CAPÍTULO 138: América
Parte da série Paixão Secreta
Eu acabei dormindo no metrô. Eu acordei assustado e quando olhei eu já tinha passado 8 estações da minha.
- mas que merda – falei me levantando – minha cabeça doía como nunca.
Eu me levantei e desci na estação seguinte. Eu tinha que voltar todas as estações. Eu fiquei parado lá esperando um metrô chegar e comecei a refletir sobre a minha vida. O que eu faria? Voltaria correndo para os “braços” de Adam, ou tentaria outras entrevistas?
Eu não sei se aguentaria por muito tempo se aquilo acontecesse outra vez. A sensação de ter seu passado jogado na sua cara é a pior que pode existir.
- uma ajuda? – falou uma voz. Eu olhei para trás e havia um homem todo sujo vestindo trapos sentado no chão.
Eu bati a mão no meu bolso e peguei tudo o que eu tinha e dei a ele.
- muito obrigado, que deus te abençoe – falou ele.
- eu começo a duvidar da existência dele – falei para o homem.
Logo um metrô praticamente vazio parou na minha frente eu entrei e logo me sentei próximo a janela, mas dessa vez nada de tirar cochilos se não eu ficaria nesse jogo o dia todo. Eu estava distraído olhando pela janela quando um homem sentou ao meu lado.
- oi – falou ele.
Eu olhei para o lado e não reconheci o homem, mas mesmo assim eu respondi, por educação é claro.
- oi – falei forçando um sorriso. O homem de olhos verdes continuou olhando para frente e eu simplesmente voltei a olhar para fora.
- não duvide de mim – falou o homem.
- o que você disse? – falei olhando para ele.
O homem olhou para mim e deu um meio sorriso.
- “não duvide de mim” – falou o homem apontando para uma das propagandas do metrô onde se lia: “Justiça – não fuja e não duvide de mim”. - porque?
- não é nada, é que… deixa pra lá.
- e então? Dia difícil? – perguntou o homem.
- porque a pergunta?
- você está parecendo um pouco abatido.
- deu pra perceber? – perguntei rindo.
- só um pouco – falou ele dando uma risada.
- o meu dia foi terrível. Pra começar ontem eu bebi demais, cheguei atrasado no segundo dia de trabalho e meu chefe me humilha e me bota no olho da rua, depois eu durmo no metrô e perco a minha estação.
- e agora um homem estranho senta eu seu lado e fica puxando conversa. –falou ele
- está longe de ser uma coisa ruim.
- que bom – falou ele.
Eu olhei para ele reparando no rosto e notei algo no olho dele.
- nossa – falei alto.
- o que? – perguntou ele.
- você tem olhos de cores diferentes – falei notando que ele tinha um olho verde e o outro azul.
- gostou? – falou ele com um sorriso.
- é muito bonito, pra dizer a verdade seus olhos são perfeitos.
- queria que meus colegas na escola pensassem assim.
- todo mundo sofre na escola né? Eu era o sonho de todo valentão: Judeu, Gay e Adotado.
- adotado?
- sim, quando tinha 4 anos.
- muito legal da parte do seu pai e da sua mãe.
- minha mãe já faleceu. Quando eu tinha 16 anos.
- meus pêsames.
- eu sei como é a dor de perder os pais.
- dói muito. Você tem um irmão Gêmeo?
- Eu e meu irmão gêmeo sofremos bastante.
- sim. – falou ele – geralmente essa diferença de olhos, especialmente azul e verde acontece em irmãos gêmeos.
- é mesmo – falei reparando – você não tem um olho azul e um olho verde, você tem os dois com duas cores.
- que bom que achou bonito.
- muito lindo.
- que bom que eu consegui melhorar o seu dia – falou ele.
- nossa, me desculpe eu nem perguntei como foi o seu dia.
- até agora tudo bem – falou ele – não tenho nada do que reclamar.
- que bom.
- espero não ter te deixado depressivo com meu dia perfeito.
- não, eu fico feliz por saber que alguém está tendo o dia melhor que o meu – falei rindo para ele.
