Carlos Mendes

Conto de Alequino como (Seguir)

Parte da série HAPPY - Felizes apesar de tudo

_ Carlos Mendes

Novembro estava chegando ao final, e com ele, as provas, o ano letivo, e o Ensino Fundamental. E que melhor comemoração para tudo isso se não uma viagem para o litoral de Espírito Santos?

A única coisa que faltava era a autorização dos meus pais, o que não seria difícil, já que a turma do meu irmão também estava indo para a viagem, e aquela não seria a primeira vez que eu já tinha viajado com ele sem meus pais, porém nenhuma dessas vezes tinha sido tão longe quanto esta.

Eu estava ali, na cozinha, explicando todos os detalhes para minha mãe, como por exemplo os professores que nos acompanhariam, o lugar onde ficaríamos, quais eram os perigos que existiam, e consequentemente a segurança que teríamos, o cronograma de atividades, a festa que a escola queria oferecer, e as festas que o lugar oferecia e as quais podíamos ir, meus amigos cujos pais já tinham autorizado irem, e principalmente a situação das minhas notas, que eram excelentes por sinal, para dar uma impressionada.

Como todos os pais, ela deu aquele discurso sobre como eu nunca vou estar crescido o bastante para as preocupações dela e de meu pai, mas disse que eu estava me formando, e que por minhas notas sempre terem sido as melhores da turma, eu merecia fechar esse ciclo com chave de ouro. Que ela iria apenas falar com meu pai antes, - eles gostavam de conversar e chegar a um consenso para nunca interferirem na decisão um do outro, o que eu achava muito maduro e fofo, não que eu entendesse muito do que era ser maduro com meus poucos treze anos - mas que se dependesse dela, eu estaria na lista de alunos confirmados.

Depois de conversar com minha mãe, me servi de um copo de suco de laranja e voltei para a sala de estar, me sentando no sofá para assistir televisão que estava transmitindo uma maratona com os quatro últimos filmes de Harry Potter, saga de que eu era muito fã.

Ao me despojar no sofá, instintivamente dei uma olhada no espelho que ficava ao lado do portal de entrada da cozinha e passei a mão nos meus cabelos castanhos claros, que caiam em fios lisos pela testa, indo até minhas sobrancelhas. Naquele momento, eu só não estava sem camisa pelo ar condicionado ligado, mas sem ele ou nenhum outro climatizador, eu estaria apenas de bermudas... jeans, como sempre.

Darlan desceu as escadas acompanhado por Hugo, seu melhor amigo que tinha vindo morar na cidade onde morávamos por causa da faculdade. Hugo tinha um moicano loiro não muito alto que descia até a nuca, o que era mais legal nele é que ele gostava de mudar, e eu me identificava com pessoas assim, nunca fui muito fã da mesmice. Hugo vestia uma camiseta branca com gola em u, cavada e larga, com um cachorro pug em meio aos dizeres "love pugs", acompanhada de uma bermuda de brim vermelha, e converse preto sem cadarço. Hugo não era o tipo de cara que tentava parecer "cool", ele simplesmente era, e era aquilo que me fazia suspirar por ele.

- [...] ainda não sei qual o propósito de tudo isso. Mas de uma coisa eu tenho certeza, essa menina está muito afim de você - disse meu irmão, olhando para os degraus enquanto os descia.

Danilo era quase que uma cópia aumentada de mim, quer dizer, eu era a cópia dele. Nossos castanhos cabelos lisos se espalhavam do mesmo jeito no nosso couro cabeludo, nossas peles pouco bronzeadas eram tão lisas que se sentia a maciez só de olhar, e os olhos eram do mesmo tom de negro, levemente fechados, com um brilho peculiar. A diferença era que meu irmão era no minimo duas cabeças mais alto do que eu, e que seus músculos bem mais definidos que os meus estavam marcados pela camisa que ele usava com o símbolo do Batman estampado no meio. E aquilo me fazia entender porque Gustavo, meu melhor amigo, suspirava por Darlan.

- Carlos, eu vou ao shopping com Hugo. Nós compraremos sungas para a viagem da escola - disse Darlan. - E eu queria um óculos diferente, mas não estou afim de ficar comprando coisinhas pra levar, você me empresta algum?

Eu tinha uma coleção de óculos escuros, bonés, tênis e chinelos, alguns um tanto infantis, mas aos poucos eu estava mudando isso, e havia algumas opções que meu irmão poderia aproveitar.

- Já estou acostumado com isso. Noventa por cento do que você tem são presentes meus - disse.

- Não exagera, gastador - disse ele, em tom de brincadeira. - Sessenta no máximo, o resto é coisa da mamãe - isso me fez rir, e eu percebi que Hugo sorriu. Teria sido do meu irmão ou da minha risada?

- Estamos saindo - disse Darlan, bagunçando meu cabelo. - Até mais tarde.

- Tchau - disse, antes que eles fechassem a porta da entrada. Eu me despedi sem olhar nos olhos de Hugo. Eu tinha essa dificuldade de fazer contato visual com um garoto de quem eu gostava.

Eu voltei a tenção para o filme, não toda ela, exatamente. Hugo e seu sorriso ainda estavam naquela sala, e aquilo me deixava um tanto desligado.

- Carlos? - Chamou minha mãe, do balcão que separava a cozinha da sala.

- A senhora quer alguma coisa? - Perguntei.

- Ainda estou terminando a decoração dos bolos. Você se importa de buscar seus irmãos para mim?

- Claro que não, mãe - disse, desligando a televisão.

