Homem Que Você Teme [Capítulo 9]

Parte da série Doces Sonhos

Eu nem acreditava no que estava acontecendo. Primeiro uma coisa gigante com asas me persegue e depois encontro Kyle. Eu continuava abraçado com ele enquanto ele me confortava tentando fazer com que parasse de chorar. Ele estava com uma camisa e uma calça preta e um tênis branco e preto.

- onde eu estou? – perguntei olhando pra ele já sem lágrimas de tanto chorar.

Ele não respondeu e apenas olhou pra mim com um sorriso no rosto.

- aonde você está? – perguntei me lembrando de algo. – você desapareceu e não me disse nada.

- eu não sei – falou ele olhando em volta e se sentando na maca.

- se eu não estou morto e estou sonhando... onde eu estou? Você não é real?

Ele pegou minha mão e colocou no rosto dele.

- eu sou mais real do que você pensa – falou ele sorrindo. Seus olhos me davam uma certa paz.

- eu estou me sentindo diferente. me sinto estranho.

- pode ser estranho pra você – falou ele batendo na cama mandando eu me sentar.

Eu me sentei e segurei na mão dele.

- nunca mais vá embora – falei olhando pra ele.

- eu nunca fui.

Eu fiquei para um tempo olhando pra ele.

- antes de você voltar você vai ter que se lembrar de algumas coisas. – falou ele.

- me lembrar do que? – perguntei ansioso.

- o que você se lembra.

- eu me lembro de você, meu pai e meu irmão. Lembro que sofri um acidente em casa e fui para o hospital.

- apenas isso?

- sim.

- vem comigo – falou ele se levantando e pegando minha mão – se você quiser ir embora você vai ter que se lembrar de algumas coisas... boas e ruins.

- não sei se eu quero – falei puxando ele pela mão. Não quero ficar longe de você outra vez.

- não vou deixar você. Vou ficar com você o tempo todo.

Eu me levantei e fui até a porta segurando a mão dele.

- preparado? – perguntou ele sorrindo pra mim.

- não – falei sorrindo pra ele.

Quando ele abriu a porta não havia mais o corredor do hospital e sim o que parecia ser o interior de uma cabana nós passamos pela porta e ela se fechou sozinha.

- o que eu vou ver aquí.

- eu não sei – falou apertando minha mão – não fica com medo.

Nós demos alguns passos dentro da cabana e de repente a porta da frente se abriu e eu ví meu pai, meu irmão com 11 anos de idade e minha mãe grávida.

- esta lugar está exatamente do mesmo jeito de quando nós viemos para nossa primeira lua de mel. – disse meu pai colocando umas malas no chão.

Meu irmão passou por nós e pareceu não nos ver e subiu as escadas.

- eles não conseguem nos ver?

- não – falou Kyle.

Minha mãe e meu pai deram um beijo e entre um beijo e outro minha mãe alisou a barriga e meu pai colocou a mão em cima da dela. Aquilo me fez derramar uma lágrima.

- tenho saudades dela – falei.

- então você se lembra? – perguntou Kyle.

- sim... mais ou menos. Eu me lembro que ela morreu quando eu ainda era bebê.

Meu pai fechou a porta e ela se sentou no sofá.

- você já pensou em um nome? – perguntou meu pai se sentando do lado dela.

- nó temos que pensar juntos – falou minha mãe sorrindo pra ele.

- tudo bem – falou meu pai abraçando ela – se eu fosse escolher o nome eu colocaria Benson. E você?

- bem. Eu sempre pensei em vários nomes para bebês, mas sempre teve um que eu gostei: Zack.

- por mim pode colocar o seu. Zack – falou meu pai dando um beijo na barriga dela.

- não posso fazer isso com você – falou ela sorrindo.

- pode sim. O próximo eu escolho – falou ele dando um beijo nela.

Meu irmão desceu as escadas.

- adivinha Jakob seu irmão vai se chamar Zack.

- eu te amo Zack – falou meu irmão dando um beijo na barriga da minha mãe.

Exatamente naquele momento eles paralisaram como se fosse um filme e alguém tivesse apertado pausa.

Corria algumas lágrimas pelos meus olhos.

- porque eu estou vendo isso? Eu não tinha nascido.

- você estava com 8 meses de vida. Você já ouvia tudo de dentro da sua mãe. Provavelmente foi aquí que eles escolheram seu nome.

