Comum & Extraordinário - Capítulo 37

Parte da série Comum & Extraordinário

Ele parecia completamente irritado comigo, e eu não sabia a razão, já que ele não tinha direito algum de se sentir daquela forma, até porque, ele havia escondido muita coisa de mim, não ao contrário.

Depois de me encarar com raiva no olhar por alguns segundos, fazendo minha adrenalina subir, ele entra, praticamente passando em cima de mim, e foi então que eu percebi que não tinha como ele saber que eu estava aqui.

- Matheus! - Eu grito depois de perceber que foi o Matheus quem ligou para ele.

- Desculpa! - Ele grita lá de cima.

Resolvo voltar a minha atenção a quem havia acabado de entrar naquela casa e então fecho a porta atrás de mim. Ele estava parado de costas para mim, de braços cruzados, e eu percebia que todos os músculos de seu corpo estavam rijos, tensos. Era como se ele pesasse duzentos quilos naquele momento. Era visível que ele estava tão fixo naquele ponto específico da sala, que nem um guindaste o tiraria dali, mas ele então finalmente se vira para mim, olhando bem dentro dos meus olhos.

- Você não deveria ter saído daquela forma! - Ele grita comigo sem se mover.

- Não? Você queria que eu fizesse o que Rodrigo? Eu fiz o que qualquer um faria!

- Você fez o papel de um adolescente dramático!

- Eu sou um adolescente!

- Você deveria ter ficado!

- Ficado? Você acha que eu sou quem? Eu ainda tenho dignidade!

- Para de palhaçada Jonathan! A gente precisa conversar! - Ele dá um passo em minha direção.

- Porra nenhuma! Vai embora!

- Eu já disse que não vou a lugar nenhum sem antes falar com você!

- Não vai? Então eu vou!

Eu me viro e começo a caminhar em direção a porta, mas o Rodrigo é mais rápido que eu. Sinto sua mão segurar meus pulsos, me girar em direção e ele e me jogar na parede, e em seguida ele vira a chave na porta e a coloca dentro do bolso.

- Me deixa ir embora!

- Não! Eu já falei que vou me explicar!

- Eu não quero ouvir nada! Eu quero você longe de mim! - Eu grito ainda mais.

- Eu nunca vou ficar longe de você!

- Vai embora Rodrigo, pelo amor de Deus!

- Eu já disse que não porra! Você é surdo?

- E me parece que sou um palhaço, um trouxa e um bobo da corte, pelo menos em seu ponto de vista!

- Eu nunca achei que você fosse nada disso!

- Então porque não me falou que eu era seu amante e que você tem um filho?

- Você não é meu amante! É meu namorado!

- Então aquela mulher tirou toda essa história do meio das pernas? Você não é casado com ela? Aquele menino não é seu filho?

- Jonathan... - Ele parecia ter amansado um pouco.

- Viu? Que merda! Ela não mentiu!

- É complicado!

- Complicado? Você deveria ter me contato...

- Eu quis te contar, eu tentei te contar várias vezes, mas nunca consegui.

- Ótimo! É bom saber da sua falta de coragem.

- Cala a boca e deixa eu falar!

- Não! Não quero ouvir porra nenhuma Rodrigo! Vai embora!

- Não!

Eu me afasto da parede e tento empurrar ele, mas ele mal se move. Depois que tento outra vez, ele toma a iniciativa e me empurra mais uma vez contra a parede, dessa vez pressionando seu corpo contra o meu, me impossibilitando de me mexer.

- Não me toque! - Eu grito para ele, tentando me soltar. - Saí da minha frente Rodrigo!

- Cala a boca porra! - Ele grita e seu hálito quente invade todos os meus sentidos.

- Por favor!

- Não! - Rodrigo me pressiona ainda mais contra a parede e me beija com força, mas eu mordo os seus lábios de propósito. Ele se afasta, com um pouco de sangue na boca. - Porra! Olha o que você fez!

- Eu falei que não era para você tocar em mim!

- Seu puto! Você machucou minha boca!

- E eu posso fazer pior! - Eu grito, me debatendo sob seu corpo, mas era impossível me soltar.

- Pode? Eu quero ver você tentar. - Ele debocha de mim.

Rodrigo se afasta e eu finalmente sinto meu corpo livre. Ele sorria com sarcasmo, esperando alguma atitude minha. Vou em sua direção e o empurro, mas ele nem se move. O empurro outra vez, com mais força, e ele dá alguns passos para trás. Armo um soco e parto para cima dele, mas ele desvia e eu acabo caindo. Me levanto, quase chorando, e tento dar outro soco, mas acabo caindo novamente, dessa vez ficando no chão. Rodrigo vem até mim e me levanta como se eu fosse um pedaço de papel, e novamente me prensa contra a parede, dessa vez sem sorrir, apenas mantendo uma expressão seria e praticamente suplicando algo para mim.

