Capítulo XXIX

Conto de Drexler como (Seguir)

Parte da série O destino de Bruno

Música tema: Drag Queen – Rita Lee

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Precisei, mais do que nunca, de tratamento com a minha psicóloga. Os pensamentos negativos não me faziam bem, isso era evidente. Eu estava mais impaciente, irritava-me com facilidade e preferia ficar só. Cheguei a lançar minha aliança na parede e perde-la ao lembrar que Carlos havia terminado comigo. Gabriel foi a maior vitima de minha mudança de temperamento repentina. Depois de bravejar que ele era o motivo do meu relacionamento com meu professor, parei de falar com ele. Carlos também havia percebido minha mudança, mas nada comentou comigo. Minhas aulas estavam monótonas. Não havia mais risadas, diálogos com meus alunos após as aulas, eu não levava mais meu violão, tão pouco o tocava em casa.

Eu chegava a chorar de raiva com a possibilidade d’aquele marginal ficar impune pela monstruosidade que fez ao seu sobrinho. A irá que senti em saber que Diógenes era o tio que abusou de Bárbara influenciou-me de uma maneira inimaginável. Tudo que eu queria era o ver morto. Eu seria capaz de mandar mata-lo ou fazê-lo com minhas próprias mãos. A verdade era que nem eu estava me reconhecendo naqueles dias.

Claudia estava conversando comigo diariamente para que eu regredisse de minha mudança de temperamento. Ela assegurou-me que tudo não passava de uma turbulência de humor causada pela depressão e que eu precisava relaxar e conversar mais com as pessoas com quem me importo. Por esse motivo Cristal passou a frequentar a casa onde eu estava residente com muito mais frequência. Contudo, eu me recusava a vê-la ou qualquer outra pessoa que não fosse minha segunda mãe, já que esta me obrigava a fazer as sessões.

Não falei muito com meus pais na semana seguinte. Tudo que eu fazia era ficar trancado em meu quarto e ler os arquivos que me eram exigidos. Por alguma razão, passei a manter contato com Patrícia. Ela era a única pessoa que eu consegui me relacionar. Quiçá por não ter ideia de meus problemas, já que pouco falávamos de problemas pessoais, apenas combinávamos de sair e beber no final de semana.

Não me reconheci quando no sábado combinamos de ir à boate que nos conhecemos e, pela primeira vez, tomei alguns copos de bebida alcoólicas. Meus sábados passaram a serem dedicados a conhecer novas casas noturnas. Cheguei a ficar um pouco alterado algumas noites, mas nada exagerado. Porém foi no ultimo final de semana, que antecedeu o congresso que participaria com Carlos, que conclui que eu odiava, mais que ao tio de Bárbara, a bebida.

Combinei com Patrícia que nos encontraríamos em frente à casa noturna que ela recomendou por volta das 23 horas. Cheguei ao local no horário combinado. Havia sido uma tarde chuvosa, por isso fazia um frio considerável, principalmente para mim, de origem brasileira, um país tropical, onde o calor é quase unanime. Vesti uma camisa de cor nude de mangas compridas, calça jeans preta, um cardigã (pois sabia que dentro da boate faria calar) e meus vans preto. Por fim, acrescentei um cordão com uma ancora no pescoço.

Não demorou muito para que ela chegasse totalmente sorridente. Ela caminhou lentamente até ficar a minha frente, onde trocamos beijos em cumprimento. Patrícia usava um sobretudo cinza que ia até seu joelho e uma salto alto preto, diferente do que ela geralmente usava, roupas curtas e sensuais. Mas quando finalmente entramos, ela despiu o casaco entregando na recepção em seguida, revelando sua verdadeira vestimenta: um vestido branco de saia justa e costas nuas.

Sem mais tempo a perder, fomos direto para o bar. A boate estava lotada. Embora ainda fosse inicio da balada, já havia inúmeras pessoas alegres e dançavam despreocupadamente na pista, jogando seus brações para cima, balançando a cabeça, batendo cabelo e adjacentes. Casais já se pegavam alheios a todos ao seu redor e pessoas faziam filas nos bares ou simplesmente já tinham seus copos e drinks em mãos. Nada que eu já não estivesse me acostumando nos últimos finais de semana.