- temos que voltar – falou Kyle abrindo a porta que dava direto para o quarto do hospital. Nós entramos e fechamos a porta.

- você está bem? – perguntou Kyle.

- estou sim. – falei limpando as lágrimas.

- você está pronto para entrar em outra porta?

- acho que sim.

Eu coloquei a mão na maçaneta e abri a mesma porta e fui para o corredor do hospital. Nós andamos alguns passos e fomos até a próxima porta.

- espero que a próxima porta seja de uma lembrança boa.

Assim que abrimos eu reconheci o lugar.

- é minha casa. – falei.

Assim que entramos e fechamos a porta eu ví meu irmão sentado no sofá jogando videogame.

- seu pai está demorando – falou minha mãe com o telefone tentando falar com ele.

Ela andava de um lado para o outro e finalmente desligou o telefone.

Ela foi até a cozinha pegou um copo de água e tomou. A barriga dela estava bem maior do que na outra lembrança.

- não deixa seus brinquedos espalhados falou ela com meu irmão.

Meu irmão não deu bola e continuou jogando.

- abaixa o volume Jakob – falou ela.

Meu irmão resmungou alguma coisa e abaixou o volume. Eu fiquei olhando meu irmão e o quanto ele era pequeno.

- porque será que ele me odeia? – falei olhando pra ele.

- você se lembra disso.

- sim... quer dizer até alguns segundos atrás eu não sabia disso.

- você sabe o porque?

- não – respondi.

Quando disse isso ví que minha mãe deu um grito e caiu de costas.

Meu irmão levantou assustado.

- mamãe – falou ele se ajoelhando perto dela.

Começou a sair sangue de sua vagina.

- está na hora. – falou minha mãe gemendo de dor.

- quero ir embora – falei para o Kyle me virando. A porta tinha desaparecido.

- eu estou aquí – falou Kyle me abraçando.

- eu não mereço ver isso – falei abraçando ele e começando a chorar.

Meu irmão abriu a porta da sala e saiu correndo pra fora gritando.

Minha mãe deu um grito alto de dor.

- porque a demora – falei limpando o nariz – Onde está o Jakob.

Quando mais ela gritava de dor mais eu começava a me lembrar do que tinha acontecido no meu nascimento.

De repente entrou dois homens e uma mulher pela porta. Eram provavelmente nosso vizinhos.

Uma poça de sangue havia se formado onde minha mãe tinha caído.

- vou ligar para uma ambulância – falou um dos homens pegando o celular.

- acho que não vai ter como esperar – disse à mulher que entrou com eles – as contrações estão a cada 30 segundos.

- vamos ter que fazer o parto dele aquí mesmo. não se preocupe Lea – disse o homem tentando acalmar minha mãe – eu sou bombeiro e vou salvar seu filho.

- salve ele, por favor – falou minha mãe suada e chorado de tanta dor. – não deixe nada acontecer com ele.

- eu não consigo mais ver isso – falei virando rosto.

Eu virei o rosto apenas ouvindo os barulhos do choro e grito da minha mãe seguido pelo barulho de um bebê chorando.

Eu me virei para ver e me ví recém nascido.

- ele é lindo – disse minha mãe.

No mesmo instante a ambulância chegou e os paramédicos socorreram ela.

- ela está com um sangramento – falou o bombeiro me entregando para o paramédico.

- se acalme senhora – falou um dos paramédicos.

Eles colocaram ela em uma maca e a levantaram.

- onde está seu marido? – perguntou.

- ele está fora. Ele deve estar chegando, mas não atende o celular. Ele está bem? – perguntou ela por mim.

- está sim – falou o paramédico empurrando a maca.

- diga ao meu marido para chama-lo de Jackson.

- a senhora vai ficar bem.

- por favor – falou ela chorando – diga á ele que eu o amo e que nosso filho se chama Jackson.

Eles há levaram e quando eles saíram eu pude ver meu irmão parado na porta. Ele tinha visto tudo sem poder fazer nada.

- quero ir embora – falei com os olhos vermelhos tentando segurar o choro.

Eu me virei e abri a porta que tinha aparecido e fui até o corredor e sentei no chão. Kyle fechou a porta e fiquei em pé na minha frente.

- eu tenho TOC. – falei limpando os olhos – eu matei minha mãe e eu tenho TOC. Meu irmão me odeia porque matei minha mãe no dia do meu nascimento.

