O namorado de minha amiga 20

Parte da série O namorado da minha amiga 01

Voo.

Decidimos tomar café enquanto esperávamos, não havia dado tempo para tomarmos em casa. “Você fala castelhano não é Claudinho?” Perguntou Guto ao que respondi que sim. “Aprendi com minha mãe” respondi a ele. "Uma vez conheci uma espanhola, que loucura..." Guto começou a contar ao que Marcello interrompeu: “Guto, agora já está bom.”

Guto soltou uma gargalhada dizendo “Eu não ia falar nada demais” Marcello sempre tenta segurar um pouco o que o Guto diz, coisas de primos segundo ele hehehe. Depois do Check in, nos dirigimos para o embarque e nos despedimos do Gutão que deu um abraço demorado no Marcello. Eu acho muito linda essa amizade que há entre os dois, jamais imaginei que houvessem de verdade amigos assim.

Quando ele me abraçou, Guto sussurrou no meu ouvido. “Cuida dele, coelhinho”. “Guto, eu amo esse moço, não vou tirar os olhos dele” Respondi recebendo de volta um beijo na testa. Entramos na área de embarque. Houve um pequeno atraso de 20min aproximadamente, mas tudo bem. Marcelo me pôs na janela e ele se sentou na poltrona do meio, curiosamente ao nosso lado viajou um padre até Guarulhos.

Ele era curioso e perguntava-nos para onde iríamos e o que fazíamos. Ele fez algumas colocações meio preconceituosas a cerca de um casal de homens maduros que estavam do outro lado do corredor e outras que nem vale a pena relatar, mas que são bem próprias de pessoas retrógradas.

Marcello não gosta de gente assim. A certa altura notei as perguntas do religioso inconvenientes para além da medida e que Marcello não estava mais afim de conversa. “Buenos Aires? É muito romântica “Declarou o sacerdote ao saber de nosso destino.

Clérigo.

“Adequada para um casal de namorados não é?” Perguntou Marcello ao padre que concordou com um sorriso, mas Marcello completou “É por isso que vamos para lá” O Padre ficou em silêncio o resto da viajem até São Paulo com uma expressão de susto engraçadíssima e Marcello não soube esconder seu sorriso de contentamento.

Marcello se incomoda com gente preconceituosa e diante de situações assim ele chega a ter uma atitude combativa. “Meu amor você que eu peça água a aeromoça para você?”; “Coelhinho encosta a cabeça aqui”.

Marcelo não se intimidou com a presença do clérigo e ainda teceu comentários de como Deus é perfeito em tudo que faz e como o amor é uma dádiva que só pode ser sentida por corações puros. Ao desembarcarmos Marcello fez questão de se despedir do padre que disse “Deus os abençoe meu filho” hihihi Eu quase explodi de risos por dentro.

Miscigenação.

Depois de aterrarmos constatamos que haveria um atraso de duas horas, tudo bem, achamos até pouco tempo diante do que tem ocorrido nestes últimos meses. Estávamos preparados para esperar. Há certa confusão e por duas vezes pensamos que nosso voo partiria.

Descobrimos que nosso voo faria escala em Buenos Aires e teria como último destino Santiago, coisa que até entendermos nos causou certo temor. Uma coleção de rostos tristes, desanimados e cansados povoava os salão de embarque. Crianças correndo ou brincando pelo chão o alegrava.

A decisão de não aceitar cartão de crédito em muitas lanchonetes é um absurdo e a ausência de um caixa eletrônico um verdadeiro desastre. A todo tempo alguém se dirigia em inglês a Marcello, talvez pela sua cara de americano não sei.

“Há uma separação muito clara em nosso país, coelhinho, negros, afros-descendentes e pardos quase não viajam de avião” Disse-me Marcello. “Nesses ambientes a presença deles está quase limitada aos serviços e isso me dói por ver que ainda temos que caminhar muito” Ele completou, e naquele momento aprendi a amar um Marcello que é para além de outros aspectos, um observador social indignado.

