Capítulo IV
Parte da série O destino de Bruno
Eu já estava na parada de ônibus para ir para meu apartamento quando aquele menino de olhos castanhos escuros, quase negros, se aproximou. Era Fernando o calouro que pagaria a disciplina de Psicologia infantil. Eu imaginei que ele fosse irmão da professora Andrea, já que eles pareceram bem íntimos, mas duvidei, pelo contrario eles teriam ido juntos. A não ser que ela não morasse com ele. Ainda sim, acho que o levaria em casa.
Eu estava perdido em minhas suposições, quando ele puxou assunto:
- E aí. Fernando, não é?
- Isso mesmo. Vai pegar qual ônibus?
- O 065. E você?
- Nenhum. Estou esperando minha carona. Ou melhor, virem deixar meu carro.
- Ah, legal. - Dentei não dá importância para sua arrogância e permaneci calado, ignorando sua presença. Preferi o garoto nervoso que vi na sala de aula que sentia-se intimidado pela professora. Mas aqui ele se mostrou um total idiota. E eu já tinha me interessado por ele.
Nunca neguei a mim mesmo que sentia atração por pessoas do mesmo sexo que eu. Também não nego a ninguém que me pergunte. Quando isso acontece, costumo dizer que gosto do ser humano, com suas perfeições imperfeitas, erros e correções.
Quando mais novo, na faixa dos 7 ou 9 anos, costumava "brincar" com um amigo. Sempre íamos um para casa do outro e quando estávamos a sós, costumávamos nos tocar, se acariciar e até mesmo a colocar aqueles minúsculos membros na boca. Algumas vezes fomos flagrados, o que me causou um interrogatório de meus pais e a proibição de nos encontrar. O que não aconteceu. Pedro, esse meu amigo, era criado pela avó, e sempre mostrou seu lado feminino, certa vez pediu que eu o penetrasse, o que não aconteceu, porque eu não tinha "estrutura" para tanto.
Hoje nós não nos falamos mais. Não porque um de nós não queira ou foi proibido, mas o destino fez com que nos afastássemos trilhando caminhos distintos. Sinto saudades daquele tempo e fico triste em ver o caminho que ele seguiu. Ele não terminou o ensino fundamental, aos 17 anos se assumiu e transvestiu-se. É quase uma mulher e atende pelo nome de Bárbara: magérrima, bem feita de corpo, mas que ganha a vida prostituindo-se nos pontos de ônibus. É fumante e nesse munda da prostituição é quase impossível não se envolver com drogas. Ela já foi presa duas vezes por posse ilegal de drogas ilícitas.
- Então, vai querer uma carona? - Perguntou Fernando que agora entrava em carro que eu nem vi quando chegou.
- Meu ônibus já deve estar chegando. Mas Obrigado. - Tentei um sorriso.
- Tem certeza? Meu caminho é o mesmo do seu percurso, considerando a linha do 065. - ele insistiu.
- Fica para uma próxima. Valeu.
- Ok, então. Até a próxima aula. - ele entrou no carro e ligou a ignição. O rapaz que trouxe o carro agora estava no banco do passageiro.
- Até! - e fiquei só. Mais uma vez.
O ônibus demorou cerca de 20 minutos para passar. Quando cheguei em casa, José Carlos e Pedro estavam assistindo TV e Guilherme estava no quarto arrumando suas coisas no armário. Fui direto para o banheiro tirar o cansaço.
O resto da semana seguiu tranquila: o movimento da biblioteca havia aumentando com previ, os professores passavam cada vez mais resenhas, fixamentos, análises, exercícios e outros gêneros academismos. Guilherme começou a trabalhar pela manhã também em uma loja de autopeças, Felipe não havia ido a primeira aula por preguiça, pois sabia que seria aquele coisa de primeiro dia, só apresentações, mas nos dias seguintes não faltou nenhum dia mais. Fernando passou a sentar logo na frente nas aulas de Psicologia por ordem da professora, que constatei ser a irmã dele e não o levava pra casa por dois motivos: não queria que achassem que ela o tratava melhor pelo gral de parentesco (que eu, particularmente, achei tosco) e por ele ter seu próprio carro. Agora eu e Guilherme íamos para casa com Fernando, pois meu companheiro de cela aceitou a carona no dia seguinte de primeira. Beatriz ainda aparecia estressada de vez em quando por ouvir os sermões de sua mãe, mas se rendeu e começou a procurar trabalho, de forma bem relaxada.
Hoje seria a calourada, depois de muita insistência da parte de Beatriz, acabei sedendo. Pedro e Carlinhos, que não nega festa e álcool, iriam comigo e Guilherme no carro de Felipe. Encontraríamos Bia já na danceteria. Já estávamos no carro esperando Guilherme, que era igual uma moça para sair de casa.
- Bora Guilherme! - Gritou Pedro. - O que tanto você fazia para demorar tanto?- Perguntou quando ele finalmente chegou.
- Procurando umas coisinhas, porque hoje que aproveitar essa festa ao máximo. - E todo mundo entendeu que ele falava de camisinhas.
- Manda umas pra cá! - Falou Carlinhos.