- O que vai beber? – a garota me perguntou ainda sorridente e já se deixando levar pela batida alta.

- A mais forte. – respondi em seu ouvido.

Patrícia concordou e, depois de algum tempo esperando o preparo, seguimos para uma mesa redonda e de ferro que existiam despeças próximas ao bar. Sentamos em uma de dois lugares apreciando o local. Pude, então, perceber com melhor atenção, o que acontecia no ambiente. Alguns dos casais que estavam trocando beijos eram pessoas do mesmo sexo, as luzes eram prioritariamente com as cores do arco-íris e em um palco distante, algumas mulheres faziam show de bate cabelo.

- É uma boate alternativa. – Patrícia afirmou-me percebendo meu olhar analítico.

- Por que me trouxe aqui? – perguntei como quem não quer nada e bebericando meu drink verde limão. O gosto era horrível e foi i m possível não fazer uma careta ao que o líquido desceu quente em minha garganta.

- Você é bi. – deu de ombro. – Não achei que fosse se importar.

- Não mim importo. – na verdade eu mim importava. Não sabia porque, mas por algum motivo eu não me sentia confortável naquele ambiente. Não era por ser uma boate alternativa, pois já havia frequentado uma no Brasil e gostado, mas algo no meu subconsciente não me queria naquele lugar. – Mas achei que você fosse hétero, você sempre fica com homens. – tentei desconversar.

- E sou. Quer dizer, já fiquei com mulheres, mas não faz meu tipo. – ela sorria como se estivesse falando a coisa mais comum do mundo, o que era verdade. – Mas hoje terá uma apresentação de um amigo meu.

- Que tipo de apresentação? – perguntei curioso.

- Não sei o que ele fará hoje, mas geralmente é bate-cabelo, acrobacia... Ele é uma Drag Queen. – arregalei os olhos em surpresa. Eu não conhecia muitos amigos de Patrícia, a não ser os que ela encontrava aleatoriamente pelas casas noturnas que frequentávamos.

- Uau! Serio? Que horas será a apresentação? – Embora já tivesse ido a boates GLS, eu nunca havia presenciado um show de Drag Queen. Muitas pessoas sempre diziam que eram apresentações espetaculares, o que sempre me deixou curioso.

- Não sei também, mas será por volta das duas da manhã. É uma das principais apresentações da noite. Mas, vem, vamos dançar. – A garota levantou-se segurando minha mão e me conduziu para o centro da pista de dança, onde pouco se via.

Eu já sentia o pouco álcool ingerido fazer efeito e mim, devido a não ser nada acostumado com o consumo e por ter sido um drink muito forte. Segurei o copo em uma das mãos e levei a outra a cintura de minha acompanhante para não nos perder um do outro. Instantaneamente a garota jogou as mãos para o alto, fechando os olhos, e começou a mexer sem medo ou preocupação. Não fiquei parado, mesmo meio duro, comecei a entrar no clima e me soltar no mesmo ritmo da garota e de todos a nossa volta.

Com o passar do tempo, terminei de tomar todo meu drink e já tínhamos voltado ao bar mais três vezes para comprar novas bebidas. Inconscientemente, sob efeito da substancia em nossas veias e deixando-nos levar pela batida que ecoava pelo salão, nossos corpos foram juntando-se cada vez mais até estarmos praticamente colado. Patrícia jogou seus braços sobre meus ombros e iniciamos uma dança extremamente sensual. Ela descia rebolando quase até o chão, ao mesmo tempo em que eu alisava suas costas e dava leves puxões em seu cabelo já desgrenhado.

