01x06 - Sim, sou gay!

Conto de escritor.sincero como (Seguir)

Parte da série AMOR DE PESO

Pai e Mãe,

Meus segredos foram descobertos. O que vou fazer? Isso não pode tá acontecendo. O que será que o Vando vai fazer com o vídeo?!

Naquele domingo acordei mal. O meu estômago estava girando e não parava de incomodar. Fui até o banheiro e vomitei tudo o que tinha dentro de mim. Sentei no vaso e comecei a chorar. Fui burro. Dei mole e me pegaram. Eu tinha tanto medo de ser quem eu realmente era que não pensava direito nas coisas.

Olivia: (abrindo a porta do banheiro) – Você está bem? Giovanna disse que você está passando mal.

Yuri: - (levantando) – Estou. Deve ter sido algo que comi ontem. (saindo do banheiro)

Olivia: - Comeu ou bebeu? Yuri… já conversamos sobre isso.

Yuri: - Tia. Não bebi, ok. Eu só devo realmente ter comido algo que não caiu bem.

Olivia: - Ei, tá realmente tudo bem, né?

Yuri: - Sim, tia. (entrando no quarto)

Olhei no meu celular e haviam 39 ligações do Diogo, além de 349 mensagens. Droga, estava chateado, mas não poderia culpá-lo. Eu precisava falar com o Vando. Ele tinha que apagar aquele vídeo. Decidi dar uma volta no bairro para encontrá-lo. O vi com alguns amigos em uma das ruas do bairro.

Vando: - Olha só. Se não é a baleia rainha. (rindo)

Yuri: - Corta essa Vando. Quero saber o que você quer para apagar o vídeo.

Vando: - (pensando) – Eu preciso de tempo, mas não se preocupa. Não vou lançar isso na internet hoje. Você ainda pode ser útil para mim.

Yuri: - Não quero ter nada com você. Me deixa em paz. (saindo, mas sendo impedido pelo Vando)

Vando: (mostrando o vídeo de Yuri e Diogo se beijando) – Já pensou teus amigos assistem esse vídeo? Já te falei o que eles aprontaram com um cabeleireiro aqui do bairro?

Yuri: - O que? (se afastando de Vando) – O que eles fizeram?

Manaus - Cinco meses antes

Seus amigos, Zedu, Ramona, Brutus e Letícia não gostavam de um cabeleireiro do bairro. Ele se chamava Mascarenhas. Um dia eles inventaram que o tal homem havia aliciado Brutus e para escapar, o teu amigo fortão partiu para a ignorância.

Mascarenhas: - Para de me bater. (no chão enquanto Brutus o chutava)

Ramona: - Bate nessa bicha. Ela não merece viver.

Letícia: (jogando água em cima de Mascarenhas) – Esse viado não pode viver.

Zedu: (ligando para a polícia)

Brutus: (chutando Mascarenhas) – Seu imprestável. Todos da tua laia deveriam morrer. Espero que a polícia te prenda e você morra lá.

Manaus – Atualmente

Yuri: - Isso é mentira.

Vando: - Como eu adoro provas. (mexendo no celular e abrindo o vídeo)

Droga. Eram eles mesmos. Agredindo um homem. A voz de Vando aparecia no fundo do vídeo, ele incentivava o ódio. Eu não podia acreditar no que eu estava assistindo. Era mentira, uma montagem. A Letícia e Ramona nunca diriam aquelas palavras. E o homem… ele estava no chão, chorando, todo ensanguentado. Eu não conseguia acreditar.

Yuri: (abaixando a mão de Vando) – Chega.

Vando: - Já pensou? Quando eles descobrirem que você é gay?

Yuri: - Eles… eles… eles não fariam isso comigo.

Vando: - Eu não teria dúvidas. (abrindo um site de noticias do celular e mostrando uma matéria)

CABELEIREIRO É LINCHADO NO PARQUE 10. Dizia a notícia em letras garrafais. Era verdade. A matéria explicava que o homem foi muito mal para o hospital e citou o vídeo também. Como eu pude confiar neles? Eles eram homofóbicos.

Vando: - Eu, pelo menos, sou verdadeiro. E se eles estiverem te usando de isca?

Yuri: (ofegante) – Não. Eles não fariam isso comigo.

Vando: - Eu só quero o teu bem. Hoje a noite se encontra comigo no Fred's. Vou te apresentar uma pessoa.

Eu não conseguia raciocinar direito fui pra casa, me tranquei no quarto e comecei a chorar. Era a única coisa que eu fiz naquele dia. Era muita coisa acontecendo comigo, os sentimentos se misturavam. Aquelas pessoas eram mesmo meus amigos? Ou era apenas mais um brinquedo para eles chutarem? Eu não conseguia respirar.

