Em busca da felicidade - Cap. 9

Conto de Itak como (Seguir)

Parte da série Em busca da felicidade

Aqui estou para mais um capítulo da série. Sinto-me mal por estar demorando tanto a postar, mas tem vezes que o tempo não me ajuda.

No mais, espero que estejam gostando.

João- muito obrigado pelo elogio. São elogios como esse que me dá coragem de seguir com a série. Muito obrigado.

Niss - eu sei que você está acompanhando. Não precisa se desculpar. Sei que todos nós temos afazeres no dia a dia. Eu mesmo, às vezes deixo de comentar as séries que acompanho, mas continuo lendo todas. Muito obrigado! Bj

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Havia se passado um mês desde que meus pais souberam de minha sexualidade e cada dia que passava as coisas pioravam. Comecei a me sentir um prisioneiro dentro de minha própria casa, era como se as paredes ouvissem até mesmo meus pensamentos.

Meu pai sempre tentava amenizar os problemas de alguma forma, mas minha mãe virou uma espiã de primeira. Infelizmente eu não tinha como mudar a situação, apenas torcia que um dia ela entendesse tudo.

Já tinha voltado ao trabalho e o resultado do vestibular não foi tão animador como eu esperava, eram 40 vagas e eu cheguei perto, se dois alunos desistissem, eu seria chamado, mas na verdade eu já não estava mais me preocupando com isso, pois tudo o que eu mais desejava naquele momento era resolver minha situação dentro de casa.

Tony? Ainda continuava conversando com ele e algumas vezes nos encontramos como amigos apenas, mas no fundo os meus sentimentos por ele estavam iguais ou até mesmo mais fortes do que quando tudo começou. Eu o admirava de tal forma que nem eu conseguia acreditar, acho que ele era tudo o que eu sempre sonhei.

Ainda acho que ele também sente algo por mim, mas resolvi respeitar a decisão dele.

Minha mãe estava pegando pesado pro meu lado, me vigiava o tempo todo, ia comigo até o trabalho e quando o expediente terminava, lá estava ela na frente da loja pra me buscar. Quando ela não conseguia fazer isso, fazia com que meu pai fosse e, eram nessas ocasiões em que eu conseguia sair um pouco sozinho ou me encontrar com Tony, pois meu pai dizia que iria me buscar no trabalho mas na verdade não ía. Ele só estava tentando aliviar aquela barra porque ele sabia que a qualquer momento eu poderia explodir.

Aline estava sempre ao meu lado mas não conseguia fazer muita coisa pra me ajudar, ela também tinha se classificado na universidade pública, mesma situação que a minha. Minha mãe havia mudado drasticamente a forma que tratava Aline, pois na visão dela, Aline me influenciava nessa minha "escolha". Queria muito fazer com que ela entendesse que isso não se tratava de uma escolha, que eu não podia simplesmente dormir num dia e acordar no outro escolhendo ser hétero, e muito menos no dia seguinte acordar novamente e escolher voltar a ser gay. Ninguém escolheria ser gay sabendo de todo preconceito que nos rodeia, sabendo que seremos insultados, que seremos motivo de piada para uma parcela dessa sociedade hipócrita. Ninguém jamais escolheria ser gay sabendo de todos os obstáculos que enfrentaríamos por conta de um estereótipo que as pessoas criam diante de um gay, é difícil, eu sei, mas quem sabe um dia ainda viveremos num lugar tranquilo onde as pessoas aceitam e respeitam a diversidade... Sonhar não custa nada.

Os dias foram se passando e minha esperança de que as coisas melhorassem só diminuía, pois na verdade, parecia que piorava, tudo.

Meu pai parecia estar preocupado com a situação, algumas vezes eu até ouvi uma conversa dele com minha mãe onde ele pedia que ela deixasse um pouco a religião de lado e procurasse me enxergar como um filho e não como um pecador; ele dizia que ele, na condição de homem hétero, teria muitos motivos para não aceitar minha condição sexual, mas que por incrível que pareça ele estava sendo totalmente maleável e agindo como uma "mãe".

Lembro-me de que quando ouvi ele dizer essas palavras, meus olhos se encheram de lágrimas, até então eu nunca havia percebido o quão grande meu pai era, sim, ele tinha uma grandeza que poucos pais têm. Apesar de todo esforço de meu pai, eu sabia que não poderia aguentar por muito mais tempo, então num dia em que minha mãe não estava, resolvi sentar e conversar com ele sobre algo que eu tinha decidido...

- Pai... Eu posso conversar com o senhor um pouco?

- Claro que pode, André... Eu só espero que não seja o que eu estou pensando.

- Eu pensei muito, pai, e eu não queria tomar uma atitude assim, mas acho que será melhor para todos.

- Você está pensando em sair de casa, não está?

- Como o senhor sabe?

- Não sei... Talvez seja minha intuição paterna, se é que isso existe.

