conseguiria.

Quando dei por mim, já estávamos em frente à casa de Claudia e percebi meu rosto novamente lavado pelas lágrimas. Após pagar o devido valor ao motorista e apertar a campainha duas vezes, a porta foi aberta por Gabriel, que a me ver, fechou a cara instantaneamente me dando espaço para que eu entrasse. Claudia estava na cozinha terminando de preparar o café. Ao perceber minha presença, rapidamente veio ao meu encontro limpando minhas lágrimas secas em meu rosto e me abraçando.

Antes que subíssemos para o escritório para que pudéssemos conversar, talvez mais uma consulta com minha psicóloga – a própria -, ela me forçou a tomar um café reforçado junto dela e seu filho que apenas me olhava de rabo de olho. Por fim, fomos, eu e Claudia, para a pequena saleta que era o escritório. Havia apenas uma estante que consumia toda uma parede, duas poltronas com uma mesinha de centro entre elas e, ao pé da parede, uma bancada com alguns enfeites. Pude ver, encima da bancada, pregado a parede, estava o quadro que havíamos a presenteado.

- Então, o que aconteceu? – com muita dificuldade, conte-lhe tudo que havia acontecido. Desde a chegada de Rafael, Marcel, Caíque e Cristal, como eu me senti na presença deles, o desabafo de Rafael para com Carlos e eu e, por fim, meu discurso preconceituoso que desencadeou minha rápida discursão com meu namorado. Também mencionei que não o tinha mais visto desde a noite passada.

- Eu só falo o que não devo Claudia. Carlos está sempre do meu lado, me ajudando em tudo. Tenho certeza que se não fosse por ele, minha depressão já me teria feito cometer suicídio. – falei exasperado. Percebi que, assim como Carlos, Claudia ficou um pouco chocada por eu admitir que tivesse depressão, pois nunca a havia falado que sabia do meu problema psicológico. – Ele é meu pilar, e eu estou sempre estragando tudo entre nós.

- Criança, você não pode ficar se culpando, sabe disso. Você foi sim preconceituoso, mas nada que não possamos rever este conceito. Mas não vamos nos aprofundar agora nesse assunto. – estávamos sentados frente a frente nas poltronas e nos encarando nos olhos um do outro. – Inicialmente, quero te parabenizar. O fato de você ter conseguido estar com eles no mesmo ambiente, conversar, interagir com eles, já é um avanço. Isso mostra que o seu tratamento esta surtindo efeito. Sua melhora já é muito evidente. – disse sorrindo e segurando minhas mãos. – Agora, o que você não pode é se culpar por tudo que acontece. – disse ficando seria novamente. – Embora seu discurso seja não admissível, é a sua opinião e Carlos terá que respeitar. Não estou o julgando, porque também entendo o lado dele, mas ele não devia ter deixado você sozinho. Contudo, ele fez bem em me avisar. Enfim. Terei que conversar com ele.

- Não! – quase gritei nervoso. – Não quero que a senhora fale com ele para que se sinta culpado e venha me pedir desculpa. Eu sei que era eu que estava errado. Que estou, na verdade. – ficamos em silencio por alguns instantes antes de eu continuar. – Carlos nunca irá me perdoar por isso. Nós nunca falamos sobre isso, mas eu sei que ele quer ser pai um dia, e eu não tenho coragem de adotar uma criança. Não com ele. Qual exemplo eu poderia dar para essa criança? Se um dia eu chegar a me casar com Carlos, o que quero mais que tudo, e adotássemos uma criança, nunca poderíamos trocar caricias a vontade pela casa com medo que ele nos veja ou qualquer coisa. Ademais, seus amiguinhos iriam fazer bullying com ele. Eu não suportaria ver uma criança sofrer por minha causa.

- Sei que foi uma pergunta retorica que você fez, mas vou te responder. O exemplo que vocês dariam para essa criança seria a do respeito. Ele cresceria vendo que o amor está além do gênero masculino ou feminino. Que não escolhemos com quem iremos nos relacionar, sentir atração, amar. Se hoje os orfanatos estão cheios, se vemos jornais noticiando que foi encontrada uma criança dentre de sacolas jogadas em lixeiras, rios, becos e adjacentes, não foram casais homossexuais que jogaram, acredite.