Segundo Marcello, num país moreno como o nosso é de se estranhar que essa mescla não esteja presente nos salões de embarque dos nossos aeroportos. “Sempre que viajo sinto falta desse mistura, e está muito claro para mim que algo está errado” Ele seguiu em sua análise. “Resultado de distorções históricas que só a educação ampla pode corrigir” Disse a ele em resposta.

Imunidade.

Ele me sorriu e disse “Meu amor, pensamos da mesma forma, você como eu tem fé na educação” Disse Marcello e completou, “nosso filho vai ter dois ótimos pais!” “Filho?” Perguntei a ele surpreendido. Ainda não havia pensado em profundidade nisso, mas de repente, esse moço que veio pra minha vida e nela tudo mudou, tudo em mim fez ser diferente, agora me fazia pensar em construir uma família mesmo.

Naquele momento seu sorriso era um sim e a convicção presente naqueles olhos tão azuis, a certeza de que a vida é um presente e que podemos sim, ser felizes e nos entregar a quem amamos sem reservas, sem medos e mesmo que tudo um dia acabe vale a pena tentar.

Vale a pena baixar os escudos e permitir que os que provam que têm coração limpo se aproximem. Amei a luz que iluminada o seu rosto naquele momento, amei estar ali ao lado dele, amei a vida. “Sempre quis ser pai, Claudinho e eu acho que você é a pessoa certa para me ajudar nisso” Ele respondeu e dei um abraço demorado nele.

Não ligo mais quando algumas pessoas olham, acho que estou ficando imune a isso como penso que Marcello também ficou. “Então? Podemos adotar um daqui a uns dois ou três anos que tal?” Marcello perguntou. “Claro que sim!” Respondi e completei “Vamos pensar nisso com carinho”. Puxa vida, ser pai, poder adotar uma criança, nem sei se isso é possível em nossa condição, mas... puxa vida... isso fez acontecer algo dentro de mim.

Santa Maria.

Começaram a fazer fila e fomos para o portão 10. Mais uma vez ele me pôs na janela dizendo que queria que eu visse nossa chegada à Argentina, dessa vez não havia ninguém no acento ao lado.

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...Senti certa peninha dele porque as suas pernas ficaram um pouco apertadas. “Quem mandou crescer demais” ele disse sorrindo quando percebeu que eu notei o problema de ajustamento.

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...Voo tranqüilo, sem turbulência e quando estávamos sobre o Uruguai ele me entregou seu MP4 para que eu visse uma coisa. Era esse clipe, http://www.youtube.com/watch?v=3zD9W9SZj9w

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...“Para que você aprenda a alma dessa nova Argentina” Disse a mim. Faz parte de um projeto de dois djs franceses eu acho, mas adorei, o senti contagiante e como gosto de experimentar gostei.

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...As interferências adocicadas dos trechos falados me encantaram. Confesso que algo acontece no coração quando se vê ao longe, chegando, do outro lado do Prata, aquela cidade que se nota plana.

Chegada.

O avião fez uma curva e sobrevoamos a cidade. “Ela é toda quadriculada!” Eu disse a Marcello que me esclareceu que aquele era o modo dos colonizadores espanhóis instalar suas cidades. A aeronave fez mais uma curva e nos preparamos para aterrar. Marcello segurou firme a minha mão e me deu um sorriso.

Percebi que ele sempre fica ligeiramente apreensivo nesse momento. Silêncio absoluto naquele turbulento momento em que tocamos o chão. Quando já no chão havíamos parado ouviram-se palmas em todo interior. Acho que é um hábito em vôos internacionais, achei extremamente charmoso.

“Bien venido al Puerto de Santa Maria de Buen Aire!” Recebi de Marcello com um beijo na testa. Ao se chegar a Ezeiza é como se estar em um país do leste europeu, o clima frio os terminais aparentemente antigos, comparados aos nossos, mas sempre extremamente charmosos.

Pela janela vi se aproximar um carrinho engraçado com uma espécie de esteira, visivelmente antigo, mas não menos elegante, ele auxiliou na retirada de nuestras equipages.