Olivia: (batendo na porta de Yuri) – Yuri. O Zedu está aqui.

Yuri: (abrindo a porta do quarto)

Olivia: - Nossa querido. Você está bem?

Zedu: - Tá precisando de algo?

Yuri: - Ontem comi algo que não caiu muito bem. Podemos conversar amanhã?

Zedu: - Claro. Te encontro na parada de ônibus.

Yuri: - Ok.

Zedu: - Com licença. (saindo)

Olivia: - Você não quer ir no médico?

Yuri: - Não tia. Vou deitar.

Olivia: - Vou comprar frango para o almoço, mas vou atrás de sopa também.

Yuri: - Tudo bem. (fechando a porta)

Deus. O que eu vou fazer? E se eles descobrirem que eu sou gay? Decidi encontrar Vando. Ele estava no Freds, mas pediu para conversamos em outro lugar. Fomos de moto até a Ponta Negra.

Vando: - Então? Vai me ajudar?

Yuri: - Quem é a pessoa que você ia me apresentar?

Vando: - Meu novo parceiro no crime. (rindo alto)

Yuri: - E quem seria?

Vando: - Você.

Yuri: - Como vou saber se você não vai me dedurar de qualquer forma?

Vando: (pegando no ombro de Yuri) – Eu estou do teu lado.

Yuri: - (se afastando) – Do que você precisa?

Vando: - Vamos nos divertir com eles. Afinal, eles pareceram felizes enquanto espancavam o Mascarenhas.

Yuri: - E o que você tem a ver com isso? Afinal, você jogou água na gente.

Vando: - Eles fizeram pra machucar. Eu fiz por brincadeira. E eu quero apenas que eles paguem o mal com o mal.

Yuri: - Nossa. E o que você pretende fazer? Como eu posso te ajudar?!

Vando: - Pra começar você deve se afastar deles.

Yuri: - Eles são meus únicos amigos e…

Vando: (falando alto) – Você não tem amigos! (se contando) – Não entendeu? Eles querem te usar como isca. Querem te humilhar.

Yuri: - Eles… (com os olhos marejados) – Eu… eu não acredito nisso.

Vando: (impaciente, pega o celular e abre o vídeo em que Mascarenhas é espancado) – É isso que você quer?

Yuri: - Chega. (tirando o celular da mão de Vando e desligando o aparelho) – O que preciso fazer?

Vando: - Como eu te disse. Você vai se afastar e vamos separar todos eles. Depois destruir um por um.

Yuri: (de cabeça baixa) – Isso é loucura.

Pedi para o Vando me deixar na Ponta Negra. Eu precisava de um tempo para pensar em tudo. Aquilo só poderia ser um pesadelo. Desci para a praia e fiquei sentido o vento bater no meu rosto, não pude evitar as lágrimas. Como eles puderam ser tão cruéis com outro ser humano? Do nada, me deu vontade de entrar na água, tirei a calça, o tênis, meia e até a camisa, fiquei apenas de cueca e entrei na água.

Yuri: - (boiando e olhando para o céu) – E se o Vando contar para todos? E se a minha tia me expulsar de casa? E se os meus amigos me humilharem? (mergulhando)

Se eu morresse naquele momento ninguém viria me resgatar. Talvez essa fosse a solução ideal, a morte. Não precisaria enfrentar ninguém. Era apenas morrer. Um dia achariam meu corpo e pronto. Mas nem pra isso eu tomava coragem. Aguentei ficar de baixo d'água uns 40 segundos. Fiquei divagando pela vida por uma hora quase, os meus dedos já estavam todos enrugados. Ao sair, vesti toda a minha roupa molhado mesmo, mas ao subir para pegar o ônibus percebi que não tinha dinheiro.

E agora, Yuri? Se eu ligasse para a minha tia tenho certeza que ela ia surtar, então decidi atender uma das 159 ligações do Diogo. Contei parte da história pra ele. Ele demorou um pouco para chegar. Em casa, a titia tentava me ligar, mas naquela altura meu celular já estava descarregado.

Olivia: - Giovanna? O Yuri falou se ia encontrar com os meninos?

Giovanna: - Não tia.

Olivia: - Onde esse menino se meteu?

Richard: (entrando) - Tia, a carteira dele tá em cima da cama.

Giovanna: - Vou ligar para as meninas.

Fui pra casa do George, Jonas e Hélder. Eles me confortaram e apoiaram em qualquer decisão que eu tomasse. Jonas até me emprestou uma bermuda e camiseta, pois, eles colocaram as minhas roupas para lavar e secar. Ficamos conversando na sala da casa deles.