Estávamos suados e alterados, mas não nos sentíamos cansados. Alheios a tudo e todos, minha acompanhante deu-me as costas e continuou com seus movimentos voluptuoso mexendo sua farta bunda sobre meu genital. Sem pensar muito a virei novamente para me encarar e engrenhei meus dedos em seus cabelos loiros puxando-a para um beijo cheio de luxuria. No mesmo instante, senti a língua da mulher pedir passagem em minha boca e a consenti. Com a outra mão, que segurava um copo com meu drink, agora vermelho, abracei-a pelas costas puxando-a mais para mim, ao mesmo tempo em que ela abraçava-me pelos ombros.

Eu já não sabia o que estava fazendo ou porquê. Apenas aproveitei aquele momento, já que não houve protesto. Não sei por quanto tempo ficamos naquele jogo de línguas e beijo cheio de libido. Quando finalmente nos separamos, era como se nada tivesse acontecido, simplesmente continuamos a dançar e sorrir alegres. Tanto eu como patrícia não nos sentíamos cansados. Já estávamos ali há horas.

- Vamos pegar mais um drink? – falou ao pé do meu ouvido. A minha bebida já havia acabado também, por isso somente segurei sua mão puxando-a em direção ao bar. Fizemos o nosso pedido e, enquanto esperávamos ficarem prontas, puxei a loira entre minhas pernas, já que eu estava sentado em um tamborete, e iniciei mais um beijo necessitado.

- E agora, com vocês... – A música eletrônica que tocava deu lugar a uma voz que ecoou entre as luzes que piscavam multicoloridas pela boate. – O show mais esperado da noite! –

Separei meus lábios de Patrícia, que foi receber nossas bebidas e procurei a origem da voz, sem sucesso. As luzes que antes rodavam por todos os lugares, agora focavam no palco principal da boate. Canhões de luzes vermelhos, verdes, branco e amarelo brincavam pelo palco, onde certamente aconteceria a apresentação. As pessoas agora estavam todas concentradas para o que viria.

- Elas, que brilham e aquecem nossos corações. Com vocês Natura Queen! – uma mulher usando somente um tapa-sexo e algo como folhas cobrindo seus seios entrou desfilando pelo, que julguei se uma passarela. Ela estava caracterizada Eva, a mulher que viveu no Jardim do Éden, e segurava um enorme píton albina. Um belíssimo espécime. Seu cabelo era verde, como sua vestimenta, e volumoso, além de muito chamativo. Com as luzes, podíamos perceber que tinha bastante brilho. – Chris Maleficent! – gritou a voz masculina mais uma vez. Uma mulher com um vestido longo, que arrastava por um metro atrás de si, caminhou seria até onde estava a outra. Sua maquiagem, como a da primeira era exagerada, como é característico das Drag Queens. Chris Maleficent tinha os cabelos negros e dois chifres longos moldados com seu próprio pelo. – E por ultimo, e não menos importante, Eva Black!

- É o meu amigo. – Patrícia apareceu ao meu lado entregando-me minha bebida e extremamente alegre, gritando para a Drag Elvira.

Em uma mistura de Elvira, a rainha da noite, Amy Winehouse e Mortiça Adams, a Drag entrou desfilando com uma expressão de esnobe e, vez ou outra, mostrando a enorme língua que chegava a tocar o queixo. Ela usava um vestido negro cheio de brilhos e um lascam na perna direita que subia até sua virilha. Seu cabelo era negro, comprido e usava um volumoso penteado. Com suas mãos apoiadas na cintura, ela caminhou até onde as duas companheiras de palco, ficando entre elas, abaixou-se tocando o chão com uma das mãos e subiu lentamente encarando o público a sua frente, causando gritos, assovios e alvoroço.

Inesperadamente, a segunda Drag Queen, Chris Maleficent, abriu o vestido que usava e tirou, jogando-o para o lado (ao que um assistente rapidamente o levou). A transformista agora vestia apenas uma meia-calça 7/8 e uma cinta-liga, uma minúscula calcinha da mesma cor e nada que cobrisse seus seios. Mais uma vez, gritos e assovios ressoaram pelo ambiente.

