Toque Em Mim [Capítulo 1]

Parte da série Doces Sonhos

- Pode dizer seu nome outra vez? – Falou Jay colocando óculos no rosto, apertando play no gravador de voz e pegando um caderno para tomar nota.

- posso sim. – falei respirando fundo.

Eu olhei em volta e tentei achar um ponto para me concentrar procurando por algo para me fazer concentrar caso perdesse a razão. Eu olhei fixamente para Jay e ele olhou fixamente para mim.

- tem certeza que está pronto para dar esse passo? – perguntou Jay cruzando as pernas.

- estou sim. – falei me aconchegando na poltrona de frente para ele.

- tudo bem – falou ele com um sorriso de lado e anotando algo. – você pode dizer qualquer coisa sobre você, algo que você se sinta a vontade compartilhar.

- meu nome é Jack tenho 21 anos, nasci e moro em Boston, não acredito em deus, sou a favor do aborto, moro com meu pai desde que nasci. Nunca conheci minha mãe, pois ela morreu durante o meu parto... – parei por um momento.

- você está indo bem – falou Jay dando um sorriso com seu cavanhaque castanho escuro – mais uma vez ele tomou nota.

- tudo bem – falei fechando os olhos e abrindo devagar. – desde que minha mãe morreu meu irmão mais velho Jake não fala comigo, ou seja... Nunca nos demos bem. Ele me culpa pela morte dela.

- onde ele está agora?

- no exército.

- e seu pai? Como ele reagiu a você?

- totalmente ao contrário do meu irmão. Meu pai sempre me tratou bem.

- como você se sente com isso? – perguntou ele olhando fixamente pra mim como se estivesse me pressionando.

- bem, quer dizer... Não tão bem já que não tenho minha mãe, mas eu me sinto feliz.

- você não acha que por acaso esse trauma não influenciou para o desenvolvimento de sua fobia?

- talvez...

- talvez?

- sim. Não posso afirmar que tem ligação direta, mas acho que o fato dela ter morrido por uma infecção possa sei lá... Talvez.

Mais uma vez ele tomou nota de algo.

- estou indo bem Jay?

- sim Jack. Pode continuar assim que se sentir confortável se quiser fazer uma pausa.

- não. Já foi difícil vir até aquí hoje.

- sei... – falou Jay rindo.

- por que está rindo? – falei começando a rir também.

- me perdoe...

- acha engraçado eu te pagar por duas sessões todas as semanas mesmo usando só uma? – falei isso tentando segurar uma gargalhada e ví que ele também segurou para não rir.

- é melhor para mim, é bom para os negócios. Faz 1 ano e dois meses que sou seu terapeuta e desde que você começou a tratar comigo você paga por duas sessões seguidas de 1 hora cada. Um das sessões você apenas limpa toda a minha sala. Enquanto você não limpa ela você não se sente confortável de se sentar e conversar.

- mas eu não limpo por causa de você. Eu confio em você é por causa dos outros pacientes.

- entendo – disse ele.

Eu olhei para um pequeno pinguim de porcelana em cima da estante e respirei fundo.

- vai continuar? – perguntou ele bebendo um copo de água.

- sim.

Eu respirei fundo:

- pode continuar falando o que você gosta não se sinta pressionado.

- eu... Gosto de músicas. Lana Del Rey especialmente.

- porque especialmente?

- as músicas dela me fazem se sentir calmo.

- ok. – anotou mais algumas coisas.

- gosto de comprar pela internet.

- você conseguiu comprar alguma coisa na Target? Semana passada você disse que iria tentar.

- eu tentei... Eu fui até a porta e fiquei olhando as pessoas lá dentro. Eles conversavam se pagavam se abraçavam e trocavam aperto de mãos e não consegui entrar, mas pelo menos eu tentei.

- sim. – falou Jay irônico. – eu sei que você tentou, mas você não pode pensar assim da próxima vez que for tentar você tem que pensar em entrar.

- tudo bem. – falei esfregando as mãos no joelho e começando a balançar as pernas.

- se sente bem? Quer dar uma pausa.

- não – falei sentindo meu rosto ficar vermelho e suado. Olhei para o pinguim de porcelana e tentei focar no que eu estava fazendo. Depois de alguns minutos eu me senti pronto para continuar.

- como você está no trabalho?

- estou bem. Na verdade é um dos poucos lugares que me sinto bem.

- ótimo. Quero que se relacione no trabalho.

- eu me relaciono. Já trabalho lá a mais de 2 anos.

- sim eu sei, mas me diga. Nesses dois anos quantas vezes você saiu para beber com um colega de trabalho?

- nunca.

Ele tomou nota mais uma vez e virou a página.

- como sei pai está em relação às terapias?

- bem. No começo ele estava relutante como eu te disse, mas agora ele está até colaborando comigo, mas na última noite aconteceu algo comigo.

- o que?

- meu pai chamou um amigo para ir em casa.

- mas eu pensei que você tivesse dito que estava se relacionando bem dentro de sua própria casa.

- sim estou. Mas é que... – antes que dissesse eu peguei meu álcool em gel e passei nas mãos. Eu fiquei vermelho e suado.