George: - O importante é você ser feliz consigo mesmo. (pegando no ombro do Yuri)

Hélder: - Também acho viado, tipo, você não pode dar o gostinho desse cara te tirar do armário. Saia antes.

Jonas: - Apenas faça aquilo que te fará feliz.

George: (celular tocando) – Com licença. (saindo da sala)

Diogo: - Você não pode deixar as pessoas brincarem com os teus sentimentos desse jeito. Se quiser eu dou uma lição nele.

Yuri: - A violência não resolve nada, Diogo.

Hélder: - O Chubby branco tem razão. Violência gera mais confusão.

Jonas: - Você não pode esconder isso da sua família. Eles merecem saber a verdade.

George: (voltando) - Gente. A Luciana ligou. Ela já tá esperando a gente.

Hélder: - Yuri, miga! (abraçando Yuri que estava sentando no sofá) – Força… e precisando de algo nos procure.

George: - Vocês podem ficar aqui. Diogo deixa a chave na portaria, por favor.

Diogo: - A gente não vai demorar… só dar tempo da roupa do Yuri secar.

Jonas: - Essa roupinha ficou tão linda em você. (abraçando Yuri)

Yuri: - Obrigado. Muito obrigado gente.

Minha tia ligou para todos os meus amigos e não conseguiu controlar o nervosismo. Eles acabaram indo até a minha casa para saber se havia acontecido algo. Eles decidiram procurar por áreas próximas, mas não encontraram nenhum vestígio. Minha tia foi até o quarto e começou a chorar, ela decidiu ligar para uma pessoa, alguém que ela confiava e poderia ajudá-la a passar por essa situação.

Giovanna: (desligando o celular) – Ele não atende.

Richard: - Tenta de novo.

Zedu: - Acho que devemos ligar para a polícia.

Brutus: - Ele está há quase cinco horas sem mandar notícias, acho que a polícia só responde casos desse tipo depois de 24h.

Luciana: - E vamos ficar parados aqui?

Ramona: - Ele não disse nada mesmo Giovanna?

Giovanna: - Não. O Yuri não é de fazer isso… a última vez que ele fugiu foi quando…

Zedu: - Foi quando o que?

Ramona: - Pra gente ajudar precisamos saber de tudo.

Richard: - Ele surtou quando nossos pais morreram. Ele quebrou toda a casa. Eu lembro. A titia tentou parar ele, mas foi pior.

Luciana: - Nossa. (sentando no sofá)

Zedu: - Caramba.

Giovanna: - Então, a nossa avó resolveu internar ele em um hospital psiquiátrico.

Brutos: - Com uma avó dessas ninguém precisa de inimigo.

Olivia: - (entrando) – Mas eu enfrentei a minha mãe e resgatei o Yuri. Ela até hoje não fala comigo, mas eu não me importo. Os pais deles não iam fazer isso, então porque eu faria?

Zedu: (com os olhos marejados, saindo da sala)

Letícia: - E vocês acham que ele pode… pode….

Richard: - Não! (saindo correndo)

(Campainha tocando)

Giovanna: - Tia, eu falo com o Richard. A senhora atende a porta.

Olivia: (indo em direção a porta e abrindo) – Yur…

Orlando: - Tudo bem?

Giovanna correu atrás de Richard, ela poucas vezes foi fofa com o nosso irmão mais novo, porém naquele momento ela precisava ser forte por eles.

Giovanna: - (entrando no quarto de Richard que estava deitado na cama) – Ei.

Richard: - Sai daqui. Não quero falar com ninguém.

Giovanna: (sentando na cama) – Richard, tudo bem ficar com medo. Mas precisamos pensar positivo. O Yuri tá bem.

Richard: - E se aconteceu algo com ele? E se ele surtou e sofreu um acidente? Eu vou ficar sozinho!

Giovanna: - Você nunca vai ficar só, tem a titia e principalmente a mim. Eu nunca te deixaria sozinho. (abraçando o irmão) – Agora a gente precisa ser forte pela titia. Ela já tá muito nervosa. Você me ajuda?

Richard: - Sim. Ajudo.

Giovanna: (abraçando Richard e o beijando no rosto)

Richard: ( sem graça)

Giovanna: (levantando) – Agora tá bom né? Já tá ficando gay demais essa situação. Vamos descer que chegou alguém.

Na casa de George, eu e Diogo ficamos nos beijando no sofá. Ele tirou a camisa e eu a minha. Ele começou a beijar meus peitos e barriga. Aquela sensação era incrível. Ele tentou levantar para tirar a calça, mas escorregou e caiu. Começamos a rir.