- Por favor, não faz isso comigo, deixa eu explicar... - Ele estava triste agora.

- Explicar? - Eu já estava chorando novamente.

- Não chora Jonathan...

- Rodrigo, por favor, me deixa sozinho.

- Eu nunca vou te deixar sozinho. Por favor, me deixe explicar o que está acontecendo, eu te imploro.

- Rodrigo...

- Vamos fazer o seguinte. Você se senta e ouve tudo o que tenho a dizer, e depois decide se quer que eu vá embora ou que eu fique com você. Pode ser assim?

- Tudo bem...

Eu me sento no sofá, com a cabeça um pouco baixa e com lágrimas caindo em meus pés. Sinto Rodrigo se mover em círculos pela sala, apreensivo, com medo de que eu não fosse compreender sua historia, seja ela qual for. Quando ele finalmente para, eu me preparo para o que eu estava prestes a ouvir.

- O que eu vou lhe contar agora, eu nunca cogitei lhe falar, lhe explicar sobre essa situação, mas como veio a tona muita coisa, vou tocar no assunto... – Ele toma fôlego. - Desde muito novo eu sabia sobre minha sexualidade, eu sabia que era diferente dos outros meninos, e no começo eu não sabia o por que. Só vim a entender o que estava acontecendo mais tarde, quando eu tinha por volta dos doze ou treze anos, e assim que eu compreendi esse problema que me perseguia, eu fiz de tudo para me livrar dele. Eu não queria ser gay, eu nunca tinha desejo ser, mas eu era, e aquilo fazia com que eu sentisse nojo de mim mesmo. Não vou culpar meu pai, dizendo que eu cresci em uma família opressora e preconceituosa, porque não foi assim. Meus pais sempre tiveram a mente a aberta, o problema era eu.

- E o que tudo isso tem a ver com a história? - Eu falo, ainda de cabeça baixa.

- Jonathan... - Ele diz meu nome, clamando para que eu me calasse, e assim o fiz. - Eu fiz de tudo para mudar o que eu era. Passei a sair com meus amigos de escola, que não eram boa companhia. Comecei a transar com várias mulheres por semana. Caí na besteira de beber, e por fim, a usar drogas. Essa fase minha durou muito tempo, tempo de mais. Comecei a me perder, a dormir na rua e acordar sujo de merda... E daí para lá, eu fui só piorando. Comecei com a maconha, alegando para mim mesmo que seria recreativo, mas depois eu passei para a cocaína, o êxtase e todo outro tipo de droga ilícita que eu conhecia. Não só cheguei ao fundo do poço, como cavei um buraco e fui mais fundo ainda. - Ele para de falar por cerca de um minuto, e então olha para mim, mas não o encaro. - Eu conheci a Rafaela quando eu tinha vinte e quatro anos através de um amigo da faculdade. Eu sempre soube qual é a dela, que ela não prestava, mas mesmo assim eu saia com ela para tentar esquecer que o que na verdade eu queria era um homem, não uma mulher. A gente transava, usava, bebia, saíamos para as festas mais frequentadas da cidade, e sempre que voltávamos a gente transava de novo.

- Eu não preciso saber disso, por favor... - Eu não aguentava ouvir que ele tinha feito tudo aquilo com ela.

- E a gente nunca usava proteção, nunca usamos, porque eu pouco me importava se eu iria contrair uma doença ou não, eu não estava me importando com minha própria saúde, e ela também não, porque tudo o que importava para ela era o meu dinheiro, as coisas que eu pagava para ela e que ela adorava expor para a cidade inteira... Tudo piorou quando ela me disse que queria fazer a três, que queria ser fodida por dois homens ao mesmo tempo. No começo eu estranhei o pedido dela, mas eu fui sem pensar duas vezes, o que eu não deveria ter feito.

- Rodrigo...

