Todo teu / 5 capítulo

Conto de Jeff-Lúcio como (Seguir)

Parte da série Todo teu / 1 Temporada

Vesti uns calções e uma t­shirt, calcei uns ténis e arranquei a correr.

Nem era só pelo exercício, para me cansar, era também para aliviar a

mente e para me distrair com outras coisas. Tinha de parar de pensar no Pedro, tinha de parar de pensar na treta da minha vida e, decididamente, tinha de parar de chorar por tudo e por nada, de me esconder dos meus avós. Quem puxa pelo corpo não tem tempo nem energia para puxar pela cabeça.

Assim que saltei o muro para a estrada, acelerei o passo e concentrei­me na respiração.

Sabia bem sentir o fresco da manhã no corpo. Em junho, as ervas secas cobriam os campos de um castanho claro, mas ainda havia ilhas de verde, protegidas do calor do sol pelas copas dos pinheiros isolados. Fui

seguindo pelas rodeiras dos carros que passavam por ali no verão, para se acercarem o mais possível das praias mais isoladas. Como sempre, quando entrei no pinhal o odor da resina envolveu­me e ouvia­se o vento agitando as ramadas altas dos pinheiros, parecendo murmurar um

cumprimento de boas vindas. Era o meu pinhal, um sítio misterioso, com as alamedas estreitas, cruzadas pelas raízes que rompiam da terra e

forradas por um tapete de caruma que abafava o ruído dos meus passos.

Apesar da beleza da paisagem, os meus pensamentos retornavam ao Pedro e, para não continuar obcecado com ele, tentei concentrar­me no único amigo que tinha, o único amigo que ele me deixara ter.

O Chico é meu amigo desde criança. É de Alfarim, eu sou do Meco, mas

é um puto da aldeia, como eu. Nunca andámos na mesma escola, mas o

pai dele ajudava os meus avós nas terras e nós brincávamos enquanto eles trabalhavam. Sempre fomos amigos, desde pequeninos, e quando entrou para a equipa de futebol, eu quis ir com ele. É mais velho que eu um ano e tal, já vai fazer vinte, enquanto eu ainda vou fazer dezoito, mas é um bocadinho lerdo e eu sempre o adorei, também por isso. Além do mais, o que lhe falta em inteligência tem de sobra em bom feitio, é

mesmo boa pessoa e sempre o defendi quando gozavam com ele. É um bom tipo e eu gosto dele, gosto mesmo.

É gay como eu, descobrimos isso há algum tempo, e a primeira vez que esteve com um gajo foi comigo, há dois anos, tinha eu quinze. Na praia por vezes acontecem coisas… com o calor, os corpos expostos…

Primeiro veio a curiosidade, a inevitável comparação, mas não ficámos por aí e, se já éramos amigos antes, melhor ficámos depois de perceber que tínhamos mais uma coisa em comum.

O meu primo ficou furioso quando descobriu, furioso mesmo. Acusou­ me de o trair, de revelar o nosso segredo, de… mas estava errado. Primeiro, porque eu nunca disse a ninguém que ele e eu… na verdade, o

Chico ficou a saber justamente por causa do escândalo que o meu primo fez. E depois, não tinha razão para se queixar, porque nessa altura ele andava com uma namorada e não me ligava nada, não me dava atenção. Que culpa tinha eu? Eu estava a precisar de sexo e as coisas com o Chico proporcionaram­se, não me arrependi nem um minuto. Foi a única circunstância em que enfrentei o Pedro: ele proibiu­me de voltar a ver o

meu amigo mas eu não aceitei, não aceitei mesmo! Foi a única vez em que lhe desobedeci frontalmente, apesar da reprimenda. Não voltámos a

fazer nada, o meu primo não queria e eu acatei, mas continuámos amigos e nunca abdicarei dele. O Chico é o Chico, sempre foi meu amigo e está acima de ciúmes, mesmo dos do Pedro.

Agora o Chico parecia apaixonado, tinha um namorado a sério, o Álvaro, um tipo de Santana. Antes disso tinha tido casos com vários homens, geralmente betinhos de Lisboa que arrendavam casa de fim de semana aqui no Meco. A maioria dos seus casos foi com gays, mas sei que até

teve algumas experiências com homens casados. Isso não é para mim, eu

gosto de coisas sérias e duradouras, gosto de segurança. Claro que gosto de sexo, muito, mas não a esse ponto. Preciso de saber que posso contar com as pessoas e acho que não aguentava imaginar que o gajo, com quem eu tinha acabado de estar, ia para casa, para a cama, encostar­se hipocritamente à mulher…

Certo! Eu a pensar estas coisas e o “meu” homem a regressar da lua

de ­mel com a mulher!

Contínua...

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