- O que o senhor me aconselha?

- Queria dizer pra você esperar as coisas se acalmarem, mas acho que nada está se acalmando; queria poder dizer que as coisas vão mudar, mas isso só Deus sabe... Então acho que a única coisa que eu posso te dizer é que independente de sua decisão, continuarei sendo seu pai e te amando igual.

Você sempre poderá contar com seu pai, André, eu jamais te abandonaria, lembre-se disso sempre.

Eu não consegui dizer mais nada depois de suas palavras. Eu sempre contive meu choro, mas nesse dia eu não consegui controlar nada... A torneira foi aberta e as lágrimas caíram como uma cachoeira. Eu abracei meu pai muito forte e lhe agradeci por tudo o que ele tinha feito por mim até o momento, e eu sabia que ele ainda faria muito mais.

- André... Eu só estou preocupado com uma coisa.

- Não se preocupe, pai.

- Sim, tenho de me preocupar. Você sabe como é nossa situação aqui em casa, não somos ricos, tenho medo de que você saia de casa e eu não tenha condições pra te ajudar em tudo.

- Eu vou saber me virar... Fora o dinheiro que a mamãe guardou do meu salário, eu também ainda tenho um pouco que eu guardei. Pode não ser muito, mas acredito que sabendo usar, consigo ficar uns meses sem me preocupar tanto... E além disso eu ainda trabalho, vou saber economizar o máximo.

- Eu sei que você é econômico... Mas alugar um apartamento, mesmo que seja um cômodo apenas, custa caro. Você vai precisar pagar calção, comprar móveis, eletrodomésticos e etc... Tudo isso custa caro... Eu posso te ajudar um pouco, mas sabe que minhas condições são limitadas.

- Meu pai... Em último caso, eu procuro um outro emprego. E caso eu seja chamado pra ingressar na universidade, posso optar por não estudar pelo menos até eu conseguir me estabilizar. Depois eu faço as provas novamente, eu confio em minha capacidade, por isso eu quero que o senhor acredite em mim também. A idéia inicial é não precisar de nem um centavo do senhor... Deixe-me tentar.

- Como você pretende contar isso à sua mãe?

- Espero que o senhor respeite minha decisão... Mas eu não vou contar nada para ela. Quero escrever uma carta e deixar com o senhor para entregá-la somente depois que eu realmente não estiver mais morando aqui. O senhor pode fazer isso por mim?

- Não sei se devo, mas farei. Conte comigo, André...

- Obrigado, meu pai. Sem o senhor eu não teria aguentado por tanto tempo... Eu sei tudo o que o senhor tem feito por mim e serei eternamente grato.

Nos abraçamos mais uma vez e senti uma paz interior indescritível. Sabia que os mesmos braços que me apertavam naquele momento, seriam capazes de fazer qualquer coisa pra me ajudar.

Fui para meu quarto com alguns jornais em mãos e comecei minha busca por um apartamento. Revirei todos os classificados e tudo parecia ser muito caro, até mesmo os mais simples e localizados nos bairros mais distantes da cidade.

Quando já estava sem esperanças, eis que me aparece um anúncio um pouco animador.

No anúncio, um homem procurava uma pessoa para dividir o apartamento. Eles moravam em quatro pessoas e um estava saindo do apartamento. Imediatamente anotei o telefone de contato e fiz a ligação.

Conversei com um homem chamado Edgar, 25 anos, estudante de psicologia (mesmo curso que eu havia escolhido), o homem que ia sair do apartamento acabara de se formar e os outros dois que moravam lá, não eram estudantes. Expliquei toda minha situação a Edgar e ele me garantiu que o fato de eu ser gay não implicaria em nada na decisão de me aceitar ou não no apartamento.

Combinamos um horário no dia seguinte, depois que eu saísse do trabalho pra conhecer o local e os outros moradores.

O preço não era tão barato, imaginei que fosse mais barato por se tratar de quatro pessoas dividindo um mesmo lugar, mas mesmo assim, 350 reais era mais barato do que qualquer outro anúncio que eu tinha visto até o momento; tratava-se de um apartamento no centro da cidade, dois quartos, cozinha, sala, banheiro e área de serviço. Isso significava que eu teria de dividir o quarto com mais um dos moradores, mas isso também não me deixava preocupado. Tudo o que eu queria era conquistar minha independência e evitar cair em uma depressão dentro de casa.

Terminamos a conversa e fui dormir um pouco mais tranquilo... Sabia que estava prestes a dar um passo rumo à uma vida totalmente diferente da que estava acostumado a viver; isso era pavoroso e excitante ao mesmo tempo.

Tomei um banho e antes de me deitar, deixei meu pai saber de minhas intenções e pedi a ele que fosse me "buscar" no trabalho no dia seguinte. Isso tudo era pra evitar que minha mãe fosse e desse fim em meus planos. Também mandei uma mensagem contando tudo a Aline e pedi que ela fosse comigo visitar o local. Ela ficou radiante em saber que tinha tomado uma decisão para mudar de vida e eu, mais feliz ainda por saber que tinha pessoas ao meu lado que me amavam e que me apoiariam em tudo.