- Eu preciso contar tudo Jonathan! Eu preciso! - Ele grita comigo, me fazendo tremer. - Ela queria, e eu fiz o que ela pediu. Ela chamou um cara que eu não conhecia, um que eu nunca havia visto pela cidade, e então fomos a um motel barato nos arredores, um que nem existe mais. Quando chegamos lá, ela se sentiu o centro das atenções, sendo desejada por dois caras, era o que ela pensava. Eu e esse cara começamos a revezar ela, mas ele não comia ela, apenas beijava, chupava e ela fazia o mesmo com ele... Depois de um tempo ali, quando eu estava fodendo ela, ele chegou por trás de mim, colocando a mão na minha bunda. Eu lembro de ter gritado com ele, chamado ele de louco, mas no fundo, eu tinha gostado. Eu olhei para ela e ela então disse que era para eu deixar, que não sairia do quarto, então eu deixei. No fim, eu acabei transado com os dois enquanto eles se beijavam, e quando dei por mim, depois de alguns minutos, eu acabei gozando dentro dela, e foi aí que eu percebi que eu estava chupando o cara. Aquilo acabou comigo. Saí de cima da cama como se eu tivesse acabado de ver algo grotesco e vomitei ali no chão do quarto mesmo, vomitei tudo o que eu tinha comido no dia. Eu lembro que o cara ria de mim, falando que eu tinha amado chupar o pau dele, e aquilo foi a gota d’água. Acabei socando ele, espancando, enquanto a Rafaela corria desesperada para fora do motel, gritando por socorro.

- Meu Deus...

- Acabei sendo preso naquele dia. Meu pai faltou pouco me matar, já que ele estava em um cargo importante do governo naquela época, e por ele ter contato com gente importante, fez tudo desaparecer. A Rafaela ameaçou a abrir a boca, mas meu pai tratou de calar ela com dinheiro, já o cara, nunca mais vi... Eu soube que ela estava grávida um mês depois do ocorrido, quando ela apareceu lá em casa com a notícia e exigindo dinheiro. Meu pai e minha mãe tentaram argumentar com ela, dizendo que ela poderia ficar hospedada lá em casa, e que depois que a criança nascesse, eles cuidariam dela, mas ela não quis, alegando que seria o ganha pão dela para o resto da vida. Eles tentaram a fazer mudar de ideia, mas foi em vão. Ela acabou nos ameaçando novamente, alegando que vazaria toda a história no jornal da cidade, mas que não o faria apenas se eu me casasse com ela no cartório, assim ela teria um nome importante e o direito de ter parte de tudo o que é nosso... Eu me casei com ela dois dias depois, em um cartório na cidade vizinha, sem ninguém ficar sabendo, e depois disso, ela falou que iria ir embora para os Estados Unidos com um cara que havia conhecido nesse meio tempo. Eu não quis deixar ela ir embora com meu filho, mas novamente ela disse que iria fazer o que bem entendesse com a vida dela, e que pouco se importava comigo e com meus pais. Ela acabou fugindo da cidade com esse tal cara um dia depois, e assim que chegou em outro país, ligou para avisar, como se nada tivesse acontecido. E depois disso, ela vinha mandando fotos do menino de vez em quando, para avisar que ele estava bem e que o dinheiro que eu mandava para ela não era o suficiente para bancar as coisas que ela tinha que comprar.

- Rodrigo... - Eu estava surpreso com toda aquela história. Nunca havia imaginado que seria tudo aquilo que ele me contou.

- E a fuga dela foi o limite para o meu pai. Lembro de quando ela saiu pela porta, depois de dar a notícia. Meu pai me pegou pela orelha, como se eu fosse uma criança, e me arrastou para o escritório dele. Ele praticamente me jogou na cadeira e se sentou na minha frente, bufando, e foi ali que ele jogou tudo na minha cara. Meu pai sempre foi um homem esperto, sempre soube o que acontecia dentro daquela casa, com todos. Sempre soube o que se passava na cabeça de todos, e comigo não foi diferente. Ele simplesmente despejou tudo em mim, falando que eu a culpa de tudo era minha. Que o fato de eu não ter me aceitado fez com que eu atingisse o fim do poço. Eu me assustei na hora, tentei desconversar, tentei me defender acusando ele, mas não adiantou. Ele falou que sempre soube que eu era gay, mas que preferiu não ver, e por isso deu no que deu. Lembro de ele ter chegado bem perto de mim, apontado o dedo bem no meio da minha cara e falando que se eu não mudasse dali em diante, que ele iria me internar a força em uma clínica. Disse também que o fato de eu ser gay não era o problema de tudo, e sim o fato de eu ter sido um infeliz inconsequente que não pensou nos próprios atos.

- Nossa... - Eu nem sabia o que dizer.

- A partir daquele dia eu parei de usar e de beber. Algo simplesmente se encaixou na minha cabeça sabe, e eu não vi mais motivos para fazer o que eu estava fazendo. Terminei o último semestre da minha faculdade, consegui um emprego em outro estado e fiquei fora por um tempo, e foi nesse tempo que eu realmente aprendi a me aceitar. - Olho para ele e vejo que seus olhos estavam brilhando. Aquilo cortou meu coração, e finalmente fez com que eu me levantasse do sofá.