“Claudinho, vamos?” Ouvi e vi que quase todos há haviam desembarcado restando nós e não mais que cinqüenta pessoas. Fiquei absorto por um instante mirando aquela paisagem diferente e tentando entender onde estávamos.

Fomos para a migración entregar o papelzinho que preenchemos durante o voo. No avião recebemos um formuláriozinho para por nossos dados. Pouco a pouco fomos deixando de ouvir o português à nossa volta. Apanhamos nossa bagagem e nos dirigimos à saída.

Hérmanos.

Engraçado que já saímos numa espécie de free shop. Comecei a ver os rostos porteños a minha frente; primeiro dos agentes da migración, después os funcionários da zona de bagagens, daí os desse corredor que mais parece um free shop. Todos elegantes, acho que aquele porte é natural.

Aqui faço uma observação, os homens argentinos são realmente lindos e conosco foram muito solícitos. As mulheres também, mas algo guardam dos personagens de Almodóvar. Senti alguma coisa dos anos 70´s, não sei se pelos cortes de cabelo, não sei se pela dramaticidade, pela tecnologia ligeiramente desatualizada, não sei dizer.

Mas com certeza senti uma liberdade que jamais senti por aqui porque a todo tempo Marcello me segurava pela mão naturalmente e não notei olhares estranhos a nos. Fomos a um guichê de remisses, que são empresas de táxis, mais seguros, segundo Marcello. Contratamos um para nos levar ao hotel. Quando o coche chegou o carregador nos avisou, e nos conduziu até o táxi e colocou as nossas malas no carro.

Já entravamos no coche quando ouvimos “No me dejas una propina señor”. Era o carregador. Marcello sorriu! A propina, significa gorjeta e parece ser quase que uma instituição no serviço argentino, que não gosta muito de moedas. Demos a propina e seguimos.

Avenidas.

“Where you come from?” dirigiu-se o motorista a Marcello com seu carregado sotaque porteño. “Brasileños” Respondeu Marcello. O Motorista riu e disse que ele parecia Americano, depois que conversamos um pouco com ele disse que pelo meu Castelhano eu passaria por espanhol, pois minha pronúncia é madrileña.

No caminho de Ezeiza até o hotel seguimos por uma estrada em ótimas condições de conservação que não parecia combinar com a frota de veículos meio antiga para os nossos padrões. Conversei com o motorista que falava do último confronto entre nossos dois países no esporte. Percebi que a rivalidade termina aí, eles na verdade gostam muito da gente e pude notar isso em todos os lugares onde fomos.

Entendi pela quantidade de plazas de peaje que algumas estradas em Buenos Aires são privatizadas, isso explica as ótimas condições de conservação. Alcançamos a cidade por um bairro chamado Floreta que continuava me lembrando um país do leste europeu.

Daí ganhamos a Avenida nueve de Júlio “La avenida más ancha del mundo com 144 metros”. Em muito, lembra o que assistimos de Paris. A cidade então começa e se revelar para nós. Eu me encantava com aquele movimento todo, tão diferente do que temos em Brasília. Marcello me observava com um sorriso nos lábios. “Que bom que você está gostando tanto assim” ele disse. Logo Chegamos a Avenida Corrientes onde fica o hotel.

Hotel.

Fomos recebidos por Sebastián, mais um dos rapazinhos lindos que há em Buenos Aires que visivelmente estava namorando pela Internet hihihi. Namoro caliente, quando deixamos a recepção após havermos preenchido as fichas e pegarmos a chave o vimos mostrando a língua para a câmera do computador, de uma forma, digamos, um pouco mais quente. Hihihi.

Sim eu também estranhei haver uma cam na recepção, mas como é um daqueles computadores moderninhos de tela plana e coisa e tal deve ter vindo junto do pacote. “Eu não vou deixar você descer sozinho viu?” Disse Marcello sorrindo. E completou dizendo “Com aquele linguão ele te agarra e te engole” e seguiu sério.

