Cap. 36,1:

Conto de Salém como (Seguir)

Parte da série Uma História de Amor

- O quê ele tem?

- Eu não sei... Ele não responde quando eu chamo...

- Deixa-me ver... Nossa... Ele parece estar morto...

- Cala essa boca, você não sabe o que está falando...

- Desculpa... Eu vou chamar socorro...

Enquanto o visinho foi chamar uma ambulância para me socorrer o Daniel segurava

minha mão sentado na beirada da cama, chorando descontroladamente, ele não sabia, mas eu havia acabado de entrar em coma. Não demorou muito a ambulância chegou, os médicos entraram no quarto e viram o Daniel abraçado comigo, chorando bastante, educadamente os médicos pediram para ele se afastar que iriam me levar para o hospital, inconformado com meu estado ele causou emoção a todos que estavam no quarto:

- É necessário que o senhor o solte para podermos levá-lo...

- O quê ele tem, doutor?

- Aparentemente ele está em coma, precisa ser removido logo...

- Mas como? Ele vai passear comigo, doutor... Nosso café já está prontinho na

mesa...

- Ele necessita urgente de cuidados especiais, precisa ser removido imediatamente.

- Bader... Fala pra eles que nós vamos passar o dia juntos hoje... Fala... Bader... Pelo

amor de Deus fala comigo...

Fui colocado em uma padiola e levado para a Santa Casa, no caminho o Daniel foi

segurando minha mão sentado do meu lado esquerdo na ambulância, enquanto isso um

médico fazia o procedimento necessário até chegar ao hospital. A pneumonia costuma

atingir os pulmões, também podendo afetar os nódulos linfáticos, o baço, o fígado e a

medula. Geralmente ocorre nos casos de contagem de CD4 inferior a 200, no meu caso a situação já havia se agravado e evoluído para algo pior.

Chegando ao hospital me colocaram em uma outra maca, eu conseguia ouvir tudo o

que eles diziam, os gritos dos médicos, o choro do Daniel, a sirene da ambulância. Doía

meu coração aquela situação, eu queria gritar e não podia, eu queria dizer que amava o

Daniel e não conseguia, nada adiantava, só o que eu poderia fazer era deixar que o meu

destino fosse cumprido. Deitado naquela maca fria eu vi minha vida se desfazendo como uma torre de baralhos ao vento, sendo levado por um longo corredor que parecia não ter mais fim. O Daniel foi segurando minha mão e me acompanhando o tempo todo até ser interrompido por um dos médicos, pois a área que eu seria levado era restrita:

- Petit... Você vai ficar bom... Amanhã a gente vai estar rindo disso tudo, você vai

ver...

- A partir de agora o senhor não pode entrar.

- Como não?

- Ele vai ser levado para o C.T.I, não é permitido a entrada de acompanhantes...

A maca passou pela área restrita, pelo vidro da porta o Daniel me olhava, chorando,

vendo eu sendo afastando de si cada vez mais, por fora eu continuava imóvel, mas por

dentro eu gritava e me debatia.

Não sei bem explicar como eu me sentia, mas era como se eu estivesse oco por

dentro, eu não sentia dor, não conseguia me mover, só ouvia vozes. Fui colocado dentro de uma sala fria, com um vidro na parede do lado esquerdo, por dentro tinha uma cortina que os médicos só abriam para a família ver.

Naquele mesmo dia o Daniel avisou minha família em Campinas que na mesma

hora vieram pra São Paulo, ao chegar no hospital minha mãe já não estava bem, sua pressão havia baixado e ela quase desmaiou, ao encontrar com o Daniel no corredor a emoção tomou conta dos dois que se abraçaram e juntos choravam:

- Daniel?...

- Dona Vivian...

- Cadê meu filho?...

- Levaram ele pra uma sala e não me deixaram entrar.

- O quê aconteceu com ele, Daniel?

- Hoje pela manhã eu fui jogar futebol com uns camaradas da academia e antes de

sair dei um beijo nele... Humpft... Eu até perguntei se ele queria que eu ficasse, mas ele

disse pra eu ir e me divertir com meus amigos...

- Eu falei com ele hoje pela manhã e ele me tratou tão diferente... Parecia se

despedir de mim...

- Quando eu cheguei em casa e fui acorda-lo para tomar café... Ele já não

respondia...

- Aonde ele está agora?