Deitei e dormi com a certeza de que no dia seguinte tudo mudaria pra melhor.

Acordei às seis da manhã, tomei um banho, fiz tudo o que tinha que fazer, tomei meu café e segui para o trabalho, acompanhado de minha mãe, é claro.

Chegamos ao trabalho e minha mãe disse que meu pai viria me buscar a noite.

O dia no trabalho foi bem corrido, o que na verdade era muito bom pra mim. Desde que havia retornado ao trabalho, estava trabalhando em tempo integral por já não ter compromisso com a escola, isso implicava em um aumento significativo, nada grandioso, mas em minha situação atual, qualquer centavo já ajudaria.

É claro que eu não queria ser um vendedor pro resto de minha vida, mas eu gostava de trabalhar com isso, gostava de ter contato com o público... Conversava com os clientes e os tratava como meus amigos, fazia com que eles se sentissem a vontade e isso fazia com que eles voltassem sempre; como eu também ganhava por comissão, isso me ajudava bastante.

Em meio a correria, as horas se passaram rapidamente, logo eu vejo que estava no fim do expediente e a adrenalina foi tomando conta de mim. Depois de tudo terminado, avistei Aline e meu pai me esperando e fui ao encontro deles. Meu pai disse que ficaria me esperando na praça de alimentação de um shopping perto de meu destino e eu segui rumo ao apartamento com Aline.

Chegando lá, Edgar já estava a minha espera. Nos cumprimentamos, apresentei Aline aos rapazes e conhecemos o apartamento. Como estava na descrição, era tudo muito simples porém bem arrumado. Já estava todo mobiliado e eu não precisaria me preocupar em desembolsar nem um centavo.

Edgar me disse que caso os outros rapazes aceitassem minha entrada no apartamento, eu dividiria o quarto com ele. O quarto tinha uma beliche, o que significava eu não ter de gastar comprando uma cama; tudo estava indo perfeitamente bem.

Os outros dois rapazes, Márcio e Gabriel , eram dois nordestinos que vieram tentar a vida em São Paulo... Não estavam estudando, apenas trabalhando no momento. O preço do imóvel, na verdade, não era 1.400 reais (350 dividido em 4). Edgar me explicou que ele pagava uma parte maior com a condição de que ele tivesse direito sobre o imóvel. Isso era um acordo verbal entre ele e os outros moradores, pois caso um dia ele precisasse do imóvel, os outros teriam de procurar outro lugar para viver. Aceitei esse acordo numa boa e só estava esperando a resposta dos outros dois.

Algo me dizia que no dia seguinte receberia um telefonema com uma resposta positiva em relação a isso, é claro que a decisão final seria de Edgar, e justamente por isso, estava tranquilo; notei que Edgar se encantou com Aline, logo ele iria querer fazer de tudo para subir no conceito dela.

Nos despedimos, fui com Aline ao encontro de meu pai. Tomamos o ônibus de volta pra casa e minha mãe já estava preocupada com a demora.

Inventei que o dia estava corrido e precisei fazer hora extra, mesmo não acreditando, ela não fez nenhuma pergunta.

Eu não gostava de agir dessa forma, de fazer tudo escondido de minha mãe... Mas eu temia que ela fizesse alguma coisa para me impedir sair de casa, mesmo eu já tendo 18 anos.

Jantei com meus pais, lavei a louça, limpei toda a cozinha, tomei um banho e fui para meu quarto. Fiquei deitado pensando em tudo o que aconteceu nesse último mês, tudo foi tão rápido e devastador que nem comemoramos as festas de fim de ano... Já havíamos iniciado o ano novo e o clima ainda era de meio de ano, enfim, tudo acontece por algum motivo. Adormeci e me preparei para o dia seguinte. Uma nova vida começaria, uma nova era, uma nova história onde eu seria o protagonista de meu destino...

-------- continua--------

Comentários

Há 3 comentários.

Por edward em 2015-10-10 16:45:09
Cara essa é uma história fantástica. ,vc escreve super bem ,eu mim sentir como se eu fosse o André,eu mim identifiquei muito com ele.parabéns pela história.
Por Niss em 2015-10-09 00:41:25
Maravilha!!! Você falou tudo na parte da "escolha" de sexualidade, muito bom mesmo. Espero que esse Edgar e os outros o aceitem e respeitem o nosso amigo aí. E que a mãe dele ou acabe com essa palhaçada ou suma da vida. Muito emocionante também na parte do pai. Adorei... Kisses Niss.
Por Ramom em 2015-10-08 12:37:15
Incrível, e a parte do pai ajudar ficou muito legal, pois não é comum acontecer, só no aguardo para a continuação, abraços!