Chris e Eva deixaram o palco somente para Natura Queen, que iniciou uma performance de contorcionismo com seu animal. Depois de algumas caricias com o animal, beijando e acariciando a serpente que se enlaçava em seu corpo, sem nenhum esforço, a artista levou sua perna direita até a altura da cabeça, ainda em pé, segurando o membro com a mão livre. Com cuidado, ela abaixou sua perna e deitou-se de barriga para cima, deixando seu animal sobre ela ao mesmo tempo em que levantava sua barriga apoiada sobre a cabeça e as pernas, jogando uma delas para cima em seguida.

Sua apresentação durou mais alguns minutos. A música era agitada, mas as pessoas, assim como eu, estavam mais interessadas na apresentação que acontecia. Natura fez mais algumas acrobacias com o animal, até que novamente o assistente de palco apareceu levando o animal. A Drag continuou com seus movimentos corporais e, inesperadamente, o trapézio apareceu para que ela pudesse fazer seu contorcionismo no ar. Uma apresentação digna de um premio.

Cerca de meia hora depois, Natura deu lugar a Chris Maleficent no palco. Antes de sair definitivamente do palco, ambas se encontraram no centro e rodaram em volta uma da outra tocando suas intimidades e trocando um beijo quente à vista de todos. Por fim, Maleficent agachou-se alisando o corpo da companheira e beijou seu ventre. Mas antes que mais alguma coisa acontecesse, a outra saiu rebolando como se nada tivesse acontecido.

Cris, que ainda vestia a mesma roupa intima, recebeu de outro rapaz um objeto, semelhante a um par de brincos, e escachou-os em seus seios e, com movimentos do ombro, os fez girar. Inicialmente, o movimento foi feito com o ombro direito, depois com o esquerdo, e posteriormente com ambos os ombros. Após fazer amis alguns movimentos sensuais, o primeiro assistente surgiu trazendo um chicote de couro preto enorme, deixando a apresentação um pouco mais mística. A transformista chicoteou o chão algumas vezes causando um sonoro estalo pela casa noturna.

Agachou-se algumas vezes para o publico mostrando seus fartos glúteos, requebrou apoiando as mãos sobre os joelhos, rodou o chicote sobre o corpo como uma fita de ginastica rítmica, porém mais sádica e voluptuoso. Bateu cabelo por incontáveis minutos, tocou a mão das pessoas e deixou ser tocada em lugares, quiçá, impróprio, por mãos da plateia a sua frente e, finalmente, despediu-se dos espectadores com uma salva de palmas, gritos, assovios e adjacentes, dando lugar a ultima Drag Queen, Eva Black, o amigo de Patrícia.

A Drag, embora um pouco mais gorda que as demais, era também a mais famosa e esperada da noite. Logo que entrou ao recinto, foi ovacionada como nenhuma foi até então. Diferente das anteriores, Eva não fez nenhuma performance corporal. Ela juntou as mãos sobre o peito encarando seria a plateia que ainda gritava seu nome descomunalmente e esperou que o assistente de palco trouxesse um microfone. Foram minutos até que todos acalmassem os nervosos.

- Calados! – bravejou para todos que riram e aos poucos atenderam ao seu pedido. – Boa noite viados! – como a teoria Behaviorista, estimulo-resposta, a plateia gritou seu cumprimento para a apresentadora da noite.

Foram horas de conversação e interação com o publico. Palavras de baixo calão foram proferidas, xingamentos direcionados, danças libidinosas foram feitas por dançarinas e dançarinos da boate, um breve strip tease fora feito por um rapaz, modelado sob o padrão de beleza vigente na sociedade atual, e por uma garota de corpo sem igual. Enquanto Eva Black fazia todos os presentes gargalharem com seu humor negro.

Sua ultima participação da noite fora uma competição de bate cabelo protagonizada por quem se habilitasse a subir no palco, valendo um ingresso para o próximo show. Quase que imediatamente, dois garotos, um travesti e quatro mulheres subiram ao palco. 20 minutos depois de muita gritaria, mãos apoiadas nos joelhos e balançar de cabeça, um rapaz de 19 anos, que estava comemorando seu aniversario, ganhou.

