Todo teu / 11 capítulo
Parte da série Todo teu / 1 Temporada
O Chico viume logo ao fundo da rua e acenoume. Estava na esplanada do Vermelho acompanhado por mais umas pessoas. Reconheci o
Pimentel, ao lado do Chico. O Paulo Pimentel é um enfermeiro de Lisboa, muito simpático, que arrenda casa no Meco para passar os fins de
semana e as férias de verão. Já o conhecia de vista há bastante tempo, da
aldeia e da praia, mas nunca lhe falara até o Chico nos apresentar. O
Pimentel tinhao contratado para lhe tratar do jardim e tinham acabado… enfim… enrolados. Virao na praia, sabia que tinha um bom físico e
também sabia que era bem dotado, o Chico tinhame feito o relatório completo, era um desbocado perigoso e contava tudo a toda a gente. Eu achava o Pimentel atraente e gostava dele por ser bem disposto e
provocador, mas o homem precisava de ser o centro das atenções e nisso exagerava um bocadinho.
À frente deles estavam dois tipos que não reconheci. Um deveria ser o
novo namorado do Pimentel, já o tinha visto uma vez e não gostava muito dele, era pouco mais velho que eu e muito bonito, mas também muito convencido. O outro estava de costas e
de cabeça baixa, concentrado numa revista. Percebi que não era o Álvaro, devia ser o tal amigo que o Chico queria apresentarme. Poderia ser alguém interessante, visto daquele ângulo parecia ter muito bom aspeto.
– Nunooo! – exclamou logo o Chico, acenando outra vez.
– Bom dia, amigo!
Responditimidamente, em vez de gritar também por ele, como era
habitual: estava em choque, bloqueado, tinha finalmente percebido quem era o desconhecido que estava com o meu amigo… era o tipo do pinhal, o corredor podre de bom.
Oh, meu, mas ele está aqui?
Levantou os olhos da revista para saber quem tinha chegado e percebi que me reconheceu. Ao menos isso, reconheceume! A bicicleta iame escapando das mãos. Fui encostála à parede, lentamente, para ter uns segundos para recuperar a compostura. Não valia a pena pôr o cadeado porque ali ninguém se atreveria a roubarma. Além disso, nem me
conseguia lembrar do código. O outro do pinhal ali? Parecera surpreendido por me ver, mas mais surpreendido do que eu não estava, com certeza!
–Olá Nuno! – o Pimentel cumprimentoume a sorrir, como sempre, apertandome a mão quando lha estendi.
– Estás bom?
–Sim – respondi vagamente, sentindome um bocado constrangido.
Era para aí a quarta ou quinta vez que ele me via, mas usava sempre aquele tom efusivo para me cumprimentar. Parecia felicíssimo por me ver e cheio de saudades minhas. Era atraente, tinha boa pinta, mas quer dizer… há limites! Eu sabia que ele gostava de putos e devia estar de
olho em mim, era sempre muito simpático comigo, mas se eu já ficava atrapalhado quando ele estava sem namorado, muito mais ficava agora que tinha um. E ainda por cima à frente de desconhecidos. Concentrei me para tentar decidir se estendia a mão ao bonzão ou se apenas lhe
acenava. Tinha de lhe apertar a mão… até porque queria mesmo tocar lhe.
Controlate, meu!… gritoume o cérebro lá do fundo… é só um gajo!
– Já conheces o Ricardo? – o Pimentel apontou para o namorado, à sua
frente.
Apertei também a mão ao Ricardo, que me fez um sorriso amarelo, como se estivesse aborrecido por ter de falar com um dos saloios da aldeia. Parecia incomodado, a fazer um frete, e irritoume logo. O seu ar
convencido, a expressão com que me olhou…
Arrogante de merda!
Ele achavase o máximo e comportavase como se me estivesse a fazer um favor. Aliás, ele não me cumprimentou, deume a mão para apertar, só isso, uma coisa flácida, mole… detestava gente assim, que não
apertava a mão. Eu já estava em stresse por estar ali o bonzão, que ainda por cima me estava a ignorar e continuava a ler a sua revistinha como se
eu não existisse, e ainda tinha de levar com isto?
– Não me lembro – respondi ao Pimentel, encolhendo os ombros, com se
estivesse a desculparme, e depois vireime para o Ricardo.
– Mas acho que sim, já nos encontrámos, não?
Os seus olhos traíramno, não gostou da minha indiferença, devia achar que eu tinha obrigação de me lembrar dele. Bem feito! É claro que me
lembrava dele, mas não estava com paciência para aquelas merdas.
Vai buscar, abelha!
Agora sim, agora era a vez do corredor. Percebi que ele me estava a
espreitar por cima da revista. Pareceu surpreendido com a minha resposta ao Ricardo, também não devia gostar dele. Noteilhe uma expressão de
curiosidade que me confundiu.
– O Duarte não conheces de certeza, é o seu primeiro fim de semana no
Meco – continuou o Pimentel.
Senti que a sua voz endurecera um pouco, não devia ter gostado da forma como eu falara com o seu “mais que tudo”.
– Mas estás enganado, Pimentel – lançou o Duarte, sorrindo levemente. –
Já nos vimos no pinhal, não foi? Então, olá outra vez, Nuno.
Nem sei como descrever. Adorei tudo! Adorei o sorriso, a voz, a forma como disse o meu nome…
–Sim, foi – balbuciei, enquanto lhe apertava a mão… e apertouma com bastante força, este sim era homem.
Fogo, Nuno!… Controlate!
Mas não havia nada a fazer, não conseguia controlarme. O tipo tinha um
sorriso espantoso… era lindo, lindo… os seus olhos negros brilhavam, cravados em mim, e eu comecei a ficar cheio de calor. Estremeci com o
seu toque e o seu olhar faiscou de satisfação.
–Tenho muito gosto, Nuno – a sua voz era doce…
–Também eu! – respondi com a maior das sinceridades.
Claro que ele percebeu logo que me tinha deixado a cabeça a andar à
roda, claro que ele estava habituado a provocar esse efeito, devia ser normal para ele, devia ter o mundo aos seus pés. Eu engoli em seco, sentia o coração entalado na garganta, e ele a sorrir, parecendo achar piada à minha reação, à minha… basbaquice.
Mas que grande merda!
Contínua...