Todo teu / 9 capítulo / parte 1

Conto de Jeff-Lúcio como (Seguir)

Parte da série Todo teu / 1 Temporada

– Caramba, Pimentel, veste qualquer coisa! – berrei assim que entrei em

casa e vi o meu amigo a sair do quarto, nu.

Eu não sou homem que se atrapalhe com cenas de nudez, mas via­se perfeitamente que tinham acabado de fazer sexo e a ereção do Pimentel, mesmo que já em quarto minguante, intimida qualquer um… menos o

Ricardo, aparentemente.

Desapareci no quarto para trocar de roupa, ao som da gargalhada do meu amigo, consciente de que a minha disposição sofrera um abalo do qual iria demorar a recuperar. Não sou tímido, nem preconceituoso, nem

moralista, nem limitado sexualmente, muito pelo contrário, sou o perfeito oposto disso tudo, no entanto, detesto assistir a cenas destas quando não posso participar. Já me estava a convencer de que a ideia deles era justamente essa, motivar­me a participar. Sabia que o Pimentel até gostava e, pelo comportamento do Ricardo comigo… simplesmente não tinha interesse nenhum, detesto envolver­me com amigos porque as

coisas acabam quase sempre numa colossal trapalhada.

Portanto não estava propriamente eufórico quando finalmente saímos para tomar café numa das esplanadas de Alfarim.

– Queres ir à frente?- perguntou­me o Ricardo, indicando­me a porta da

frente do carro, no que foi um esforço simpático para me agradar.

Felizmente, nem precisei de responder­lhe, bastou­me olhá­lo por cima dos óculos para ele perceber que não me passaria pela cabeça qualquer outra coisa que não fosse ir à frente, que ele poderia ser o namorado do

meu amigo, mas que o seu lugar seria sempre no banco de trás. Ele sentou­se sem dizer mais nada, afinal o estereótipo sobre a burrice dos

louros não era universal. Mas a minha boa disposição durou poucos minutos: o Pimentel insistia em arranjar­me um homem, há meses que andava a apresentar­me a toda a gente que conhecia.

– Eu não preciso que me ajudes a arranjar homens, Pimentel, preciso é

que me ajudes a afastá­los! – rosnei, secamente.

– Mas não queres um namorado?

Virei­me para trás e a expressão que fiz foi suficiente para matar o

sorriso estúpido que estava estampado na cara do Ricardo.

– Eu não tenho namorados, Ricardo, tenho bonecos que uso como me

apetece.

O tipo era irritante e convenci­me de que teria de lhe explicar detalhadamente que, para mim, os “apêndices” devem ficar quietinhos e

calados, respondendo apenas quando alguém lhes dirige uma pergunta. E

mais, começava a suspeitar que o meu amigo sofria de “apendicite” porque o Ricardo parecia­me, cada vez mais, uma fonte de problemas.

– Sabes que há um miúdo aqui no Meco de quem és capaz de gostar… –

o meu amigo Pimentel tem a característica da persistência, o que em algumas situações pode ser uma qualidade, mas que para mim é

normalmente um defeito desesperante. Pior ainda, é um perfeito autista quando teima.

– És tu que gostas de crianças, amigo, não eu – lancei, contendo­me para não fazer referência ao meu absoluto desinteresse em esbanjar o meu dinheiro a sustentar miúdos… seria demasiado desagradável, mesmo vindo de mim. Mas não sei se ele terá compreendido a piada, convenci­ me de que não porque continuou como se eu não tivesse dito nada.

– Eu não o conheço muito bem, é amigo do nosso jardineiro, o Chico, que me contou uma série de coisas sobre ele que te interessarão, de

certeza.

Brilhante! O amigo do jardineiro…

Fiquei com vontade de tomar o pequeno­almoço e de me meter no carro logo a seguir, a caminho de Lisboa! Quem é que me mandava alinhar nestes números…

– Eu moro num apartamento, Pimentel, não preciso de jardineiros! –

exclamei impaciente. – Em minha casa só sobrevivem os catos.

– Vamos tomar café à esplanada da associação desportiva, o Chico costuma aparecer por lá…

– É um sonho que realizo graças a ti, amigo, muito obrigado – lancei, agora irónico.

– Sempre quis conhecer o teu jardineiro na esplanada do

clube de futebol da aldeia…

E tudo foi pior do que as minhas piores expectativas: o autismo do meu amigo; a esplanada de cadeiras de plástico, queimadas pelo sol, numa varanda de cimento coberta por um toldo vermelho roto; os clientes, todos velhotes, que olhavam para nós como se fossemos intrusos

Contínua...

Comentários

Há 1 comentários.

Por Elizalva.c.s em 2017-01-18 16:01:26
Parabéns esta muito bom continue assim😍😍😍😘😘😘😘