Kyle se agachou e alisou meu rosto.

- me desculpa – falou ele.

- pelo que? – perguntei limpando o rosto.

Ele ficou em silencio e o sorriso tinha desaparecido do seu rosto.

- o que foi? – perguntei me levantando.

- acho que não é por isso que você tem TOC.

- como assim? – falei limpando o rosto. – como você pode saber? Você disse que não sabia.

- eu não sei – falou ele se levantando e respirando fundo – eu apenas sei, eu sinto isso.

- eu não quero ver mais nada. Eu quero ficar aquí.

- você não pode desistir – falou Kyle.

- por favor não quero mais sofrer.

- o que você acha que eu sinto? Como você acha que eu me sinto vendo você sofrer e não poder fazer nada – falou Kyle me olhando profundamente.

Eu olhei profundamente pra ele e fiquei pensando em como seria se eu morresse de uma vez.

- você não pode desistir – falou Kyle – é por isso que estou aquí para poder te ajudar a passar por isso.

- eu me lembro de você Kyle. Quer dizer... não lembro muito, mas lembro o suficiente para saber que eu te amo, mas se você está aquí comigo quer dizer que você morreu.

- eu não sei – falou Kyle.

- se você morreu eu não quero ver essa lembrança.

- eu estou aquí – falou Kyle pegando nos meus braços e me abraçando – você vai conseguir. Faça isso por mim.

Eu o abracei e fechei os olhos sentindo seu perfume.

- tudo bem.

Ele me soltou e pegou na minha mão. Nós andamos até a porta seguinte. Antes de chegar nela eu ví as luzes piscando.

Nós olhamos para trás e aquela criatura estava parada no fim do corredor olhando. Eu apertei a mão de Kyle.

- não tenha medo – falou ele dando um passo até a porta e a criatura deu dois passos em nossa direção.

Eu parei um pouco de sentir medo e comecei a pensar.

- Kyle – falei olhando para a criatura.

- sim? – falou ele olhando pra mim.

Hoje mais cedo quando esse monstro apareceu eu estava perto dessa porta e eu tentei abri-la.

- você está dizendo que...

- ele não quer que eu entre.

Nós dois olhamos ao mesmo tempo para aquela criatura e ela estava parada nos encarando.

- e se essa coisa estiver tentando me proteger? E se eu não aguentar o que eu ver lá dentro?

- acredite em mim. Você precisa ver o que têm lá dentro.

Kyle deu um passo para trás chegando mais perto da porta e a criatura deu um passos grande em nossa direção.

- ele não quer que você entre também. – falei olhando pra ele.

- que diabos têm aí dentro? – falou Kyle.

Nós ficamos imóveis por algum tempo pensando se iriamos entrar naquela porta.

- nós temos que entrar Jack eu vou estar aquí ao seu lado.

- eu também estarei ao seu lado – falou para Kyle

No momento que disse isso a criatura começou a deslizar em nossa direção. Ela esticou o braço e começou a gritar. Nós nos assustamos e nós dois nos viramos e abrimos a porta.

Estava escuro lá dentro.

- têm certeza? – falei para Kyle. Ele olhou para a criatura e ela se aproximava de nós dois.

Ele entrou e me puxou pra dentro fechando a porta.

Estava escuro e silencioso.

- eu estou aquí – falou Kyle apertando minha mão.

De repente tudo se iluminou. Nós estávamos novamente em minha casa, mas desta vez era de dia.

Ouvi a porta se destrancando e meu pai entrou e logo atrás eu entrei. Eu aparentava ter 10 anos de idade.

- vai se trocar – disse meu pai me dando um beijo e me mandando subir e vestir uma roupa para tomar banho de piscina.

Logo atrás veio o amigo do meu pai Kenny que entrou e fechou a porta. Ele entrou com um charuto aceso e ainda tinha sua barba por fazer.

- você falou com Jakob? – perguntou Kenny para meu pai.

- ainda não – falou meu pai indo até a cozinha. – o exército é dureza ele não deve ter tempo para ligar.

Eles pegaram uma cerveja cada um e abriram tomando um gole.

Kenny se sentou no sofá da sala e pegou um cinzeiro e colocou o charuto.

Meu pai ficou em pé e tomou um gole.

- droga – falou meu pai.

- o que foi? – falou Kenny tomando um gole da cerveja.