- não é sempre assim tão perfeito. Tenho meus dias bons e ruins afinal eu sou policial.
- policial?
- sim, espero não ter te assustado com essa informação. – falou ele mostrando o distintivo pendurado em um cordão prateado, ele logo colocou outra vez para dentro da camisa.
- não me assustou não.
- que bom se não eu teria que revista-lo.
Eu dei uma risada.
- você tem quantos anos? – perguntou ele.
- 23 e você?
- 45 – sou bem mais velho que você, já vivi muito.
- eu imagino, meu pai é dois anos mais velho que você e ele já passou por muita coisa.
- meu filho podia ser como você, ele só vive trancado no quarto com seu computador, televisão. Nunca tira um tempo para conversar comigo.
- quantos anos ele tem?
-14 anos.
- essa fase é complicada eu acho que passei pela mesma coisa.
- as vezes eu tenho a impressão de que nós não somos conectados e que ele não gosta de mim.
- não pense isso, ele gosta sim de você, mas é que nessa época da vida nós nos preocupamos muito com amigos e status. A família é como se fosse uma pedra no sapato.
- você passou por isso? – perguntou ele.
- não, mas eu sou gay, para nós o mundo funciona diferente é como se o colégio fosse uma guerra e cada dia uma batalha.
- o meu filho se identifica como uma garota – falou ele.
- sério?
- sim
- e você aceita ele como é?
- completamente. A mãe dele abandonou nós dois quando ele nos contou. Eu amo meu filho como se fosse a minha própria vida.
- ele vai travestido para a escola?
- sim.
- ele deve sofrer muito preconceito na escola. Eu lembro como é essa fase.
Ele olhou para fora.
- me desculpe ter dito isso, eu não queria te desanimar.
- eu sei como é – falou ele – eu também sofro muito preconceito, especialmente no trabalho.
Eu pensei um pouco antes de fazer a próxima pergunta.
- posso fazer uma pergunta pessoal?
- pode.
- você já conversou com ele? Sobre… perguntou se ele tem vontade de mudar de sexo?
- sim. ele disse que pensa nisso as vezes e ao mesmo tempo que tem vontade ele diz ter medo.
- você leva ele ao psicólogo?
- não.
- desculpa, mas como é seu nome?
- Cody.
- Cody, não deixa ele passar por isso sozinho, ele deve estar confuso e desorientado, converse com ele, se ele te evitar é ai que você deve tentar com mais força. Imagine como deve ser confuso para ele estar na escola ouvindo todos dizerem que ele não é normal. Leva ele ao psicólogo.
- você acha que eu devo?
- sabe o que eu acho? Você dois deveriam ir sabe. Eu imagino como você deve sofrer psicologicamente com tudo isso.
- eu não acredito muito em psicólogos.
- vai por mim, funciona meu pai e eu visitamos muito para resolver alguns problemas que pareciam impossíveis de se resolver.
- obrigado pelo conselho – falou ele – é bom ter alguém que eu possa conversar sobre isso. eu fiquei sozinho depois que minha esposa se foi e digamos que nenhuma mulher que ter um relacionamento com um homem que tem um filho que se identifica como uma mulher.
- sinto muito.
- não sinta. Eu passaria a minha vida inteira sozinho pelo meu filho.
- é bom saber que você o ama tanto, mas será que ele sabe o que você está disposto a fazer pela felicidade? Ele sabe o que você faz por ele?
Ele não respondeu nada e apenas ficou pensando por um longo tempo.
- espero não estar me intrometendo, afinal estamos na América onde todo mundo se intromete na vida do outro.
- pelo contrário, eu gostei muito da nossa conversa. E eu fico realmente agradecido pelos seus conselhos, eu realmente vou procurar um psicólogo e tentar arrancar ele da casca.
- faça isso – falei dando uma batidinha amigável no ombro dele.
Nós olhamos em volta e por alguns segundos ficamos em silêncio
- em qual estação você disse que era a sua? – perguntou Cody.