- Eu sei disso. Mas ainda sim haverão pessoas o julgando por ter pais gays.

- E não é isso que você está fazendo, julgando? – Permaneci em silencio, sem argumentos. – Mas como eu disse, esse não é o foco de nossa conversa hoje.

- Carlos perguntou se eu tinha vergonha de ser gay. – disse virando o rosto com vergonha. Eu não tenho vergonha de minha sexualidade. Muito pelo contrario, agradeço a Bárbara por ter me ajudado a me descobrir.

- E o que você lhe disse? – Claudia indagou me fazendo encara-la.

- Que eu não sou gay, sou bi. Acho que ele entendeu errado e ficou chateado.

- E você tem vergonha? – perguntou com a voz mansa.

- Não! Sempre fui muito bem resolvido. Não saiu por aí gritando para todo mundo minha sexualidade, porque acredito que não devo satisfação da minha vida a ninguém, mas também não nego. Meus amigos todos sabem minha sexualidade e me respeitão. Também nunca recusei andar de mãos dadas com Carlos pela rua, mesmo com o medo que tenho. – expliquei tudo olhando diretamente nos olhos de minha psicóloga que olhava para mim me analisando.

- Medo de que, exatamente?

- De sofrer preconceito. Principalmente depois do que aconteceu em Paris. – Claudia não precisou dizer nada, apenas levantou uma de suas sobrancelhas em questionamento. – Quando a gente estava indo para a Universidade de taxi, acabamos que nos beijando. O motorista parou o carro no meio da avenida e nos mandou descer dizendo coisas horríveis conosco. – relatar as lembranças daquele dia fizeram com que lagrimas grossas e dolorosas surgissem em melos olhos, mas rapidamente as limpei.

- Essa é uma minoria.

- Assim como a comunidade LGBT.

- Eles são uma minoria ainda maior. – disse rapidamente sorrindo de lado. – Há héteros na causa de vocês, imagino que saiba.

- Sim, eu sei. – concordei suspirando.

- Voltando. Por que você se considera bi?

- Entendo os heterossexuais como sendo pessoas que sentem atração pelo sexo o posto. Gays, ou homossexuais, como preferi, são quem sentem atração por pessoas do mesmo sexo. Por fim, os bissexuais, que sentem atração por... Pelo ser humano. Carlos mesmo, em uma aula ainda no Brasil, quando o perguntaram sobre sua sexualidade, ele disse que amava o ser humano em suas perfeitas imperfeições. Eu adotei essa linha de pensamento. Mas ele me afirmou ser gay, então... Enfim, acho que a senhora entendeu o que eu quis dizer.

- Sim, claro. Você não tem um preferencia de gênero. Mas há homossexuais que saem com pessoas do sexo posto. Principalmente quando não a família não apoia. Outras vezes por simples capricho ou vontade. Estes, muitas vezes nem sentem prazer, mas vão só para omitir sua sexualidade por vergonha ou algo semelhante. Também há...

- Não sou nenhum desses. Eu sou bi porque gosto de homens e mulheres. Eu sinto prazer com os dois, mas só amo uma pessoa: Carlos. – vi um grande sorriso abrir-se no rosto de Claudia. E por um momento em não soube o motivo, só depois de alguns segundos dei-me conta do que havia falado. Eu admiti para outrem, que não Carlos, que o amava.

- Fico feliz de ouvir isto. Mas você precisa dizer isto para ele. – disse se inclinando sobre a poltrona em minha direção.

- Eu já disse. – falei em quase um surrurro, mas não precisei repetir, antes disso, Claudia pulou em meus braços me parabenizando e mandando-me ir trás dele e pedir desculpa novamente.

Comentários

Há 1 comentários.

Por Niss em 2015-07-10 10:33:52
Awnn que lindooooooo. De ex vc não sAbe o que é ler e comentar de um celular e ainda com Internet lenta. Affs por isso demorei um pouco mas espero que o Bruno consiga superar isso é que Carlos o desculpe. Kisses, Niss.