- tenho que ir até no centro. Amanhã é o domingo... – ele olhou pra baixo triste – faz exatamente 10 anos que Lea faleceu.

Kenny olhou para o meu pai.

- você tem certeza que é só isso?

- o que? – falou meu pai.

- amanhã seu filho faz 10 anos de idade.

Meu pai passou a mão na cabeça.

- é verdade – disse ele.

- não deixe os momentos ruins atrapalharem os bons momentos da sua vida. Eu conheci a Lea e ela ficaria triste se você não comemorasse o aniversário do Jack. Eu sei que amanhã você vai se lembrar de que sua esposa faleceu, mas também comemora o nascimento do seu filho.

- você está certo – falou meu pai forçando um sorriso – eu já te contei em como Jack recebeu esse nome?

- não – falou Kenny.

- ela juntou os nomes que nós queríamos Benson e Zack e quando fui até o hospital pegar meu bebê e se despedir da Lea o paramédico que os socorreu disse que Lea queria que ele se chamasse Jackson.

- sinto muito – falou Kenny

- eu vou planejar uma festa para ele e preciso comprar algumas coisas, você se importa de cuidar dele?

- não – falou Kenny – pode ir e levar o tempo que for.

- obrigado – fico te devendo essa – falou meu pai pegando a chave do carro.

Eu desci as escadas sem camisa pronto para nadar.

- aonde meu pai foi tio Kenny?

- Jack amigão senta aquí com o tio Kenny?

Eu desci as escadas com minhas chilenas no pé fazendo barulho no chão e me sentei do lado dele.

- seu pai teve que ir resolver um problema, mas logo ele vai voltar. – falou Kenny me abraçando.

- não parece tão Ruim – falei para Kyle.

Kyle não respondeu e continuou olhando para a cena sem piscar e ele apertou minha mão. Eu olhei novamente para o sofá e eu continuava sentado ao lado de Kenny.

- então... você já está virando um homenzinho! – falou Kenny.

- sim – falei sorrindo – posso ir tomar um banho na piscina tio Kenny?

- espera – falou Kenny me abraçando junto dele. – você não gosta do tio Kenny? – perguntou ele.

- sim.

- se o tio Kenny te pedir uma coisa você faz pra ele?

- sim tio Kenny.

Kenny levantou um pouco a camisa e abriu o zíper da calça, pegou minha pequena mão e colocou entre suas pernas.

- mas você não pode contar pro papai ok? – falou ele sorrindo pra mim.

A fumaça do charuto dele dançava pela sala.

- não é possível – falei chorando enquanto via aquela cena.

Olhei para Kyle e ele também chorava. Seus olhos verdes agora era rodeados por uma cor vermelha.

Minhas mãos tremiam eu não conseguia me mexer. Kenny colocou o charuto na boca e abriu os braços e fechou os olhos olhando pra cima e gemeu enquanto eu repetia alguns movimentos que ele tinha me ensinado.

Eu senti uma dor no meu coração e minha cabeça começou a doer de ver aquilo, pois eu estava me lembrando. Eu não conseguia parar de olhar para aquilo.

Meu eu de 9 anos olhou pra mim e ficou olhando sem dizer nada me encarando como se ele me visse.

- Jack! – falei esticando o braço para o meu eu de 9 querendo ajuda-lo – eu tremia e chorava.

- me ajude – falou Jack olhando pra mim enquanto Kenny me pegava no colo e acariciava meu frágil corpo.

- solta ele – gritei alto de tanta raiva. Meu rosto estava vermelho e eu suava muito.

Kenny me ouviu e olhou pra mim em pé. Eu me assustei não era para ele me ver. Ele se levantou do sofá. Meu eu de 9 anos tinha desaparecido. Ele veio andando em minha direção sorrindo.

- titio está aquí – falou ele chegando perto de mim. – eu olhei para o lado e Kyle tinha desaparecido.

- Kyle? Você prometeu ficar ao meu lado!

Kenny pegou minha mão e colocou dentro da calça dele.

- faz do jeitinho que titio te ensinou.

Eu tremia, estava apavorado, triste, com nojo, me sentindo culpado, mas eu fiz o que ele mandou pois eu tinha medo dele.

Ele colocou o charuto na boca e deu um trago assoprando na minha cara. Eu tossi e me senti tonto e caí no chão.