- Aqui! - Ele ia entregando, quando eu intervi.
- Nops. Você tem namorada e ela não estará lá. Isso significa que não usara com ela. Então guarda pra você Guilherme.
- E daí que vou usar com outra? Ela é sua irmã ou algo assim por acaso? - perguntou entre risos.
- Não, ela não é minha irmã ou algo semelhante. Mas se há algo que odeio, é traição. Então se vai trair, deixe para fazer quando eu estiver longe. Não quero ser cúmplice.
- Ok, ok. Quando chegarmos lá e a Madre Tereza sair do carro, você me dá Guilherme. - bufei e todos riram de mim. Seguimos conversando de como seria o trote que faríamos amanhã na casa de Alex, um riquinho da turma de Alice que estudava comigo.
Quando chegamos, logo vi Alice conversando com a Beatriz , que abriu um sorriso e veio ao meu encontro, deixando a Alice com um sorriso tímido na minha direção e seguindo para perto de André que estava abraçado com outra menina.
- Oi gatinho. - Disse Bia quando se aproximou de mim.
- Oi linda - ela vestia uma saia de renda preta com uma blusa folgadinha beje. Eu estava com sempre: bermuda jean preta, camisa gola V que mostrava um pouco dos meu músculos (não muito desenvolvido) do peitoral e dos braços, e por fim minha sapatinha que quase não sai do meu pé.
- Tenho uma novidade.
- Arranjou um emprego?
- Não. Idiota! - falou ela desmanchando o sorriso.
- Desculpa, esquentadinha. Diz o que é então.
- A Alice. Ela está louquinha por você. - um sorriso largo surgiu em meu rosto.
- Serio? Ela falou isso?
- Bem... não exatamente... - Ela desviou o olhar.
- Como assim " não exatamente"?- falei já perdendo a animação.
- Desde que começamos a falar, ela não parava de falar em seu nome. Até quando falei do Felipe, ela confundiu com seu nome. Quando você chegou, ela abriu um sorriso e falou seu nome bem baixo.
- Isso não quer dizer nada.
- Claro que quer. Você tem duas opções: ou vai falar com ela, ou eu vou.
- Pode deixar. Eu mesmo farei isso. - falei tomando coragem.
- Isso aí, Maria do Bairro.
- Oi? Não entendi.
- Você é dramático igual ela. - falou rindo e eu deixando ela sozinha e indo em direção ao bar buscar uma dose para a Alice e uma coca para mim.
- E aí, pessoal. Tudo bem, Alice? - falei com confiança.
- Oi, Bruno. - ela falou surpresa ao me ver ali.
- Está bebendo? - ela negou com a cabeça - Aceita?
- Obrigada. - Disse aceitando a bebida. - Achei que não bebesse.
- E não bebo. Aqui só tem refrigerante. Trouxe a bebida para você - Falei dando uma piscadinha e sorrindo para ela.
- Muito gentil da sua parte. - o casal que estava com ela percebeu o clima e começou a se distanciar.
- Adora essa danceteria. É muito raro encontrar uma com um estilo tão eclético, você não acha?
- Com certeza. Que estilo você mais curte?
- Samba. Não há duvida - ri um pouco - Mas adoro forró. Funk também é bom para mexer um pouco.
- Concordo.
- Quer dançar? Adoro essa música. - estava tocando "Sabiá" do Luiz Gonzaga. Seria legal para uma segunda aproximação.
- Adoraria.
E fomos para o dance. Começamos dando sozinhos, mas logo me aproximei dela para dançarmos colados. Logo após tocou alguns funks, sertanejo e mais forró. Fiquei surpreso quando começou a tocas "Você é linda" do Caetano Veloso e ela encostou sua cabeça em meu ombro e ficamos embalando ao som leve e romântico da canção, mas foi quando começou "Beija eu" da Marisa Monte, musica mais que sugestiva que ela me olhar nos olhos e eu aproximar nossos rosto para um primeiro beijo calmo.
- O que acha de irmos lá pra fora conversar um pouco? - perguntei, ela apenas concordou com a cabeça.
Já lá fora, ficamos sentados em um banco um pouco afastado das pessoas. Trocamos caricias, nos beijamos e conversamos um pouco. Alice era tudo que eu imaginava: doce, calma, simples, elegante, carinhosa e beijava bem (muito bem). Era mais de três hora da manhã quando trocamos contatos e ela se despediu de mim indo embora com André, que descobri ser seu primo, e a namorada dele.
Depois de muito procurar, ligar, procurar em becos e tudo mais, eu e Zé Carlos, que não pegou ninguém, para a felicidade de sua namorada, encontramos Guilherme com uma menina dentro do carro de Felipe, quando estávamos levando-o quase desmaiado, pois o encontramos morto de bêbado. Pedro estava com Beatriz, então foi fácil encontra-lo para irmos embora.
Como eu não bebi nada a noite toda, levei o carro. Deixamos Felipe em seu apartamento a cuidado de seu primo com quem dividia o apartamento, e fui para meu apartamento com os rapazes com o carro. Devolveria no outro dia. O caminha para casa foi regado de sermões em Guilherme.