- Bruno – Patrícia, que estava agarrada ao meu pescoço o beijando e cheirando durante toda a competição de bate cabelo, chamou-me. – Quer ir conhecer a Eva Black? – ela me encarava sorridente e, antes que eu respondesse, selou nossos lábios em um beijo fulminante.

Quando, depois de minutos, separamos nossos lábios, Patrícia me puxou entra a multidão que voltava a agitar-se ao som eletrizante que ecoava no ambiente. Mas do que antes e com a casa um pouco mais vazia, a luxuria estava ainda mais presente. Casais heteros e homoafetivos trocavam beijos, caricias e se tocavam sem nenhum pudor na pista de dança e/ou nas periferias da boate.

Aparentemente, Patrícia já era conhecida naquela casa noturna, visto que ao chegar próximo aos camarins, nossa passagem foi liberada sem qualquer problema. Ou talvez fosse o fato de um amigo estar se apresentando. A verdade era que eu não sabia muito bem o que estava fazendo, o álcool já fazia efeito em meu corpo antes mesmo das apresentações das Drag Queens.

Eva permitiu nossa entrada em seu aposento logo que Patrícia se identificou de forma bastante peculiar e intima. O espaço, que não era muito grande, era bem simples: uma penteadeira com um enorme espelho e uma variedade de utensílios para maquiagem, uma cadeira para a artista sentar-se e se preparar, e por fim uma arara com roupas comuns e outras extravagantes. Também havia um banco, suficiente para três pessoas, em um canto próximo a arara de roupas.

A transformista usava um robe vinho ornado de flores brancas. Seu cabelo ainda estava com o mesmo penteado estilo anos 1950/60 e a maquiagem ainda exageradamente marcada, ainda sim magnifica. Imediatamente que entramos no pequeno cômodo, a artista abraçou minha acompanhante trocando beijos e risadinhas falsamente espirituosos.

- Quem é esse boy-magia? – disse a Drag vindo em minha direção e abraçando-me no instante que fechei a porta atrás d mim.

- Bruno. É um amigo meu. – Patrícia estava sentada em frente à penteadeira vasculhando os objetos e retocando sua maquiagem. – Bruno, está é o amigo que te falei, Eva, como você percebeu.

- Prazer. – estiquei a mão em cumprimento quando tive a oportunidade. Ela apertou.

- Um estrangeiro... Satisfação. – piscou para mim e dando-me as costas para encarar sua amiga logo em seguida. – Para onde vão depois daqui?

- Não temos destino. – Mesmo estando um pouco alheio a conversa, aproximei-me sentando-me no banco acolchoado.

- Podemos ir para minha casa, o que acha? – perguntou encarando-me com um sorriso convencido no rosto e dando uma rápida piscadela para mim novamente. Eva estava por trás de Patrícia apoiada sobre os braços da cadeira, deixando seu busto encostado na cabeça de minha acompanhante.

- Acho uma ótima ideia. – Patrícia gargalhou e olhou para cima trocando um olhar significativo com sua amiga antes de me encarar sorrindo.

- Ótimo. Esperem-me lá fora, logo ficarei pronta.

Sem mais o que fazer, segui Patrícia até a recepção para pegarmos seu casaco e fomos para fora do estabelecimento pela porta dos artistas, na parte detrás da boate. Era uma avenida, devido o horário, pouco movimentada. Esperamos por cerca de 20 minutos até que Eva Black aparecesse pela mesma porta com o mesmo penteado, um vestido longo azul marinho e um casaco de pele, artificial, degrade preto e branco até metade das coxas.

No mesmo momento, um taxi parou a nossa frente. Não questionei nada. Os drinks que consumi durante a noite não me permitia questionar o quê que fosse. Apenas segui as meninas e entrei no taxi sem me preocupar para onde íamos. Fiquei no meio das duas e logo que Patrícia entrou, fechando a porta atrás de si, iniciamos mais um beijo. Suas mãos foram céleres aos meus cabelos puxando-me mais para seu corpo, enquanto eu corria minhas mãos por sua cintura e, involuntariamente, apertei seu seio com a mão livre.

