Cap. 32:

Conto de Salém como (Seguir)

Parte da série Uma História de Amor

- Não diga uma coisa dessa...

- O senhor pode passar aqui na delegacia para pegar alguns pertences que estavam

no carro?

- Sim, claro.

- O carro foi para perícia, vamos aguardar para ver se deixaram alguma pista que

possa nos levar a um esclarecimento do caso...

Não era possível que alguém poderia sumir assim sem deixar nenhuma pista, como

se fosse tragado pela terra. Eu sabia que aquele sumiço repentino não partiria do Daniel,

meu coração me dizia que alguma coisa estava errada, e naquela hora eu tive a certeza.

Corri até o quarto, vesti uma roupa e fui até a delegacia. Chegando lá o delegado

estava atendendo um caso de violência doméstica. Sentei no banco de concreto no canto ao lado do balcão e fiquei aguardando ele registrar o caso junto com o escrivão.

- Desculpe por fazê-lo esperar, seu Bader...

- Vim buscar as coisas do Daniel.

- Vou pedir para trazerem pra você.

- Obrigado.

É incrível a diferença de tratamento que eu tive quando fui na delegacia registrar a

agressão sofrida junto com o Daniel e na hora em que registrei o seu desaparecimento. Por isso que eu dizia sempre, que você só é gente nesse mundo se você tem dinheiro, caso contrário, você é apenas mais um número nas estatísticas da violência urbana. Claro que a minha aparência de quando fui procurar o Daniel demonstrava que eu era uma pessoa bem posicionada financeiramente, diferente daquela vez que fui registrar queixa sobre agressão, no qual fomos de bermuda e regata.

Peguei os pertences do Daniel, tais como a carteira, CDs, celular, um casaco ainda

com seu perfume e a chave do carro. Dentro de sua carteira havia R$200,00 intactos, sinal de que os ladrões não queriam seu dinheiro.

Era estranho alguém querer seqüestrar somente a pessoa e não ligar para pedir um

resgate. Tudo bem que R$200,00 não é muita coisa, mas também não é um valor que se

passa despercebido nos mundos de hoje.

Acabei nem indo trabalhar. Voltei para casa triste, chorando muito. Estacionei o

carro na garagem e fiquei ali por um tempo com a cabeça sobre o volante, pensando, até

criar coragem e entrar em casa. Abri a porta, joguei a chave sobre a mesa e segui em

direção ao quarto quando o telefone tocou. Sem vontade nenhuma de manter contato com o mundo eu comecei a entrar em depressão outra vez, mesmo assim fui atender ao telefone.

- Alô?

- Alô, Bader?

- Sim.

- É o Bruno...

Pronto. Como se já não bastasse o seqüestro do meu namorado, ainda tinha o Bruno

que não parava de me perseguir. Será que ele não se tocava que eu não queria mais nada?

- O que você quer, Bruno?

- Preciso te ver... Falar com você...

- Não tenho mais nada pra falar com você, se possível não me procure mais, por

favor.

- Mas eu tenho, você não vai se arrepender...

- Tudo que eu quero é ver você feliz e vivendo bem, mas longe de mim.

- Então vamos nos ver pela última vez, está bem?

- Depois você promete me deixar em paz?

- Ok.

- Me encontre no café da Haddock Lobo...

- Humpft...

Pedi para ele me encontrar em um café na Rua Haddock Lobo, onde sempre

costumávamos ir quando morávamos juntos. Era só o que faltava agora, um ex-namorado que um dia me abandonou sem nenhuma consideração comigo, agora ficar no meu pé seguindo meus passos, dando uma de cachorro arrependido.

À noite fui encontrá-lo, sem a mínima vontade de olhar para sua cara de pau, sua

voz já me causava nojo e seu perfume ânsia de vômito.