O elevador era charmosamente antigo, havia dois, capacidade máxima para 3 pessoas. Sem que eu esperasse, Marcello me agarrou e me deu um beijo que me deixou tonto, “É o nosso primeiro Beijo em solo estrangeiro” Disse ele. Nosso quarto ficava no sétimo andar. “Habitación com baño privado, cama matrimonial y calefación com servício de desayuno en la habitación sin cargo” Disse Marcello antes de abrir a porta.

Hotel II.

“Ele pediu pra eu esperar do lado de fora, pôs as malas dentro do quarto e voltou. “Você deixa eu fazer uma coisa? Mas estou com vergonha de pedir com medo de você achar brega” Ele me disse.

Eu achei graça tentando adivinhar o que seria. E falei que ele podia pedir. “Deixa eu te carregar no colo”. Eu sorri e disse que tudo bem, mas que eu não ia dar conta de carregá-lo quando fosse minha vez. Daí ele sorriu, me tomou no colo e disse no meu ouvido “Carregar a mim não, mas... (*) “.Bom essa parte acho que eu posso pular hihihi.

Bem. Voltando a falar do quarto, acho que Marcello não foi generoso ao falar dele, era um quartinho até bem legal. O banheiro é que era um pouco estranho; o chuveiro ficava na frente da porta, mas tudo bem, era só tomar banho de porta fechada. Uma coisa me causou medo no banheiro. O bidê. Nem me aproximo daquilo, morro de medo dele hihihi. “Bem é melhor tomarmos um banho, não? Já são 17h horas e acordamos às 5h. Viajamos o dia todo já eu estou me sentindo azedo” Disse Marcello exagerando.

Ele é fanático por banho como eu, mas estava ainda bem cheirosinho. Primeiro ele entrou, pouco tempo depois ele me chamou. “Amorzão, vem tomar banho comigo!”. Bom estava frio e a água estava quente e... hihihi não recusei o convite. Foi um banho revigorante. Seguimos para a cama depois do banho para nos “aquecermos” hihihi. Marcello estava impossível, parecia que não nos víamos havia tempo. Cochilamos até às 20h. Quando acordamos, tomamos outro banho e nos preparamos para sair.

4 graus lá fora, todos abrigados em seus agasalhos, gorros, cachecóis, luvas, sobretudos. Decidimos caminhar pela Calle Florida. Muita gente na rua apesar do frio. “Chicas, Chicas, Chicas” ouvia-se dos rapazes que oferecem garotas de programa aos que passam. “Señor, tenemos mujeres, homens lo que quiera” um deles disse para mim que ri. “Isso é deprimente” disse Marcello.

Cidade.

Caminhamos até o Shopping Pacífico e lá resolvemos comprar dois sobretudos para nos abrigarmos do frio de forma correta. A galeria é aquecida, quase todos os ambientes o são nesta época do ano. Realmente nossa moeda está valorizada, o peso argentino está setenta centavos de real. Conseguimos comprar dois sobretudos por 250 pesos.

“Vamos comer alguma coisa coelhinho?” Marcello me perguntou ao que respondi que sim e fomos a um café, Havanna. Parece um pub inglês e há uma placa onde se lê que a casa se reserva ao direito de recusar clientes. Pode?hihihi.

Bem, a moza se aproximou e se dirigiu em inglês a nosotros, fiz o pedido a ela em espanhol que perguntou simpaticamente de onde éramos, se éramos americanos ou espanhóis. “Brasileños?! Que bein!” Disse ela ao respondermos.

Não sei porque eles se animam tanto ao saber que vendem, servem ou transportam brasileiros, desconfio que realmente a rivalidade só está no futebol. “Você se dirige de forma tão natural que até parece um deles” Disse Marcello sorrindo.

Pagamos a cuenta e dejamos la propina para la moza que sonrió, muy hermosamente. Como entendi que a propina é necessária estabeleci un peso para cada e pronto, nada más. Marcello riu e disse que eu jamais poderia cursar outra coisa.

O movimento na rua parece que nunca cessa, gente para cá, para lá. Marcello e eu estávamos um pouco cansados ainda da viagem e resolvemos voltar para o hotel, mas no caminho decidimos caminhar um pouco pela rua, como simples anônimos até o obelisco que fica muito próximo do hotel.

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