- Obrigada, meu amor. E não deixa eles comerem nada. Se não eles não lancham e sempre fica sobrando coisa do café da tarde.

- Sim, senhora - disse, simulando uma continência.

Ela colocou a mão na cintura e me reprovou com um olhar, mas por fim sorriu.

Eu corri até meu quarto, vesti um par de óculos escuros tipo aviador, e um boné de aba reta, e assim saí para buscar meus irmão mais novos na escola.

No caminho encontrei algumas pessoas conhecidas, muitas delas do colégio em que eu estudava. Inclusive Marcos, um amigo de infância, ao qual eu me afastei um pouco depois de me descobrir. Assim foi com a maioria dos meus colegas meninos.

- Carlos? Tudo bem? - Perguntou ele, atravessando a rua para me cumprimentar.

- Tudo e você?

- Bem também. Esse final de semana vai acontecer um churrasco lá em casa. Um pessoal do meu colégio vai aparecer por lá. Por que você não vem? Eu fiquei sabendo que você vai estudar no meu colégio, eu posso te apresentar a galera.

- Nossa. Eu acho que pode ser uma boa ideia.

- É. E eu quase não te vejo. Nós precisamos conversar sobre as meninas.

- Ah, claro! - Disse ficando constrangido. Claro que Marcos não sabia que eu gostava era de garotos. - Eu vou adorar conhecer a galera... Você se importa se eu levar dois amigos? Eles também vão mudar de escola comigo.

- Não me importo, não. Legal te ver. Espero você no sábado.

- Nos vemos - disse, indo na direção contrária a dele.

Depois de dez minutos de caminhada com os fones no ouvido, eu cheguei ao portão da escola dos meus irmãos. Fui a sala deles e os busquei. Enquanto saíamos Amanda, uma morena de cabelos encaracolados até a cintura, de olhos verdes, que estudava na turma do meu irmão veio falar comigo.

- Carlos? Ainda bem que eu te encontrei. Eu precisava muito da sua ajuda. Amanhã é aniversário daquele amigo do seu irmão que chegou na cidade no meio do ano.

- O Hugo?

- Ele mesmo. Eu queria muito comprar alguma coisa para ele. Você sabe que tipo de game ele gosta?

- Eu não sei se o Hugo gosta de videogame. Acho que ele é mais de livros.

- E que tipo?

- Eu não sei muito bem - menti. Eu sabia praticamente tudo sobre os gostos de Hugo, talvez até melhor que ele. Quando fui a sua casa com meu irmão fiquei horas memorizando os títulos que ele tinha no quarto. E seu gosto era bem parecido com o meu. A não ser pelas histórias medievais, das quais eu não era muito fã, apesar de reconhecer uma boa história mesmo não me atraindo.

Aquele era o caso de Amanda. Ela era linda, e eu não podia negar isso, e era uma menina, o que a fazia ter chances reais de Hugo gostar dela, o que não era o meu caso, além de ela ter 17 e eu só 13. - Aventura, no geral - resolvi dizer.

- Você é um fofo - disse ela, me dando um beijo no rosto.

- Carlos tem namorada! Carlos tem namorada! - Cantaram Breno e Cecília, durante quase todo o caminho para casa. O que me deixou muito irritado.

Quando chegamos no portão de casa meu celular tocou. Eu olhei para identificar e mostrava o número de Gustavo.

- Eu vou atender o telefone e já subo. Levem suas mochilas - disse, entregando-os as respectivas bolsas.

- Amigo. Estou saindo do shopping. Acabei de encontrar com o Hugo e com o seu irmão. Ainda estou recuperando o fôlego.

- Hum.

- Que desanimo é esse? Você não costuma ficar assim quando eu te falo sobre o Hugo.

- É a Amanda do terceiro A.

- O que tem ela haver com isso?

- É que eu tenho quase certeza que ela está interessada no Hugo, e é só que ela tem mais chances de ficar com ele do que eu.

- Por que?

- Sejamos realistas, Gustavo. O que eu sinto por ele é coisa de criança, e tem isso, eu só tenho treze anos, sem falar no fato de eu ser um menino.

- E daí? Você nem sabe se o Hugo é heterossexual mesmo. Você mesmo disse que nunca viu ele com nenhuma garota.

- Mesmo que ele fosse gay. Ele tem dezoito anos, com certeza não vai ficar interessado por um garoto de treze.

- Sabe de uma coisa? Você nunca pensou em ter chances reais com ele. E não é por causa disso que você vai deixar de ficar animado quando o assunto for Hugo. Não interessa se ele se apaixonar por aquela menina ou não. E se é coisa de criança, como você diz, nada vai te impedir de suspirar por ele enquanto você não encontrar alguém.

- Eu nem sei se quero encontrar alguém. Eu só tenho treze anos.

- Então para de se martirizar.

- Você tem razão, eu estou sendo um :bobo. Mas me conta, meu irmão falou com você?

- Ele disse que amanhã eu e você temos um compromisso a noite.

- Nós dois? Ele não me disse nada.

- Então ele vai dizer. Amigo, eu vou desligar. Estou quase chegando em casa, e minha mãe já deve ter chegado.

- Tudo bem. A gente se fala amanhã, no colégio.

- Até - disse ele, mandando um beijo antes de desligar a ligação.

Na hora do jantar, Darlan perguntou a meu pai se eu poderia ir a pizzaria com ele e Hugo no dia seguinte para comemorar o aniversário do amigo. Foi aí que eu entendi o compromisso que Guto falava sobre. Alguns outros amigos de Hugo foram convidados, alguns meninos e meninas do colégio.

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