- eu não disse – falei olhando para o marcador. – que droga, passei outra vez da minha estação.
- passou muitas?
- 5 estações.
- sinto muito – falou ele.
- sem problemas – falei me levantando – foi bom conversar com você, mas eu tenho que descer.
Ele também se levantou.
- a sua é a próxima? – perguntei.
- não, mas eu vou te acompanhar até em casa.
- não precisa.
- é o mínimo que eu posso fazer depois da conversa que tivemos.
- tem certeza? Eu não vou te atrapalhar em nada?
- não – falou ele cochichando – esse é meu trabalho, andar disfarçado no metrô, não conte para ninguém.
- não vou – falei indo até a porta.
Nós então fomos para a porta do metrô e assim que ele parou na estação nós dois descemos e fomos até o outro lado para voltarmos.
- sua casa é muito longe? – perguntou Cody.
- não, mas não precisa me levar lá.
- preciso sim – falou ele com um sorriso – eu realmente goste de te ter conhecido. Eu geralmente não tenho o costume de falar da minha vida com estranhos, mas com você eu me senti confortável o bastante.
- obrigado por me fazer especial em dia um tão ruim como hoje.
- o dia ainda não acabou – falou Cody
Nós entramos no metrô e depois que chegamos na estação nós saímos até a rua e eu indiquei que iriamos para a esquerda. Nós dois andamos por um longo caminho e fomos conversando.
- sai casa fica nessa rua?
- não. Daqui duas quadras eu viro a direita andamos mais um pouco e chegamos na minha casa.
- eu falei tanto de mim e você não falou quase nada sobre você. – falou Cody.
- eu não tenho quase nada o que contar. Minha vida pode ser resumida no dia de hoje.
- você não tem ninguém? Algum namorado?
- acredita que eu sou solteiro?
- sério? Você parece ser uma pessoa tão madura pra sua idade, com certeza deve ter pretendentes.
- geralmente a culpa é minha, eu escolho as pessoas erradas e digamos que os pretendentes não me interessam.
- porque?
- eu já fui uma pessoa muito festeira…
- como assim?
- eu já fiz muito sexo no passado e os meus “pretendentes” que se dizem apaixonados por mim só querem sexo e hoje em dia eu não quero só isso.
- entendo.
- então por esse motivo eu prefiro ficar sozinho.
- é melhor mesmo – falou ele enquanto virávamos para a direita.
- minha casa é logo ali.
Nós andamos mais um pouco e paramos na porta da minha casa.
- muito obrigado mesmo por ter me acompanhado até em casa.
- obrigado pelos conselhos – falou ele.
- por nada – falei batendo a mão no portão e ele abriu.
Eu olhei para o lado e percebi que ele tinha sido forçado.
- algum problema? – perguntou Cody
- eu tranquei antes de sair.
- deixe me vez – falou ele abrindo o portão e vendo que a porta da minha casa estava aberta.
- meu deus, alguém arrombou – falei vendo de fora algumas coisas quebradas e outras faltando.
- fica aqui fora – falou ele tirando o distintivo para fora da camisa e pegando uma arma no coldre da perna.
- tudo bem – falei ficando de fora enquanto ele entrava sorrateiramente.
Eu esperei alguns minutos e logo ele saiu.
- não tem ninguém – falou ele.
- vou ligar para o meu pai.
- vou ligar para a policia – falou Cody se afastando.
Eu busque i o nome do meu pai e o telefone chamou quatro vezes até que ele atendeu.
- oi filho
- pai o senhor está bem?
- estou sim filho, porque?
- eu acabei de chegar em casas e ela foi invadida.
- você está bem? alguém te machucou?
- não pai, relaxa eu estou bem. tem um policial aqui comigo.
- eu estou indo para ai agora.
- vou esperar o senhor aqui.
- fala para ele ir até a delegacia, vamos encontra-lo lá.] – falou Cody.
- pai, não vem aqui o policial disse para ir para a delegacia.
- qual delas? – perguntou meu pai.
- qual delas Cody?
- a que fica na rua 87.