Yuri: - Cuidado, não estamos nas nossas casas. Essas estátuas do George parecem caras. (ajudando Diogo levantar)

Diogo: - Pois é. (olhando fixamente para Yuri) – Você é lindo. (beijando Yuri)

A gente transou ali, no meio da sala do George. Eu me sentia bem ao lado do Diogo, ele me passava segurança. Ele foi um verdadeiro príncipe naquele dia, a transa foi super diferente, eu gostei mais. Não teve pressa ou palavras baixas, fizemos amor.

Na casa da minha tia, ela e Orlando ligavam para alguns amigos do juiz. A minha tia ficava cada vez mais apreensiva. Ela pensava o pior. A campainha tocou mais uma vez e era o Carlos.

Carlos: - Vim o mais rápido que eu pude. (percebendo a presença de Orlando) – O que ele tá fazendo aqui?

Olivia: - Ele apareceu. Veio fazer uma visita.

Carlos: - Relaxa. E o Yuri?

Olivia: - Não atende, não liga. (chorando) - Obrigado por vir. Eu não sei o que fazer.

Carlos: (abraçando Olivia) – Ei. Calma. Não foi nada. Ele vai aparecer.

Os meus amigos tentavam juntar as peças para saber do meu paradeiro. Zedu se sentiu impotente e com o sentimento de derrota, afinal ele se considerava o meu melhor amigo.

Leticia: - Ei. (pegando no ombro de Zedu e o assustando)

Zedu: - Oi?

Letícia: - Tá preocupado também?

Zedu: - Um pouco. Ele poderia ter me contado. Será que foi algo que eu fiz?

Letícia: - Eu acho que ele tá bem.

Diogo estava dirigindo o carro do pai dele. No percurso, a gente começou a ouvir a música 'Freedom' do George Michael. Começamos a cantar como loucos. Ele aumentou a música, o vento que vinha da janela deixava tudo mais especial. Chegamos na entrada da minha casa e começamos a nos beijar.

Diogo: - Quer que eu te acompanhe? Vai dar uma quase 1h.

Yuri: - Relaxa. (saindo do carro) – A minha tia deve tá dormindo. Te vejo na escola de manhã?

Diogo: - Com certeza.

Entre em casa estavam todos lá. A minha tia correu e me abraçou. Todos começaram a fazer perguntas e veio tudo a tona. O vídeo, as ameaças de Vando e a morte dos meus pais. Comecei a ouvir vozes, e elas não estavam vindo daquela sala. Todas na minha cabeça.

Yuri: - Chega!! (assustando todos) – Querem saber? De verdade? Vão todos para o inferno! (subindo)

Olivia: (pasma)

Giovanna: - Nossa.

Olivia: - Vou conversar com ele. Giovanna, leva o pessoal até a porta, por favor. (subindo para o quarto)

Giovanna: - Pode deixar. Vamos gente? (levando o pessoal até a porta)

Carlos: (sentando no sofá) – Acho que você deveria ir também, Orlando. Afinal deve ter uma vida movimentada.

Orlando: (sentando ao lado de Carlos) – Não. Vou esperar a Olivia.

Carlos: - Realmente. Acho que não precisa.

Orlando: - Quero saber se posso ajudar em mais alguma coisa.

Carlos: - Acho que você já ajudou de mais.

Orlando: - E você? Não precisa trabalhar cedo? O estágio começa que horas?

Carlos: - Estou dando suporte para a minha chefe, sabe como é. A gente se vê todo o dia, então conheço muito sobre ela.

Eu estava sufocado. Comecei a chorar. Ver aquelas pessoas me lembrava o motivo de estar aflito. Todas as cobranças voltaram. Sentei na cama e coloquei a mão no rosto. A minha tia entrou e sentou do meu lado.

Olivia: - O que houve? Que forma de agir foi aquela? Seus amigos estavam preocupados com você. Ficaram aqui todo o tempo.

Yuri: - Acredite. Aquelas pessoas são tudo menos meus amigos.

Olivia: - Como assim? Filho. Eu não tô te entendendo? Aconteceu algo?

Yuri: (levantando) – Não tia. Não aconteceu nada.

Olivia: - Amor. (levantando e indo até Yuri) – Você precisa me contar as coisas. Não pode guardar tudo para você.

Yuri: (se esquivando da tia e sentando na cama) – Eu não posso. Tia. Eu tô aqui. Nada aconteceu comigo. Eu só quero dormir.

Olivia: - Yuri. Você sabe que eu sempre estarei aqui quando você precisar. (indo em direção a saída do quarto)

Yuri: (pensando) – Conta. Conta. Conta pra ela agora.