O Bruno nunca foi pontual, sempre atrasou em nossos encontros e me deixava

irritado, um pouco relaxado, mas naquele dia eu fiquei surpreso, pois no horário certo ele estava lá me esperando, pontual. Quando cheguei, ele já estava sentado na mesa tomando uma cerveja, todo perfumado, limpinho, igual quando o conheci, exceto aquele cabelo lambido que ele estava usando que pra mim não combinou nada com ele.

Na época em que eu conheci o Bruno, eu morava há pouco tempo na cidade, não

conhecia quase nada. Certa vez estava voltando da faculdade e no ponto de ônibus o vi pela primeira vez. Notei que ele me dava umas olhadas suspeitas, mas nem liguei muito.

Acabamos pegando o mesmo ônibus e os olhares vindos dele continuavam, um pouco

deslocalizado acabei me perdendo e descendo no ponto errado.

Fiquei procurando a faculdade pelas ruas movimentadas dos Jardins, pois era meu

primeiro dia e eu não conhecia São Paulo até então. Quando eu ia atravessar a rua, levei um susto, dei de frente com aquele garoto que me paquerava dentro do ônibus. Ele havia descido no ponto seguinte para me procurar e entregar um bilhete com seu nome e telefone.

Na hora fiquei sem reação quando fui bordado por ele na esquina da República do Líbano, tentando me entregar o bilhete. Ele se ofereceu para me acompanhar até a

faculdade, pois ele sabia onde ficava e dois meses depois já estávamos namorando.

- Boa noite...

- Boa... Viu como hoje fui pontual?

- Pois é.

- Quer beber alguma coisa?

- Quero uma água tônica.

- Você está tão bonito...

- Obrigado.

- Não precisa agradecer, você sabe que é lindo.

- Bruno, não foi para elogiar minha beleza que você quis me encontrar, certo?

- Isso é verdade.

- Vamos direto ao assunto?

- Eu quero...

- Você quer o quê?

- Te pedir perdão e voltar a viver com você como antes.

- Mas que cara de pau a sua, foi você mesmo que me abandonou deixando aquele

bilhete sobre a mesa, dizendo que não queria mais nada, lembra-se?

- Eu já estou arrependido, te pedi perdão e te quero outra vez.

- Bruno, um dia eu pensei que estava amando você, mas quando você me deixou eu

vi que não era amor.

- Me dê mais uma chance, Bader?

- Não Bruno, eu já estou em outro relacionamento.

- Com o Daniel...

- É.

- Você gosta muito dele?

- Eu amo ele.

- E por que não está com ele agora?

- Porque ele sumiu, foi seqüestrado.

- Ah que pena...

- Pare com essas ironias.

- O que é isso, amor? Não pense mal de mim, por favor... Eu posso te ajudar a trazer

o Daniel de volta.

- Não me venha com suas lorotas.

- Eu sei como encontrá-lo...

- Humpft... Como?

- Eu tenho uns amigos da pesada ae...

- Imagino que você tenha se juntado com um pessoal não muito correto...

- Pois é, eu posso te ajudar com a ajuda deles.

- Como?

- Eu sei onde o Daniel está.

- Como você sabe? Foram seus amigos que seqüestraram ele?

- Eu sei tudo sobre vocês, Bader. Claro que pra te ajudar eu vou querer algo em

troca...

- O que você quer? Dinheiro? Um carro? Uma moto?

- Eu quero você, apenas.

- O que você sabe sobre minha vida?

- Faz algum tempo já que eu venho observando a rotina de vocês...

Quase voei no pescoço dele quando o maldito confessou que seqüestrou o meu

amor, será que eu nunca teria um momento de paz em minha vida? Quando tudo estava

indo bem no meu relacionamento sempre aparecia alguém para atrapalhar.

- Então foi você que entrou no meu apartamento e revirou minhas coisas...

- Uhum.

- Por que você fez isso? Eu vou na policia agora...

Ele segurou minha mão e disse bravo olhando nos meus olhos:

- Se eu fosse você não faria isso, esqueceu que ele está comigo?

- Não o machuque, por favor.

- Só vai depender de você, meu amor...