- Porque você não me contou isso antes? - Eu chego bem perto dele. - Porque não me falou nada?

- Porque eu tive medo de você não me achar mais digno. Jonathan, você ainda é um garoto, com a mente de adulto, mas ainda é um adolescente. Você tem toda a sua juventude pela frente. Pode sair com o cara que quiser, namorar com o cara que quiser, e eu tenho quase trinta anos, sou velho de mais para você. No começo eu não queria que passasse de uma boa foda, mas acabei me envolvendo, mesmo sabendo que você deveria estar saindo com caras de sua idade, não com homens mais velhos, casados e com um filho para sustentar.

- Você sempre será o mesmo para mim...

- Mas eu não queria que você tivesse que ouvir tudo isso, que passasse a me ver como um fraco.

- Mas você não é fraco. Você passou por tudo isso com dificuldades, mas no fim, quando viu no que iria dar, resolveu tomar um rumo, sozinho, e eu lhe admiro muito por isso.

- Eu te contei tudo, até mesmo as partes humilhantes Jonathan...

- E eu ouvi, e depois de processar toda a informação, vi que tudo isso aconteceu porque você não quis encara o que estava acontecendo, o que é simplesmente normal. Você se escondeu atrás do sexo, das drogas e do álcool, e é assim que todos escondem seus demônios e se escondem da própria verdade, aquela que eles se recusam a ver.

- O que eu fiz para merecer você hein? - Ele segura meu rosto, sorrindo.

- Bem, algo realmente impressionante, porque não sou para o bico de muitos. - Eu sorrio de volta.

- Convencido! - Ele exclama e se aproxima para me beijar, mas eu o paro com minhas mãos em seu peito. - O que foi?

- O que vamos fazer em relação a nós dois e a Rafaela? Porque eu tenho certeza que ela não vai gostar de saber que você está comigo.

- É claro que ela não vai, mas que se foda. Não vou mais cair nas chantagens dela. Ela precisa do dinheiro que eu dou para ela todo o mês. Ela sabe que eu consigo a guarda do Miguel em segundos, já que ela está na cidade.

- Miguel?

- Sim, esse é o nome dele. Foi a única coisa que eu consegui depois que ela foi embora, o nome que eu sempre quis dar para meu filho.

- Que lindo. - Eu sorrio, de verdade.

- Igual a você...

Ele se aproxima de mim, e dessa vez, eu finalmente deixo ele me tomar em seus braços e me beijar, fazendo com que eu simplesmente me perca naquele calor que só a gente tinha, e foi em meio aos seus abraços apertados e beijos demorados, que eu vi que não era qualquer coisa que iria acabar com tudo o que a gente tinha construído, mesmo sendo algo surreal que parecia ter saído de um filme, ou de um conto. Somos fortes, e tínhamos acabado de provar isso para nós mesmos.

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Boa Noite...

Então, eu sei que alguns de vocês esperam uma boa explicação por parte do Rodrigo nessa história toda, e eu espero que tenham entendido o lado dele, ou não. E para aqueles que acham que é mentira, que ele só está enganando o Jonathan, eu tenho uma coisa para dizer... Não vou contar. Rsrsrsrsrs. Vocês ainda vão ter muitas surpresas...

No mais, um beijão para todos vocês, e fiquem bem.

E-mail para contato: matheusn1992@hotmail.com

Comentários

Há 4 comentários.

Por luan silva em 2015-09-03 19:39:03
ñ sei o que falar, é muita informação, espero de verdade q o rodrigo ñ esteja mentindo ou se aproveitando do jonathan, eles ja viveram tantas coisas, eles são tão lindos juntos, foi muita informação ainda ñ consegui processar td kk enfim tô muito ansioso pelo proximo..
Por Jr.kbessao em 2015-09-03 15:51:21
Acho tão lindo o amor dos dois. Nada haver eles se separarem. Torço pela felicidade deles! Continua logo por favor!!!! Kkkkk
Por Niss em 2015-09-03 01:19:26
Bom é uma história convincente até, ms, se eu fosse o Jonathan eu iria, mas, com um pé atrás. Quero só ver no que isso vai dar. Espero pelo proximo. Kisses, Niss.
Por diegocampos em 2015-09-02 23:19:43
Achei fofo o Jonathan e o Rodrigo espero que o Rodrigo não tenha mentido e que a Rafaela não atrapalhe a relação dos dois são lindos juntos