Quando eu abri os olhos eu estava outra vez no corredor do hospital. Kyle estava sentado se escorando na parede e olhava pra baixo triste. Eu continuava tremendo e caia algumas lágrimas do meu rosto que agora pingavam no chão, pois eu não conseguia me levantar.

Eu me sentei ao lado de Kyle que ainda permanecia na mesma posição sentado, triste sem dizer nada.

- eu nem acredito que isso aconteceu comigo. – falei limpando lágrimas dos meus olhos.

Eu olhei pra ele e ele ficou encarando o chão.

- eu não me importo de você ter saído de lá acredito eu tentei.

- eu me lembrei – falou ele com a voz rouca.

- o que? – perguntei.

- quando estávamos vivos e juntos você me contou.

- o que?

Ele continuou calado.

- acho que você não vai precisar entrar em nenhuma porta para saber da próxima história.

Eu respirei fundo e limpei os olhos.

- pode contar.

Ele olhou pra mim e lambeu os lábios para começar a falar.

Jack. Meu eu sou policial... ou pelo menos era. Um dia você passou muito mal em uma tarde enquanto andava pelo shopping procurando seu pai. As pessoas estavam assustadas com você e não te ajudaram enquanto você passava mal, mas eu estava no shopping aquele dia e te ajudei a respirar já que você estava com falta de ar.

- eu me lembro – falei – eu fiquei impressionado com seus olhos, pois tinha sido a primeira pessoa com olhos verdes que eu tinha visto em minha vida. Fiquei tão admirado que melhorei enquanto você dizia coisas para eu me acalmar.

Na época eu conheci seu pai que ficou muito impressionado, pois eu era a primeira pessoa com quem você falava a anos. Ele ficou tão agradecido por eu ter te salvado que naquele mesmo dia me chamou para jantar em sua casa.

Depois daquele jantar algo mudou em mim.

- em mim também – falei. – eu lembro que não conseguia te tirar da minha cabeça.

- eu fui o primeiro homem que você confiou depois do que aconteceu...

Nós demos uma pequena pausa.

- na época eu não sabia dessa história. Eu sabia que você tinha TOC e a cada dia me aproximava mais de você, sempre depois ou antes do trabalho eu te visitava e seu pai me recebia bem em casa. As vezes eu te lavava para o terapeuta.

- como meu terapeuta se chamava? – perguntei curioso.

- Adam – falou ele.

- acho que me lembro dele – falei respirando fundo pronto para escutar o resto da história.

Os meses se passaram e nós nos apaixonamos, você estava quase que curado do TOC. Você tinha 19 anos na época.

- isso aconteceu então a 2 anos atrás.

- exato.

- certa noite te convidei para passar a noite em minha casa... você sabe para o que...

- sim. Entendo – falei interrompendo ele;

- pois bem... nós nos deitamos na cama e eu subi em cima de você e te beijava, mas toda vez que passava a mão em seu corpo você começava a chorar. Eu fiquei com medo de ter te machucado, mas você me disse que não era minha culpa. Eu disse que podia confiar em mim então você me disse que o melhor amigo do seu pai Kenny tinha te estuprado...

Eu comecei a engolir o ar e não soltava eu tentei me controlar e Kyle pegou minha mão.

- se acalma – falou ele apertando minha mão – se quiser eu paro de contar.

- pode continuar – falei tentando estabilizar minha respiração.

- tudo bem – falou ele dando um beijo na minha mão.

Eu me levantei furioso da cama, pois eu já tinha conhecido o amigo do seu pai, tinha estado no mesmo lugar que ele. uma raiva enorme me dominou. Você começou a dizer que não tinha problemas, mas eu era cabeça dura demais para te escutar e estava com muita raiva então eu deixei você em casa e peguei minha moto e fui até a sua... com minha arma.

- e então? – falei olhando pra ele limpando uma lágrima do meu rosto.

- eu nunca cheguei na sua casa. – falou ele olhando pra mim.

- sinto muito – falei abraçando o braço dele.

Eu fiquei deitado no ombro dele querendo nunca soltar. Eu não queria viver, eu queria viver a morte com Kyle.

- espera um pouco – falei levantando a cabeça.

- porque eu não lembro de nada disso?

- eu não sei – falou Kyle.

- eu posso responder essa – falou a voz de um homem. Eu olhei para o lado e Kyle tinha desaparecido.

- quem está aí? Kyle?

- sou eu maninho! Não se lembra de mim?

Meu irmão surgiu de uma das portas.