- fica tranquilo. Pode me contar o que aconteceu?

- sim. - Eu respirei fundo ficando mais calmo, mas continuei vermelho.

- não precisa ter vergonha – falou Jay. – se você tiver gostado do amigo do seu pai não têm problemas. Por acaso seu pai está tendo problemas por você ser gay?

- não é isso. – eu passei álcool em gel nas minhas mãos outras vez.

- fica calmo – falou ele tirando os óculos. – não sei se faço o seu tipo, mas minha esposa diz que meus olhos são sua calmaria na tempestade. Olhe pra eles. Meus olhos verdes.

- eu olhei para os olhos dele. – por um tempo eu senti a pressão do meu sangue se estabilizar.

- engraçado não é? – falou Jay.

- o que? – falei tentando controlar minha respiração.

- as vezes minha esposa diz que meus olhos são azuis. Às vezes ela diz que é castanho e amarelo em volta.

- ela está errada... Seu olho é cinza.

- está mais calmo? – falou ele colocando os óculos outra vez.

- sim. – falei respirando fundo.

- então. Me conte o que aconteceu.

- meu pai levou um amigo para casa ontem, um sócio da empresa talvez... Não sei. Eu estava no sofá e me levantei para cumprimentá-lo. Passei álcool em gel na minha mão... ele me olhou estranho, mas continuou com a mão estendida. Eu o achei muito bonito. Logo depois peguei na mão dele e apertei.

- isso é muito bom. Faz tempos que você não me contava sobre ter contato com outra pessoa.

- ele é realmente um homem encantador.

- mas, você não citou o problema.

- pouco depois eu fui tomar banho e desci as escadas e assim que cheguei à sala eu ví ele e meu pai fumando charutos. Foi como se tudo acontecesse em câmera lenta. Kenny olhou pra mim descendo as escadas e assoprou a fumaça pro alto e deu um sorriso pra mim.

- o que você fez? – perguntou Jay.

- eu larguei o copo de segurava na mão e voltei correndo pro quarto tirei todas as minhas roupas e tomei outro banho. Peguei minhas roupas coloquei em um saco plástico e joguei no lixo.

Correu uma lágrima do meu olho enquanto dizia isso.

- porque o choro? – falou Jay – me passando um lenço.

- não precisa – falei pegando um lenço e limpando o rosto. – eu nunca vou conhecer ninguém, toda vez que eu me interesso por alguém eu faço alguma coisa.

- Jack não se sinta triste por ser quem você é! Relacionamentos são feitos de confiança e Tenho certeza que Kenny vai entender. Você só precisa...

- mas eu preciso disso. Eu sou virgem. Nunca beijei ninguém. Sempre ouço e vejo namorados se beijando e dizendo como é bom e tudo o que eu quero é sentir a mão de outro homem junto a minha. Quero sentir a respiração dele em minha face. .

- depende de você. Você sabe que leva tempo... se lembra.?

- passos pequenos? – falei.

- Passos pequenos, isso mesmo – falou Jay anotando mais algumas coisas.

- posso continuar?

- sim – falou Jay.

- acho que consigo.

- têm certeza? – falou Jay descruzando as pernas e tirando os óculos.

- acho que sim.

- você acha ou tem certeza?

- certeza – falei respirando.

- então... pode dizer seu nome outra vez? – falou Jay.

- meu nome é Jack e tenho TOC.

- causado por? – falou Jay

- causado pelo trauma de minha mãe que morreu por uma infecção durante meu parto. Sendo assim eu tenho... mania de limpeza? Ao estremo?

- bom esse não é o nome cientifico, mas você conseguiu. – falou ele fechando o caderno de notas e se levantando. – aceitação é o primeiro passo.

- estou pronto para próximo passo? – perguntei esperançoso.

- sim.

Eu fiquei feliz e me levantei querendo dar um abraço nele de felicidade... mas não consegui.

Ele abriu os braços esperando um abraço.

- passos pequenos – falei.

- ok – falou ele rindo e esticando a mão. – você está pronto pra cumprir a promessa que fez? você trata comigo á dois anos e nunca pegou na minha mão. Eu só vou acreditar que está pronto para o próximo passo se apertar a minha mão.

Eu olhei para a mão dele. Eu peguei meu vidro de álcool em gel e pedi pra ele mostrar a palma da mão. Ele mostrou a palma da mão e joguei um pouco de álcool em gel. Ele esfregou as mãos e esticou mais uma vez.

- você... pegou no seu bebê hoje?

- não – falou Jay esticando sua mão. Eu pude ver seu braço peludo e como ele era alto. Seu cabelo castanho escuro arrepiado quase brilhava sobre a luz da sala.

Eu estiquei a mão e peguei na mão dele apertando. Ele sorriu. E eu sorri de volta.

- você está pronto – falou Jay. – mas a partir da semana que vem você só terá uma sessão.

- passos pequenos – falei abrindo a porta – obrigado. Até semana que vem.

Eu saí da sala de terapia e meu pai estava me esperando de fora para me levar embora.

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