Capítulo I - TUDO NOVO DE NOVO!
Parte da série Unconditionally
A luz que penetrava pela janela ainda sem cortinas do meu novo quarto, em minha nova casa, era quase como uma faca em meus olhos, esfrego-os instintivamente, e procuro ver no celular que horas eram, e infelizmente estava na hora de acordar, 06h, afinal São Paulo é uma cidade grande, eu tinha um ônibus para pegar, e uma nova escola para encarar.
- Já sabe, nada de falar com estranhos no ônibus, andar sempre com o celular ligado, jamais andar com fones nos ouvidos, me avisar quando houver qualquer imprevisto...
- Mãe, já entendi! - interrompi minha mãe que me alertava dos perigos de São Paulo repetidamente.
- Desculpe se estou sendo repetitiva meu filho, mas é uma cidade nova e muito grande, somos só nos dois, eu só quero te proteger. - disse minha mãe enquanto colocava o leite no meu cereal.
Sorri para ela e permaneci em silêncio, eu sabia que ela só queria me proteger. Assim que me serviu saiu apressada, sem ao menos perceber que ainda estava usando o avental.
- Mãe você vai trabalhar em um restaurante? - disse num tom de deboche.
- De onde tirou isso? Sabe que fui contratato para trabalhar na ARCHTECTON! - disse ela colocando uma porção de coisas na bolsa.
- O avental! - falei apontando para sua cintura, com cara de “é óbvio que eu sei!”
- Ah, claro, estou um pouco, ou melhor, bastante nervosa. - ela gargalhou - Beijos filho, boa aula, e quando chegar quero saber de tudo! - despediu-se.
- Beijo, bom trabalho!
Estava feliz por minha mãe, este escritório de arquitetura sempre foi o sonho de emprego dela, nossa vida ia melhorar depois disso, mas confesso que preferia ter ficado em Floripa, lá pelo menos eu já tinha minha rotina, estava habituado à monotonia.
Assim que fechei o portão de entrada da nossa nova casa, com um pouco de esforço, já que era a primeira vez que fazia aquilo, percebi que aquele era um simpático subúrbio, parecia tranquilo, a parada do ônibus ficava do outro lado da rua.
Sentado no ônibus, eu podia observar um pouco de São Paulo, já havia visitado a escola com minha mãe, a TOLEDO & ALBUQUERQUE, era uma das melhores escolas particulares de São Paulo, e lá eu tinha direito a uma bolsa de 50%, graças ao novo emprego de minha mãe.
Assim que cheguei, após caminhar duas quadras, desde onde o ônibus havia me deixado, pude perceber a grande movimentação, de carros de luxo, e os alunos indo em direção ao portão da escola, pensei comigo mesmo: “É Vinicius, tá na hora!”.
Quando adentrei o portão principal, percebi que era como se eu fosse invisível, até ai tudo bem, isso sempre foi normal para mim, até que tenho a sensação de estar sendo observado, e eu realmente estava, um cara com uma touca preta, me observava ao longe, sorri, mas ele rapidamente voltou a mexer em seu iPhone, que pelo visto era o smartphone padrão da escola, todos tinham, menos eu claro.
Após ser ignorado fui procurar as listas, quando de repente uma menina apressada tropeça em mim, derrubando todos os livros que carregava, e não era pouca coisa.
- Ai me desculpa, é que eu to procurando meu armário pra guardar os livros que vão ser utilizados no semestre...
- Fica calma eu te ajudo. - a interrompi e levantei para ajudá-la com os livros.
- Obrigada, não precisava se preocupar...estranho? - ela disse, ou perguntou, não sei ao certo, franzindo a sobrancelha.
- Vinicius Rodrigues! Prazer! - cumprimentei-a sorrindo.
- Prazer Vinicius, sou a Julia! Você é novo por aqui não é mesmo? - ela voltou a juntar os livros do chão.
- Sou sim, vim de Florianópolis! Ahm, mas mudando de assunto você poderia me ajudar a achar o 1º ano C2? - perguntei acomodando parte dos livros dela embaixo do braço.
- Não acredito, é minha sala, vamos ser colegas! Te levo até lá, mas peraí cadê seus livros do semestre?
- Era a segunda pergunta, eu não trouxe não sabia que tinha onde guardar! - falei surpreso.
- Claro que tem, você não recebeu um cartão?
- Sim, esse? - disse entregando-o a ela.
- Exatamente, aqui atrás tem todas as informações! Armário 711D. - ela sorriu e devolveu-me o cartão.
Confesso que fiquei um pouco constrangido, estava tudo ali mesmo.
Até chegarmos, no meu até então desconhecido armário, ela me falou muito sobre a escola, sobre os alunos, professores, eu já estava me inteirando, e afinal se pudesse escolher alguém para sentar ao lado com certeza seria Julia.