- rua 87 pai.
- vejo você lá.
Eu desliguei o telefone.
- a viatura está a caminho – falou Cody.
- tudo bem – falei tremendo.
- se acalma – falou ele.
- eu não acredito que isso aconteceu.
- sua casa tem alarme Mike – falou Cody – por acaso alguém tem o código?
- só eu e meu pai. – falei tentando lembrar de mais alguém… - espera! – Cody olhou para mim. – hoje eu vim aqui em casa e o alarme disparo e a empresa ligou pedindo confirmação de alguns dados. Eu peguei um moto taxi e o motorista ficou de fora, ele pode ter ouvido o que eu disse.
- qual o número que você o chamou?
Eu entreguei o número e Cody ligou e o telefone chamou várias vezes e todas as ligações foram encaminhadas para a caixa de mensagens.
- ele sabia o código?
- não. Eu apenas digitei, mas quando o alarme dispara a empresa liga e se tiver sido um engano eles pedem confirmações de alguns dados. Ele pode ter arrombado a porta e assim que o telefone chamou ele confirmou os dados.
- mas se a porta for arrombada a empresa fica sabendo – falou Edward. – além disso as portas foram forçadas, mas não foram arrombadas.
- mas só eu e meu pai temos a chave – falei apalpando os bolsos e nada da minha chave. – minha chave desapareceu.
A viatura chegou e Cody explicou para os colegas o que tinha acontecido e logo eles nos levaram para a delegacia e eu fui direto prestar queixa de roubo e eu contei tudo o que tinha acontecido desde a hora em que chamei o Moto taxi até a hora que ele me deixou no trabalho.
- eu então perguntei se ele esperaria por mim e ele disse que não podia, então eu ofereci mais dinheiro e ele concordou em esperar.
- ele pode ter visto o que você tinha dentro de casa enquanto você tomava banho. – falou Cody.
- depois que eu me arrumei eu tranquei tudo e ele estava aqui fumando e quando cheguei ele apagou o cigarro e nós fomos para o meu trabalho, chegando lá ele disse que não aceitaria o dinheiro e meio que me fez marcar um encontro com ele.
- ele sabia que não teria ninguém em casa – falou Cody – ele marcou o encontro para saber mais ou menos a hora que estaria em casa.
- como eu fui burro.
- você não foi burro – falou Cody – você foi enganado você não é o culpado pelo o que aconteceu você é a vítima.
- ok – falei tomando um gole do copo de água.
Cody saiu da sala primeiro e depois que eu terminei de explicar eu sai da sala e logo vi meu pai, Vanessa e Adam sentados na sala de espera e eu fui até meu pai para um abraço.
- ainda bem que não aconteceu nada com você – falou meu pai.
- está tudo bem com você? – perguntou Vanessa.
Eu então dei um abraço nela.
- tudo ótimo, ainda bem que não estava em casa.
- tudo bem Mike? – falou Adam me abraçando e dando um beijo no meu rosto.
- estou sim – falei abraçando ele forte.
- que bom – falou ele beijando meu rosto.
Eu soltei ele e fui até meu pai para outro abraço.
- eles levaram tudo pai.
- não importa filho – falou ele beijando meu rosto. – o que importa é que ninguém se machucou.
- foi culpa minha.
- não foi. O Policial Harvey nos explicou tudo.
- quem?
- Cody Harvey – falou ele se aproximando.
- obrigado – falei olhando para ele.
- está tudo bem – falou ele me abraçando.
- o que você estava fazendo em casa uma hora dessas filho? – perguntou meu pai.
- eu fui demitido – falei olhando para ele com vergonha.
- demitido? porque?
- eu cheguei atrasado.
- só por causa disso? eu vou lá hoje conversar com seu chefe.
- nem pensar pai, o senhor está nervoso e não via descontar em ninguém. Não vai fazer como fez com o Adam quando foi na empresa tirar satisfação e além do mais eu estou errado.
- ok – falou meu pai nervoso tentando se acalmar. ele me deu outro abraço e disse que me amava.