Olivia: - (abrindo a porta)

Yuri: - Tia?

Olivia: - Oi? (olhando para Yuri)

Yuri: (nervoso e bem baixo) - Eu sou gay.

Olivia: (fecha a porta do quarto)

Eu abri meu coração. Foi difícil, mas, ao mesmo tempo, me deu um alívio. Pensei muito sobre tudo na minha vida e precisei contar para a minha tia.

Yuri: (nervoso e falando baixo) - Eu sou gay.

Olivia: (fechando a porta, sentando ao lado de Yuri e pegando na mão de Yuri) – Eu sei. (respirando fundo) – Só estava esperando você tomar coragem para me contar.

Yuri: (chorando)

Olivia: (pegando no rosto de Yuri) – Oh querido. Nem imagino as coisas que passaram pela tua cabeça. (abraçando o sobrinho) – Eu te amo. Eu te amo de qualquer forma, azul, verde, laranja. Você é quase um filho para mim. Estava com medo?

Yuri: - Pensei muito na forma que a senhora reagiria. Fiquei com medo de ser expulso… (chorando)

Olivia: - Amor. Não, não. Você nunca deveria imaginar isso. (enxugando as lágrimas de Yuri) – Você é um menino tão especial. Ser homossexual não é algo ruim. Infelizmente as pessoas falam isso. Foi por isso que você sumiu? Por isso que tratou seus amigos dessa forma?

Yuri: - Eu precisava de um tempo para pensar. Eu me senti preso.

Olivia: - Yuri.. Nunca te expulsaria dessa casa, afinal ela é sua e dos seus irmãos. Eu não tenho por que ter preconceitos, não sou igual à minha mãe. E seus pais também não eram. (se emocionando)

Yuri: - É que eu sou gordo, louco e gay. A senhora não entende. (chorando)

Olivia: - Meu amor. Infelizmente a sociedade é assim, mas nós que te amamos, sabemos quem você é realmente.

Yuri: - Eu sei, tia. Desculpa. (abraçando Olivia) – Eu não estou de castigo, né?

Olivia: - Ah. Claro que está. Uma semana sem sair de casa. (levantando e pegando o notebook de Yuri) – Sem internet também. Cadê o teu celular? (confiscando o telefone de Yuri) – Agora vai tomar um banho e dormir. Tá mais do que na hora. (saindo do quarto)

Zedu, Brutus, Letícia e Ramona conversavam sobre a minha atitude na frente da casa de Letícia. Meus amigos ficaram preocupados, principalmente após descobrirem meus problemas psicológicos, mas eles também tinham seus próprios demônios.

Brutus: - Vamos ficar preocupados com o grandão?

Zedu: - Ele parecia tão transtornado, né?

Ramona: - É. Confesso que fiquei assustada. Ele teve um colapso nervoso, isso é muito sério.

Letícia: - O que vamos fazer?

Zedu: - Vamos tratar ele normal. Acho que ele ficaria com vergonha da gente.

Letícia: - Você tem razão.

Ramona: - E também não deveríamos deixá-lo sozinho.

Zedu: - Será que tem alguma coisa haver com o Diogo?

Brutus: (batendo a mão uma na outra) – Eu quebro esse cara.

Ramona: (pegando no ombro de Brutus) – Chega de violência.

Letícia: - Puxa pelo menos o Yuri poderia ter conversado com a gente.

Zedu: (parecendo chateado) – Todos nós temos segredos… ou acha que a gente vai contar pra ele o que houve ano passado?

Letícia: - Verdade.

Brutus: - E se ele descobrir? Ele vai entender?

Ramona: - Ele vai ficar com medo e não vai querer a nossa amizade.

Na sala de casa, Orlando e Carlos esperavam a minha tia. Ela desceu e se assustou ao vê-los na sala.

Olivia: - O que vocês estão fazendo aqui?

Carlos e Orlando: (levantando do sofá) - Esperando você.

Olivia: - Gente. Eu agradeço muito o apoio de vocês, mas já vai dar quase três da manhã. Acho que vocês deveriam ir.

Giovanna: (entrando com uma massa verde no rosto, segurando um copo de água) – Eu falei para eles titia. (subindo as escadas)

Sim. Todos tem seus segredos, mas porquê eu?! Qual o propósito da minha amizade com eles? Eu fiquei com medo de verdade. Pelo menos a titia entendeu e me abraçou. Poderia ter sido diferente. No dia seguinte, acordei mais feliz do que o normal. A titia deixou o café da manhã pronto. Acho que ninguém dormiu bem. Giovanna e Richard pareciam zumbis. A gente nem tocou no assunto do meu desaparecimento, a Van chegou e eles foram para a escola. Encontrei a turma na parada de ônibus, tentei agir naturalmente, mas quase não consegui. Fui em silêncio na maior parte do caminho e encontrei o Diogo na frente da escola o que foi um alivio.