- Levaram ele pro C.T.I... Tiraram ele de mim, dona Vivian... Levaram meu petit...

- Calma filho...

- Ele está em coma...

Enquanto minha mãe e a Millena ficavam juntas com o Daniel, meu pai e meu

irmão Rodrigo foram buscar informações sobre onde e como eu estava:

- Por favor, eu quero saber onde está internado o paciente Bader Pires.

- O senhor é o que dele?

- Sou pai.

- Um momento que vou verificar.

- Obrigado.

Fiquei em um local de isolamento por causa da minha doença. No quarto só havia

eu e uma enfermeira que ficava me vigiando o tempo todo, somente depois de dois dias

internado foi liberada a visita.

- Acompanhante de Bader Pires?

Todos que estavam na sala de espera se levantaram, o Daniel tomou a frente e o

médico informou:

- Aqui...

- O que o senhor é dele?

- Sou o noivo do Bader.

- Eu sou a mãe dele.

- O paciente Bader Pires se encontra em um quadro estável, sua situação é grave...

- Por favor, doutor, ajude meu filho...

- Se acalme, senhora... A visita pode ser liberada para apenas uma pessoa subir por

dez minutos...

- Vá a senhora, dona Vivian...

- Você não se incomoda, Daniel?

- Claro que não, a senhora é a mãe...

- Obrigado.

- Dona Vivian... Diga a ele que eu o amo.

- Pode deixar.

Enquanto todos ficaram na sala de espera minha mãe acompanhou o médico até a

unidade onde eu estava, minha mãe não pode entrar na sala, teve que se contentar em me ver através de um vidro como um bebê de berçário, com a testa apoiada no vidro

juntamente com as mãos, ela chorava relembrando nossos momentos juntos e rezava por

mim:

- Meu filho... Meu menino... O que fizeram com você?

"Mamãe... Cadê meu tênis azul escuro?"

"Bader, não corre assim que você vai cair, meu filho..."

"Papai eu te amo!"

"Que cara é essa, filho?

Passei no vestibular"

"Alô... Mãe?

Oi filho...

Mãe... O Bruno me deixou..."

- Deus... Eu entrego meu filho em suas mãos... Não o abandone agora, por favor.

Deitado naquela cama eu conseguia ler seus pensamentos, tamanha era a força

deles. Junto com ela eu também chorava, mas chorava por dentro. Minha alma chorava,

pois meu corpo permanecia estável.

O tempo se passou rapidamente, logo minha mãe teve que voltar e a cortina foi

fechada, emocionada ela chegou na recepção onde todos esperavam ansiosamente por uma notícia minha:

- E aí, mãe?

- Ele está tão pálido... Cheio de aparelhos... Parece que está dormindo, rostinho

sereno...

Abraçada à Millena, minha mãe tentava tomar um copo d'água que meu pai

segurava nas mãos. O Daniel se abaixou no chão e encostou-se à parede, fechou seus olhos e passou a relembrar os momentos em que vivemos juntos.

- Daniel... Você não quer ir até em casa descansar um pouco?

- Não, Rodrigo. Enquanto meu petit não sair daqui eu também não saio...

- Mas faz dois dias que você está sem dormir, sem comer...

- Eu sei Millena, mas não importa. Vou ficar aqui com meu noivo até ele melhorar.

- A dona Vivian está precisando descansar um pouco, Rodrigo.

- Levem ela lá pra casa, toma a chave...

- Eu vou trazer então umas roupas para você.

- Obrigado, Millena... Cuide da Dani também que deve estar com fome e saudade

do meu petit...

- Pode deixar.

Não é fácil pra ninguém ver uma pessoa que você ama naquelas situações em que eu

me encontrava, enquanto eles sofriam, eu também sofria junto.

Todo esse tempo eu sonhava que estava dentro de um corredor muito escuro, no

final havia uma luz muito forte cujo estava me sugando, como se eu estivesse sobre uma

esteira, mas ao mesmo tempo em que eu ia me aproximando da luz eu era impedido por

uma força maior que me puxava de volta.

Comentários

Há 2 comentários.

Por ®red® em 2016-09-14 06:11:15
Do quadro clinico acertei!! viva as aulas deram certo. Mas quanto a teu conto, ta muito bom. Não fico mais sem ler. Quero urgente o próximo.
Por joão em 2016-09-13 20:39:32
Esperando o próximo capítulo ansioso