- Jake... Jakob? – falei me levantando.

- você morreu?

- não sei – falou ele. – talvez eu seja apenas a representação que sua mente criou para você. Uma imagem que você se sente confortável.

Meu irmão estava exatamente como da última vez que o tinha visto... por foto é claro.

Alto, forte, cabelo raspado e sem barba. Ele usava o uniforme do exército. Eu corri até ele e dei um abraço. Ele me abraçou de volta. Se não podia abraçar meu irmão verdadeiro eu queria abraça-lo naquela experiência de quase morte ou sei lá o que...

Eu olhei pra ele e ele estava fazendo uma coisa que ele não costumava fazer muito: sorrir.

- eu posso te contar porque você não se lembra de nada do que aconteceu com Kyle e nem com Kenny.

Ele abriu a porta do quarto e apareceu uma sala que eu acho que conhecia.

- você reconhece essa sala? – perguntou ele.

- não sei... talvez.

Nós entramos e ele sentou em uma poltrona e me mandou sentar na outra.

- você pode me contar o que aconteceu? Porque eu não lembro de nada disso?

- Jack... quando uma pessoa passa por um trauma muito grande como desastres naturais e é muito para ela suportar e a terapia não funciona os médicos opinam por um tratamento diferente.

- qual?

- com você foram usados dois tipos de tratamento, mas antes eu quero contar o que aconteceu com Kyle.

- tudo bem – falei me acomodando.

- depois que Kyle sofreu o acidente você se culpou profundamente pelo o que aconteceu com ele. você tinha ataques noturnos e não saia mais de casa. Seu terapeuta te via em casa e você se recusava a dizer qualquer coisa que fosse.

Ele então decidiu usar tratamento de choque em você. Claro que hoje em dia é tudo muito organizado e não é assustador como vemos nos filmes. Tratamento de choque é usado normalmente hoje em dia e juntamente com o tratamento de choque você tomou um medicamento usado em vitimas de traumas muito forte. Esse medicamente apaga sua memoria.

- mas eu me lembro de toda minha vida, mas eu juro que antes de ver o Kyle eu não lembrava dele. Parece que esse medicamento só apagou ele.

- exatamente. Depois de 2 sessões de tratamento de choque você começou a tomar os comprimidos e fazer terapia para apagar exatamente a memória ruim. Para poder atacar exatamente o trauma que você tinha sofrido ao perder Kyle.

- o que aconteceu com Kyle?

- eu não sei. Jack eu sou apenas seu subconsciente te dizendo o que você sabe, mas não quer se lembrar.

- ok, pode continuar.

- Jack junto com o trauma de Kyle foi apagado a memória do abuso que você sofreu. Por isso você não lembra de nenhum dos dois quando está acordado. Depois que alguns meses que o tratamento começou a fazer efeito Adam, seu terapeuta, recomendou que você tivesse outro terapeuta para criar novas memórias então seu pai te levou para ver...

- Jay. – falei olhando pra ele. Meu irmão tinha desaparecido e em seu lugar apareceu Jay.

- agora você se lembra de mim.

- sim – falei olhando pra ele e reparando em seus olhos verdes.

- eu te amo? – perguntei.

- só você tem a resposta – falou Rupert. Jay tinha desaparecido e em seu lugar apareceu Rupert.

Eu olhei por baixo da porta e ví uma sombra nela e alguém bateu.

- quem é.

- está na hora de voltar – falou meu irmão que tinha aparecido outra vez no lugar de Rupert. – você está se curando, está na hora de você acordar.

- eu quero ver Kyle. – falei.

- quem é Kyle? – falou Kenny que tinha aparecido.

Eu me levantei.

- fica longe de mim – eu me virei e tentei abrir a porta e quando não consegui olhei para a poltrona e me ví com 10 anos de idade sentado na poltrona.

- eu vou me lembrar do que eu ví aquí? De tudo o que eu me lembrei?

- não. Mas você pode. Basta você querer. – falei comigo mesmo.

A maçaneta começou a girar e aporta abriu devagar.

Eu olhei outra vez para a poltrona e não tinha ninguém. Quando olhei de volta para a porta eu ví um clarão muito forte que fez meus olhos doerem.

Por um momento pensei que tinha finalmente morrido. Eu senti uma paz de espirito que durou apenas alguns segundos até que ouvi a voz dele.

- Ele está acordando – falou Jay gritando.

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