- O que você quer de mim? Uma viagem? Um carro? Uma moto? Diga logo, peça o

que você quiser que eu te dou, mas não faça mal ao meu Daniel.

- Eu já disse que quero você... Já disse que sua felicidade é comigo, gato... Se você

voltar pra mim eu mando soltá-lo.

- Por que você está fazendo isso?

- Desculpa amor, na verdade nem não era pra seqüestrar ele, e sim você.

- O quê?

- É verdade, eu ia seqüestrar você e te levar pra morar comigo em um paraíso que

minha mãe montou, uma pousada em Porto Seguro... Mas um dos comparsas acabou

confundindo vocês e seqüestrou o cara errado, quando eu vi a cagada que ele havia feito já era tarde, não poderia soltá-lo porque corríamos o risco de ser cagüetados, a única

alternativa foi essa, mano...

- Não me chame de "mano"... Eu não acredito que você foi capaz de tanto...

- Eu digo e repito, se você voltar pra mim eu solto ele. Vamos viver juntinhos pra

sempre, só eu e você?

- Isso não.

- Calma amor, não precisa responder agora. Você tem até o fim da semana para me

dar a resposta. Pense com carinho, tá?

Deixei aquele lugar correndo, indignado com tamanha audácia do Bruno, como ele

foi capaz de chegar a esse ponto, eu reparei que ele estava mesmo um pouco descontrolado, mas nunca imaginaria que ele teria o atrevimento de seqüestrar a mim ou ao Daniel. Fui chorando o caminho inteiro, parei o carro na porta da delegacia, mas na hora fiquei com medo de denunciar e algo de ruim acontecesse com meu Daniel, o Bruno estava muito esquisito, eu não fazia idéia do que ele seria capaz de fazer com o amor da minha vida.

Aquelas alturas, a mãe do Daniel já estava sabendo do seqüestro, pois de dentro do carro mesmo eu liguei pra ela e contei o que havia acontecido. Claro que eu seria capaz de dar tudo o que já tinha conquistado financeiramente para ver o Daniel livre outra vez, deitado na minha cama sorrindo só de bermuda sem camisa e me chamando de petit, mas o preço que o Bruno estava pedindo era alto demais.

Eu me lembro que um pouco antes do Bruno sumir, ele começou a se misturar com

umas pessoas suspeitas, usando drogas, foi andando no meio "das bocas" que ele contraiu aquelas doenças e acabou passando pra mim. Ele não necessitaria entrar nessa vida, sempre teve de tudo, veio de família de classe média alta, tradicional, falava inglês fluente, cursou até o 2º ano de Administração e largou tudo depois que se juntou com esses "amigos". Não sei o que se passava pela cabeça dessas pessoas que tem de tudo na vida e opta pelo caminho errado.

Cheguei em casa triste, chorando, fechei a porta da sala e logo o telefone tocou.

- Alô?

- Oi meu amor...

- O que você quer, Bruno?

- Você sabe muito bem o que eu quero.

- Por favor, solte o Daniel...

- É como eu disse, só depende de você.

- Deixa eu falar com ele, por favor?

- Eu não resisto a um pedido seu, Bader.

- Petit...

Quando eu ouvi sua voz comecei a chorar, senti meu corpo flutuar no espaço, meu

coração acelerou como o motor de um carro importado, eu sentia em sua voz certo medo,

ele estava em pânico, e não demorou muito eu entrei também.

- Daniel... Você está bem?

- Pelo amor de Deus petit... Me ajude... Por favor...

- Eu vou tirar você daí amor...

- Chega dessa ladainha. E então amor, já decidiu?

- Por que você está fazendo isso comigo?

- Porque eu te amo, Bader.

Comecei a ouvir gritos de fundo:

- O que é isso? Por que o Daniel está gritando desse jeito?

- Seu namorado é um pouco teimoso, só dando uma pequena lição para ele aprender

quem é que manda aqui.

- Por favor, Bruno, não o machuque...

- Gato, eu já disse, só depende de você...

- Fala logo o que eu preciso para você soltá-lo?