Eva Black não ficou apenas olhando. Senti uma mão percorrer minha coxa e logo que separei meus lábios de Patrícia, a Drag me puxou para beija-la, mal me dando tempo de recuperar o fôlego. A língua que vi no palco mais cedo, que imaginei ser audaciosa, concluir ser atrevida e experiente. Senti lábios em meu pescoço e novas mãos em minha coxa subindo para minha intimidade. Uma mão, que eu desconhecia a dona, tentava ferozmente abrir minha causa, em vão.

Patrícia roubou-me a Eva para si, e para o meu deleite momentâneo, apreciei as duas pessoas trocarem um beijo cheio de luxúria e desejo. Nos poucos segundos que abri os olhos, pude ver o contato das línguas. A Drag punha sua língua para fora para o deleite de Patrícia que a chupava com os olhos fixos hora em mim, hora em sua companheira. Logo me juntei à dupla para compartilhar do beijo e caricias gratuitas que eram oferecidas.

Conclui que o taxista era acostumado com este tipo de relação, pois em nenhum momento se pronunciou, mostrou-se desconfortável ou algo semelhante. Assim como eu, por estar sob efeito de álcool, não me preocupei de sua presença, tão pouco minhas acompanhantes.

Sob hipótese alguma consigo recordar como aquele momento prosseguiu. Lentamente tentei abrir os olhos, mas instantaneamente tornei a fecha-los. A luz daquele cômodo desencadeou uma leve pontada em minha cabeça. Levei a mão ao local e tentei abrir os olhos novamente. Aos poucos consegui mantê-los aberto. Sentia meu corpo dormente e minha cabeça dava leves pontadas.

Aos poucos pude me localizar. Eu estava deitado em uma cama de casal extremamente grade, suficiente para quatro pessoas, em um quarto desconhecido. Ao meu lado, um corpo descansava. Reconheci, pelos cabelos loiros, ser Patrícia. Em frente ao leito havia uma televisão acoplada à parede, ao lado de duas portas. Na parede esquerda havia outra porta e na direita uma enorme janela de vidro, meramente coberta por cortinas de uma tonalidade verde muito clara. Supus que dava a varanda, ou algo semelhante.

Sem que eu pudesse analisar qualquer coisa mais, a porta, próxima a televisão, abriu-se. Um homem, razoavelmente gordo, que eu desconhecia, entrou pela mesma e sorrio-me cativante a me ver encarando-o. Ele vestia uma bermuda de algodão azul clara e uma camisa branca, e trazia uma caneca fumegante entre as mãos. Lentamente o homem caminhou até mim e sentou-se, sobre uma das pernas, na cama próximo aos meus pés.

- Oi... Dormiu bem? – perguntou com a voz doce. Eu conhecia aquela voz de algum lugar, mas naquele momento, minha cabeça não conseguia raciocinar.

- Olá... – tentei sentar-me na cama, mas uma tontura me atingiu juntamente com uma pontada em meu celebro. Eu tinha duvida se havia alguém tentando esfaquear ou esmagar, com as próprias mãos, o meu celebro. – Onde estou? – quis saber de imediato.

- Em meu apartamento. – ele bebericou sua bebida me encarando nos olhos. Sua informação não foi suficiente para me localizar. Ao menos eu sabia de quem era o tal sujeito a minha frente. – Aceita um chocolate quente?

- Não, obrigado. – Ele assentiu e fechei os olhos com força, ao que uma nova fisgada me atingiu.

- Então... Como está se sentindo? – O homem pousou a caneca em uma espécie de banco a frente da cama que só agora havia percebido.

- Com dor de cabeça... – tentei me levantar, mas senti tudo a minha volta girar e uma rápida escuridão tapar minha vista. - ... E um pouco tonto. – finalizei conseguindo focalizar tudo novamente.

- Vou pegar um remédio para você. – disse levantando-se da cama com sua caneca em mãos.