Diogo: - Oi. (abraçando Yuri e olhando para Zedu)

Yuri: - Oi.

Diogo: - Então? Falou com a tua tia.

Yuri: - Falei.

Diogo: - E ai?!

Yuri: (sorrindo) – Ela disse que já sabia.

Diogo: (rindo) – Que bom. Fico feliz. E tú já contou pra ele sobre o teu namorado?

Yuri: - Que… que… na..na… namorado?

Diogo: - Eu.

(campainha tocando)

Yuri: - Vamos para a sala. (entrando na escola)

Diogo: (sorrindo)

Brutus: - Nossa. Fomos ignorados.

Ramona: - Ah, deixa ele. O Diogo é amigo dele.

Letícia: - Sim. A gente também tem nossas amizades.

Zedu: - Mas ele nem se despediu.

Ramona: - Para, Zedu. Que tú faz pior com a gente. Nem sei como a Alicia não apareceu ainda.

Brutus: - Verdade.

Alicia: (beijando a nuca de Zedu) – Bom dia meninos.

Brutus, Ramona e Letícia: - Bom dia. (saindo de perto de Zedu)

Antes de entrar na sala o meu celular tocou. Pedi licença do Diogo e atendi. Era a minha tia.

Olivia: - Oi, filho. Tudo bem?

Yuri: - Sim, tia. Aconteceu alguma coisa?

Olivia: - Não. Só queria saber como você tá?

Yuri: - Estou ótimo.

Olivia: - Tá na sala de aula, né?

Yuri: - Vou entrar daqui a pouco.

Olivia: - Tá tudo bem mesmo, né?

Yuri: - Sim. Ei, tia. Pode ficar tranquila. Eu vou ficar bem.

Olivia: - Tá bom, mas qualquer coisa me liga. Quer que eu vá te pegar hoje?

Yuri: - Não tia. Obrigado. Preciso ir. Te amo. (desligando celular)

A aula foi maravilhosa. Eu sentei perto de Diogo e passamos a manhã trocando recadinhos. No intervalo, fomos para o nosso lugar secreto e confesso que dormi. O sono me pegou de jeito. No segundo tempo a gente continuou com a troca de recadinhos. Eram piadas, comentários ácidos (da parte do Diogo) e uma bobagens românticas.

Diogo: (mensagem) – Quando você vai aceitar namorar comigo?

Yuri: (mensagem) – Calma. Te conheço a pouco tempo.

Diogo: (mensagem) – Não quero te perder.

Yuri: (mensagem) – Bobo. Bobo demais.

Diogo: (mensagem) – Bobo por você.

Yuri: (rindo)

Zedu: (olhando e faz cara de poucos amigos)

Alicia: - O que houve?!

Zedu: - Nada.

Alicia: - Tá olhando muito lá para trás. É pra Luciana?!

Zedu: - Para de falar besteira. (abrindo o caderno e rabiscando)

Yuri: (rindo)

Professor: - Algum problema Yuri?!

Yuri: - Nã...nã...não pro...professor. Tudo bem. (olhando para Diogo)

Zedu: (levantando a mão)

Zedu: - Pois não, José.

(alguns alunos rindo, inclusive Alicia)

Zedu: - Preciso ir ao banheiro.

Professor: - Vá rápido. Tenho um exercício para passar.

Alunos: (murmurando por causa do exercício)

Professor: - Chega. Silêncio. Terminem a leitura.

Zedu: (saindo da sala chateado)

Na escola da Giovanna uma novidade deixou todos os alunos animados, o professor de artes estava escrevendo um espetáculo baseado na história da Cinderela. Lógico que a minha irmã já se imaginou vivendo a personagem principal. Ela e sua única amiga

Cláudia: - Você vai querer participar?

Giovanna: - Claro que eu vou. Já pensou? (abrindo os braços) – Eu… a nova Cinderella.

Niandra: - Tem gente se achando.

Giovanna: - Eu não me acho querida, eu sou. (piscando e sorrindo para Niandra)

Niandra: - Você sabe que existe uma audição, né?!

Giovanna: - E, claro, que eu vou arrasar. Não me preocupo.

Professor de Artes: (pendurando um panfleto para os alunos assinarem)

Giovanna: - (pegando uma caneta e assinando seu nome bem bonito e o 'i's' com coração) – Pronto. Agora preciso buscar referências para fazer o teste. Espero que tenha música.