- Muito simples, eu liberto o seu amor e você fica no lugar dele, mas é claro que

você terá tratamento 5 estrelas.

Eu não agüentei quando ouvi os gritos do Daniel ao fundo, não era justo que ele

ficasse pagando por algo que não tinha nada haver com ele, eu o amava mais que tudo e a ultima coisa que eu queria na vida era vê-lo sofrer, mesmo que para isso eu tivesse que ficar em seu lugar.

- Está bem, como faremos?

- Muito simples, eu solto ele e você foge comigo...

- Como vou ter a certeza que você o soltou mesmo?

- Eu liberto ele na sua frente, se for da sua preferência.

- Ok. Quando? Onde? Que horas?

Combinamos tudo pelo telefone, mas eu não ficaria em paz enquanto o Daniel

estivesse em cativeiro. Marcamos a libertação dele para o dia seguinte, tive que manter a policia longe do caso por exigência dele, com certeza havia mais pessoas por trás disso, jamais o Bruno conseguiria fazer tudo sozinho, com certeza era por influência deles que o Bruno seqüestrou o Daniel, uma idéia dessas não sairia daquela cabeça oca.

No outro dia liguei para a mãe do Daniel e contei tudo sobre sua libertação, pedi

para que ela ficasse despreocupada que naquele dia mesmo ela teria seu filho de volta.

Depois de falar com ela, fui até o quarto e me despedi da Dani, peguei a chave do carro e segui para o local combinado.

Estacionei o carro na rua de trás, o lugar era um terreno baldio com uma construção

abandonada, à medida que eu ia caminhando rebatia um eco nos cômodos mal acabados da obra, aquele piso de terra vermelha misturado ao entulho e lixo me faziam espirrar, comecei a sentir tontura por falta de alimentação, fazia dias que eu não me alimentava direito, os remédios então... Fiquei esperando ansiosamente por eles que demoravam a chegar, o lugar estava um pouco escuro, motivo pelo qual me deixava com mais medo.

Encostei em uma pilastra aguardando um sinal deles, o tempo estava se fechando,

senti umas gostas d’água começarem a cair, quando me esquivei para baixo de uma

marquise escutei um assovio, era o Bruno e junto com ele estava o Daniel sob a mira de

uma arma, comecei a chorar quando o vi abatido daquele jeito, um pouco mais magro,

barba por fazer...

- Petit...

- Amor, o que fizeram com você?... Como o combinado, estou aqui.

- Muito bem, gato. Sempre pontual...

- Agora cumpra com sua palavra e solte ele.

-Tudo bem.

Ele jogou o Daniel no chão fazendo com que ele caísse e batesse a cabeça,

ocasionando um desmaio, da forma que ele caiu parecia estar um pouco fraco, deveria ter ficado todo esse tempo sem comer:

- Não... Daniel?...

- Não repita mais o nome desse cara. Agora você é meu.

- Por que você fez isso com ele?...

Eu chorava muito naquela hora, chorava por tudo, pelo amor que eu estava

perdendo, pela minha vida que se tornaria uma desgraça, pelo sofrimento do Daniel...

Seguia em direção ao Bruno quando dois carros fecharam o cerco, era a policia, mas como ela havia ficado sabendo? Eu fiz como o Bruno havia pedido, não comuniquei a ninguém, exceto a mãe do Daniel... Só poderia ser ela que havia acionado a policia, quando tudo parecia estar correndo bem algo acontece para atrapalhar. Aos gritos o Bruno dizia:

- Eu não te falei que não queria policia envolvida?

- Mas eu não chamei policia nenhuma...

- Você me traiu... Você me traiu... Eu vou matar o infeliz que roubou meu amor de

você.

- Não faz isso.

Comentários

Há 1 comentários.

Por em 2016-08-13 01:21:44
DESCULPA MAIS VAI SER SACANAGEM VC DEMORA A POSTA O PROXIMO CAPITULO, POSTA LOGO PELO AMOR DE DEUS 😐😐😞