Tentei me levantar novamente, mas no instante que joguei o lençol que antes me cobria, percebi que estava completamente pelado, o que me assustou. Rapidamente desfiz o movimento, cobrindo-me até o pescoço dessa vez. Tudo que minha mente conseguia fazer era criar milhões de hipóteses macabras do que aconteceu na noite passada, e nenhuma era boa. Nenhuma suposição me fazia sentir melhor comigo mesmo. Lágrimas formavam-se em meus olhos prontas para lavarem meu rosto.

Mais uma vez o homem cujo nome eu não sabia retornou ao quarto trazendo-me um copo com água e um comprimido. Sentei-me na cama, lutando contra a tontura e dor que se propagou por todo o corpo, e aceitei a medicação que me era oferecida. Tomei o comprimido e bebi toda água, que me fez sentir melhor. Por fim entreguei o copo de vidro agradecendo pela gentileza.

- Deveria tomar um banho, irá se sentir melhor. – falou confiante.

- Onde estão minhas roupas? – O homem ainda estava a minha frente, com um sorriso simpático no rosto, me encarando, o que me deixou um pouco desconfortável.

- Sua calça e cueca estão na maquina de lavar. Sua camisa... – ele caminhou até a porta da parede esquerda e entrando lá enquanto falava. Ele demorou por alguns minutos até retornar com algumas peças de roupa e me entregou. – Devem servir. Deveria tomar o banho, o banheiro fica ali. – disse apontando para aporta onde pegou as roupas.

- O que houve com minha camisa? – perguntei confuso.

- Digamos que se tivéssemos prosseguido, terias feito um sexo bastante... Selvagem. – Ele disse com cautela. Arregalei os olhos em surpresa. Flashes da noite anterior surgiram em minha cabeça: a boate, os beijo ferozes com Patrícia, o taxi, os amassos com Patrícia e sua amiga Drag Queen, as mãos atrevidas percorrendo meu corpo...

- Quando você diz ‘tivéssemos prosseguido’, quer dizer que nós não... – eu estava arrebatadoramente assustado.

- Que nós não fizemos nada. – mais uma vez o homem sentou-se sobre a perna a minha frente. – Parei de tentar quando você começou a chamar por seu professor... Carlos, o nome dele, não é? – disse serio. Desviei o meus olhos no mesmo instante. Não consegui acreditar em tais palavras. Contudo, na tentativa de dissipar aquele assunto indesejável, mudei tema.

- Se não tivemos nada, por que estou sem roupa? – indaguei confuso ao que puxava mais o lençol sobre mim.

- Eu disse que eu parei, não ela. – ele apontou para a mulher ao meu lado da cama. Um forte sentimento de traição me consumiu. Mesmo eu e Carlos não mantendo nenhuma relação, senão professor-aluno, sentia como se tivesse concretizado o motivo de nossa separação. – Mas ela também parou quando você vomitou encima dela. – Meus olhos cresceram veloz em surpresa, ao mesmo tempo o homem tentava contar as risadas.

- Eu não... – ele apenas acenava com a cabeça afirmando minha vergonhosa proeza.

- Você me deu bastante trabalho ontem à noite.

- Por quê? – franzi a testa em questionamento.

- Depois que limpei a sala, Patrícia já dormia como uma pedra e você estava jogado no chão do quarto todo sujo. Alguém tinha que te dar um banho... – ele disse apontando para se mesmo assegurando sua façanha. Senti meu rosto ruborizar em vergonha por vomitado sobre minha amiga e ainda ter sido exposto a um desconhecido. – Mas não se preocupa. Apenas tirei sua roupa e te coloquei abaixo da ducha e depois na cama. Por isso reforço meu concelho: tome um banho. – disse se levantando.

- Você é a Eva, não é? – perguntei encarando suas costas.

- A Eva Black é uma personagem. Aqui eu sou Evandro. Porém, sim, sou eu, afinal ela faz parte de mim. – sem dizer mais nenhuma palavra, Evandro dirigiu-se até aporta, que conclui ser a de saída do quarto para os demais cômodos da casa, ou qualquer habitação onde eu estivesse. Ele parou na passagem e sorriu cordialmente para mim antes de sair efetivamente.