Niandra: - (assinando em letra grande) – Boa sorte. (saindo)

Giovanna: - Você vai precisa queridinha.

Cláudia: (assinando) – Quero experimentar. Nunca fiz uma peça antes.

Giovanna: - Você pode treinar lá em casa. Vai ser tão divertido.

Cláudia: - Sim. Espero que a Niandra não pegue no nosso pé.

Giovanna: - Ela que nem sonhe em fazer isso. (jogando o cabelo)

Não eram apenas eu e Diogo que estávamos conversando por recadinhos. Letícia começou a receber mensagens de Arthur, filho de um dos diretores da produtora que a minha amiga fazia parte.

Arthur: (mensagem de texto) – Oi?

Letícia: (mensagem de texto) – Oi, tudo bem?

Arthur: (mensagem de texto) – Puxa. Se eu não mandar mensagem, morro de esperaria

Letícia: (mensagem de texto) – Desculpa, mas estou com muitos trabalhos na escola. Vida de estudante é difícil.

Arthur: (mensagem de texto) – Quero te ver. Será que pode arrumar um tempo para mim nessa sua vida de estudante/modelo?

Letícia: (mensagem de texto) – Posso sim. Hoje a noite te falo.

Arthur: (mensagem de texto) – Fala mesmo? Ou vai me enrolar?

Letícia: (mensagem de texto) – Falo mesmo.

Ramona: (olhando para o celular de Letícia) – Olha. Alguém está apaixonada.

Letícia: (riso abafado) – Eu? Apaixonada? Nem conheço o garoto.

Ramona: - Ele parece ser gato.

Letícia: - Muito. Ele é lindo, né? Mas estou fazendo a tática da difícil. (rindo)

Professor: - Hoje vocês estão muito comediantes. Posso saber qual é a graça?

(todos os alunos se olham e riem)

Na empresa, a minha tia ainda mantinha uma certa distância do Carlos. Falava apenas o necessário, mas nem sempre seu plano funcionava.

Carlos: - Tá tudo bem?

Olivia: - Oi?

Carlos: (sentando perto de Olivia) – Perguntei se está tudo bem?

Olivia: - Sim.

Carlos: - E o teu sobrinho? O que ele aprontou?

Olivia: - Ai, Carlos. (chorando)

Carlos: (levantando, indo até a porta e fechando) – Calma. (sentando novamente) – O que aconteceu?

Olivia: - (limpando as lágrimas) – Sou uma péssima tia.

Carlos: - Péssima tia? Eu não vi isso ontem. Eu a vi muito preocupada com ele.

Olivia: - Eu sei… eu sei….

Carlos: - Ele te falou isso?

Olivia: - Não. Na verdade… ele… ele… ele contou que é homossexual.

Carlos: - E é por causa disso que você tá chorando?

Olivia: - Estou preocupada. Sabe quando gays morrem no Brasil por causa da homofobia?

Carlos: - Infelizmente milhares. O mundo virou um lugar maluco.

Olivia: - Eu me preocupo com a saúde dele. Principalmente a mental.

Carlos: - Escute. O Yuri é um menino esperto e tem ótimos amigos. Eles estavam tão preocupados quanto você, (pegando na mão de Olivia) – Agora posso fazer uma pergunta?

Olivia: - Pode.

Carlos: - Por quê você me ligou?

Olivia: Bem… (se afastando de Carlos) – É que você é uma das poucas pessoas que eu conheço aqui e… Carlos… vamos voltar para o trabalho? Os teus papéis não vão se assinados sozinhos.

Naquela tarde, não esperei por ninguém e peguei a condução sozinho. Queria evitar a turma, afinal não queria ter quer confrontá-los por causa do Mascarenhas , e também evitei sair de casa para não encontrar o Vando, aquele ridículo. Durante a semana, recebi a visita do Diogo algumas vezes, nós estávamos bolando a ideia para o projeto de história.

Yuri: - Adorei a ideia. Será que o George vai nos ajudar? (acompanhando Diogo até a porta)

Diogo: - Ele tem todos os equipamentos, acho que ajuda sim.

Yuri: - Amanhã vamos com ele?

Diogo: Sim. (beijando Yuri)

Yuri: (beijando Diogo, mas para depois de um tempo) – A minha tia tá aqui. (abrindo a porta)

Diogo: - Tudo bem. Tchau. (saindo)

Yuri: - Tchau. (fechando a porta, sorrindo e sentando no sofá)

Olivia: (sentando ao lado de Yuri, parecendo nervosa)

Yuri: - Tá tudo bem? A senhora parece um pouco estranha.