Quando paramos em frente ao meu armário, retirei as chaves que ainda estavam nele, e o tranquei, para minha surpresa, o mesmo cara que estava me observando no saguão de entrada, vinha naquela direção, até chegar ao armário ao lado do meu. A Julia parou de falar, quando percebeu que ele se aproximava. Assim que ele olhou diretamente para mim, abaixei a cabeça, ele parece ter sorrido com o canto da boca, mas não sei ao certo, aquele olhar foi o suficiente para que pudesse analisa-lo, ele usava um alargador com uma folha de maconha estampada, a touca que eu já havia observado, calças jeans que pareciam estar caindo , e deixavam a mostra a famosa Calvin Klein branca, devo ter ficado vermelho, pois senti algo que nunca sentira antes, logo ele foi embora e Julia continuou a falar.
- Toma cuidado com ele! - ela parecia séria.
- Quem? - me fiz de desentendido.
- Esse garoto, que estava no armário ao lado, o nome dele é Cesar Cavallieri, ninguém sabe muito sobre ele, deve ter dinheiro para estar aqui, mas dizem que ele já esteve internado em várias clínicas psiquiátricas, ele anda sempre sozinho, e as únicas vezes que fala com alguém é pra comprar fumo. - ela falou baixinho.
- Fumo? - perguntei sem entender.
- Ah Vinicius, cê sabe! Fumo, Maconha, Canabis, Marijuana....Aqui a maioria fuma, e acredite isso não é o pior, se você ver um pó branco por ai, não é talco pode ter certeza!
- Okay, Okay, já entendi! - afirmei gesticulando com as mãos.
- Vamos que a aula já deve estar começando! - ela me puxou pelo braço corredor afora.
Assim que chegamos a sala, pude observar rapidamente que Cesar, estava sentado ao fundo, sozinho mexendo no seu celular, na frente sentavam algumas meninas, que pareciam ter transformado a camiseta, que era uniforme da escola, em um tipo de top, com shorts muito curtos, perto da janela, sentavam três caras, que gargalhavam sem parar, e demais era tudo como nas outras escolas, eu e Julia sentamos juntos na frente.
- Ai Julinha to esperando aquela chance que você me prometeu! - gritou um cara loiro com os olhos azuis, da turma lá do fundo.
- Aguenta mais um pouquinho Rafa, os porcos estão quase criando asas! - Julia falou sem olhar pra ele.
- Só pode ser sapata! - cochichou uma das garotas seminuas para outra.
- São uns idiotas, aqueles lá do fundo são o Rafael, que você acabou de ouvir cagar pela boca, na frente dele, com cara de emburrado é o Rodrigo, e ao lado dele é o Lucas. - ela rolava o lápis em cima da mesa enquanto falava. - As duas vadias são a Grazi e a Renata.
Eu permaneci em silêncio, mas confesso que já tinha notado o Rodrigo, ele era moreno, tinha os olhos verdes, e era, digamos bastante sarado para a idade dele, imagino que tivesse uns 18, 19 anos. Ele era mais fechado que os outros dois.
A professora Lucia, de Geografia, entrou na sala, e a bagunça acabou, todos ficaram em silêncio, ela era uma senhora de meia idade, cabelos grisalhos, e parecia muitíssimo séria. Não consegui prestar atenção na metade das coisas que ela falou, eu ainda estava intrigado com César, ninguém vai pro sanatório, por fumar umas.
- Então menino, você é surdo? Vou pedir novamente, levante-se e apresente-se para os seus colegas!
- O-O-O QUE? - gaguejei após uma cutucada da Julia.
- Seu nome ga-ga-gaguinho! gritou Rafa do fundo da sala fazendo a turma inteira gargalhar.
- Rafael calado! - não quer ir para diretoria no primeiro dia de aula não é mesmo? - ela parecia irritada.
- Meu nome é Vinicius Rodrigues, tenho 16 anos, vim de Florianópolis, para estudar aqui! E é isso! - foi só o que consegui falar, já que no mesmo instante percebi que Cesar sorria no fundo da sala, olhando para mim, e estranhamente seu sorriso mexia comigo.
- Seja bem vindo Vinicius! Apresentações feitas, vamos a aula! - a professora virou-se para o quadro.
As horas não passavam foi quando resolvi pedir para ir ao banheiro, isso sempre funcionava.
- Professora, posso ir ao banheiro? - perguntei sem jeito.
- Não demore! - balbuciou a professora.
Me dirigi rapidamente ao banheiro, não havia nenhum aluno nos corredores, e nem mesmo no banheiro. Assim que entrei no banheiro fui até a bancada da pia, olhei no espelho, abaixei o rosto, e joguei um pouco de água, quando voltei a olhar no espelho quase morro de susto, César estava atrás de mim com um sorriso no rosto.