Depois de tomar coragem e conferir se a mulher ao meu lado dormia, levantei cauteloso, tampando com a roupa que me fora entregue me fora entregue até chegar ao banheiro. Era bastante espaçoso, mas não reparei muito nos detalhes. Encontrei uma escola de dentes intacta sobre a bancada de mármore e usei-a para lavar minha boca que ainda tinha um gosto ruim. Demorei-me o quanto pude no banho pensando em tudo que poderia ter acontecido na noite anterior, em Carlos, ter passado a noite fora com estranhos etc. Somente naquele instante me dei conta do quão preocupada estaria Claudia. Saí do chuveiro e vesti as roupas que recebi: uma cueca preta ainda com etiqueta, uma bermuda jeans escura e uma camisa de mangas ¾.

Quando finalmente sai do banheiro, Patrícia ainda dormia sobre acama, agora de bruços e agarrada a um travesseiro. Eu não sabia se ela dividia aquele apartamento com Evandro, mas fosse como fosse, era bastante espaçoso. Saindo do quarto, percorri um corredor com mais três porta até chegar à sala. Eu precisava ir embora, pois só conseguia pensar na aflição de Claudia.

- Evandro? – chamei cuidadoso da sala. O homem, que aparentava ter 25 ou 30 anos de idade, apareceu por uma porta vindo da cozinha. – Eu tenho que ir embora...

- Fiz café para a gente. Fica, depois te levo em casa.

- Eu adoraria, mas não posso... Você sabe se cheguei com carteira, celular... – Evandro estava escorado no batente da porta com os braços cruzados me encarando.

- Sim, tirei de seus bolsos antes de colocar sua roupara para lavar. – ele entrou na cozinha e voltou, minutos depois, com meus objetos em mão. – Seu celular tocou algumas vezes, mas preferi não te chamar e fiquei receoso de atender. – Havia dezenas de chamadas: Claudia, Carlos, Cristal, Gabriel... Era de fácil dedução que Claudia havia ligado para todos a minha procura, já que somente ela fora avisada que eu sairia.

- Eu tenho que ir, estão preocupado comigo.

- Ah, claro. Mando sua roupa por Patrícia. – disse entregando-me um cartão com seus contatos. Mas antes que eu pegasse em suas mãos, ele puxou sorrindo, deixando minha mão suspensa no ar. – Espero que esse não seja nosso único encontro. – entregou-me por fim o cartão.

- Digo o mesmo. Obrigado. Por tudo! – por algum motivo desconhecido, senti-me afeiçoado a Evandro. Por isso, sem que ele esperasse, o abracei forte. Ele demorou há um pouco a entender, mas por fim retribuiu o abraço. – Tenho que ir.

- Tudo bem. Até mais vê. – O homem me acompanhou sorrindo até a porta de entrada do apartamento e abriu-a para mim, me dando passagem. Antes que eu pudesse sair efetivamente, ele tornou a falar. – Você o ama, não é mesmo? – eu sabia do que ele estava falando, mas não o encarei, tão pouco disse qualquer coisa. – Se há uma possibilidade de que fiquem juntos, por mais rêmora que seja, não permita que se extinga.

- Ele acha que o traí... – disse segurando o batente da porta, ainda de costas para Evandro.

- Se ele acha, é porque não foi, prove. Não o deixe ir, você poderá se arrepender depois. Como eu. - Não disse mais nada. Com lágrimas nos olhos, deixei o apartamento indo em direção as escadas.

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I love You Drag Queens <3

Comentários

Há 1 comentários.

Por Niss em 2015-07-22 23:44:53
Apesar de eu nao ter conhecido nenhum drag, eu as adoroooo, divas divonicas.- Boas palavras a de Eva, espero ver o Bruno felz, não importa com quem, (apesar de preferir o Carlos) apenas quero o ver feliz. Kisses, Niss.