Olivia: - Yuri. Você já é um homemzinho, então precisa ter certos cuidados e…

Yuri: - Porquê a senhora está falando isso?

Olivia: - O mundo… as pessoas… elas… elas… são… como eu posso falar… humm… perigosas, então… você não deve confiar em ninguém…. O sexo… ele é… o sexo é algo muito intimo, então eu…. (entregando várias camisinhas para Yuri)

Yuri: (ficando vermelho) – Tia… tia… eu… já pesquisei muito sobre isso na internet… eu… eu… não… digo….

Giovanna: (entrando) – O que vocês estão fazendo?

Yuri: (escondendo a camisinha no bolso)

Yuri e Olivia: (levantando) – Nada.

Yuri: - Vou arrumar a horta. (saindo)

Olivia: - Vou regar as plantas. (saindo)

Giovanna: (fazendo careta) – Que horta e plantas?

Deveria ter contado para a titia que eu não era mais virgem, mas do que ia adiantar? Ela talvez já desconfiasse. Que vergonha. Nunca gaguejei tanto na minha vida. Apesar de tudo não conseguia tirar da minha cabeça aquela história do Mascarenhas. Será que eles teriam feito aquilo por maldade?

Eu e Diogo conseguimos a permissão de George para usar seus equipamentos de filmagem, ele nos deu um mini curso de filmagem, era complicado, mas prazeroso. Era legal também que eu e Diogo ficávamos sozinhos no estúdio de George. A gente conseguiu o contato de uma pianista para o nosso projeto, então começamos os ensaios para a gravação oficial.

Pianista: - Até amanhã. (saindo)

Diogo: (fechando a porta) – Bem. Vamos arrumar? (chegando perto de Yuri e o beijando)

Fizemos sexo ali no estúdio de George. Estávamos pelados no chão, eu gostava de estar junto ao Diogo, mas ao mesmo tempo sentia que faltava alguma coisa. Ele era atencioso, carinhoso, mas acho que eu não o amava. Às vezes, me sentia uma pessoa horrível.

Diogo: (encostando a cabeça no ombro de Yuri) – Eu gosto de estar com você.

Yuri: (fazendo carinho no cabelo de Diogo) – Eu também. Você é meu único amigo.

Diogo: - E o Zedu?

Yuri: - Não sei.

Diogo: - Ele já sabe que você é gay?

Yuri: - Ainda não contei para eles.

Diogo: - Está esperando o que?

Yuri: - Não sei.

Richard encontrou no meu quarto as camisinhas que a tia Olivia me deu. Ele guardou no bolso e resolveu levar para a escola. Ele mostrou para todos os amigos.

Gomes: - Isso é teu?

Richard: - É. Estou guardando para quando conseguir uma namorada.

Juca: - Credo. Namorada? O melhor é jogar vídeo game.

Richard: - Ei. Vamos aprontar com a professora?

Todos: - Vamos.

Quando a professora do Richard entrou na sala de aula, ela se deparou com várias camisinhas cheias. Ela ficou possessa e começou a gritar com os alunos.

Professora: - Quem fez isso? (gritando)

Alunos: (rindo)

Professora: (apontando para Richard) – Foi você, né? Seu enviado do mal!!! (gritando)

Richard: - Não fui eu professora.

Alunos: (rindo)

Professora: (estourando todas as camisinhas)

A semana passou correndo. Desde o dia em que descobri que os meus amigos haviam atacado o Mascarenhas, eu não falava direito com eles. Na hora do intervalo, sempre inventava algo para escapar deles. Um dia, o Diogo me beijou no nosso lugar secreto, ele falou que ia pegar refrigerante para nós. Quando olhei para trás, o Zedu, a Letícia, o Brutus e a Ramona me olhavam perplexo.

Zedu: (nervoso) – Era por causa disso? Era por causa disso que você estava estranho com a gente?

Yuri: - Eu…. Eu… posso….

Brutus: - Caraca grandão.

Ramona: - Amigo? Porque não nos contou?

Yuri: - O que vocês estão fazendo aqui?

Letícia: - A gente te seguiu para saber o que você estava aprontando e… desculpa….

Zedu: - Eu pensei que eu era o teu melhor amigo… e você… faz isso comigo.

Ramona: (olhando para Zedu)

Letícia: - Uma pena Yuri.

Brutus: - O que vamos fazer? (olhando para os outros)

Yuri: (assustado) – Por favor… saiam daqui…

Brutus, Zedu, Ramona e Letícia: - (se aproximam de Yuri)

Yuri: - Se afastem. Fiquem longe de mim!

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